Carlos Newton
A decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem base numa irrealidade absurda. O juiz federal Walter Nunes, conselheiro do CNJ que relatou a polêmica questão, partiu do princípio que a atual jornada de trabalho dos servidores será mantida. Ou seja, apenas haverá um revezamento entre os funcionários para garantir a prestação de serviço no horário determinado. Para justificar sua tese, o conselheiro disse “duvidar da alegada falta de servidores para cumprir a determinação”.
Pior a emenda do que o soneto, diriam os antigos magistrados. Sem perceber, o ilustre conselheiro de repente está denunciando que os Judiciários dos Estados e do Distrito Federal, todos, sem exceção, estão trabalhando com excesso de funcionários, isto é, todos contrataram servidores sem necessidade. Então, estaríamos diante de um caso de Polícia, de um escândalo nacional de enormes proporções.
A Federação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário nos Estados (Fenajud) não aceitou essa avaliação do juiz Walter Nunes e imediatamente protestou contra a decisão. Em nota, a Fenajud alegou que, por falta de pessoal, o cumprimento da determinação do CNJ ampliará a jornada de trabalho dos servidores – hoje fixada em seis ou sete horas diárias.
“Fica-nos a preocupação de (saber) em que termos será efetivamente garantido esse horário, com a escassez de servidores nas unidades cartorárias. Terão os tribunais condições de suprir as unidades judiciais sem prejudicar a jornada de trabalho dos servidores?”, questiona a Federação.
Não é por aí que o Conselho Nacional de Juiz vai conseguir colocar os juízes para trabalhar. A agilização da Justiça precisa ser feita em outros moldes, que digam respeito diretamente ao trabalho dos magistrados. Como todos sabem, o Judiciário é o mais privilegiado dos Poderes. Os magistrados têm férias duas vezes ao ano e o número de feriados e dias enforcados na Justiça é absurdo, fato público e notório.
O pior é que, no Brasil, juiz relapso ou corrupto não é punido. O máximo que lhe pode acontecer é um verdadeiro prêmio – ganhar aposentadoria precoce, com salário integral e direito a seguir trabalhando como advogado. Na Filial é assim, mas na nossa Matrix, os Estados Unidos, juiz corrupto vai preso algemado, com qualquer mortal.
Recentemente, o Conselho Nacional de Justiça puniu com aposentadoria compulsória o juiz Antônio Fernando Guimarães, do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, por favorecer os clientes do escritório de advocacia Vilhena & Vilhena.
O luxuoso apartamento onde o juiz mora em região nobre de Belo Horizonte pertence ao filho do advogado Paulo Vilhena, João Braúlio Vilhena, mas o magistrado não se declarou impedido nos julgamentos de causas envolvendo o escritório, o que demonstra conduta incompatível com o exercício da magistratura.
O juiz pagava aluguel de R$ 200, valor ridículo e considerado “simbólico”, O relator do caso, conselheiro José Adônis Callou de Araújo Sá, disse ter “dados que comprovam que as causas envolvendo o escritório Vilhena das quais Guimarães participou, que tiveram resultado favoráveis, têm valor impressionante, enquanto os de causas que julgava contra tinham valores bagatela”. E acrescentou:
“Um magistrado pode ser amigo de um advogado. Isso é uma coisa. Outra coisa é que essa amizade produza feito de efeito econômico. Vantagens econômicas não são meramente afetivas. Não existe almoço de graça.”
O pior de tudo isso é que, no julgamento do ilustre magistrado, o presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Cezar Peluso, e os conselheiros Ives Gandra Martins e Leomar Barros se posicionaram contra a punição, apoiando a possibilidade de o juiz Antônio Fernando Guimarães estar sendo era perseguido por disputas internas.
Porém, no entender da corregedora Nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, não havia dúvida e considerou que “este processo traz à lume um verdadeiro câncer, presente em alguns tribunais do país”.
Muito bom, muito bonito. Mas enquanto juiz corrupto não realmente for punido no Brasil, tudo é só brincadeirinha. Condená-lo a se aposentar mais cedo, com salário integral e direito de seguir trabalhando como advogado, isso não é punição, é bonificação.
A Justiça só funcionará quando houver respeito ao cidadão, quando ele puder recorrer à Corregedoria, abrir um processo contra um juiz (como se faz na OAB contra os advogados), e a coisa funcionar, sem espírito de corpo. Vejam o caso da Tribuna, há 31 anos esperando uma indenização mais do que justa.
Eu mesmo tenho uma questão judicial aqui no Rio, em que há 4 anos aguardo que o juiz se digne a nomear um depositário judicial, um dos atos mais simples e corriqueiros no Judiciário. Quando insisto com meus advogados para denunciar o juiz à Corregedoria, eles dizem que não adianta nada e, aí sim, o juiz ficará eternamente sentado sobre o processo.
Aqui na Filial os juízes são os únicos cidadãos verdadeiramente inimputáveis. Enquanto isso não mudar, o que poderemos esperar? É muito triste e desalentador, porque se a Justiça funcionasse, todo o resto funcionaria, as autoridades e as elites não seriam tão promiscuas e corruptas, temeriam uma punição que não existe hoje. Sabem que estão à salvo da Justiça, que só existe para punir quem fica nos degraus mais baixos da escala social.
Que país é esse, Francelino Pereira? Com toda certeza, não é um país sério, porque no Brasil os juízes estão muito acima da lei da ordem.