Carlos Chagas
O presidente Lula não resiste: bate na imprensa até quando não precisa. Esta semana, em praça pública, declarou que o povo aprendeu a votar sem seguir pseudo-formadores de opinião pública. Acrescentou que o noticiário tenta debilitar a campanha de Dilma Rousseff, mas o trabalhador pensa por si mesmo e por isso o país está melhorando.
Com todo o respeito, mas o primeiro-companheiro deveria atentar que nem todo mundo, na mídia, julga-se “formador” de opinião. Esquece-se da escola da humildade, segundo a qual somos “informadores”. Quem se forma é a sociedade, estimulada por diversos fatores, entre eles o de estar bem informada. E se não está, deveria.
Claro que existem jornalistas de nariz em pé, proclamando-se “formadores”, mas eles estão mais para o ridículo do que para a realidade. Também não é verdade que o noticiário tenta debilitar a campanha de sua candidata. Alguns veículos cultivam essa distorção, mas generalizar consiste num profundo exagero. Ninguém pode investir impunemente contra a natureza das coisas, e ela indica sempre a impossibilidade de se enganar todos por todo o tempo. Se Dilma conta com o apoio da maioria, seu patrono não precisaria incomodar-se com tentativas de sua desestabilização. Deveria preocupar-se com o uso da Receita Federal por parte dos aloprados de sempre, estes, sim, empenhados em desestabilizar a ex-ministra.
Nos últimos dias parece que se abriram as comportas do absurdo, nos pronunciamentos do presidente Lula. Ele também afirmou, inaugurando um armazém da Conab, em Uberlândia, que os Estados Unidos e a União Européia aprenderam a respeitar o Brasil assim como um elefante tem medo “e se borra” por causa de um rato. Ora bolas, não somos ratos e, se fossemos, não estaríamos imunes aos montes de matéria orgânica expelidos pelos elefantes, até sobre nossas cabeças.
Mais uma escorregada de S. Exa. aconteceu quando calou diante de um disparate institucional de seu ministro da Agricultura. Talvez pretendendo credenciar-se para continuar no próximo governo, o indigitado auxiliar derramou-se em referências ao terceiro mandato do Lula. Disse que se o presidente quisesse, continuaria no poder com o apoio do país inteiro. Era para ter levado monumental reprimenda, de público e de corpo presente. Afinal, uma das virtudes do Lula foi ter respeitado e cumprido a Constituição, que proíbe o terceiro mandato. Quanto a sustentar que o país inteiro apoiaria o golpe, há controvérsias.
Agenda torta
Há dias que se registra uma aberração fluindo da agenda presidencial. Ainda quarta-feira, como na véspera, o palácio do Planalto divulgou os compromissos diários de seu inquilino. Audiências variadas, comparecimento a eventos, deslocamentos aéreos e sucedâneos. Não dá para entender, porém, porque se informa, por exemplo, a partida para Ribeirão Preto às 17.30 horas, a chegada àquela cidade às 18.30 e, às 19 horas, “compromisso privado”, enfemismo para o comparecimento do Lula a um comício com a presença de Dilma Rousseff. São essa pequenas coisas que perturbam o bom-senso. Se o presidente tem o direito, como cidadão, de freqüentar comícios, por que esconder aquilo que todo mundo assiste pela televisão?
Com medo de quem?
Em segredo, sem avisar ninguém, desembarcou em São Paulo, ontem, nada menos do que George W. Bush, dos Estados Unidos. Veio para faturar mais algum, no caso, fazer palestra para um grupo de seguradores e banqueiros. Teve direito a não enfrentar a aduana, não ter sua bagagem revistada e a seguir da pista do aeroporto para um hotel nos Jardins, precedido por batedores e cercado por seguranças do FBI, da Polícia Militar paulista e da Polícia Federal.
Muita gente pergunta qual foi o cachê, parece que mais de cem mil dólares, mas tão importante quanto será saber o tema do pronunciamento do ex-presidente americano. E por que o sigilo, como se estivesse desembarcando no Iraque ou na Palestina. Bem que poderia ter dado um passeio nas ruas Vinte e Cinco de Março, em São Paulo, ou da Alfândega, no Rio, para ver como por aqui convivem em harmonia árabes e judeus.
Memória curta
Dedicam-se tucanos e penduricalhos a criticar Dilma Rousseff por não haver comparecido a mais um debate promovido pelas Organizações Globo, quando José Serra e Marina Silva lá estiveram. A memória dos políticos é curta. Bastaria contar quantas vezes Fernando Henrique Cardoso faltou a convites iguais, em 1994 e 1998. Não quis desgastar-se, respondendo a concorrentes, a jornalistas e ao público. Teve seus motivos, porque se encontrava liderando as pesquisas, a um passo da vitória, certamente as mesmas razões de Dilma, esta semana. Mas será bom lembrar a quantos debates ela já foi e, salvo engano, ainda deverá ir.
Fonte: Tribuna da Imprensa