Jaciara Santos / Redação CORREIO Fotos: Marina Silva
Aparentemente inofensivo, o hábito de beber vinho tinto com Coca-Cola (mistura conhecida como rabo-de-galo), bastante comum entre adolescentes, pode estar formando uma geração de alcoólatras. Afinal, a ingestão de álcool na faixa entre 12 e 19 anos deixou de ser brincadeira e já atinge status de problema de saúde pública.
Pesquisa do pneumologista Adelmo Machado Neto, 47 anos, sobre o consumo de cigarros, bebidas alcoólicas e maconha entre estudantes das redes pública e privada em Salvador aponta que 31,1% do público-alvo bebe regularmente. Em termos absolutos e somente levando em conta o universo da pesquisa, fala-se de quase 90 mil meninos e meninas, distribuídos por 47 escolas, em 33 bairros de 15 diferentes regiões da cidade.
Mais que sinalizar o elevado consumo de drogas lícitas e ilícitas entre estudantes, o estudo - tema de tese de doutorado da pós-graduação em Medicina e Saúde da Ufba- põe em perspectiva, dentre outros aspectos, a responsabilidade dos pais na formação de futuros alcoólatras. De acordo com Machado Neto, quando não proíbem o filho de beber, os pais aumentam em quase três vezes a possibilidade dele se envolver com o álcool. É o que pode ter acontecido com Juan*, 17, 2º ano do ensino médio em um colégio estadual no bairro de Cajazeira IV. Na família, de maioria cristã, o pai é uma ovelha desgarrada. Toma umas e outras aos finais de semana e nunca proibiu o filho de imitá-lo. Há poucos meses, a ingestão de anabolizantes (outra praga entre os jovens) levou Juan ao hospital, levando o a suspender o uso do álcool. “Não bebo há dois meses. Mas não digo que é para sempre”, adianta. EpidemiaO caso de Bruno*, 18, é mais preocupante.Cursando o segundo semestre de eletromecânica numa escola particular, no bairro de Nazaré, sua semana letiva tem dois dias a menos.“Na segunda- feira, está todo mundo de ressaca,quase ninguém aparece”, diz. “E, na sexta, já sabe, é dia de beber”, acrescenta, com naturalidade. Segundo o jovem, a maratona etílica invade o domingo. O que ele bebe? “De tudo!”, responde, sem piscar: “Cerveja, vinho, conhaque, uísque...”. “É quase uma epidemia”, assusta- se a professora Gildete Farias Conceição, 53, licenciada em Língua Portuguesa e docente do Colégio Estadual Severino Vieira. Especialista em Educação e Saúde Pública, ela pesquisou o tema durante sua pós-graduação em Psicopedagogia Clínica e Institucional, no ano passado, para construir a monografia Drogas lícitas na escola. Dentre outras lições, o estudo mostrou à pesquisadora que a desagregação familiar está associada à questão.“Sem uma base familiar sólida, o jovem está mais propenso ao uso abusivo de drogas, sejam elas permitidas ou não”, resume. Ex-empresário atribui sobriedade ao AA Gustavo* começou a beber aos 14 anos e sabe exatamente as razões que o levaram a mergulhar na bebida. “Sob a influência do álcool, eu me sentia mais solto, alegre, bonito, retado, machão”. Não demorou muito e ele só conseguia se relacionar se estivesse “anestesiado”, como define o estado de embriaguez.
A dependência durou sete anos. Período suficiente para ele abandonar os estudos e deteriorar suas relações sociais. Aos 21, em plena terça-feira de Carnaval, num camarote no circuito Barra-Ondina, teve um insight: admitiu ser alcoólatra e decidiu trocar a possibilidade de uma morte prematura por uma vida mais longa. Resolveu que, a partir daquele momento, não voltaria a beber. Hoje, decorridos quase nove anos, Gustavo é membro da irmandade Alcoólicos Anônimos e está convicto de que tomou a decisão certa no momento exato. “A esta altura, eu já poderia estar morto”, observa, com a serenidade característica dos seguidores do programa, que completa 74 anos neste ano. Para ele, a pesquisa acadêmica sobre o envolvimento de jovens baianos com o álcool não representa exatamente uma surpresa: mesmo sem dispor de estatísticas (um dos princípios do programa), ele testemunha o avanço do alcoolismo sobre adolescentes e jovens em Salvador. Embora esteja há mais de oito anos sóbrio, Gustavo sabe que não está curado: “O alcoolismo é uma doença controlável, mas incurável”, ensina. Ele lamenta que muitos jovens se deixem levar pelas influências e terminempassando por tudo o que ele passou. Entrevista com Adelmo NetoAutor do estudo 'O consumo de tabaco, álcool e maconha entre adolescentes escolares de Salvador', o pneumologista Adelmo Machado Neto pesquisa o tema há dez anos e não tem dúvida de que os números revelados pela pesquisa são ilustrativos: “Isso aqui é apenas a ponta do iceberg”, resume, ressaltando a importância de políticas para combater o problema.
Que aspecto o senhor destacaria no estudo? No aspecto quantitativo, o que mais chama atenção é o contingente de estudantes na faixa de 11 a 19 anos envolvido com drogas lícitas e ilícitas em Salvador. Somente de usuários de álcool, são quase 90 mil. Isso não é pouco. Eu digo que, sem sombra de dúvida, o que estamos vendo é só a ponta do iceberg. O problema é muito mais grave. Quais os principais fatores associados ao abuso de drogas?A desagregação familiar, a influência do meio (a falsa ideia de que tráfico não é crime), a ausência de religiosidade (seja qual for a crença) e a ausência de políticas públicas de enfrentamento à questão. Existe relação entre o uso de drogas lícitas e ilícitas? Esse é um outro ponto importante. O estudante que consome bebida alcoólica tem 40 vezes mais probabilidades de usar tabaco (cigarro comum) do que aquele que não bebe. O que fuma e bebe temdez vezes mais chances de também usar maconha. Que soluções a pesquisa propõe? O fato de trazer o tema para a discussão já é uma tentativa de enfrentar a questão. Mas há outros desdobramentos: a partir da pesquisa, a Aliança de Redução de Danos Fátima Cavalcanti (Serviço de Extensão da Famed) elaborou um projeto de intervenção preventiva para capacitação e supervisão de multiplicadores. A proposta envolve alunos, pais e educadores.
Fonte: Correio da Bahia
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