Camila Mattoso e Bruno Boghossian
Folha
Um relatório produzido pelo setor de Inteligência da Secretaria de Segurança do Distrito Federal dois dias antes do ataque às sedes dos três Poderes, em Brasília, alertou autoridades locais para a possível invasão de órgãos públicos e “a intenção de prática de atos de violência” no domingo (8).
A Folha teve acesso ao documento, enviado na sexta-feira (6) ao substituto do então secretário de Segurança do DF, Anderson Torres, e ao órgão responsável por planejar atividades operacionais da área.
OMISSÃO COMPROVADA – Apesar do aviso, a Polícia Militar não enviou agentes em número suficiente para conter a ação criminosa e permitiu a entrada de manifestantes golpistas na Esplanada dos Ministérios.
O relatório de Inteligência aponta que autoridades de segurança do Distrito Federal tinham conhecimento da organização dos atos, das motivações e dos planos dos manifestantes dias antes do ataque – incluindo a possibilidade de depredação.
A partir do monitoramento de grupos em aplicativos de mensagens, o documento cita a realização de atos em Brasília dos dias 6 a 8 de janeiro, “com vinda de caravanas de outros estados, em oposição ao atual governo federal”.
SITUAÇÃO “ALARMANTE” – O relatório classifica a convocação dos protestos como alarmante e reproduz imagens distribuídas nas redes que descrevem as manifestações como a “tomada de poder”. O risco de atos de violência também é assinalado no texto pela possível participação de CACs (Caçadores, Atiradores e Colecionadores) e publicações que falavam em “sitiar Brasília”.
“As divulgações apresentam-se de forma alarmante, dada a afirmação de que a ‘tomada de poder’ ocorreria, principalmente, com a invasão ao Congresso Nacional”, afirma o relatório da divisão de inteligência.
Em seguida, o documento destaca que os manifestantes propunham não só a invasão do Congresso, mas a ocupação de “órgãos públicos que representam os três Poderes”, o que indica que autoridades sabiam da ameaça também ao Palácio do Planalto e à sede do STF (Supremo Tribunal Federal).
CULPA DO SECRETÁRIO – O documento foi elaborado com o objetivo de “assessorar o planejamento integrado de segurança pública” e a “tomada de decisão” diante dos atos.
Em depoimento à Polícia Federal nesta sexta (13), o governador afastado Ibaneis Rocha (MDB) afirmou que apenas o secretário de Segurança tinha acesso aos dados de inteligência sobre a manifestação. Ele disse ainda que recebeu informações da pasta de que os atos seriam pacíficos.
O então secretário Anderson Torres, que havia sido ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro (PL), viajou para os EUA no sábado (7) –um dia depois do envio do relatório e um dia antes do ataque.
“DE FORMA PACÍFICA” – No domingo, o secretário-executivo da pasta, Fernando de Sousa Oliveira, que exercia o cargo na ausência de Torres, disse ao governador que a situação era tranquila e que havia negociado com os manifestantes para que eles descessem em direção à praça dos Três Poderes “de forma pacífica”.
“Nossa inteligência está monitorando e não há nenhum informe de questão de agressividade, ligada a esse tipo de comportamento”, declarou Oliveira.
A Folha entrou em contato com Fernando de Sousa Oliveira e com o advogado de Torres. Nenhum dos dois se manifestou até a publicação desta reportagem.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – A culpa do secretário interino, delegado Fernando de Sousa Oliveira, está mais do que configurada. Resta saber se ele é apenas idiota ou agiu dolosamente. Quanto a Anderson Torres, consta que ele teria viajado na própria sexta-feira e não no sábado, como está registrado nesta matéria. De toda forma, deveria ter sido informado pelo interino, ao menos por telefone, e deveria ter dado instruções a ele. Se o interino Oliveira não avisou Torres, para tirar uma onda de autossuficiente, vai segurar um rojão de todo tamanho. São fatos que ainda falta apurar. (C.N.)