Carlos Chagas
Em política, as coisas costumam não ser o que parecem. Semana passada o presidente Lula ofereceu o esperado jantar aos dirigentes nacionais do PMDB para celebrar o acordo de o maior partido nacional acoplar-se formalmente à candidatura Dilma Rousseff. A quem interessava o noivado?
Ao contrário do que se espalhou, não era fundamentalmente ao noivo, em busca do dote. Afinal, ele já se encontra muito bem aquinhoado no governo. Claro que não tanto quanto o PT, porque os companheiros possuem doze ministérios e o PMDB, seis.
Mesmo assim, os peemedebistas, mais do que satisfeitos em termos de poder, cumpriram o ritual de pedir a mão da noiva.
Só que o pai queria mais. O presidente Lula pretendia que o PMDB marcasse o dia do casamento, ou seja, que desde já indicasse o candidato à vice-presidência na chapa da candidata, selando o compromisso. Fazendo correr os proclames no cartório.
Apesar das juras de amor, o noivo saltou de banda. Era para ter saído do jantar no palácio da Alvorada o nome do companheiro de chapa, que selaria as bodas.
Não saiu, apesar das sucessivas referências ao nome do deputado Michel Temer. Ficou para mais tarde a indicação, como naqueles noivados em que o adiamento da data do casamento deixa em aberto a possibilidade de o noivo pular fora.
A razão é simples: o PMDB quer mais garantias de estar consolidando seu futuro. Não tem certeza de que Dilma Rousseff conseguirá decolar. Prefere aguardar novas pesquisas e, mais do que elas, sentir no ar o vento da vitória, por enquanto soprando no sentido de José Serra. Comprometer-se de forma absoluta com a candidata poderá ser uma fria. Melhor deixar aberta uma janelinha para a fuga pouco ética do noivo diante do desafio do casamento. E se a chefe da Casa Civil continuar inferiorizada nas preferências populares, não apenas para Serra, mas, também, para Ciro Gomes?
Por tudo isso, Michel Temer evitou a precipitação, até por saber que pouco levará para a candidatura, em termos de votos e de entusiasmo eleitoral. Hesita em trocar a presidência da Câmara e o comando de fato do PMDB pelo que poderá constituir-se numa aventura. Claro que gostaria de tornar-se vice-presidente da República, mas sem garantia, melhor lhe pareceu aguardar. Como cobertura, então, humildemente faz chegar à imprensa outras opções: por que não Henrique Meirelles, Edison Lobão ou Nelson Jobim?
O pai da noiva engoliu o adiamento. A festa de noivado estava contratada, os amigos convidados, a noiva ansiosa. Aconteceu. Mas no ar permanece aquela desconfiança de que ninguém ousa falar, na família: e se o noivo der no pé?
Gilmar fora dos autosDurante séculos prevaleceu aqui e no estrangeiro a máxima de que juiz só fala nos autos, ou seja, não dá declarações a respeito dos casos em julgamento nem sobre qualquer outro tema.
Na verdade, tratava-se de uma limitação de personalidade, porque os juízes, afinal, são cidadãos como quaisquer outros, com direito à liberdade de expressão e até dispondo da prerrogativa de indignar-se e de alertar o semelhante. Acresce que o vertiginoso desenvolvimento dos meios de comunicação mexeu com o ego de todo mundo. Quem não gosta de aparecer na televisão, tendo sua imagem difundida por todos os quadrantes, ainda mais dizendo coisas inteligentes?
Importam menos as causas, mas a verdade é que os juízes, hoje, freqüentam naturalmente a imprensa, falando fora dos autos.
Não deixa de ser estranho, porém, que numa única semana o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, tenha por quatro vezes distintas lançado dúvidas sobre as viagens do presidente Lula pelo país, em companhia da ministra Dilma Rousseff, fiscalizando obras do PAC. Que as oposições, com os tucanos à frente, tenham denunciado os périplos como campanha eleitoral antecipada, nada haverá que opor. Estão no papel delas. Agora, levanta algumas dúvidas o presidente da mais alta corte nacional de justiça seguir na mesma linha. Tanto porque poderá ser chamado a decidir a questão nos autos, se alguma representação contra o Lula seguir do Tribunal Superior Eleitoral para o Supremo, quanto pelas acusações do PT de que age assim por conta de simpatias ostensivas com o grupo que deixou o poder e ao qual serviu até ser indicado ministro.
Fonte: Tribuna da Bahia
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