Dora Kramer
Um acordo só seria aceitável e considerado de cavalheiros se fosse nos termos da lei, em que as partes concordam em obedecer estritamente às regras. Aí sim, seriam desnecessários os recursos à Justiça. Mas, convenhamos, para isso não é preciso abrir
Em 2005, quando o publicitário Duda Mendonça confessou à CPI dos Correios que foi pago por meio de caixa 2 para trabalhar na campanha do presidente Luiz Inácio da Silva na eleição de 2002, a oposição fez acordo com o PT e não levou o caso adiante.
Imaginou que a parada de 2006 estava ganha de qualquer forma e dispensou a guerra desgastante. Parou no meio do caminho e ali ficou à espera da vitória por gravidade.
Havia também o problema do então presidente do partido, Eduardo Azeredo, cuja campanha pela reeleição (perdida) para o governo de Minas Gerais havia se servido do mesmo operador – Marcos Valério – que viria a prestar serviços ao PT anos depois.
Em 2009 o PSDB entrou com várias ações contra o governo na Justiça Eleitoral por campanha antecipada. Perdeu todas.
Em 2010 ganhou duas e está conversando sobre a possibilidade de fazer um acordo de procedimentos proposto pelo PT, só agora preocupado com o “exagero” das ações ainda motivo de deboche por parte do presidente Lula, que diverte plateias com piadas sobre as multas impostas a ele.
Enquanto a oposição perdia sistematicamente na Justiça, o PT não parecia atento à questão da infração a lei eleitoral.
A partir do momento em que o plenário do Tribunal Superior Eleitoral aplicou uma multa de R$ 10 mil e um juiz do TSE determinou outra sanção de R$ 5 mil ao presidente Lula indicando uma tendência, o presidente do partido, José Eduardo Dutra, achou por bem procurar o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra.
Segundo ele, para propor “um acordo de procedimentos” a fim de não “inibir a livre manifestação dos cidadãos”.
Diálogo
É de se perguntar: que acordo? Quais procedimentos, se a lei é uma só? Onde já se viu partido, ainda mais dois partidos que disputam a Presidência da República, abrirem diálogo deixando de lado a Justiça quando ela é parte do problema em questão?
Aqui não se trata da manifestação dos cidadãos e sim da movimentação dos partidos em relação ao que pode ou não pode ser feito no período em que as candidaturas não estão registradas e do uso da máquina pública a serviço de candidatos.
Esse argumento de “judicialização” da campanha é artificial. O recurso ao Tribunal Eleitoral é um instrumento legítimo dos partidos, faz parte do jogo.
O simples fato de a oposição aceitar abrir conversações a respeito indica que há, por parte do PSDB, um interesse de fazer um acerto de cavalheiros pelo qual o partido fique também imune a ações judiciais por parte do PT.
Guardadas as proporções, uma repetição do que já ocorreu no Congresso algumas vezes sempre com ganho de causa para a impunidade.
Acordo
Ademais, esse tipo de acerto entre partidos significa que os políticos se acertam para apartar a Justiça Eleitoral do processo. Um acordo só seria aceitável e considerado de cavalheiros se fosse nos termos da lei, em que as partes concordam em obedecer estritamente às regras.
Aí sim, seriam desnecessários os recursos à Justiça. Mas, convenhamos, para isso não é preciso abrir diálogo algum. Basta andar na linha e pronto.
O que parece estar em jogo aqui é outra coisa: um acerto mútuo de não agressão para deixar a Justiça impossibilitada de atuar.
Lições do abismo
De acordo com a cartilha do professor Paulo Vannucchi, ministro dos Direitos Humanos, o papel da imprensa é “informar, cobrar e denunciar”. Quando age fora desse limite se transforma em “uma espécie de partido de oposição”.
Opinar ou criticar, como faz o ministro, é prerrogativa exclusiva de partido de oposição. Ou “uma espécie de”.
Por esse critério, nem às legendas de situação o professor confere a oportunidade de emitir críticas e opiniões. Isso só os partidos de oposição – ou “uma espécie de” – têm o direito de fazer.
Seria o caso, então, de o professor se filiar a uma espécie de partido de oposição, já que gosta tanto de criticar e opinar. Só por uma questão de foro íntimo, porque legalmente a Constituição já lhe garante esse direito. Bem como aos demais cidadãos.
Fonte: Gazeta do Povo