Câmaras Municipais optam por ocultar informações de total interesse do povo. Mas essa prática é criminosa
Tayonara Géa
Agora que você já conhece a função de um vereador e o trabalho que deve ser exercido pela Câmara Municipal, chegou a hora de começar a análise sobre a transparência do Poder Legislativo da sua cidade. Em uma simples consulta ao site da Casa de Leis é possível averiguar se existe a intenção em deixar claras as informações que são de direito do povo. Isso mesmo. Tudo o que acontece dentro dessa Casa de Leis deve ser acessível – pelo menos deveria – e contar com a participação popular.
Em princípio, não é com essa visão de ser transparente que a maioria das Câmaras Municipais – das regiões onde atuamos – trabalha. Quando o Jornal do Trem & Folha do Ônibus decidiu acessar os sites desses órgãos públicos, para saber um pouco mais sobre alguns dados básicos (como salário dos vereadores, número de assessores, verbas de gabinete) e também verificar a presença dos parlamentares nas sessões, nas votações dos projetos e no trabalho das Comissões, se deparou com a ausência das informações na maioria dos legislativos. E quando solicitou às assessorias de imprensa, recebeu respostas do tipo: “pra quê?” ou “enviaremos em breve” (e já se passaram duas semanas e até o momento os dados não foram encaminhados).
E aí surge a pergunta: por que não ser transparente? A resposta é simples: porque não existe um comprometimento dos órgãos fiscalizadores e, nem mesmo, interesse dos eleitos pelo povo em demostrar o trabalho (se é que existe em algumas Casas). Porém, o cidadão está com a ‘faca e o queijo nas mãos’ para ter acesso a qualquer informação, pois existe uma lei que obriga o legislativo a informar o que for solicitado.
Para todos os órgãos
A lei nº 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação, não deve ser aplicada apenas às Câmaras Municipais. Trata-se de uma determinação que regulamenta o direito, previsto na Constituição, de qualquer pessoa solicitar e receber dos órgãos e entidades públicas – de todos os entes e Poderes – informações públicas por eles produzidas ou custodiadas.
“É uma lei que favorece o cidadão, porque ele não precisa justificar o pedido da informação e o servidor público não pode questionar – e nem cobrar – os motivos da solicitação. Esse tipo de questionamento ocorre porque não há uma transparência ‘natural’ dos órgãos públicos. E é absolutamente fundamental que eles sejam transparentes porque são mantidos com o dinheiro da sociedade – através de pagamento de taxas e impostos. A única forma de verificar se as ações estão sendo tomadas em critérios pertinentes e o dinheiro público gasto corretamente é pela transparência”, explica o consultor e autor do livro ‘Lei de Acesso à Informação: reforço ao controle democrático’, Fabiano Angélico.
Cutucando com a vara curta
O fato de ser transparente é algo novo nos poderes legislativos. Segundo a advogada especialista em Direito Público do Conam (Consultoria em Administração Municipal), Giselle Bezerra, “o protagonista de ter de mostrar as ações e como o dinheiro público era gasto sempre foi o Executivo. Os demais órgãos se viram obrigados a tornar as informações públicas há pouco tempo. Tudo isso passa por uma mudança cultural, e é preciso que haja um esforço para que isso aconteça”.
Para Fabiano Angélico, essa ação de transparência incomoda tanto o mal, como o bem intencionado, porque traz uma obrigação de organizar a informação, criar canais para disponibilizar os dados e receber demandas da sociedade. É aquela coisa de que fazer a coisa certa traz esforço e incômodo. Mas os gestores mais inteligentes e os servidores públicos mais antenados sabem que isso vai reverter em benefícios para a própria instituição pública, tanto em termos de ganho de confiança de melhorar a relação com a sociedade, quanto aos procedimentos internos – assim, a própria gestão pública fica mais fácil. Mas essa é visão em longo prazo, que poucos órgãos públicos têm”.
Fazer por fazer?
É preciso que a transparência seja feita e bem feita. Isso quer dizer que não basta jogar os dados no site, colocar gráficos de difícil entendimento, e dificultar o acesso do cidadão às demais informações. É preciso comprometimento.
“A própria Lei de Acesso à Informação impõe que as informações sejam claras e objetivas, visando a facilidade. A norma trouxe elementos mínimos para a transparência, mas não veio com layout – que muitas vezes são complicados de entender. Mesmo com os dados no site, o cidadão não está impedido de protocolar o pedido e solicitar os dados de forma mais clara”, comenta a advogada.
Cobranças e ações
Entidades não governamentais, órgãos públicos e a própria sociedade devem fiscalizar as Câmaras Municipais e cobrar ações transparentes.
Nessa semana, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MP) divulgou uma avaliação todas as Câmaras Municipais do Estado. Foi verificado se essas Casas oferecem ferramentas online que possibilitem a fiscalização de contratos e dos gastos públicos pelos cidadãos. Para aquelas que apresentaram irregularidades serão expedidas recomendações no próximo dia 9 de dezembro, para que haja uma adequação à transparência. Caso as providências não sejam atendidas no prazo de 90 dias, o MP poderá ajuizar uma ação civil pública pelo crime de improbidade administrativa do poder público.