Carlos Chagas
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Marcado para hoje o encontro do secretário-geral da presidência da República, Gilberto Carvalho, com os representantes das centrais sindicais, a impressão é de que encenarão uma farsa. Enxugarão gelo ou irão ensacar fumaça. Porque qualquer que seja o resultado, pela aceitação ou não do salário-mínimo em 545, 550 ou até 560 reais, sindicalistas e governo estarão penalizando o trabalhador. Fazendo o jogo das elites sob o rótulo da proposta de reduzir os desníveis sociais.
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Não dá para aceitar a campanha desenvolvida pelo andar de cima, de que cada real de aumento do salário-mínimo determinará um rombo de 286,4 milhões nas contas públicas. Ou de que mesmo fixado em 545 reais, o impacto será de 1 bilhão e 400 milhões.�
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Começa que não é rombo nem impacto. Trata-se de investimento naquilo que o governo do país deveria ter como mais sagrado, no caso, fazer justiça ao trabalhador. Aliás, que não será feita através de nenhum dos números anunciados. Porque, pela Constituição, o salário-mínimo deveria bastar para o trabalhador e sua família enfrentarem despesas com habitação, alimentação, vestuário, transportes, educação, saúde e até lazer. Não será com 545, 550, 580 reais e nem com mil. Nenhum líder sindical, muito menos nenhum ministro, alto funcionário ou dirigente de empresas estatal sobreviveria com essa merreca.
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A meta anunciada pelo popularíssimo Lula era de elevar o salário-mínimo a 100 dólares. Uma piada, acrescida do fato de que o dólar despencou de valor. Pior ficou a tramóia de atrelar-se o reajuste do salário mínimo ao crescimento do Produto Interno Bruto no ano anterior. Quer dizer, se diminuem os lucros do empresariado e dos banqueiros, quem paga é o trabalhador.
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Está o país há mais de oito anos governado pelo Partido dos Trabalhadores. Que partido é esse que não cuida de seus supostos integrantes? Nem se fala de CUT, Força Sindical e penduricalhos. Retoricamente, podem rotular de nefasta a oferta do governo, de compensar o baixo nível do salário mínimo com mínimo refrigério nas declarações do imposto de renda, cujos beneficiários serão os melhor favorecidos. Nefastos são os que estarão sentados à mesa das negociações, hoje. �
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USINA PRESIDENTE MÉDICI
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Dilma Rousseff estará inaugurando, amanhã, a usina hidrelétrica de Candiota III, no Rio Grande do Sul, denominada de “presidente Médici”. Uma prova de que o Brasil alcançou a maioridade, de que ficaram para trás velhos ódios e justos ressentimentos? Ou apenas mais uma ironia da História? Pelo menos estamos distantes do Antigo Egito, onde um faraó que galgava o poder mandava raspar dos monumentos os caracteres expressivos do nome do antecessor, substituindo-os pelos seus, como se tivesse sido ele o construtor de tudo.
Aqui, ainda mantém suas denominações a “rodovia Castello Branco”, a “ponte Costa e Silva” e agora a “usina presidente Médici”. Pior para a memória deles se algum usuário decidir pesquisar seus débitos para com a democracia. O que não dá, apesar da tentação, é ver alguns aloprados querendo mudar o nome das obras públicas de acordo com as características do regime vigente. Até porque, o mundo gira…
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O NOVO CONGRESSO�
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Os trabalhos do Congresso serão reabertos na próxima terça-feira. Em se tratando de uma nova Legislatura, com direito a tiros de canhão e revista às tropas pelo senador José Sarney. Tanto na Câmara quanto no Senado, caras novas em meio à maioria de velhas figuras. Indaga-se sobre a possibilidade de tudo ser diferente, a partir de agora. A resposta é negativa, ainda que não se torne necessário concordar com o amargo diagnóstico de Ulysses Guimarães, para quem “pior do que o atual Congresso, só o próximo”.
Velhos jornalistas adquirem o costume saudosista de dizer que “no tempo deles é que era bom, havia parlamentares como Afonso Arinos, Milton Campos, Gustavo Capanema, Aliomar Baleeiro e tantos outros luminares”. É bom sacudir a poeira da intolerância e imaginar que daqui a cinquenta anos os jovens repórteres de hoje estarão lembrando que Congresso bom era nos tempos em que eles começaram, com Geddel Vieira Lima, Mão Santa, Eduardo Suplicy e muitos mais…
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O novo Congresso será como todos os anteriores: o retrato da nação. Nem melhor nem pior do que ela.�
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CIDADE ARRASADA
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De todos os governadores eleitos ou reeleitos em outubro passado, quem maiores agruras enfrenta é o do Distrito Federal, Agnelo Queiroz. Encontrou uma cidade arrasada, onde tudo são problemas. Além do tesouro vazio, os serviços públicos postos em frangalhos. Hospitais desmoronando, postos de saúde sem médicos e enfermeiros, filas intermináveis às suas portas. Um sistema de ensino público obsoleto e insuficiente para a demanda. O trânsito caótico, até a mais moderna ponte da cidade interditada e limitada por rachaduras em seus pilares.
A segurança pública à mercê do crime desorganizado, o tóxico grassando em progressão geométrica e um Judiciário lento e incapaz de atender as mínimas necessidades da população. São cobranças de todo lado, sem falar no êxodo que continua fazendo fluir para cá, à procura de empregos inexistentes, multidões oriundas do Centro-Oeste, do Norte e do Nordeste.
Fonte: Tribuna da Imprensa