Publicado em 12 de dezembro de 2024 por Tribuna da Internet
Paulo Peres
Apesar de estarmos vivendo grave crise econômica, com o desemprego, a miséria e a violência, em todos os sentidos, sendo incentivadas pelas elites políticas e administrativas do país, que não se preocupam com as desigualdades sociais, a figura de Papai Noel faz a festa para quem ainda está empregado ou vive de rendas.
A classe média brasileira, geralmente, gasta 50% do valor que recebe do 13º salário com o pagamento de dívidas, mas vai às compras atendendo ao apelo do Papai Noel, um velhinho bonachão apenas para o comércio.
OUTRAS VERSÕES – A chegada de Papai Noel na noite de Natal é esperada com ansiedade por crianças em todo o mundo, embora o mito do “bom velhinho” carregue outras versões em nada carismáticas ou bondosas, como revela Roland Barthers em seu livro “Mitologias”, que faz uma análise semiológica das mensagens veiculadas pelos meios de comunicação de massa.
Segundo o livro, Papai Noel funciona como imagem reparadora da sociedade. É um momento em que a sociedade se livra de sua culpa, através do presente e da imagem idealizadora do “bom velhinho”, pois a sociedade não aceita que ele possa ter um lado bom e outro mau.
Papai Noel surge, neste aspecto, como um personagem apenas bom e com ele a sociedade se redime. Isso passa para a criança, que é impedida de expressar seu lado agressivo (mau).
ALGO REPRESSOR – Os psicólogos veem assim um comportamento repressor do Papai Noel, na medida em que o presente, na verdade, é uma troca. Só recebe presente quem se comporta bem, uma maneira do pai esconder a repressão que ele exerce sobre o filho.
A ideia de que Papai Noel teve origem como sucessor de São Nicolau ou São Klaus pode ter sido o início do hábito de dar presentes na Alemanha, não é muito aceita pelos psicólogos.
Para os psicólogos, Papai Noel, como se apresenta hoje, é uma construção moldada sobre fragmentos de mitos europeus. “Nessa construção encontramos, entre outros, o componente de humanização que é semelhante aos dos desenhos animados. Quer dizer, a figura do Papai Noel é acentuada pelos traços curvos, é engordada como acontece com os bichos”.
CONSUMO SUPÉRFLUO – Na verdade, Papai Noel só existe como escamoteamento, porque o consumo continua sendo culpado, enquanto ele é o móvel inocentador desse consumo, pois absolve sua culpa.
Por outro lado, é um dos muitos mitos do poder em sua imagem dadivosa. Por isso, “ele é Papai Noel, um substituto do pai, porque é o pai quem realmente faz. Pai, em escala social, é a instituição. Logo, Papai Noel é uma imagem institucional”, do ponto de vista psicológico.
AUTOGRATIFICAÇÃO – Na análise psicanalítica, Papai Noel opera como elemento de frustração do superego e de resistência ao consumo. Ele frustra o superego do consumidor naquilo que este tem de crítica à gratificação. Quer dizer, o anseio de gratificação pelo presente de Papai Noel e, este presente é uma autogratificação, sobretudo, quando se dá alguma coisa a um filho.
No Brasil, o incremento da propaganda do mito Papai Noel, a partir de 1930, associa-se à industrialização e ao acréscimo de dependência externa. Vale ressaltar que, na década de 30, em todo o mundo, Papai Noel assumiu a feição que tem hoje, esse caráter bonachão, no quadro de uma crise econômica duradoura, quando foi necessária a intervenção do Estado em todos os setores da economia (a política do New Deal reproduzida nos países europeus de diferentes formas).