Publicado em 24 de julho de 2021 por Tribuna da Internet
Ana Dubeux
Correio Braziliense
“Não é sobre abrir portas; é sobre empurrá-las”. Assim a senadora Simone Tebet (MDB) reflete a respeito do seu pioneirismo na política. Primeira prefeita de sua cidade natal, Três Lagoas (MS), não parou mais de derrubar muros. Essa realidade não é mais branda na CPI da Covid, na qual tem tido participações destacadas.
“A CPI tem sido um celeiro de atitudes grosseiras para com a bancada feminina. A melhor forma de combater é fazer o que estamos fazendo. Mostrar que somos capazes, que nossa atuação faz diferença e é importante para o país. Tentaram, mas não conseguiram calar a nossa voz”, diz.
A senadora acredita que a “CPI já tem fortes indícios e muitos elementos probatórios da prática de crimes, incluindo a corrupção passiva e ativa”. “Temos documentos, troca de mensagens, quebras de sigilos. Na volta do recesso, a CPI terá de colocar nome, sobrenome e CPF dos responsáveis. Quem foram os corruptores, os cooptados, os atravessadores, os servidores, os agentes políticos”, avalia.
A primeira a presidir a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a primeira vice-governadora do Mato Grosso do Sul, a primeira líder de bancada do PMDB… Como encarou a presença solitária, como mulher, nos diversos postos que assumiu quebrando tabus?
Claro que isso me dá orgulho, mas também não nego uma ponta de tristeza. Já estamos na década de 20 do século 21, e eu ainda tenho sido a primeira a ocupar postos importantes na política. O que me conforta é que isso significa saber que, depois de mim, virão muitas outras mulheres. Não sinto que é uma presença solitária. Ainda somos poucas, mas a luta coletiva não nos faz sozinhas.
A senhora é filha de uma lenda política. A política brasileira decaiu?
Obrigada pela referência tão carinhosa ao meu saudoso pai, Ramez Tebet. Infelizmente, sou obrigada a concordar que estamos vivendo um apagão de grandes lideranças. Fazem falta homens públicos como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Teotônio Vilela, Mário Covas, e tantos outros de outros tempos políticos. Temos hoje bons políticos, aqueles que indicam caminhos, mas nos faltam grandes estadistas, os que caminham, e nós os seguimos. O estadista é aquele que, como diria o poeta, quando parece não haver caminho, o fazem, ao caminhar.
Qual a materialidade de corrupção no caso da Covaxin?
Temos fortes indícios e muitos elementos probatórios da prática de crimes. Isso mesmo: no plural, incluindo a corrupção passiva e ativa. Temos documentos, troca de mensagens, quebras de sigilos. Na volta do recesso, a CPI terá de colocar nome, sobrenome e CPF dos responsáveis. Quem foram os corruptores, os cooptados, os atravessadores, os servidores, os agentes políticos.
Está convencida de que houve prevaricação do presidente Bolsonaro? Que provas a CPI já elencou para comprovar o crime do presidente?
Houve omissão do Governo Federal na condução errática da pandemia. Da primeira fase da CPI, temos elementos que dão conta do estímulo ao uso de medicamentos sem comprovação científica, da ação para fazer a população acreditar na imunidade de rebanho, do atraso na compra de vacinas, da falta de planejamento nacional na condução das ações voltadas à pandemia, da inexistência de comunicação com a população no sentido de uma melhor proteção contra o coronavírus. Agora, já existe materialidade de crimes relacionados à negociação para a compra da Covaxin. O presidente diz que, ao ser informado pelos irmãos Miranda, passou a bola adiante para o ministro da Saúde, general Pazuello. Esse, por sua vez, disse ter encaminhado a incumbência da investigação para o então secretário-executivo, coronel Élcio Franco, o mesmo que, em um único dia, se deu por satisfeito para encerrar qualquer averiguação de irregularidade. Onde está a comprovação do pedido de investigação? Ainda não chegou à CPI documento que comprove não ter havido prevaricação por parte do governo federal.
Qual o papel e a importância das mulheres nos trabalhos da CPI?
Todos lembram que, após horas de interpelação, o deputado Luis Miranda revelou o nome do líder do governo, deputado Ricardo Barros, durante os meus questionamentos. Eu também questionei a veracidade dos invoices da Precisa Medicamentos, demonstrando erros primários nos documentos. Temos exemplos de contribuições essenciais das senadoras Eliziane, Leila, Zenaide, Soraya, enfim, a bancada feminina está unida para que sempre estejamos presentes na CPI. Apesar de não terem nos dado direito a uma cadeira, temos nos feito ouvir e estamos procurando fazer a diferença.
Sua atuação firme e implacável na CPI a fez virar alvo do exército bolsonarista nas redes sociais. Isso a amedronta?
Isso tudo é fruto da divisão que se acelerou, nos últimos tempos. Caminho ao largo desses extremos. Já passei por vários momentos difíceis nas redes. O que não admito é mentira. Fake news. Já fui vítima de injustiças. Acho interessante e fico muito grata a todos os que me defendem, porque conhecem, e reconhecem, as minhas ações. Isso é muito bom. Apesar dos ataques, tenho percebido uma mudança de humor nas minhas redes. Muitas manifestações de apoio, e isso me dá força para seguir em frente, sabendo que estou no caminho certo
Seu nome aparece bem nas listas de pré-candidatos à presidência em 2022. Essas citações a encorajam? A presidência é um sonho? O MDB se uniria em torno da sua candidatura?
Estamos diante da pior crise sanitária da história do Brasil. Graças às vacinas, o número de mortes tem caído. Estamos em meio a uma CPI que pode ter um desfecho demolidor na política nacional. Temos de resolver a gravíssima crise econômica, com índices assustadores de desemprego e de fome. Não é hora de falar de 2022. Sou a favor da construção de uma terceira via consistente com reais chances de vitória. O Brasil não merece a repetição de uma disputa entre os extremos. Em relação ao meu partido, tenho dito que meu nome está à disposição, mas não escondo a minha preferência por concorrer à reeleição ao Senado. Mas, em política, tudo muda muito rapidamente. Então, o momento é de serenidade para aguardar a hora certa para decidir.
A importância da união em torno de um projeto suprapartidário para mitigar os efeitos da pandemia nos próximos anos é possível?
Eu sou uma pessoa que valoriza o diálogo. Temos de nos sentar à mesa para absorver as melhores ideias de cada um e construir programas consistentes e políticas públicas eficazes. Entendo que o caminho seja mesmo esse. De forma republicana, uma união suprapartidária seria importante para encontrar as melhores saídas para o pós-pandemia. Não é hora de extremismos. Não é hora de muros que nos dividam, muito menos de cercas que nos segreguem.