Desde 1º de janeiro de 2002, o euro é moeda corrente em vários países da União Europeia. Na época, muitas expectativas e também muitos temores foram associados à nova moeda. Checamos o que disso se tornou realidade.
Por Uta Steinwehr e Andreas Becker
Quando as rolhas de champanha voaram na virada do ano 2002, 12 países da União Europeia (UE) estavam prestes a perderem suas moedas nacionais. Os primeiros a adotarem o euro como moeda comum foram Alemanha, Bélgica, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda, Áustria, Portugal e Espanha. Hoje, são 19 nações, pois mais tarde seguiram-se Estônia, Letônia, Lituânia, Malta, Eslováquia, Eslovênia e Chipre.
O euro não era completamente novo naquela época, pois já estava sendo usado há três anos como chamado dinheiro contábil, por exemplo, para transferências bancárias ou no comércio internacional.
A moeda comum foi um grande passo para a UE, pois aproximou os seus membros. E foi também um grande saco de surpresas, porque ninguém podia prever com certeza o que aconteceria com a moeda única.
A DW analisou cinco previsões feitas por economistas, políticos e observadores no momento da mudança de moeda e, 20 anos depois, verificou se elas se tornaram realidade.
1 - O euro se tornará uma nova moeda de reserva
Verificação pela DW: correto
Uma moeda de reserva é uma moeda que é utilizada em grandes quantidades, por muitos governos e instituições. Em 1997, Fred Bergsten, então diretor do Instituto Peterson de Economia Internacional (PIIE), argumentou que o euro se tornaria "pelo menos a segunda moeda mais importante do mundo" e poria fim ao domínio exclusivo do dólar americano.
Não importa quais estatísticas ou indicadores você olhe, depois do dólar americano e do euro, não há nada por muito tempo.
Em termos de moeda de reserva, o dólar é o indiscutível número um: de acordo com estatísticas do Fundo Monetário Internacional, cerca de 59,2% de todas as reservas oficiais de moeda no segundo trimestre de 2021 foram de dólares americanos. O euro segue em segundo lugar, com 20,5%.
Já em termos de transações internacionais, as duas moedas estão no mesmo patamar, de acordo com os números da organização SWIFT, através de cujo computador são processadas quase todas as transferências globais. De acordo com estes números, em outubro de 2021, foram transferidos praticamente tantos dólares americanos (39,1%) quanto euros (38,1%). Um ano antes, o euro estava até mesmo um pouco à frente do dólar.
O dólar americano continua liderando como moeda de reserva global, mas o euro se estabeleceu como a segunda moeda mais importante.
2 - Mais cedo ou mais tarde, o Reino Unido adotará o euro
Verificação pela DW: errado
Bem, este provou ser provavelmente o maior erro de prognóstico. É verdade que o ceticismo em relação ao euro já era alto no Reino Unido nos 1990, mas também havia fortes apoiadores. Para o então primeiro-ministro britânico, Tony Blair, era do interesse de seu próprio país aderir à Zona do Euro. Muitos representantes do mundo dos negócios também acreditavam que o euro se tornaria uma moeda paralela que um dia poderia substituir a libra esterlina.
Originalmente, os próprios britânicos receberiam o direito de escolha, mas isso nunca aconteceu. Em vez disso, a história tomou um rumo muito diferente e o fatídico referendo sobre o Brexit em 2016 abriu caminho para o Reino Unido até mesmo deixar a UE.
3 - O euro não será tão forte quanto o marco alemão
Verificação pela DW: errado
Os alemães estavam orgulhosos de seu marco alemão, considerado uma moeda forte, particularmente estável em valor durante um longo período de tempo. De acordo com uma pesquisa, antes da introdução do euro como dinheiro contábil, apenas um quarto dos alemães acreditava que o euro seria tão estável quanto o marco alemão.
Entretanto, o euro provou ser mais resistente do que o D-Mark. Desde 2002, a moeda comum tem perdido uma média de 1,6% de seu valor a cada ano. Para o marco alemão, a inflação no período igualmente longo desde 1982 tem sido de 2,4% ao ano. Assim, após 20 anos, o euro tem mais poder de compra do que a antiga moeda da Alemanha. .
É claro que tais comparações devem ser feitas com cautela, pois os períodos diferem historicamente. A inflação foi particularmente alta nos anos após a reunificação em 1990. Em contraste, a crise financeira e da dívida desde 2007 levou a taxas de inflação excepcionalmente baixas na Zona do Euro por um longo tempo − mas isso está apenas começando a mudar por causa da pandemia de coronavírus.
4 - Abandonar as moedas nacionais se tornaria um problema econômico para os países do sul da UE
Verificação pela DW: correto
Desde o final da Segunda Guerra Mundial, os países do sul da Europa têm se desenvolvido economicamente de forma menos dinâmica do que os do norte. Suas moedas também eram menos estáveis do que o marco alemão.
O poder econômico dos países que introduziram o euro como moeda corrente em 2002 cresceu quase 50% desde então. Isso é apenas cerca da metade do crescimento dos EUA. Na maioria dos países do sul europeu, entretanto, o crescimento tem sido muito mais fraco do que no norte. Isto pode ser constatado mesmo se excluindo Luxemburgo e Irlanda, onde o crescimento foi particularmente forte devido a empresas do setor financeiro e de tecnologia da informação.
Portugal e Itáliaestão particularmente atrasados. E a Grécia não teve quase nenhum crescimento em 20 anos.
A razão está na crise da dívida do euro há cerca de dez anos, como resultado da qual a economia em muitos países realmente encolheu. Foi um problema para países como a Grécia e a Itália não terem moeda própria, com a qual poderiam ter amortecido a crise com uma desvalorização, da mesma forma como fizeram várias vezes antes do euro.
Naquela época, se a dracma ou a lira perdessem valor em relação ao marco alemão, os produtos gregos e italianos se tornavam mais baratos no exterior e, portanto, mais atraentes. O mesmo se aplicava às férias, que lá se tornaram mais baratas para os turistas do exterior.
Com o euro, a possibilidade de desvalorização desapareceu e a crise atingiu as economias mais fracas duramente. Isto é demonstrado pelos ainda elevados números do desemprego.
5 - A Alemanha e outros países do norte da Europa têm que pagar as dívidas dos países economicamente mais fracos.
Verificação pela DW: correto, até certo ponto
Mesmo antes da introdução do euro, a maioria dos economistas já acreditava que a união monetária só poderia funcionar se seus membros administrassem suas economias de forma similar. Para garantir isso, existem critérios de convergência, também chamados Critérios de Maastricht. Eles estabelecem tetos, por exemplo, para o déficit orçamentário (3% do Produto Interno Bruto) e para o nível da dívida pública (60%). Um país deve cumpri-las antes de poder aderir à Zona do Euro.
Vinte anos depois, fica claro que quase todos os países violam as regras quando se trata de dívida e déficit. Mas para ser justo é preciso dizer que os custos do combate à pandemia são um fardo adicional no balanço patrimonial.
O medo da Alemanha e de outros países mais ricos sempre foi um dia ter que pagar pelos países economicamente mais fracos. Mas isso foi evitado mesmo durante a crise do euro. Os países em crise receberam garantias e empréstimos no valor de centenas de bilhões, alguns com vencimentos muito longos. Somente se estes explodissem é que os países doadores ficariam com o fardo. Até agora, no entanto, eles não sofreram nenhum dano, muito pelo contrário: só a Alemanha arrecadou quase três bilhões de euros em juros para o dinheiro emprestado à Grécia até 2018.
A pandemia provocou a reviravolta. Para financiar o fundo de reconstrução da UE, os países estão agora assumindo pela primeira vez uma dívida pela qual são corresponsáveis. Tempos excepcionais exigem medidas excepcionais, dizem os apoiadores. Os críticos, por outro lado, lamentam o fim da responsabilidade de cada Estado e o início de uma união de dívidas.
Os críticos, por outro lado, lamentam o fim da responsabilidade de cada Estado e o início de uma "União de Dívidas".
Deutsche Welle