Gabriel Braga com a mãe, chamada de “Doutora Saudade”
Carlos Newton
A atual geração de políticos está conseguindo transformar o Congresso Nacional num circo de horrores. Depois de dois impeachments presidenciais e dos escândalos do mensalão e do petrolão, com o presidente Lula da Silva passando 580 dias na cadeia, quando se pensa que já vimos tudo em matéria de baixarias e esculhambações, surge agora a possibilidade de cassação do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), que não foi apanhado com dólares na cueca ou algum desvio de verbas públicas.
A mais nova vergonha institucional da política começou a ocorrer no dia 2, quando o deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), relator do Conselho de Ética da Câmara, pediu a cassação de Glauber Braga por haver expulsado com chutes um militante do Movimento Brasil Livre, Gabriel Costanero, que ofendera a honra de sua mãe, a ex-deputada Saudade Braga.
OFENSOR HABITUAL – Em 16 de abril de 2024, o deputado Glauber Braga foi abordado na Câmara por Gabriel Costanero, um agente provocador, que costuma ofender parlamentares e figuras políticas de esquerda, para gravar suas reações e exibi-las suas redes sociais, para conquistar os votos que lhe faltaram na última eleição.
Vídeos compartilhados na internet mostram Costanero discutindo e chamando o parlamentar de “burro” e “fraco”, enquanto fazia a transmissão online.
No momento da discussão, Glauber Braga afirmava que Costanero responde por violência doméstica contra uma ex-companheira, enquanto o militante de direita respondia tratar-se de difamação e repetia xingamentos contra o parlamentar. A discussão aumentou quando Costanero mencionou a mãe de Glauber Braga e a chamou de “safada”. Foi quando o deputado chutou o militante e o empurrou para fora do prédio, por uma das portas laterais. A cena foi testemunhada e registrada por dezenas de pessoas.
À BEIRA DA MORTE – Certamente o militante do MBL não sabia que a mãe de Glauber estava à beira da morte, enfrentando um quadro avançado de Alzheimer e viria a falecer poucos dias depois, em 8 de maio de 2024, aos 75 anos.
Certamente, o provocador do MBL também não sabia que Maria da Saudade de Medeiros Braga era conhecida na Região Serrana do Rio de Janeiro como Doutora Saudade, pela atuação como médica de família durante muitas décadas, com destaque para seu trabalho na zona rural.
O reconhecimento por sua dedicação se revelou em suas eleições para deputada e para prefeita de Nova Friburgo em dois mandatos.
FORTE EMOÇÃO – No Direito, a ocorrência de “forte emoção” é considerada circunstância atenuante. Mas o estado emocional de Glauber Braga, ao reagir à ofensa contra sua mãe em estado terminal, não foi levado em consideração pelo Conselho de Ética.
Mas o pior mesmo é que seu principal acusador, o deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), jamais poderia pedir a cassação de Braga, porque ele próprio foi protagonista de episódio semelhante dentro da Câmara, porém ainda mais grave.
Em abril de 2001, Paulo Magalhães era deputado e desfechou “socos e pontapés” no jornalista e escritor baiano Maneca Muniz, que autografava o livro “As Veias Abertas do Carlismo” na Câmara dos Deputados.
À época, o escritor acompanhava deputados baianos que denunciaram esquemas de corrupção e achaques do então senador Antônio Carlos Magalhães (PFL), o ACM, tio de Paulo Magalhães, que desfez a noite de autógrafos e sequer foi submetido ao Conselho de Ética..
SETE MANDATOS – Por ser sobrinho de ACM, Paulo Magalhães já está no sétimo mandato, e continua a ser um ilustre desconhecido, que nada fez e nada faz em defesa do povo, rigorosamente nada.
Defendeu “a socos e pontapés’ a honra de ACM, mas não aceita que Glauber Braga tenha feito o mesmo, em defesa da honra da própria mãe, e agora propõe que a Câmara casse o parlamentar por ser de um partido diferente, com ideias também diferentes, nada a ver com o entrevero com o militante do MBL..
Agora, até o evangélico Silas Malafaia surpreende aliados ao se opor à cassação do deputado Braga, e o pastor tem toda razão, é preciso admitir que o pastor tem o direito de acertar, porque é mais do que óbvio que a cassação de Glauber Braga seria uma vergonha histórica na Câmara, uma casa criada para defender a democracia.
Por José Montalvão
A Bahia, berço de grandes nomes da política brasileira, como Otávio Mangabeira, Rui Barbosa, Vieira de Melo e Waldir Pires, parece ter se distanciado do ideal de representatividade que um dia orgulhou seu povo. Estes homens, cada um a seu modo, deixaram marcas profundas na história nacional, sendo sinônimos de inteligência, coragem e probidade. Infelizmente, o que vemos hoje é um cenário desolador, marcado pela ausência de líderes com estatura moral semelhante.
Nos dias atuais, figuras políticas baianas que deveriam honrar esse legado se perdem em contradições, incoerências e ações marcadas por conveniências pessoais. Um exemplo recente disso é a postura do deputado baiano relator do pedido de cassação do deputado Glauber Braga. Com evidente parcialidade, ele adota dois pesos e duas medidas ao julgar um caso envolto em emoção e dor — como bem observou o jornalista Carlos Newton, Glauber apenas reagiu, tomado pela forte emoção de defender a honra de sua mãe, então à beira da morte.
O que causa indignação é a seletividade desse julgamento. O relator, no passado, teve atitudes muito mais agressivas, inclusive contra jornalistas, sem que houvesse qualquer consequência séria para sua própria conduta. Como, então, justificar a severidade no caso de Glauber, senão por puro oportunismo político?
O Congresso Nacional, que já abrigou mentes brilhantes e vozes firmes na defesa da democracia e da justiça social, hoje mergulha em um processo contínuo de degradação. O que vemos é a institucionalização da hipocrisia, onde o discurso moralista serve apenas para perseguir adversários, enquanto se acobertam os próprios erros e desvios.
A política brasileira, e em especial a baiana, precisa urgentemente reencontrar o caminho da ética, da coerência e do compromisso real com o povo. Caso contrário, continuaremos assistindo à destruição da credibilidade das instituições e à alienação da sociedade, cada vez mais descrente de que algo possa, de fato, mudar.