Por Fernando Duarte
Por mais que o ato em memória ao 8 de Janeiro tenha tido ares institucionais, com a presença dos presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, e do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco, há um sequestro do tema pela esquerda. E isso diminui a importância que deveria haver para a defesa da democracia, que foi ameaçada com a ação de vândalos nas sedes dos três Poderes da República, no começo de 2023. Basicamente, o estereótipo de que a esquerda defende o Estado democrático de direito - e que outros segmentos da sociedade não - acabou reforçado. Aí reside um problema.
Não que tenha havido falha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou de seu entorno ao realizar um ato em Brasília, para manter viva a memória daquele fatídico dia na capital federal. O esforço é preciso ser reconhecido. Só que, ao optar pelo sequestro por um espectro político, percebemos que seguimos com uma polarização social extremada, que não se encerrou após as eleições de 2022 e ainda permanece latente. Culpa, principalmente, da direita raivosa que, ao invés de construir pontes ao diálogo, opta por esse distanciamento retórico.
Assim como aconteceu após o 8 de janeiro de 2022, não cabe apenas aos protagonistas do Judiciário, do Legislativo e do Executivo reafirmarem o compromisso com a democracia. Todos os atuantes na cena política deveriam estar falando, publicamente, contra essa mancha criada na história dessa nossa jovem democracia. Enquanto essa pauta ficar restrita, maior o risco de episódios lamentáveis como os vistos no ano passado voltarem a acontecer. E, convenhamos, ninguém em sã consciência gostaria de lidar com o caos e a balbúrdia promovidos por pessoas que não vivem conectadas à realidade.
Ao optarem pelo silêncio, figuras que poderiam ascender como lideranças de um campo mais à direita do espectro político passam a integrar o mesmo caldo que depredou patrimônio público em um domingo que deveria ter sido como outro qualquer. A lista, inclusive, não é pequena e inclui proeminentes nomes da cena nacional, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ou o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (União). As razões eleitorais são justificativas perfeitas, mas não deveria ser assim. Ou se defende a democracia ou está ao lado de quem colocou ela em xeque, algo que não me parece necessariamente algo que esteja no escopo de atuação de Tarcísio ou de ACM Neto, para ficar restrito aos exemplos citados.
Relembrar a importância do Estado democrático de direito e como os poderes estão devidamente constituídos na República não é uma obrigação de quem está ocupando cargos atualmente. É papel de todo e qualquer democrata. Que aquele 8 de janeiro de 2022 nunca mais volte a se repetir. E que essa pauta não seja sequestrada pela esquerda nem rechaçada pela direita.