Editorial
Constrangida pela repercussão do descontrole no uso da cota de passagens aéreas pelos parlamentares, a Câmara dos Deputados anunciou ontem, após reunião da Mesa Diretora, providências para enfrentar excessos e conter a indignação da sociedade com algumas revelações dos últimos dias. Movido pela mesma preocupação, também o Senado resolveu reagir. Mesmo depois da indignação provocada, ambas as casas do Congresso deixaram em aberto a possibilidade de os parlamentares recorrerem à cota do Legislativo também para bilhetes aéreos a serem usados por filhos e cônjuges, além de assessores. Isso significa que a margem para a continuidade dessa verdadeira farra com dinheiro público se mantém e, certamente, continuaria sem qualquer limite se os abusos não tivessem se tornado públicos.
A gastança em deslocamentos aéreos só se tornou conhecida depois da revelação de que um parlamentar, o deputado Fábio Faria (PMN-RN), bancou com dinheiro da Câmara bilhetes aéreos para a ex-namorada Adriane Galisteu, para um grupo de artistas e até mesmo uma viagem ao Exterior da mãe da apresentadora. Os brasileiros ainda tentavam passar da indignação a ações capazes de gerar providências concretas por parte do parlamento quando surgiu a informação de que também ministros de Estado teriam usado passagens aéreas da mesma cota, mesmo depois de terem se licenciado como parlamentares para integrar o primeiro escalão do Executivo. São situações inadmissíveis, que obviamente só ocorrem porque, se faltam controles e se não há um mínimo de conscientização necessária por parte dos políticos, de maneira geral, a tendência é predominar sempre a falta de cuidado nos gastos bancados com dinheiro público, portanto dos contribuintes.
Independentemente das reações improvisadas diante das denúncias e das desculpas comumente desfiadas quando a situação assume ares de descontrole, o fato é que o episódio contribui para desgastar ainda mais a já combalida credibilidade do Congresso. É inadmissível que, acobertados pela falta de controle e de transparência sobre os gastos públicos bancados pelos contribuintes, políticos possam bancar deslocamentos aéreos de quem nada tem a ver com a atividade parlamentar. E é menos aceitável ainda que a classe política só reaja a esse tipo de deformação, e mesmo assim timidamente, depois de confrontada por denúncias.
Entre as atribuições do Congresso, estão a de fiscalizar atos do Executivo, o que deveria levar a instituição a se preocupar permanentemente com a ética e com o rigor no uso de verbas orçamentárias. A sociedade, portanto, tem o direito de esperar que o Legislativo se disponha a promover uma mudança comportamental motivada não apenas por pressões externas, mas também, principalmente, pela vontade de seus próprios integrantes.
Fonte: Zero Hora (RS)
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