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domingo, abril 03, 2022

Alemanha quer usar reservas ambientais – para o Brasil, propõe “floresta em pé”




Por Geraldo Luís Lino 

Assim como a União Europeia (UE), a Alemanha também quer promover uma “flexibilização” das leis referentes às áreas de proteção ambiental, devido ao impacto da guerra na Ucrânia sobre as importações agrícolas provenientes da Ucrânia e da Rússia. A exemplo do bloco, a intenção é utilizar as Áreas de Interesse Ecológico (EFAs, sigla em inglês), para cultivos de favas e ervilhas.

Em entrevista à agência Bloomberg (11/03/2022), o ministro da Agricultura Cem Oezdemir justificou: “A guerra de Putin contra a Ucrânia nos mostra os pontos vulneráveis do nosso sistema agrícola. Portanto, as nossas medidas visam a proporcionar uma assistência rápida e a tornar a agricultura em conjunto menos vulnerável às crises.”

Na Alemanha, as EFAs somam 1,2 milhão de hectares (12 mil km2), área que representa pouco mais de um quarto do estado do Rio de Janeiro.

O ministério também anunciou medidas para agilizar a burocracia em programas que promovem o uso de energias renováveis na agricultura.

Ao mesmo tempo, em uma tocante demonstração de suas preocupações ambientais, os alemães propõem para o Brasil uma agenda bem diferente, a da “floresta em pé”, eufemismo para a insidiosa pauta do “desmatamento zero”, que, alegadamente, não coloque em risco a estabilidade dos biomas Amazônia e Cerrado e, portanto, não represente uma imaginária ameaça à dinâmica climática global.

Basicamente, esta foi a mensagem transmitida pela maioria dos debatedores germânicos que participaram do 2º Colóquio Brasil-Alemanha sobre Política e Direito Ambiental, em 21 de março. Evento promovido pelo Senado Federal em parceria com o Fórum Euro-Brasileiro sobre Democracia e o Observatório do Meio Ambiente e das Mudanças Climáticas do Poder Judiciário, vinculado ao Conselho Nacional de Justiça.

O recado geral, compartilhado pelos debatedores brasileiros, foi que o Brasil precisa aproveitar a preservação ambiental como um ativo econômico.

A fundadora e presidente da ONG Earth 3000, Maritta von Bieberstein Koch-Weser, afirmou que a “bioeconomia da floresta em pé” proporciona à floresta um valor mais vantajoso que o desmatamento:

    A floresta precisa ser competitiva, ou seja, a floresta em pé precisa ter mais valor, e precisa oferecer valores sustentáveis, do que quaisquer lucros gerados por meio do desmatamento. (…) Ao mesmo tempo, quando nós olhamos para a riqueza biológica, climática, hídrica, nós temos de pensar também em todas as propriedades intelectuais, na herança intelectual, em todos os conhecimentos indígenas de milhares de anos. Temos de pensar também em todos os conhecimentos tradicionais dos caboclos. Isso é um aspecto muito importante quando nós queremos precificar a floresta em pé.

Pelo menos, ela reconheceu que nem só de preservação podem viver os amazônidas: “O investimento no desenvolvimento econômico da região é, desproporcionalmente, pouco. As populações tradicionais indígenas vivem longe, numa região enorme e têm enormes problemas de transporte, energia e infraestrutura.”

Já o físico, biólogo e ex-parlamentar Ernst-Ulrich von Weizsäcker destacou o aumento das queimadas na Amazônia e, também, na própria Alemanha e em países como a Austrália e a China. E também alertou para a elevação do nível do mar: “Imaginem o seguinte: a água do mar sobe três metros. Nós teríamos, em consequência disso, um problema de refugiados que ultrapassaria em grandeza todos os problemas de refugiados que tivemos nos últimos 100 anos. Nós precisamos de soluções urgentes.”

Copresidente do arquimalthusiano Clube de Roma, Weizsäcker insistiu na tecla do alarmismo ambiental, afirmando que nada menos que um milhão de espécies animais e vegetais estão em extinção atualmente e o principal responsável por tal tragédia é o agronegócio: “Quais são as causas? Perdão, nós somos as causas. Nós, homens, somos as causas. (…) A expansão da agricultura de grande porte é o maior inimigo da natureza. Só que ninguém quer saber essa verdade, ninguém quer ouvir essa verdade, mas ela é uma realidade.”

Por ironia, Weizsäcker é filho do físico e filósofo Carl Friedrich von Weiszäcker (1912-2007), um dos grandes cientistas do século XX, que tinha uma visão do mundo muito mais arejada e realista que a de seu rebento.

Por sua vez, a eurodeputada Anna Cavazzini, presidente do Comitê sobre Mercado Interno e Proteção do Consumidor do Parlamento Europeu, enfatizou a política de “neutralidade em dióxido de carbono” do bloco europeu:

E nós estamos agora trabalhando para colocar em prática esse New Green Deal. Nós temos muitos projetos de lei para eficiência energética, energias renováveis, e isso é muito atual agora com a guerra russa. Nós temos de proteger o clima, mas, por outro lado, nós temos de ser independentes das importações de combustíveis fósseis, e o meu país, a Alemanha, depende em 50% das importações de combustíveis fósseis da Rússia.

Ademais, advertiu sobre a política europeia de priorizar o fornecimento de produtos que não envolvam desmatamento, o que, para ela, pode ajudar o Brasil a priorizar uma política agrária sustentável sem desmatamento:

    As empresas europeias ou operadores, como consta na lei, que importam produtos, e isso, no momento, são seis produtos, que é a cadeia de produção de carne, cacau, café, óleo de palma, soja e madeira, se esses produtos foram importados, as empresas precisam fazer uma avaliação de diligência e precisam comprovar que esses produtos não são provenientes de áreas desmatadas. E isso é bastante inovador; não houve no passado. Uma empresa que não consegue provar isso não pode vender o produto no mercado interno europeu.

Semanas atrás, Cavazzini já havia se manifestado “preocupada” com a aprovação pelo Congresso Nacional do texto-base do Projeto de Lei (PL) 6.299/2002, que altera a atual Lei de Agrotóxicos (MSIa Informa, 18/03/2022).

Por sua vez, o presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, Jaques Wagner (PT-BA), que convocou o evento, preferiu observar a necessidade de punições para os proprietários que prejudiquem os “povos originários”, contaminem um lençol freático ou derrubem a floresta:

    Nós queremos estabelecer o modus vivendi de como produzir sem degradar. Porque senão, me permitam, será uma produção imediatista. Permitam-me até dizer: uma produção burra, porque ela não será longeva. Quantos milhões de hectares nós temos de terra degradada, que poderiam ser recuperados, para não se continuar com a cantilena de que precisa desmatar, desmatar e desmatar?

A diretora do Instituto de Manejo e Certificação Agrícola e Florestal (Imaflora), Marina Piatto, reforçou a cantilena, afirmando que o Código Florestal não é suficiente para conter o desmatamento e promover uma agricultura mais moderna:

    A indústria da carne bovina, os produtores de gado, assim como os produtores de soja, e seus compradores, vêm sendo chamados a agir há mais de uma década por sua parcela de responsabilidade no desmatamento da Amazônia e do Cerrado, e não só pelo desmatamento, mas também pelo trabalho análogo à escravidão e pela invasão de terras públicas.

É curioso – e perigoso – que tantos brasileiros se deixem iludir por esse discurso hipócrita e oportunista dos europeus “amantes da natureza”, que defendem a produção na Europa e a proteção ambiental no Brasil. É mais que hora de abrir os olhos sobre a agenda pseudoambientalista de interesses muito mal disfarçados.

MSIa

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