Carlos Chagas
Tivessem um pouquinho de coragem e os quatro principais candidatos presidenciais teriam feito reunir seus representantes, ontem, para dar um basta à humilhação a que se submetem nos debates promovidos pelas redes de televisão. Um grito de independência para prevenir novos vexames marcados para seus próximos encontros.
Não dá para assistir outra vez, sem protestar, esse engessamento absurdo dos candidatos às tais “regras dos debates”. É verdade que quando a campanha começou concordaram todos com a submissão aos limites de tempo para suas respostas e, mais ainda, com a momentânea ditadura dos mediadores, responsável pela grosseria dos cortes de áudio e vídeo daqueles que se encontram terminando seus raciocínios e são interrompidos por conta da truculência das normas antes acordadas. Para o bom andamento dos debates, seria necessário aplicar o verbo “flexibilizar”, tão a gosto dos neoliberais. Se um candidato encontra-se em meio ou no final de uma exposição, mandariam o bom senso e a educação que pudesse terminá-la. Depois, é claro, a extensão de tempo seria oferecida aos demais, a título de compensação.
O que fica ridículo é assistir possíveis futuros presidentes da República no papel de meninos de curso primário submetidos à palmatória do mestre-escola. Alguns mediadores, diga-se, até constrangidos pela obrigação de cortar quem tem a palavra, como ainda domingo na Rede-TV. Outros, nem tanto, porque prevalecem, em maioria, os arrogantes, aqueles que andam atrás de alguns minutos de glória indevida, abusando do rótulo tornado pejorativo quando chamam os convidados de “CANDIDAAAATO”.
Como todos os postulantes ao palácio do Planalto submetem-se às determinações das redes, ávidas de faturar o prestígio alheio, fica difícil que nos próximos debates venham a impor a lógica de suas prerrogativas. Continuarão sendo cortados ou, pior ainda, levados a reduzir respostas pela metade, sempre de olho nos implacáveis reloginhos que prejudicam e até distorcem suas mensagens.
Guardadas as proporções, os debates transformaram-se num programa de calouros onde não faltam, sequer, os intervalos faturados a peso de ouro, onde os candidatos transformam-se em propagandistas de sabonetes, supermercados ou veículos a preço de ocasião. Será um dos exageros do modelo econômico que nos assola e diante do qual todos baixam a cabeça?
Mais um engodo
Ontem, mais uma vez, a enganação. O presidente Lula embarcou cedo para Santa Catarina, visitando obras e comparecendo a eventos em diversas cidades. À noite, terminou o périplo em Joinville, onde sua agenda referia-se a “compromisso privado”. Por coincidência, na mesma praça onde Dilma Rousseff realizava mais um de seus comícios. Coincidência não foi, muito pelo contrário. Por que, então, não ser anunciada a presença do primeiro-companheiro no palanque de sua pupila? “Compromisso privado” uma ova: participação clara, aberta e até constitucional de um cidadão, presidente da República ou não, no processo eleitoral de seus país. Só não se justifica a enganação…
Oportunidade perdida
Pelo jeito, a recente reforma no palácio do Planalto revolucionou as bases da arquitetura universal. O quarto andar, onde funciona a Casa Civil, está completamente isolado do terceiro, gabinete do presidente da República. Não há escadas, muito menos elevadores, interligando os dois pisos. Sequer telefones ou, mesmo, moleques de recado capazes de levar mensagens de um patamar para outro. O quarto andar constitui-se numa galáxia à parte, sem comunicação com o terceiro.
Nem o presidente Lula nem Erenice Guerra trocaram uma palavra a respeito das denúncias sobre tráfico de influência que atingiram a chefe da Casa Civil e seu filho. Mentirosas ou verdadeiras, as acusações parecem não ter existido, na sede do Executivo. Fica tudo como está, sob o pretexto de que quanto mais mexer, mais o episódio fede.
É claro que seria desgastante para o governo, o presidente e até sua candidata a dispensa da ministra encarregada da coordenação administrativa. Só que sua permanência fica pior, sem uma simples recomendação para que vá comprovar sua inocência desvinculada de laços com o poder. Vale repetir o que escrevemos ontem: que saudades do Itamar…
Ainda espera
Engana-se quem supõe José Serra entregando os pontos. Como Ulysses Guimarães em 1989, o candidato ainda espera que os votos venham a jorrar em cascata. O velho patriarca da democracia aguardou até o fim a virada do jogo, parecendo-lhe inconcebível que o eleitorado desconhecesse seu papel na queda da ditadura. Abateu-se ao verificar que ficou atrás do Dr. Enéas, não encontrando explicação para a vitória de Fernando Collor.
Serra adota o mesmo raciocínio. Imagina que até o dia 3 mudanças profundas acontecerão. Joga seus cacifes na realização do segundo turno, quando tudo poderia ser diferente. O diabo é que não se anima a mudar o eixo da campanha, trocando as veementes críticas ao governo Lula e à adversária por propostas concretas e efetivas de realizações para o futuro.
Fonte: Tribuna da Imprensa