Publicado em 22 de março de 2021 por Tribuna da Internet
Carlos Newton
Depois de passar os dois primeiros anos de gestão fazendo ameaças de golpe e se arvorando de estar no comando das Forças Armadas, o presidente Jair Bolsonaro conseguiu criar nova institucional na última sexta-feira (dia 19), ao proclamar que poderia baixas “medidas duras” contra governadores e prefeitos.
Depois de tantos exercícios infundados de jactância gratuita, empunhando a caneta esferográfica e tudo o mais, é impressionante que Bolsonaro ainda não tenha percebido que não é ele quem comanda as Forças Armadas. Quem o faz é inquilino do Planalto, seja quem for, mas apenas no exercício de suas funções, e só pode exercer esse comando em nome do interesse público e jamais em nome do interesse pessoal, sobretudo quando se trata de um político sem equilíbrio emocional e que circunstancialmente conseguiu chegar à chefia do governo.
MAIA E MINISTROS – Desta vez, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), ex-presidente da Câmara, para ganhar mais 15 minutos de fama, apressou-se em informar ao presidente do Supremo, Luiz Fux, a gravidade da fala de Bolsonaro. Outros ministros do STF também o fizeram, como se Fux estivesse distraído ou desligado do noticiário político, algo que rigorosamente jamais acontece.
A verdade é que são tantos disparates de Bolsonaro que Fux já nem dá mais importância aos absurdos que o presidente diz a todo momento. Mesmo assim, atendendo a pedidos, Fux resolveu ligar para Bolsonaro para pegar a tradução simultânea e saber se o presidente da República estava se referindo a estado de sítio.
Tremendo na base, o chefe do governo negou e saiu com críticas à imprensa, que estaria distorcendo suas palavras, porque disse que “um terreno fértil para a ditadura é exatamente a miséria, a fome e a pobreza. Onde um homem, com necessidade, perde a razão. Estão esperando o quê? Vai chegar um momento, gostaria que não chegasse esse momento, mas vai acabar chegando”.
VALE PARA TODOS – O inesperado telefonema de Fux pode até ter levado Bolsonaro o entender o recado de que não apenas ele, mas também os presidente do Supremo e do Congresso podem pedir intervenção militar, nos termos do famoso art. 142, ao definir que “as Forças Armadas destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
Ou seja, se Bolsonaro continuar bagunçando o coreto, como se dizia antigamente, tanto Fux quanto o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), juntos ou separadamente, podem requisitar a ação dos militares.
É claro que Fux, hábil e educado, não tocou no assunto. Apenas indagou a Bolsonaro qual é o seu real objetivo com esses palavras, ou seja, cobrou explicações. E Bolsonaro teve de se explicar, fato que constituiu uma humilhação para o presidente da República, sem a menor dúvida.