Nas eleições de 2008 o número de mulheres eleitas como prefeitas e vereadoras foi pequeno, como já tinha ocorrido em 2006 nas eleições gerais. A presença de mulheres no poder político está congelada. Não cresce nem vai crescer se não mudarem as regras do jogo. Não é um problema para as mulheres enfrentarem, como se fosse uma demanda corporativa. Homens e mulheres têm que representar o conjunto de homens e mulheres. A escassa participação de mulheres no poder público é um déficit na democracia no Brasil. Por que as mulheres não ascendem ao poder político? Por que o poder político não incorpora as mulheres?
É um escárnio considerar que falta interesse ou capacidade às mulheres. Os homens comparecem em menor número que as mulheres nas eleições, se abstêm mais, votam em branco ou anulam os votos em maior número que as mulheres. As mulheres participam em escala crescente como protagonistas em todas as áreas que atuam na esfera pública – sindicatos, associações, atividades pastorais, universidades, conselhos – o que lhes confere mais legitimidade como atores políticos.
Há certamente um conjunto de fatores psíquicos, culturais e políticos que interferem para interditar ou filtrar o acesso das mulheres aos espaços de poder no Legislativo, no Executivo e mesmo no Judiciário. No entanto, as regras ou a falta delas são determinantes.
A posição do Brasil no ranking de participação de mulheres em cargos públicos é constrangedora. Das 513 vagas para deputados, só 46 são ocupadas por mulheres (9%). No Senado são 10 mulheres para 81 vagas (12,3%). Na Argentina com 35% e na Costa Rica com 38,6% mudaram as regras e a iniqüidade foi reduzida de forma exemplar. Outros países como Equador e Espanha reconheceram a essencialidade da participação feminina e estenderam as regras para o Executivo.
Democracia requer ruptura com privilégios e efetiva igualdade para o exercício da cidadania e acesso aos espaços de decisão no Legislativo, no Executivo e no Judiciário.
Quanto mais poder, menos mulheres. A presença de mulheres como governadoras (3 em 27) e prefeitas não passa de 7,7%. No governo Lula, que instituiu a Secretaria Especial de Políticas para Mulheres - com status ministerial - a participação de mulheres caiu das 5 iniciais para apenas 2.
A participação de mulheres no Executivo não pode depender da magnitude dos governantes. Só houve avanços notáveis em países que adotaram medidas especiais de caráter temporário ou permanente que asseguraram participação partidária ou perto disso nos escalões mais altos do Executivo, de cotas de mulheres no topo das listas partidárias e financiamento público das campanhas, cada vez mais caras. A subrepresentação feminina está presente também nas mesas do Legislativo, as altas esferas de decisão partidária, nos grupos de decisão partidária, nos grupos de pressão nos tribunais.
Há um círculo vicioso na reprodução da desigualdade. São tão poucas as mulheres nestes círculos que suas eventuais falhas e fracassos reforçam a exclusão. Só uma participação mais ampla, em espaços variados, criará identificação, confiança e motivação para estimular as mulheres a incursionarem nos espaços decisórios. Enquanto forem tão poucas, não muda a cultura sobre o papel das mulheres no espaço público e as próprias mulheres manterão a estranheza e o distanciamento face da política. E quem perde é a democracia. É verdade que as raízes do problema não estão só na política. Mas é inegável que no Brasil a política é feita por homens e para os homens. Política e poder são monopólio dos homens que instituíram seus interesses como universais.
Não se trata de idealizar o feminino. No poder, assim como os homens, as mulheres acertam e fracassam e representam projetos progressistas ou conservadores. A desproporção de representação política fica mais exacerbada quando se toma a participação das mulheres negras e indígenas, as mais pobres entre os pobres.
Os debates sobre reformas políticas devem incorporar a participação das mulheres, maioria da população e do eleitorado nos espaços da política e do poder.
*Nilmário Miranda é jornalista, ex-Secretário Especial de Direitos Humanos, e atual presidente da Fundação Perseu Abramo.
Publicado no jornal O Globo, em 24/02/2009
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