BRASÍLIA - Autor de requerimento para criar uma CPI mista sobre o uso de cartões corporativos pelo governo, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) passou o Carnaval debruçado sobre 2 mil páginas de documentos e perícias produzidos pelo Tribunal de Contas da União (TCU) que, segundo ele, comprovam uma farra no uso dos cartões. "Há fraudes e irregularidades", afirma.
Sampaio diz que não é objetivo da CPI investigar gastos do presidente Lula e sua família e avisa que ela atingirá tanto o governo do PT como o do PSDB, do ex-presidente Fernando Henrique. Ele começa a recolher hoje assinaturas na expectativa de atingir o número exigido - 171 na Câmara e 27 no Senado - até meados da próxima semana.
PERGUNTA - O sr. tenta a criação de uma CPI mista, mas já se fala numa CPI do Senado, onde a oposição é mais forte. As pessoas estão compreendendo que a CPI é uma investigação mais ampla?
CARLOS SAMPAIO - Não é por causa de três ministros, de cujos gastos com o cartão ficamos sabendo agora. Tenho 2 mil páginas de perícias feitas pelo Tribunal de Contas da União, que não contemplam dados sigilosos. Só a CPI pode acessar informações sigilosas. Se não conseguirmos a CPI mista, entregarei todos os dados que tenho para que ela seja feita no Senado.
Aonde a CPI pode chegar?
A CPI poderá investigar com poderes que a Controladoria Geral da União (CGU) não tem. A CGU é um órgão ligado ao governo e não tem a capacidade judicial que a CPI tem. A CPI pode requisitar documentos, convocar depoimentos e dispõe de instrumentos que a CGU não tem. O desfecho da CPI deverá ser o de apresentar os responsáveis pelo uso indevido do cartão para serem punidos pela Justiça e o de criar um novo mecanismo que dê eficiência à fiscalização. Por isso, é que uma há chance efetiva na coleta das assinaturas. O receio do governo é a maior evidência de que a CPI tem de acontecer.
Depois que falei em CPI, a ministra Dilma pediu uma investigação e, dois dias depois, o ministro Paulo Bernardo soltou uma nova norma sobre o uso dos cartões. Estão fazendo tudo para evitar a CPI. O ministro Paulo Bernardo disse que seria a "CPI da tapioca", em referência ao fato de o ministro dos Esportes, Orlando Silva, ter usado o cartão para pagar despesas em uma tapiocaria, em Brasília. Não é a CPI da tapioca, como disse Paulo Bernardo. São R$ 140 milhões de gastos, de 2004 para cá. A CPI vai investigar de 2001 até agora, desde o nascedouro do cartão corporativo. Ou seja, pega PT e PSDB. São dois anos nos quais o PSDB, meu partido, era governo. Não estou partidarizando. A CPI vai cuidar de fatos mais graves que os episódios dos ministros.
O ministro Paulo Bernardo, e acho que não foi por má-fé, demonstrou um desconhecimento completo do uso do dinheiro público. Poderia ser uma tapioca, R$ 1 ou R$ 1 milhão. Ele tem de ter cuidado em não ridicularizar, porque se trata de dinheiro público, não do dinheiro dele. A CPI não é para fazer auê. É para pegar o mau uso.
O que a CPI deve investigar?
A CPI vai investigar três coisas. Duas são o uso indiscriminado do cartão corporativo e o desvirtuamento do uso. Nesses pontos, a perícia feita pelo TCU constatou que 60% do uso tem sido para saques na boca do caixa. O terceiro ponto é a verificação de fraudes no uso. Há um caso, por exemplo, de pagamento de dez diárias, sendo que a perícia constatou que a hospedagem durou cinco dias. Todas essas irregularidades estarão no foco da CPI. Por tabela, está a questão dos ministros.
As investigações vão atingir gastos do presidente e de seus familiares?
Sou contra, em princípio, à quebra de sigilo dos gastos do presidente. Por trás desses gastos há uma questão de segurança nacional. O presidente e sua esposa não estarão no foco da CPI. Isso poderia sugerir um interesse de bisbilhotar. A intenção também não é de acabar com o cartão corporativo, um instrumento ágil e moderno e que permite ter o extrato de todos os gastos. O problema é o desvirtuamento do uso do cartão.
E o caso de um segurança de Lurian, filha de Lula, que usou o cartão para fazer compras em lojas de materiais de construção, autopeças e ferragens, entre outras?
Tudo que entra no foco familiar é ruim para a CPI. Mas como a imprensa noticiou, talvez fosse o caso de requisitar os documentos, mas manter o sigilo.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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