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quinta-feira, novembro 28, 2019

CONTAS REJEITADAS PELA CÂMARA DE VEREADORES = Supremo Tribunal Federal

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EMENTA: JULGAMENTO DAS CONTAS DE EX-PREFEITO MUNICIPAL. PODER DE CONTROLE E DE FISCALIZAÇÃO           DA CÂMARA DE VEREADORES                    (CF, ART. 31). PROCEDIMENTO DE CARÁTER POLÍTICO-ADMINISTRATIVO. NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DA CLÁUSULA DA PLENITUDE DE DEFESA E DO CONTRADITÓRIO (CF, ART. 5º, LV).  DOUTRINA. PRECEDENTES. TRANSGRESSÃO, NO CASO, PELA CÂMARA DE VEREADORES, DESSAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. SITUAÇÃO DE ILICITUDE CARACTERIZADA. CONSEQUENTE INVALIDAÇÃO DA DELIBERAÇÃO PARLAMENTAR CONSUBSTANCIADA EM DECRETO LEGISLATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO.

- O controle externo das contas municipais, especialmente daquelas pertinentes ao Chefe do Poder Executivo local, representa uma das mais expressivas prerrogativas institucionais da Câmara de Vereadores, que o exercerá com o auxílio do Tribunal de Contas (CF, art. 31).

Essa fiscalização institucional não pode ser exercida, de modo abusivo e arbitrário, pela Câmara de Vereadores, eis quedevendo efetivar-se no contexto de procedimento revestido de caráter político- -administrativo – está subordinada à necessária observância, pelo Poder Legislativo local, dos postulados constitucionais que asseguram, ao Prefeito Municipal, a prerrogativa da plenitude de defesa e do contraditório.

- A deliberação da Câmara de Vereadores sobre as contas do Chefe do Poder Executivo local de respeitar o princípio constitucional do devido processo legal, sob pena de a resolução legislativa importar em transgressão ao sistema de garantias consagrado pela Lei Fundamental da República.

DECISÃO: O presente recurso extraordinário foi interposto por     ex-Prefeito Municipal que se insurge contra acórdão emanado do           E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que lhe negou o direito de ver respeitadas, pelo Poder Legislativo local, em sede de julgamento de contas pela Câmara Municipal de Santos, as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

O aspecto central da decisão em referência, objeto do presente recurso extraordinário, acha-se consubstanciado em acórdão assim ementado (fls. 1.786):

Ação anulatóriaMunicípiopedido de anulação                      de decisão do Tribunal de Contas – rejeição das contas do                          ex-Prefeito de Santos do exercício de 2002 – oportunidade de         defesa conferida ao autor pelo órgão vistor – desnecessidade                      de abertura de prazo para defesa na Câmara Municipaledilidade que acolheu o parecer – verba honorária reduzida.” (grifei)

A parte ora recorrente, ao deduzir o presente apelo extremo, sustentou que a decisão questionada teria transgredido os preceitos inscritos no art. 5º, incisos LIV e LV, e no art. 93, inciso IX, ambos da Constituição Federal.

O Ministério Público Federal, em fundamentada manifestação da lavra do eminente Subprocurador-Geral da República Dr. RODRIGO JANOT MONTEIRO DE BARROS, ao opinar pelo conhecimento e provimento do presente recurso extraordinário, formulou parecer que contém a seguinte ementa (fls. 1.948):

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. APRECIAÇÃO DAS CONTAS DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO        MUNICIPAL. PROCEDIMENTO DE CARÁTER POLÍTICO- -ADMINISTRATIVO. INDISPENSABILIDADE DA PLENITUDE DE DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. CF, ARTS. 5º, LV E 31, § 2º.
…...................................................................................................
3. Reafirmação da orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal no sentido da indispensabilidade da observância da garantia constitucional da ampla defesa e do contraditório no procedimento político-administrativo de controle parlamentar das contas do Chefe do Poder Executivo local. CF, arts. 5º, LV, e 31, § 2º.” (grifei)

Sendo esse o contexto, passo a apreciar o presente recurso extraordinário. E, ao fazê-lo, entendo assistir plena razão à douta Procuradoria-Geral da República, cujo parecer bem demonstra que o acórdão ora questionado diverge do entendimento que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria em exame.

O controle externo das contas municipais, especialmente daquelas pertinentes ao Chefe do Poder Executivo local, representa uma das mais expressivas prerrogativas institucionais da Câmara de Vereadores, que o exercerá com o auxílio do Tribunal de Contas (CF, art. 31).

Essa fiscalização institucional, por sua vez, é desempenhada pelo Poder Legislativo do Município no âmbito de procedimento revestido de caráter político-administrativo, tal como acentuado, em preciso magistério, pelo saudoso e eminente HELY LOPES MEIRELLES (“Direito Municipal Brasileiro”, p. 608, 15ª ed., São Paulo, 2006, Malheiros Editores):

A função de controle e fiscalização da Câmara sobre a conduta do Executivo tem caráter político-administrativo e se expressa em decretos legislativos e resoluções do plenário, alcançando unicamente os atos e agentes que a Constituição Federal, em seus arts. 70-71, por simetria, e a lei orgânica municipal, de forma expressa, submetem à sua apreciação, fiscalização e julgamento. No nosso regime municipal, o controle político-administrativo da Câmara compreende a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, através do julgamento das contas do prefeito e de suas infrações político-administrativas sancionadas com cassação do mandato.” (grifei)

Esse entendimento doutrinárioque enfatiza a imprescindibilidade da observância da garantia constitucional da plenitude de defesa e do contraditório (CF, art. 5º, LV) – reflete-se na autorizada lição de JOSÉ NILO DE CASTRO (“Julgamento das Contas Municipais”, p. 25/43, itens ns. 1-2, 3ª ed., 2003, Del Rey), que também adverte, a propósito do procedimento político-administrativo de controle parlamentar das contas do Prefeito Municipal, que a deliberação da Câmara de Vereadores sobre as contas do Chefe do Poder Executivo local, além de supor o necessário respeito ao postulado constitucional da ampla defesa, de ser fundamentada, sob pena de a resolução legislativa importar em inaceitável transgressão ao sistema de garantias consagrado pela Constituição da República.

Cabe referir que essa mesma percepção do tema é revelada, em substancioso estudo, pelo eminente Professor EDUARDO BOTTALLO (“Julgamento de Contas de Prefeito e Princípio da Ampla Defesa”, “in” “Direito Administrativo e Constitucional – Estudos em Homenagem a Geraldo Ataliba”, vol. 2/334-338, 1997, Malheiros), cujo magistério, no tema, assim  foi por ele exposto:

a) a apreciação das contas de Prefeito, prevista no art. 31, § 2º, da Constituição da República, é tarefa que não se contém no âmbito doprocesso legislativo’ de competência das Câmaras Municipais; trata-se, ao revés, de julgamento proferido dentro de processo regular, cuja condução demanda obediência às exigências constitucionais pertinentes à espécie;
b) não é correto o entendimento de que, no caso de apreciação de contas de Prefeito, o exercício do direito de defesa se dá apenas perante o Tribunal de Contas durante a fase de elaboração do parecer prévio, e isto porque esta instituição não julga, atuando apenas como órgão auxiliar do Poder Legislativo Municipal a quem cabe tal competência;
c) o julgamento das contas de Prefeito pela Câmara Municipal deve observar os preceitos emergentes do art. 5º, LV, da Constituição da República, sob pena de nulidade.” (grifei)

Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, considerada a essencialidade da garantia constitucional da plenitude de defesa e do contraditório, que a Constituição da República estabelece que ninguém pode ser privado de sua liberdade, de seus bens ou de seus direitos sem a observância do devido processo legal, notadamente naqueles casos em que se estabelece uma relação de polaridade conflitante entre o Estado, de um lado, e o indivíduo, de outro.

Cumpre ter presente, bem por isso, que o Estado, em tema de restrição à esfera jurídica de qualquer cidadão (titular, ou não, de cargo público), não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária, desconsiderando, no exercício de sua atividade, o postulado da plenitude de defesa, pois cabe enfatizaro reconhecimento da legitimidade ético-jurídica de qualquer medida imposta pelo Poder Público, de que resultem, como no caso, consequências gravosas no plano dos direitos e garantias individuais, exige a fiel observância do princípio do devido processo legal (CF, art. 5º, LV), consoante adverte autorizado magistério doutrinário (MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, “Comentários à Constituição Brasileira de 1988”, vol. 1/68-69, 1990, Saraiva; PINTO FERREIRA, “Comentários à Constituição Brasileira”, vol. 1/176 e 180, 1989, Saraiva; JESSÉ TORRES PEREIRA JÚNIOR, “O Direito à Defesa na Constituição de 1988”, p. 71/73, item n. 17, 1991, Renovar; EDGARD SILVEIRA BUENO FILHO, “O Direito à Defesa na Constituição”, p. 47/49, 1994, Saraiva; CELSO RIBEIRO BASTOS, “Comentários à Constituição do Brasil”, vol. 2/268-269, 1989, Saraiva; MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, “Direito Administrativo”,          p. 686/688, 25ª ed., 2012, Atlas; LÚCIA VALLE FIGUEIREDO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 444/446, 9ª ed., 2008, Malheiros; HELY LOPES MEIRELLES, “Direito Administrativo Brasileiro”, p. 107/108                 e 755/756, 38ª ed., 2011, Malheiros, v.g.).

A jurisprudência dos Tribunais, notadamente a do Supremo Tribunal Federal, tem reafirmado a essencialidade desse princípio, nele reconhecendo uma insuprimível garantia, que, instituída em favor de qualquer pessoa ou entidade, rege e condiciona o exercício, pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que em sede materialmente administrativa ou no âmbito político-administrativo, sob pena de nulidade da própria medida restritiva de direitos, revestida, ou não, de caráter punitivo (RDA 97/110 – RDA 114/142 – RDA 118/99 – RTJ 163/790, Rel. Min. CARLOS     VELLOSO – AI 306.626/MT, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “in Informativo/STF nº 253/2002 – RE 140.195/SC, Rel. Min. ILMAR  GALVÃO – RE 191.480/SC, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – RE 199.800/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.):

RESTRIÇÃO DE DIREITOS E GARANTIA DODUE PROCESS OF LAW’.
- O Estado, em tema de punições disciplinares ou de restrição a direitos, qualquer que seja o destinatário de tais medidas, não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária, desconsiderando, no exercício de sua atividade, o postulado da plenitude de defesa, pois o reconhecimento da legitimidade    ético-jurídica de qualquer medida estatal - que importe em punição disciplinar ou em limitação de direitos - exige, ainda que se cuide de procedimento meramente administrativo (CF, art. 5º, LV), a fiel observância do princípio do devido processo legal.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reafirmado a essencialidade desse princípio, nele reconhecendo uma insuprimível garantia, que, instituída em favor de qualquer pessoa ou entidade, rege e condiciona o exercício, pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que em sede materialmente administrativa, sob pena de nulidade do próprio ato punitivo ou da medida restritiva de direitos. Precedentes. Doutrina.
(RTJ 183/371-372, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Isso significa, portanto, que assiste, ao cidadão, mesmo em procedimentos de índole administrativa ou de caráter                 político-administrativo, a prerrogativa indisponível do contraditório e da plenitude de defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, consoante prescreve a Constituição da República em seu art. 5º     inciso LV.

O respeito efetivo à garantia constitucional do “due process of law”, ainda que se trate de procedimento político-administrativo (como no caso), condiciona, de modo estrito, o exercício dos poderes de que se acha investida a Pública Administração (a Câmara de Vereadores, na espécie), sob pena de descaracterizar-se, com ofensa aos postulados que informam a própria concepção do Estado democrático de Direito, a legitimidade jurídica dos atos e resoluções emanados do Estado, especialmente quando tais deliberações importarem em graves restrições à esfera jurídica do cidadão.

Esse entendimentoque valoriza a perspectiva constitucional que deve orientar o exame do tema em causa – tem o beneplácito de autorizado magistério doutrinário, tal como aquele expendido pela eminente Professora ADA PELLEGRINI GRINOVER (“O Processo em Evolução”, p. 82/85, itens ns. 1.3, 1.4, 2.1 e 2.2, 2ª ed., 1998, Forense Universitária):

O coroamento do caminho evolutivo da interpretação da cláusula dodevido processo legalocorreu, no Brasil, com a Constituição de 1988, pelo art. 5º, inc. LV, que reza:

Art. 5°, LV. Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.’

Assim, as garantias do contraditório e da ampla defesa desdobram-se hoje em três planos: a) no plano jurisdicional, em que elas passam a ser expressamente reconhecidas, diretamente como tais, para o processo penal e para o não-penal; b) no plano das acusações em geral, em que a garantia explicitamente abrange as pessoas objeto de acusação; c) no processo administrativo sempre que haja litigantes. (...)
É esta a grande inovação da Constituição de 1988.
Com efeito, as garantias do contraditório e da ampla defesa, para o processo não-penal e para os acusados em geral, em processos administrativos, já eram extraídas, pela doutrina e pela jurisprudência, dos textos constitucionais anteriores, tendo a explicitação da Lei Maior em vigor natureza didática, afeiçoada à boa técnica, sem apresentar conteúdo inovador. Mas agora a Constituição também resguarda as referidas garantias aos litigantes, em processo administrativo.
E isso não é casual nem aleatório, mas obedece à profunda transformação que a Constituição operou no tocante à função da administração pública.
Acolhendo as tendências contemporâneas do direito administrativo, tanto em sua finalidade de limitação ao poder e garantia dos direitos individuais perante o poder, como na assimilação da nova realidade do relacionamento Estado-sociedade e de abertura para o cenário sociopolítico-econômico em que se situa, a Constituição pátria de 1988 trata de parte considerável da atividade administrativa, no pressuposto de que o caráter democrático do Estado deve influir na configuração da administração, pois os princípios da democracia não podem se limitar a reger as funções legislativa e jurisdicional, mas devem também informar a função administrativa.
Nessa linha, dá-se grande ênfase, no direito administrativo contemporâneo, à nova concepção da processualidade no                   âmbito da função administrativa, seja para transpor para a                atuação administrativa os princípios do ‘devido processo legal’, seja para fixar imposições mínimas quanto ao modo de atuar da administração.
Na concepção mais recente sobre a processualidade administrativa, firma-se o princípio de que a extensão das formas processuais ao exercício da função administrativa está de acordo com a mais alta concepção da administração: o agir a serviço da comunidade. O procedimento administrativo configura, assim, meio de atendimento a requisitos da validade do ato administrativo. Propicia o conhecimento do que ocorre antes que o ato faça repercutir seus efeitos sobre os indivíduos, e permite verificar como se realiza a tomada de decisões.
Assim, o caráter processual da formação do ato administrativo contrapõe-se a operações internas e secretas, à concepção dos  ‘arcana imperii’ dominantes nos governos absolutos e lembrados por Bobbio ao discorrer sobre a publicidade e o poder invisível, considerando essencial à democracia um grau elevado de visibilidade do poder.
.......................................................................................................
Assim, a Constituição não mais limita o contraditório e a ampla defesa aos processos administrativos (punitivos) em que haja acusados, mas estende as garantias a todos os processos administrativos, não-punitivos e punitivos, ainda que neles não haja acusados, mas simplesmente litigantes.
Litigantes existem sempre que, num procedimento qualquer, surja um conflito de interesses. Não é preciso que o conflito seja qualificado pela pretensão resistida, pois neste caso surgirão a lide e o processo jurisdicional. Basta que os partícipes do processo administrativo se anteponham face a face, numa posição contraposta. Litígio equivale a controvérsia, a contenda, e não a lide. Pode haver litigantes – e os sem acusação alguma, em qualquer lide.” (grifei)

Não foi por outra razão que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal – ao examinar a questão da aplicabilidade e da extensão da garantia do “due process of law” aos processos de natureza   administrativaproferiu julgamento, que, consubstanciado em acórdão assim ementado, reflete a orientação que ora exponho na presente decisão:

Ato administrativoRepercussões – Presunção de legitimidade – Situação constituídaInteresses contrapostosanulaçãoContraditório. Tratando-se da anulação de ato administrativo cuja formalização haja repercutido no campo de interesses individuais, a anulação não prescinde da observância do contraditório, ou seja, da instauração de processo administrativo que enseje a audição daqueles que terão modificada situação já alcançada. (...).
(RTJ 156/1042, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – grifei)

Cumpre salientar, ainda, que a colenda Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 261.885/SP, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, que versava matéria idêntica à que ora se examina, decidiu nos mesmos termos ora expostos no presente ato decisório:

PREFEITO MUNICIPAL. CONTAS REJEITADAS PELA CÂMARA DE VEREADORES. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DO DIREITO DE DEFESA (INC. LV DO ART. 5º DA CF).
Sendo o julgamento das contas do recorrente, como       ex-Chefe do Executivo Municipal, realizado pela Câmara de Vereadores mediante parecer prévio do Tribunal de Contas, que poderá deixar de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Casa Legislativa (arts. 31, § 1º, e 71 c/c o 75 da CF), é fora de dúvida que, no presente caso, em que o parecer foi pela rejeição das contas, não poderia ele, em face da norma constitucional sob referência, ter sido aprovado, sem que se houvesse propiciado ao interessado a oportunidade de opor-se ao referido pronunciamento técnico, de maneira ampla, perante o órgão legislativo, com vista à sua almejada reversão.
Recurso conhecido e provido.” (grifei)

Impende ressaltar, por necessário, que essa orientação vem sendo observada em sucessivas decisões – monocráticas e colegiadas   proferidas, no âmbito desta Suprema Corte, a propósito da mesma controvérsia suscitada nesta causa (AC 2.085-MC/MG, Rel. Min. MENEZES DIREITO RE 235.593/MG, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RE 313.545/MG, Rel. Min. GILMAR MENDES – RE 394.634/MG, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – RE 367.562/MG, Rel. Min. DIAS TOFFOLI – RE 447.555/MG, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – RE 459.740/RS, Rel. Min. AYRES BRITTO –      RE 583.539/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE, v.g.):

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREFEITO MUNICIPAL. CONTAS REJEITADAS PELA CÂMARA MUNICIPAL. DIREITO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. PRECEDENTES.
1. É pacífica a jurisprudência desta nossa Casa de Justiça no sentido de que é de ser assegurado a ex-prefeito o direito de defesa quando da deliberação da Câmara Municipal sobre suas contas.
2. Agravo regimental desprovido.
(RE 414.908-AgR/MG, Rel. Min. AYRES BRITTO – grifei)

A análise da presente causa evidencia que se negou, à parte ora recorrente, o exercício do direito de defesa, não obstante se cuidasse de procedimento de índole político-administrativa em cujo âmbito foi proferida  decisão impregnada de nítido caráter restritivo, apta a afetar a situação jurídica titularizada pelo ex-Prefeito Municipal.

O fato irrecusável é que a supressão da garantia do contraditório e o consequente desrespeito à cláusula constitucional pertinente ao direito de defesa, quando ocorrentes (tal como sucedeu na espécie), culminam por fazer instaurar uma típica situação de ilicitude constitucional, apta a invalidar a deliberação estatal (a resolução da Câmara Municipal,               no caso) que venha a ser proferida em desconformidade com tais parâmetros.

Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, conheço do presente recurso extraordinário, para dar-lhe provimento (CPC, art. 557, § 1º - A), em ordem a julgar procedente, em parte, a “ação ordinária anulatóriaajuizada por Paulo Roberto Gomes Mansur, observados, para tanto, os estritos limites que a própria parte ora recorrente delineou em seu pedido (fls. 1.845), invertidos os ônus da sucumbência.

Publique-se.

Brasília, 08 de junho de 2012.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator

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