Um levantamento exclusivo feito por Oeste mostra que, em 2020, mais de 100 organizações brasileiras (ou estrangeiras com projetos no Brasil) receberam dinheiro da Fundação Open Society.
Por Gabriel de Arruda Castro
Em agosto de 2020, o Supremo Tribunal Federal determinou que a polícia do Estado do Rio de Janeiro não poderia realizar operações policiais em favelas enquanto durasse a pandemia. O argumento dos ministros (com a exceção de Luiz Fux e Alexandre de Moraes, que foram voto vencido) era uma mistura incompreensível de alegações que iam do combate à covid-19 ao “racismo estrutural”. A decisão, por sua vez, atendia a uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) impetrada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB).
O número de entidades que podem apresentar uma ADPF é muito restrito — além de autoridades da República, apenas sindicatos, o Conselho Federal da OAB e, por fim, partidos políticos com parlamentares no Congresso. Por isso, o PSB foi quem assinou a ação. Por trás do partido, entretanto, havia uma coalizão de entidades não governamentais, o que dava a impressão de que diversos setores da sociedade apoiavam a medida. Até mesmo um site especial (www.adpfdasfavelas.org) foi lançado para pressionar pela proibição das ações policiais. Mas a maior parte das organizações apresentadas como apoiadoras da iniciativa tem algo em comum. Das 15 entidades não governamentais que aparecem como responsáveis pelo movimento, 11 receberam, naquele ano, dinheiro da Open Society Foundations, organização do megabilionário húngaro George Soros. São elas: Conecta Direitos Humanos, Fogo Cruzado, CESeC (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania), Justiça Global, Coletivo Papo Reto, Instituto Marielle Franco, Observatório de Favelas, Iser (Instituto de Estudos da Religião), Redes da Maré e a Iniciativa Direito Memória e Justiça Racial.
Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes ainda citou um relatório da Anistia Internacional Brasil que apontava para o suposto racismo da polícia carioca, cujas vítimas seriam majoritariamente jovens negros. A organização também obteve recursos da Open Society naquele ano. Juntas, essas 13 entidades receberam, só em 2020, US$ 7,5 milhões (R$ 38,7 milhões) da Fundação de George Soros. E a lista completa é muito maior.
Um levantamento exclusivo feito por Oeste mostra que, naquele ano, 109 organizações brasileiras (ou estrangeiras com projetos no Brasil) receberam repasses da Open Society.
Os dados de 2021 ainda não estão disponíveis.
Origem na Hungria
A Open Society (Sociedade Aberta, em português) foi criada em 1984, em uma Hungria ainda dominada pelo comunismo. Hoje, tem sua sede à Rua 57, em Nova Iorque, a dois quarteirões do Central Park. Os funcionários se espalham por estações de trabalho modernas e sem divisórias. Lá, são tomadas as decisões que influenciam a vida de pessoas que nunca saberão quem é George Soros. Somente em 2020, a entidade distribuiu US$ 1,35 bilhão (R$ 6,95 bilhões) a organizações parceiras ao redor do mundo.
E a agenda da Open Society é clara. Embora não defenda abertamente pautas da velha esquerda (Soros foi um opositor do regime comunista em sua terra natal), a fundação promove toda a agenda da nova esquerda radical. Isso inclui a liberação das drogas, o desencarceramento de presos, a restrição ao trabalho da polícia e a promoção da “identidade de gênero”, além de outros itens que podem afetar diretamente o tecido social e a economia de um país. No caso do Brasil, a entidade também beneficia organizações que se apresentam como defensoras do meio ambiente e dos povos indígenas.
Em sua página na internet, a organização se orgulha de que parte de seus recursos se destina à “liberação de presos não violentos” (embora a definição de “não violento” não seja apresentada). O grupo também quer pôr fim a leis que punam usuários de drogas. “Nós trabalhamos com autoridades locais e a polícia para promover uma abordagem às drogas que priorize a segurança e a saúde dos usuários, em vez da repressão”, explica a Open Society. Já em 1994, Soros lançou uma organização (O Centro Lindesmith) para defender a legalização das drogas ao redor do globo. Ele incentiva ainda políticas que protegem as minorias de “verificações de identidade, revistas e outras formas de intimidação por parte da polícia”. No campo da sexualidade, a fundação financia organizações que “promovem direitos em áreas como o reconhecimento legal da fluidez de gênero” — seja lá o que isso signifique.
Em tese, o financiamento de organizações brasileiras pela Open Society não é ilegal. Mas o volume maciço de dinheiro vindo do exterior cria a sensação de que certas organizações de fato representam os desejos e as opiniões da sociedade — quando na verdade sua influência no debate público é fruto, em grande parte, das decisões tomadas no prédio da Rua 57, em Manhattan. O ciclo tem se repetido há anos: a Open Society decide financiar uma organização no Brasil, e essa organização ganha uma aparência de legitimidade desproporcional ao seu tamanho real. Com essa influência inflada por dinheiro estrangeiro, ela tem maior capacidade de influenciar o debate público — nos meios de comunicação e, sobretudo, no diálogo com autoridades. A decisão do STF sobre as ações policiais na favela é um bom exemplo disso.
Os principais beneficiados
A organização mais beneficiada pela Open Society em 2020 no Brasil foi a Associação Direitos Humanos em Rede, que se apresenta em sua página como Conectas Direitos Humanos. O repasse foi de US$ 5 milhões (R$ 25,7 milhões). A aplicação exata dos recursos é uma incógnita. A descrição no site da Open Society fala apenas no apoio a “ações de caridade e educacionais”. A entidade brasileira tem uma postura hostil ao trabalho da polícia e, recentemente, atuou contra a realização de audiências de custódia remotas (que reduzem custos e aumentam a agilidade do sistema prisional). O argumento era que a medida tornaria mais difícil averiguar potenciais casos de tortura a presos. A atual diretora-executiva da entidade, Juana Kweitel, divulgou a campanha do “Ele Não”, contra Jair Bolsonaro, nas eleições de 2018.
Em segundo lugar, aparece o Instituto Clima e Sociedade, que obteve US$ 1,4 milhão (R$ 7,2 milhões). A diretora-executiva da entidade, Ana Toni, foi presidente do Conselho do Greenpeace Internacional por sete anos. O instituto tem como objetivo “fortalecer as condições que alavanquem práticas duradouras de mitigação e resiliência das mudanças climáticas”.
Em terceiro, com US$ 1,1 milhão (R$ 5,7 milhões), está o CESeC, ligado à Universidade Cândido Mendes. A organização promove a liberação das drogas e a agenda mais radical do movimento LGBT.
Em quarto lugar, aparece a Empresa Maranhense de Serviços Hospitalares. A Open Society destinou US$ 1 milhão (R$ 5,1 milhões à época) para apoiar hospitais do Maranhão durante a pandemia de covid-19.
O mesmo valor foi repassado para a ParáPaz, uma agência do governo paraense. De acordo com a Open Society, o objetivo foi ajudar o governo do Pará a atuar nos “aspectos socioeconômicos da pandemia”.
A lista de beneficiados ainda inclui organizações como a Ponte Jornalismo, a Escola de Comunicação da UFRJ, a Fundação Getulio Vargas, a página Quebrando o Tabu, a ONG Viva Rio e o Instituto Igarapé.
O Brasil ganha importância
A Open Society aumentou consideravelmente o volume de recursos aplicados no Brasil. Entre 2016 e 2019, a organização repassou em média US$ 8,2 milhões por ano. Apenas em 2020, foram US$ 22 milhões, o equivalente a mais de R$ 113 milhões, considerando o câmbio médio do ano. O número de organizações beneficiadas também cresceu significativamente: de 48, entre 2016 e 2019, para 109, em 2020. Entre 2016 e 2019, o Brasil recebeu, em média, 0,82% dos recursos globais da entidade. Em 2020, o valor dobrou para 1,56%. Ou seja: embora continue recebendo uma parcela pequena do volume total da Open Society, o Brasil tem ganhado relevância.
Ironicamente, Soros, que fez fortuna no mercado financeiro e já foi definido como um especulador internacional, não é bem-visto em sua terra natal. O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, acusa o bilionário e sua fundação de atacarem a identidade nacional dos húngaros em diversos fronts. Por exemplo, ao pressionar o país pela abertura de suas fronteiras a imigrantes vindos do Oriente Médio e da África, e que muitas vezes entram na Europa pelo Leste, passando pela Hungria. Em 2018, a Open Society fechou seu escritório na Hungria, depois que o Parlamento local, já sob o comando dos aliados de Orban, aprovou um pacote de legislação que, dentre outras medidas, tornava crime a promoção da imigração ilegal no país.
Revista Oeste