Dizendo-se cansado da vida pública, senador descarta disputar novo mandato e culpa o Congresso e o Judiciário por impunidade
Fábio Góis
Sempre apontado como uma das referências éticas do Congresso Nacional, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), 78 anos, admite estar de saída da vida pública, após mais de quatro décadas no exercício de mandatos eletivos. Em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, ele descarta disputar nova eleição e se mostra pessimista em relação ao futuro do Parlamento brasileiro.
Eleito para seu quarto mandato no Senado em outubro de 2006, Simon tem cadeira garantida na Casa até o início de 2015.
”Não sei se vou chegar lá, na minha família ninguém chegou. Então não penso mais em concorrer. Agora, sinceramente, se fosse concorrer de novo, eu lhe diria que estou cansado, não teria condições de me candidatar de novo. Passou a minha vez”, afirma.
Com atuação voltada sobretudo para o combate à corrupção e a defesa da ética nos últimos anos, o peemedebista critica o corporativismo e a falta de iniciativa do Legislativo e a morosidade do Judiciário para combater a impunidade. ”O Congresso atual é negativo, muito negativo”, critica.
Autor de propostas que restringem a candidatura de políticos condenados em primeira instância e que prevêem a divulgação dos nomes dos candidatos que respondem a processo na Justiça, Simon também não poupa os magistrados.
“Eu acho muito cômoda a posição da Justiça, com todo o respeito, de querer apenas dizer quem está sendo processado. Em compensação, a Justiça não julga nunca”, reclama.
Ministro da Agricultura, no governo José Sarney, e líder do governo Itamar Franco, Pedro Simon mantém-se independente em relação ao governo Lula. Por um lado, elogia as recentes iniciativas do Executivo, sobretudo da Polícia Federal, no combate à criminalidade, mas, por outro, condena o radicalismo da base aliada e da oposição no Congresso, que, segundo ele, está minando a credibilidade das comissões parlamentares de inquérito.
“Quem é oposição é radical, defende o governo anterior e é contra o atual. E quem é governo é radical: defende o governo atual e é contra o anterior. Então, as CPIs que estão aí dão em zero, porque cada um defende uma parte e não se investiga coisa nenhuma”, avalia o senador, que foi membro destacado da CPI que levou ao impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello, em 1992.
Finalista das duas categorias do Prêmio Congresso em Foco 2008, o senador foi apontado por jornalistas que cobrem a Câmara e o Senado como um dos 16 senadores que mais bem exerceram o mandato este ano e um dos cinco parlamentares que mais se destacaram no combate à corrupção.
Congresso em Foco – O senhor é autor de uma proposição segundo a qual político com condenação em qualquer instância da Justiça é declarado inelegível. Contudo, a Justiça Eleitoral e o próprio Supremo Tribunal Federal já decidiram que a inelegibilidade só se justifica quando o candidato foi condenado em última instância. O senhor não acha que está havendo permissividade por parte da Justiça em relação aos candidatos com pendência judicial?
Pedro Simon – O Brasil é o país da impunidade. Eu tenho dito e repetido que só ladrão de galinha vai para a cadeia. A Justiça eleitoral está debatendo a tese que o próprio presidente do Tribunal Superior Eleitoral e os presidentes dos tribunais regionais eleitorais defendem de que com uma condenação o cidadão não pode ser candidato. Com quem tem “ficha suja” não pode ser diferente. Eu vou por uma posição diferente: defendo a tese de que quem está sendo processado não pode ser candidato, mas que a Justiça tem a obrigação de julgar os casos antes da eleição. Eu acho muito cômoda a posição da Justiça, com todo o respeito, de querer apenas dizer quem está sendo processado. Em compensação, a Justiça não julga nunca. É verdade o que a Justiça diz, que tem uma legislação lerda, frouxa, que quem pega um bom advogado empurra, empurra e não se julga nunca. Tanto a Justiça quanto nós temos a obrigação de tomar providências no sentido da rigidez, da determinação de que [os processos] têm de ser julgados. No momento em que meu projeto define que quem está sendo processado não pode ser candidato, quem está sendo processado vai correr para ser julgado. Se o processado não pode ser candidato, ele vai correr feito doido para ser julgado, esse é o ideal. Eu sou muito simpático à Justiça eleitoral quando ela fala em “ficha suja” e tudo o mais, só que eu acrescento e ponho a Justiça na jogada, embora ela diga, com razão, que muitas vezes nós, Congresso, somos responsáveis, porque na hora de votar um projeto que dê rapidez ao Código de Processo Penal, que facilite o julgamento, a gente sempre empurra com a barriga. A grande verdade é que precisamos tomar providências nesse sentido: quem tem ficha suja não pode ser candidato, mas é obrigado a ser julgado antes da eleição. Se, por qualquer eventualidade não foi julgado antes da eleição, os eleitos têm de ser julgados entre a eleição e a posse.
Durante o governo Lula, o que aumentou: a corrupção, como prega a oposição, ou o combate à corrupção, como alega o governo?
Eu sou obrigado a reconhecer que nós tivemos uma fase positiva de combate à corrupção, isso não há como negar. E eu não vou discutir aqui os excessos da Polícia Federal, e acho que houve – por exemplo, a escuta telefônica do presidente do Supremo, que foi um absurdo. Mas, em compensação, ela atuou. Eu tenho o maior respeito pelos homens da Abin [Agência Brasileira de Inteligência] e da PF, são pessoas voltadas para a busca do bem comum. Mas eu não sei se o crime aumentou, porque na verdade ele sempre existiu. Na verdade, aumentou a sua exposição, ele tem vindo mais a público, e tem sido mais debatido. Lamentavelmente, desde o início do governo Lula, o Congresso não tem cumprido a sua finalidade.
Por quê?
As CPIs se esvaziaram. Nos governos Itamar Franco, Fernando Collor e Fernando Henrique, as CPIs exerceram uma grande função. Era uma época em que as CPIs agiram de uma maneira espetacularmente positiva. A CPI conseguia ter certa isenção, fosse da oposição ou do governo. No caso do Collor, quando chegou no início da discussão, 80% eram a favor do Collor, mas quando chegou ao final, em que os fatos apareceram, 90% ficaram contra ele. Neste atual governo, lamentavelmente, não: quem é oposição é radical, defende o governo anterior e é contra o atual. E quem é governo é radical: defende o governo atual e é contra o anterior. Então, as CPIs que estão aí dão em zero, porque cada um defende uma parte e não se investiga coisa nenhuma. O Congresso atual é negativo, muito negativo. Justiça seja feita à Procuradoria [Geral da República], os promotores e à Polícia Federal, que está atuando, ocupando o vazio que o Congresso deixou. Sou obrigado a reconhecer.
Como o senhor vê o conflito entre tal abuso investigativo e a necessidade de investigação?
Eu vim da ditadura, o meu partido lutou contra a ditadura, nós sofremos todo o tipo de arbítrio e injustiça que pode acontecer. Nós, que fizemos uma luta pela democracia e uma Constituição a favor da democracia, não queremos que o arbítrio e a violência existam. Mas também não queremos cair no lado contrário: de repente, ver um embate em que um banqueiro [Daniel Dantas, preso pela Operação Satiagraha] tem todo mundo do lado dele, e ele praticamente isento de tudo.
Graças a um projeto de sua autoria, o Supremo não mais precisa consultar o Congresso para processar um parlamentar. O que ainda é preciso mudar nesse sentido?
A vida inteira, o Supremo, para iniciar um processo contra um parlamentar, tinha de pedir licença para a Câmara, se fosse deputado, e para o Senado, se fosse senador. Modéstia à parte, eu lutei numa luta de 20 anos, e hoje não é mais assim. Hoje, o procurador-geral da República denuncia e o Supremo processa o parlamentar sem dar bola nem para o Senado nem para a Câmara. Eu não fui totalmente vitorioso, mudaram meu projeto, permitindo o seguinte: o Senado ou a Câmara pode votar pela suspensão, mandar parar o processo. Eu fui contra isso, mas na verdade não teve necessidade: até hoje ninguém, na Câmara ou no Senado, teve coragem de fazer isso.
O que a aprovação deste projeto mudou na prática?
Antigamente, ninguém era processado. O Supremo mandava pedir licença para processar, e o pedido ficava na gaveta do presidente do Senado, do presidente da Câmara, e nunca o cara era processado. Isso mudou, hoje é processado. O que aconteceu? Quando o aprovamos, nosso projeto ficou na gaveta do [Geraldo] Brindeiro. O ex-procurador-geral da República deixou na gaveta dele. Agora, com o atual procurador [Antonio Fernando de Souza], são muitos os parlamentares que estão sendo processados.
É o momento de ir além e acabar com o foro privilegiado?
Acho que sim, o foro privilegiado está sendo negativo. Mas temos de ter cuidado. Não podemos ter, de repente, um promotor fanático, lá do interior, ou um juiz apaixonado, daqui a pouco interpor um processo contra o presidente da República por qualquer coisa. Há de ter certo cuidado nesse sentido, mas acho que deveria ter alguma coisa com relação à Justiça eleitoral, ou coisa que o valha. Agora, da maneira com que está o foro privilegiado, ele termina sobrecarregando tudo. Por exemplo, o processo do mensalão está lá. O Supremo fez um ato espetacular, denunciou os 40 [acusados pelo procurador-geral], mas vai levar dez anos para seguir adiante.
Os processos sobre crimes de corrupção ou improbidade administrativa deveriam ser priorizados nas cortes do país?
Prioridade total. Um projeto meu diz que quem está sendo processado e é candidato tem de ser julgado em primeiro lugar, não pode ficar na gaveta de ninguém. O delegado de polícia tem de pegar, em primeiro lugar, o caso de um político processado por crime eleitoral, por crime político, por corrupção. O promotor tem de denunciar ou arquivar em primeiro lugar. O juiz tem de julgar em primeiro lugar, o tribunal tem de julgar em primeiro lugar. E, se é época de eleição, antes da eleição ele tem de ser julgado. Se, por qualquer motivo, ele não for julgado antes da eleição, entre a eleição e a posse ele tem de ser julgado.
Nos últimos dias de vida, o senador Jefferson Péres vinha declarando não sentir mais estímulo em continuar na vida pública, tamanha era sua decepção com os seguidos casos de corrupção envolvendo seus pares. O senhor costuma subir à tribuna do Senado para fazer discursos inflamados contra os desmandos na administração pública. O senhor também considera se afastar da vida pública em razão disso?
Eu não saberia te responder por uma razão muito sincera: eu tenho 78 anos e mais seis anos de mandato. Meu mandato encerra em 31 de janeiro de 2015, dia do meu aniversário, quando estarei fazendo 85 anos. Não sei se vou chegar lá, na minha família ninguém chegou. Então não penso mais em concorrer. Agora, sinceramente, se fosse concorrer de novo, eu lhe diria que estou cansado, não teria condições de me candidatar de novo. Passou a minha vez.
O que a população ainda pode esperar deste Congresso?
É uma desilusão muito grande. Corrupção tem em qualquer lugar, tem gente que acha que o Brasil é um país corrupto, que isso não acontece em outros lugares. Acontece, e muito, em outros lugares. A diferença é que, em outros lugares, o cidadão é processado e vai para a cadeia. A Operação Mãos Limpas, que foi feita na Itália, cassou o mandato de mais de cem parlamentares, botou na cadeia empresários, a começar pelo presidente da Fiat à época, a maior empresa da Itália. Ela condenou juízes, procuradores, agiu fundo, fundo mesmo. Houve um momento, no Japão, em que três ex-primeiros-ministros se suicidaram de vergonha dos processos. No Brasil, não. Fica tudo nas gavetas, não acontece nada. Esse é o mal. A imprensa publica manchete atrás de manchete, em jornal, rádio, televisão: roubou, matou, degolou, houve um escândalo, e não é julgado. O que acontece? Para efeito de opinião pública, não aconteceu nada, foi absolvido. Mas o cidadão honesto, decente, digno, às vezes tem uma manchete injusta, cruel, que não é verdadeira – mas, como não foi julgado, vai tudo para o mesmo rol. Há uma desilusão generalizada. Por isso, repito: tem de ser julgado, e prioritariamente, para que mude o panorama da vida brasileira.
Fonte: Congresoemfoco
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