Foto: Sergio Amaral/STF/Divulgação/Arquivo
Corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão. No destaque, o juiz Marcelo Holland Neto, que se encontra afastado do Tribunal de Justiça de São Paulo há 32 anos01 de junho de 2024 | 08:25Salomão nega retorno de juiz afastado por tribunal há 32 anos
O Conselho Nacional de Justiça acompanhou o voto divergente do corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, e rejeitou, por maioria, a proposta de determinar ao Tribunal de Justiça de São Paulo o reaproveitamento do juiz Marcelo Holland Neto, que se encontra afastado do tribunal há 32 anos.
A decisão evita possível agravamento de uma longa divergência entre o CNJ e o TJ-SP.
Holland Neto foi condenado em 1992 à pena de disponibilidade pelo tribunal paulista, entre outros motivos, por coparticipação em fraude eleitoral.
Quando recorreu ao CNJ, Holland pretendia ver aprovado o imediato retorno às funções de seu cargo –em caráter definitivo–, “retroagindo e reconhecendo todos os direitos a partir de maio de 2003, quando seu reaproveitamento foi inconstitucional e ilegalmente negado”.
No julgamento mais recente, foi analisada no plenário virtual uma questão de ordem apresentada pelo juiz e pela Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages) pelo aproveitamento de Holland.
O relator, conselheiro Pablo Barreto, determinara que o TJ-SP procedesse o reaproveitamento do magistrado. Barreto foi acompanhado pelos então conselheiros Giovanni Olsson e Marcos Vinícius Jardim Rodrigues.
Salomão divergiu e o processo foi retirado de pauta a pedido da conselheira Renata Gil. O relator voltou a analisar o caso e determinou ao TJ-SP instaurar um novo PAD (Processo Administrativo Disciplinar) para verificar a necessidade de aplicar a aposentadoria compulsória a Holland.
Por unanimidade, foram aprovadas alterações na Resolução nº 135 sugeridas pelo relator.
Ultrapassado o prazo de cinco anos da pena de disponibilidade, e não havendo pedido de aproveitamento ou depois de sucessivos indeferimentos, o tribunal deverá instaurar PAD para assegurar o contraditório e a ampla defesa.
PARA ENTENDER O CASO
Em 1992, o TJ-SP julgou comprovada a coparticipação de Holland numa fraude quando atuou como juiz eleitoral em Guarulhos (SP). Ele foi acusado de alterar a apuração dos votos para favorecer dois candidatos à Câmara Municipal.
Holland teria recebido um “relógio valioso presenteado por um candidato beneficiado” e auxílio-moradia pago pela prefeitura daquela cidade.
Em 1994, o TJ-SP negou a volta do juiz ao cargo por considerar que suas infrações “revestem-se de intensa gravidade”. Dez anos depois, Holland recorreu ao CNJ para voltar ao cargo, mas o órgão se negou a analisar o caso.
Em 2016, o advogado Emmanoel Campelo, então conselheiro do CNJ, determinou, em decisão monocrática, que o TJ-SP instaurasse procedimento administrativo para reaproveitamento de Holland.
Campelo entendeu que, se o juiz não recebeu a pena máxima de aposentadoria compulsória, não haveria como ser punido eternamente com a disponibilidade.
“Nada justifica impedir que o apenado possa dar continuidade às suas atividades laborativas, essenciais que são para a preservação da dignidade pessoal e, além, para a realização dos ideários da alma”, escreveu o conselheiro na decisão.
Em 2018, a defesa de Holland pediu que ele fosse inscrito na Escola Paulista da Magistratura. O TJ-SP rejeitou o pedido, alegando que os cursos eram destinados a magistrados da ativa.
CONHECIMENTO INSUFICIENTE
O juiz foi submetido a uma sindicância da vida pregressa, a verificação da aptidão física, mental e psicológica e a uma avaliação de sua capacidade técnica e jurídica. O relator disse que Holland deixou de comparecer em duas oportunidades agendadas.
Em 2021, por unanimidade, o Órgão Especial do TJ-SP decidiu que Holland demonstrou “conhecimento jurídico insuficiente para retomar atividade jurisdicional”, e que seu reaproveitamento seria um “risco para os jurisdicionados e para o Poder Judiciário”.
A banca avaliadora concluiu “pela baixa compreensão do conteúdo dos cursos e de capacidade de sua exposição; incorreção da quase totalidade das respostas, muitas descontextualizadas, demonstrando desatualização no direito; declarou-se, portanto, diante dos votos proferidos, o aproveitamento insatisfatório do magistrado”.
Numa das sessões no CNJ, o então conselheiro Rubens Canuto admitiu que “a gravidade dos fatos recomendava uma aposentadoria compulsória, mas o TJ-SP optara pela aplicação da pena de disponibilidade –não foi o CNJ–, assegurando ao juiz o direito de retornar ao cargo”.
Segundo o CNJ, Holland exerceu a magistratura por apenas sete anos. A maior parte do período –quatro anos– foi marcada pelo processo disciplinar.
Em sustentação oral, naquela ocasião, o advogado Cristovam Dionísio de Barros Cavalcanti Junior disse que o tribunal agiu com “maldade” e “leviandade”. “A nossa Constituição veda a pena perpétua. É desumano”, disse.
Na sessão do último dia 28, embora o julgamento de questão de ordem não admita sustentação oral, o presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, abriu exceção.
O advogado Cavalcanti Junior manifestou-se contra a abertura do PAD. “Ninguém pode ser punido duas vezes pelo mesmo fato”, disse.
O ex-presidente do TJ-SP Manoel Pereira Calças (2018/2019) sustentou nos autos que Holland “busca, por via transversa, e o que é pior, em tom nitidamente emulativo [que pretende obter direito que sabe inexistente], ressuscitar discussão já sepultada”.
Frederico Vasconcelos, FolhapressPoliticaLivre