No último dia 22 o STF por maioria absoluta dos seus membros (6X5), entendeu que a chamada Lei da Ficha Limpa, Lei Complementar nº. 135/2010, não poderia ser aplicada nas eleições passadas de 2010, uma vez que a norma modificadora da Lei Complementar nº. 64/90 – Lei das Inelegibilidades - entrara em vigor no dia 04.06.2010, quando o art. 16 da Constituição somente admite mudança das regras eleitorais até um ano antes da realização das eleições.
A Lei da Ficha Limpa nasceu da iniciativa popular capitaneada pela CNBB e tem como objetivo impedir a participação em processo eleitoral por aqueles que tenham cometidos atos de improbidade administrativa ou delitos contra a administração pública, se condenados por Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais Federais ou Regionais Eleitorais, não importando se ação transitou em julgado ou não.
Quando da apresentação o projeto houve grande repercussão na imprensa e grande parte da população se posicionou favoravelmente, desencantada com os frequentes atos de corrupção na Administração Pública em todos os níveis. Em razão da histeria e prementes as eleições, o Parlamento Nacional sem questionar os males da medida de exceção, o aprovou, promulgando-se a norma em seguida.
Vamos entender a dinâmica da legislação eleitoral. Existe entre nós a chamada Lei das Inelegibilidades – C 64/90 – que estabelece as condições de inelegibilidades para quem pretenda concorrer a mandatos político, e a Lei da Ficha Limpa não se constitui em uma nova lei das inelegibilidades, limitando-se ela a alterar a LC 64, criando novos institutos.
A LC 6490, dentre inúmeras outras causas de inelegibilidade, prevê como causas, a rejeição de contas por decisão irrecorrível, condenação criminal com trânsito em julgado nos crimes ali definidos e o parentesco. A Lei da Ficha Limpa ao alterar a redação da LC 64/90 incluiu como causas impeditivas para o registro da candidatura a condenação por decisão colegiada em processo criminal e de improbidade administrativa, art. 1º, I, “d”, “h”, “j” e “l”, a renúncia impeditiva da cassação de mandato, letra “k”, e alongou o prazo de inelegibilidade, também letras “g”, “h”, “j”, “l”, “m”, “n”, “o” , “p” e “q”.
Seja na elaboração do Projeto, quanto na sua votação e sanção encontramos imperfeições de natureza de técnica-legislativa e manifestas inconstitucionalidades que se aplicadas sob o manto da moralidade, imporá riscos imensuráveis ao estado de direito” e a democracia, abrindo-se precedentes perigosos contra as garantias constitucionais do cidadão.
Há uma descrença nas instituições e isso leva a um entendimento equivocado que tudo que for aplicado ao acusado de crimes contra a administração ou atos de improbidade administrativa será válido. Isso é um risco de que não podemos correr, já que os estados fascistas se formaram nessa esteira perigosa e sempre deu no que deu. Os exemplos maiores são a Alemanha de Hitler, a Itália de Mussolini, Portugal de Salazar, a Espanha de Franco e as ditaduras lotinoamericanas e da África.
Na votação dos casos Roriz e Jáder Barbalho, dentre vários outros, se entendeu pela aplicabilidade da lei as eleições de 2010, com o alongamento do prazo de inelegibilidade passando de três para oito anos.
Diferentemente do que foi posto na imprensa por âncoras de jornais e personalidades diversas, o STF, Corte Maior e legítima guardiã da CF, não esvaziou a nova lei, eis que apenas aplicou dispositivo constitucional de vedação da aplicabilidade da “Lei do Ficha Limpa” nas eleições de 2010, na previsão do art. 16 da Carta Federal, que tem a seguinte redação: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência." A sua aplicação poderá acontecer nas eleições de 2012.
Dois outros aspectos da Lei do Ficha Limpa, no meu entendimento, se mostram violentamente contrários a Constituição e o passionalíssimo e a histeria não poderão forçar ou dobrar o STF para sua aplicação. Refiro-me a irretroatividade dos efeitos da lei e ao princípio da presunção de inocência, garantias constitucionais dos incisos XL e LVII do art. 5º e do inciso III do art. 15 da CF.
Pela redação da LC 64/90, o impedimento para concorrer em eleições nos casos de sua aplicação era de 03 anos e com a LC 135/2010, o prazo passou a ser de 08 anos, com aplicações sobre as hipóteses já constituídas, retroagindo a lei os seus efeitos. A renúncia a mandato eletivo antes da instaurado procedimento de cassação de mandato, passou a ser considerado como causa de inelegibilidade por 08 anos, o caso de Jáder Barbalho.
A CF ainda ao tratar dos direitos fundamentais do cidadão no seu art. 5º, XXXV, de forma clara, prevê que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”, mesma interpretação encontrada na antiga lei de Introdução ao Código Civil, Dec.-Lei nº. 4657, de 04.09.1942, convertido em Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro com a redação dada pela Lei nº. 12.376/2010. A regra válida será que a inelegibilidade pelo prazo de 08 anos somente alcançará aquele que tenha sido declarado inelegível a partir da vigência da LC 135/2010, coibindo-se o perverso efeito a retroatividade da lei repudiada pelo direito brasileiro.
Desafio maior do STF será confrontar o disposto nas letras “d”, “e”, “h”, “J”, “l”, “n” e “o” do art. 1º, I, da LC 135/2010 que alterou a redação da LC 64/90, já que a nossa CF tem como direito fundamental do cidadão o “princípio da presunção da inocência” que somente admite validade e eficácia da sentença condenatória com o trânsito em julgado da sentença.
Quando o legislador popular redigiu o anteprojeto da LC 135 que recebeu convalidação do legislador brasileiro, feriu frontalmente uma conquista da humanidade e que levou séculos para ser alcançado, o princípio da presunção da inocência, albergado pelo direito pátrio como garantia fundamental, e o pior, criou uma espécie de execução definitiva para situação sujeita ainda a apreciação das instâncias superiores, trasnsitória, e sem o trânsito em julgado.
Pela redação dada pela LC 135 para a ocorrência de inelegibilidade basta que a pessoa tenha sido condenada por órgão colegiado da instância ordinária, entendendo-se como tal, a decisão de uma Turma, Grupo de Turmas ou Plenária. Exemplificando: Se uma pessoa é condenada por uma Turma ou Câmara de um Tribunal de Justiça Estadual, Tribunal Regional Federal ou uma Corte Regional Eleitoral, automaticamente se tornará inelegível, mesmo que contra a decisão seja cabível recurso perante as Cortes Superiores, quando no direito pátrio, em razão do princípio da “presunção da inocência”, a sentença condenatória somente adquire validade e eficácia depois do seu trânsito em julgado, quando não há mais recurso a ser exaurido, cujo conceito, da coisa julgada, se encontra bem postado no art. 467 do CPC: “Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”
Entendo que esse será o maior desafio para o STF, já que se acolhia a inelegibilidade com a redação das letras enunciadas acima, com a redação dada pela LC 135, pois, sem efeito e sem garantia ficará o princípio da presunção de inocência.
O mesmo Ministro Celso de Mello, um dos mais ilustres integrantes do STF em toda sua história ao deferir medida liminar na AC 2763/RO, decisão de 16.10.2010, publicada no DJe de 01.02.2011, manifestou: “O “status poenalis” e o estatuto de cidadania, desse modo, não podem sofrer - antes que sobrevenha o trânsito em julgado de condenação criminal - restrições que afetem a esfera jurídica das pessoas em geral e dos cidadãos em particular. Essa opção do legislador constituinte (pelo reconhecimento do estado de inocência) claramente fortaleceu o primado de um direito básico, comum a todas as pessoas, de que ninguém – absolutamente ninguém – pode ser presumido culpado em suas relações com o Estado, exceto se já existente sentença transitada em julgado. É por isso que este Supremo Tribunal Federal tem repelido, por incompatíveis com esse direito fundamental, restrições de ordem jurídica, somente justificáveis em face da irrecorribilidade de decisões judiciais....Não obstante tais considerações, observo que o ora requerente teve o registro de sua candidatura negado pelo só fato de existir, contra ele, condenação penal emanada de órgão colegiado do Poder Judiciário, embora ainda não transitada em julgado, porque impugnada, como efetivamente o foi, em sede recursal extraordinária (RE 633.707/RO).”
No julgamento da ADPF 144-DF, relator o eminente Ministro Celso de Mello, o STF, por maioria, vencidos os Senhores Ministros Carlos Britto e Joaquim Barbosa, julgou improcedente a argüição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do voto do Relator, decisão esta dotada de efeito vinculante, segundo a Lei nº 9.882/1999. Da ementa do v. ac. se extrai: “PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL DE INOCÊNCIA: UM DIREITO FUNDAMENTAL QUE ASSISTE A QUALQUER PESSOA – EVOLUÇÃO HISTÓRICA E REGIME JURÍDICO DO PRINCÍPIO DO ESTADO DE INOCÊNCIA – O TRATAMENTO DISPENSADO À PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA PELAS DECLARAÇÕES INTERNACIONAIS DE DIREITOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS, TANTO AS DE CARÁTER REGIONAL QUANTO AS DE NATUREZA GLOBAL – O PROCESSO PENAL COMO DOMÍNIO MAIS EXPRESSIVO DE INCIDÊNCIA DA PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL DE INOCÊNCIA – EFICÁCIA IRRADIANTE DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA – POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DESSE PRINCÍPIO AO ÂMBITO DO PROCESSO ELEITORAL”.
A CF nos arts. 5º, LVII, e 15, III, consagrou o princípio da presunção da inocência e o art. 15, III, tratou especificamente da inelegibilidade por decisão criminal transitada em julgado, o que vale dizer, se houver decisão condenatória passível de apreciação em recurso extraordinário, não há que se falar em coisa julgada e muito menos de inelegibilidade.
O CPP no art. 669 prevê que somente depois de transitar em julgado a sentença será exeqüível, o que foi repetido pela Lei de Execução Penal – nº. 7.210/84 que exige para execução da pena o trânsito em julgado da decisão condenatória. Já a Lei de Improbidade Administrativa – nº. 8.429, 02.06.1992 – em seu art. 20, é bastante elucidativa ao dizer: “A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.”
A LC 135 é fruto da descrença e da histeria estimulada pela imprensa que não se satisfaz em investigar, processar, condenar e executar a sentença em linchamento público e sem direito de defesa. É preciso cuidado em se preservar a norma constitucional e as garantias fundamentais do cidadão. O combate a corrupção somente será eficaz quando de baixo para cima, do cidadão, porém, se o cidadão se beneficia dela por qualquer modo, não haverá repressão eficaz.
Impossível numa sociedade democrática privar o cidadão dos princípios do “devido processo legal” e da “presunção da inocência”, sendo relevante dizer que o devido processo legal impõe a plena observância dos princípios constitucionais.
O Min. Cezar Peluso, Presidente do STF, recentemente anunciou a elaboração de uma PEC para ensejar a execução da sentença de forma definitiva depois de condenação em instância ordinária e antes do seu trânsito em julgado. Duvido de que dessa monstruosidade jurídica o Min. Celso de Mello tenha feito parte ou se o ex-ministro Sepúlveda Pertence, se ainda ministro, viesse a concordar. O Dr. Flávio Luiz Yarschell, advogado e, professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP), em matéria do Portal terra (26.03.2011), manifesta a seguinte preocupação: "Um princípio da legislação brasileira, em matéria penal, é de que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória", define o advogado. "A proposta dele (Peluso) é criar um conceito de coisa julgada que não existia. Eu não sei se isso não afronta essa garantia, que poderia ser posta como cláusula pétrea. Você está dizendo que ocorre a coisa julgada quando não ocorreu. Se existe um recurso cabível, se a decisão ainda pode ser revista, por definição, não houve coisa julgada
QUITANDA. A guerra da Líbia está servindo como prateleira de negócios da indústria armamentista. Agora o Governo Brasileiro poderá fazer uma enquete indagando se deverá comprar o Rafale, de fabricação francesa (Dassaul), ou o F18 Supper Hornet dos Estados Unidos (Boeing). Para mim a proposta da França que se apresentava mais liberal do que a política dos falcões do pentágono seria mais proveitosa por transferir tecnologia. O diabo é que a França defende eficiência de sua arma ao abater 05 aviões Galeb das forças de Kadafi e dois helicópteros Mi-35. Os aviões Galeb é um projeto iugoslavo da década de 70, lento, que serve apenas para treinamento. O Mi-35 que a força área brasileira tem é de efeito devastador. Segundo Fernando Arbache, doutor em Inteligência de Mercado pelo ITA e prof. da Fundação Getúlio Vargas, o melhor para o Brasil é o avião Gripen NG, da sueca Saab. O problema da quitanda é que a Suécia não entrou na guerra.
ANILTON E MÁRIO NEGROMONTE. A imprensa local divulgou de forma dúbia do encontro do Prefeito com o Ministro. Não vejo nada demais. Trata-se de dois gestores públicos e os interesses municipais devem preponderar sobre as picuinhas políticas locais.
REGIVALDO. Não vejo o porque da preocupação em perguntar a Regivaldo se ele será o vice de Anilton nas próximas eleições municipais. Regivaldo é o atual Presidente da Câmara e deve se preocupar em fazer uma administração boa e resgatar a credibilidade da instituição, agindo com transparência. Quantos as próximas eleições muitas águas irão rolar e vai ser mais ou menos assim como naquela marchinha de carnaval: “até 4ª feira meu bem”.
Paulo Afonso, 27 de março de 2011.
Fernando Montalvão.
Titular do escritório Montalvão Advogados Associados.