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sábado, julho 09, 2022

O legado do ex-premiê japonês Shinzo Abe




Abe pouco antes do atentado em Nara

Ele esteve mais tempo à frente do governo japonês que qualquer outro. Em 2020, renunciou ao cargo sem conseguir aprovar uma reforma constitucional pela qual lutou toda a sua vida. Abe morreu em um atentado aos 67 anos.

Por Martin Fritz

Shinzo Abe dividia a opinião pública em seu país. Para seus críticos, ele representava um Japão chauvinista e retrógrado, que minimizou as atrocidades cometidas pelo país na Ásia durante a Segunda Guerra Mundial.

Em um discurso em 2015, quando o Japão completou 70 anos de sua derrota na Segunda Guerra, Abe expressou "profundo pesar" pelas vítimas do conflito, mas não chegou a se desculpar.

Sua promessa de construir um "Japão forte e próspero" lembrava o lema imperialista de "nação rica, exército forte" do período Meiji na segunda metade do século 19. Ele queria revisar a Constituição pacifista, que acreditava ter sido imposta pelos Estados Unidos ao Japão em 1946, em favor de um Estado mais forte. No entanto, nunca foi capaz de realizar seu sonho de reforma.

Já seus partidários o viam como um reformador pragmático que fortaleceu a economia do Japão e a parceria com os EUA "para que o Japão nunca fosse relegado a uma nação de segunda classe", como ele disse certa vez. Abe relaxou a política monetária, promoveu altos gastos do governo e fechou importantes acordos comerciais com a União Europeia e os países do Pacífico.

Durante seu mandato, o Japão se abriu como nunca antes para trabalhadores estrangeiros, investidores e turistas. Ele evitou reformas estruturais dolorosas, mas seu governo provou que uma economia altamente desenvolvida pode crescer, apesar da diminuição da população.

Luta contra as ambições hegemônicas da China

É provável que um importante legado de Abe tenha sido aproximar o Japão da Ásia. Com sua visão de um "Indo-Pacífico livre e aberto", o político aumentou a conscientização em toda a Ásia sobre as ambições da China por hegemonia e fortaleceu as relações econômicas entre o Japão e os países da região por meio de uma política ofensiva de investimentos.

"A Índia e o Sudeste Asiático perceberam um Japão mais assertivo como uma influência regional proativa e estabilizadora", disse Yoichi Funabashi, presidente do think tank Asia Pacific Institute, quando Abe renunciou em 2020. A luta pelo poder entre a China e os EUA, que escalou significativamente durante seu mandato, forçou Abe a caminhar na corda bamba entre as duas superpotências. Por meio de uma interpretação ampliada da Constituição japonesa, ele conseguiu ao mesmo tempo expandir a aliança de segurança com os EUA e proteger o comércio com a China, o parceiro econômico mais importante.

Do ponto de vista dos historiadores contemporâneos, Abe foi o primeiro premiê a representar o novo consenso da elite japonesa para garantir o peso político global de seu país no longo prazo. Esse consenso foi formado depois que o Japão foi substituído pela China como a segunda maior economia do mundo no curso da crise financeira.

A realização dos Jogos Olímpicos de Tóquio, adiados para 2021 devido à pandemia, também pode ser interpretada como um projeto de fortalecimento nacional. Com sua garantia de que a usina nuclear de Fukushima estava sob controle, Abe ajudou pessoalmente a trazer as Olimpíadas para o Japão.

Mas muitos projetos de política externa não se concretizaram, sobretudo o esperado acordo de paz com a Rússia, com Tóquio e Moscou ainda em desacordo sobre o destino das quatro disputadas Ilhas Curilas, e o esclarecimento do destino dos japoneses sequestrados na Coreia do Norte.

Abe deve a duração recorde de seu governo a dois fatores: por um lado, a economia japonesa experimentou vários anos de prosperidade, por outro, a oposição sempre permaneceu fraca.

Descendente de uma dinastia política

O período de 2009 a 2012, no qual pela primeira vez desde 1955 um partido que não o liberal-democrata esteve no poder por um longo tempo, foi caótico devido à inexperiência de seus políticos e ao desastre nuclear e tsunami de 2011. Depois disso, os eleitores não ousaram mais experimentar e permaneceram leais a Abe. Nem mesmo vários escândalos de corrupção mudaram isso.

"A criação de estabilidade política pode ser destacada como seu principal sucesso", disse o especialista alemão em Japão Sebastian Maslow. Segundo ele, após anos de lutas internas pelo poder e muitos escândalos financeiros, Abe reabilitou os liberal-democratas e os tornou capazes de governar novamente.

Abe não se destacou nem como orador nem como intelectual. O que o levou ao topo da política foi sua descendência de uma família rica, com raízes profundas na política japonesa. Seu tio-avô Eisaku Sato foi primeiro-ministro, assim como seu avô Nobusuke Kishi, e seu pai, Shintaro, foi ministro das Relações Exteriores.

"O elemento definidor de sua carreira foi o revisionismo histórico", comentou o historiador alemão Sven Saaler, da Universidade Sophia de Tóquio. Como exemplos disso, o historiador cita as representações eufemísticas do passado da guerra japonesa na maioria dos livros escolares e a reintrodução da educação moral.

Shinzo Abe morreu aos 67 anos de idade em 8 de julho de 2022, após ser baleado em um evento de campanha eleitoral.

Deutsche Welle

Guerra na Ucrânia mal começou, afirma Putin




Presidente russo zomba de esforços do Ocidente para ajudar a Ucrânia e punir Moscou, acusando supostos "iniciadores da guerra-relâmpago econômica" de atiçarem hostilidades a fim de isolar e enfraquecer a Rússia.

O presidente russo, Vladimir Putin, pronunciou nesta quinta-feira (07/07) uma de suas advertências mais ameaçadoras em relação à guerra na Ucrânia. Numa reunião com líderes parlamentares em Moscou, ele afirmou que a campanha militar no país vizinho mal começou.

"Todo mundo deve estar ciente que, de um modo geral, ainda não começamos nada a sério. Ao mesmo tempo, não rejeitamos conversações de paz. Mas aqueles que as rejeitam devem saber que, quanto mais longe [a guerra] for, mais difícil será eles negociarem conosco."

O chefe do Kremlin acusou os aliados ocidentais de atiçarem hostilidades. "Ouvimos muitas vezes que o Ocidente quer lutar conosco até o último ucraniano. Isso é uma tragédia para o povo ucraniano,  mas parece que tudo está caminhando nessa direção", afirmou. "Hoje escutamos que eles querem nos derrotar no campo de batalha. O que dizer? Eles que tentem."

Outro alvo das invectivas de Putin foi o "liberalismo totalitário" que o Ocidente estaria procurando impor a todo o mundo – assim como tentando usar o conflito para isolar e enfraquecer a Rússia: "Eles simplesmente não precisam de um país como a Rússia. Por isso, têm usado terrorismo, separatismo e as forças destrutivas internas em nosso país."

Segundo o ex-agente da KGB, as sanções ocidentais contra Moscou não atingiram sua meta, "semeando divisão e conflito na nossa sociedade e desmoralizando o nosso povo".

As medidas punitivas estariam, de fato, criando dificuldades, admitiu Putin, "mas não tudo aquilo com que contavam os iniciadores da guerra-relâmpago econômica contra a Rússia". "O curso da história é inevitável, e as tentativas do Ocidente coletivo de impor sua versão da ordem global estão condenadas ao fracasso."

Avanço russo mais lento do que previsto

O negociador-chefe ucraniano, Mykhailo Podolyak, reagiu no Twitter à alegação de Putin de uma conspiração do Ocidente contra a Rússia: "Não há um plano do 'Ocidente coletivo'. Só há um exército Z específico que invadiu a Ucrânia, bombardeando cidades e matando civis. Tudo mais é propaganda primitiva."

O líder parlamentar Serguei Mironov, do partido Uma Rússia Justa, sugeriu que se estabeleça uma agência especial para agilizar a integração à Rússia dos territórios ucranianos ocupados – uma ideia que Putin prometeu considerar.

Desde que iniciaram a invasão, em 24 de fevereiro, as forças russas capturaram amplas áreas do país vizinho. Contudo seu progresso nestes mais de quatro meses tem sido mais lento do que prediziam diversos analistas.

Depois do fracasso em tomar a capital Kiev e outras grandes cidades no nordeste ucranianos, os invasores desviaram seu foco para o centro industrial da região do Donbass, no leste, disputada por separatistas pró-Rússia desde 2014 – ano em que foi anexada a península da Crimeia.

No início deste mês , as Forças Armadas russas anunciaram ter assumido o controle de Lugansk, uma das duas províncias que formam o Donbass, e que agora estariam preparando uma ofensiva contra a vizinha Donetsk.

Deutsche Welle

O complicado histórico de crimes de guerra relacionado à morte de Abe




O ex-primeiro-ministro assassinado era ligado ao 'negacionismo dos crimes de guerra', segundo os inimigos mais radicais de sua posição, chamada militarista. 

Por Vilma Gryzinski

“As comemorações vão começar”. A mensagem na rede social chinesa mais frequentada, com 150 mil curtidas em uma hora, resumiu sentimentos profundamente entranhados nos países asiáticos onde o Japão imperialista cometeu crimes inomináveis desde o começo do século XX até ser derrotado pelos Estados Unidos em 1945.

Oficialmente, a China não quer que o assassinato de Shinzo Abe seja “comemorado” como uma revanche por esses crimes – às vezes, a fúria contra o Japão explode mesmo sem incentivos vindos de cima.

Em muitos países asiáticos, onde o Japão matou um número calculado entre três e catorze milhões de civis, o passado não passou e permanecem em carne viva ressentimentos contra políticos como Abe, associado à ala militarista do Partido Liberal Democrata.

Abe deixou o governo em setembro de 2020, debilitado por uma forma incapacitante de síndrome de intestino irritável, mas até depois de largar o poder continuou o ato que é associado à falta de arrependimento pelos crimes cometidos em nome do imperador: a visita ao templo de Yasukuni. Nele estão registrados os nomes de quase 2,5 milhões de pessoas, além de alguns animais de estimação, que morreram a serviço do país.

Entre elas, 1 068 criminosos de guerra, incluindo Hideki Tojo, ministro da Guerra e primeiro-ministro entre 1940 e 1944. Portanto, o principal responsável pelos atos genocidas cometidos na China e na Coreia, para ficar nas piores atrocidades, incluindo não apenas o extermínio da população civil nos territórios chineses anexados e o bárbaro abuso de pelo menos 200 mil coreanas como escravas sexuais em bordéis montados para os soldados japoneses.

Ao saber que os ocupantes americanos haviam dado a ordem para sua prisão, Tojo tentou se suicidar, atirando na marca feita por um médico com carvão em seu peito, para acertar no coração. Errou – uma vergonha pelos padrões japoneses. Acabou no grupo dos seis piores criminosos de guerra enforcados depois de um julgamento em que o promotor americano Joseph Keenan pretendeu despojá-los do “glamour de heróis nacionais e expô-los pelo que foram: assassinos comuns”.

Foi enterrado em Yasukuni.

Daí porque as visitas de políticos japoneses são sempre vistas como uma tentativa indireta de homenagear homens como Hideki Tojo, algo que seria impensável na Alemanha, profundamente desnazificada, tanto pela brutalidade dos ocupantes soviéticos quanto pelo pragmatismo de resultados dos americanos.

No Japão, o processo foi diferente. O prodigioso general Douglas MacArthur não deixou dúvidas aos japoneses de fraque e cartola que tentaram amenizar as condições da rendição com uma frase histórica: “As questões envolvendo diferentes ideais e ideologias foram resolvidas nos campos de batalha do mundo e, portanto, não estão abertas a discussão ou debate”.

Mas também fez concessões quase inimagináveis. A principal delas: permitir a permanência do imperador Hiroíto, em nome de quem todos os atores dos eventos japoneses haviam feito o que fizeram.

O Japão já estava brutalmente vencido, antes mesmo das duas bombas atômicas que selaram a rendição, prevenindo, a um preço terrível, que a resistência autodestrutiva continuasse, a um custo calculado em dez milhões de baixas entre os japoneses e 1,7 milhão entre os americanos.

Manter o imperador garantiu uma transição rápida para o programa de MacArthur: desmilitarizar o Japão, implantar um regime democrático e promover a reconstrução nacional.

Em dez dias, a equipe de especialistas em língua e cultura japonesa levada por MacArthur escreveu a constituição, sob o comando do tenente-coronel Charles Kades, um advogado do estado de Nova York. A jovem americana Beate Sirota, originalmente judia ucraniana, de apenas 22 anos, convocada pelo pleno domínio sobre a língua japonesa que aprendeu quando criança, morando no país, influenciou a cláusula estabelecendo a igualdade entre homens e mulheres, numa época em que elas andavam 1,80 metro atrás deles.

A nova constituição consagrou a desmilitarização do país a tal ponto que até hoje o Japão não tem forças armadas, mas forças de autodefesa, mesmo tendo se tornado um dos maiores aliados dos Estados Unidos e enfrente agora duas ameaças avassaladoras: a ascensão da China, com seu projeto de “engolir” o Pacífico inteiro, e a nuclearização da Coreia do Norte.

Não é apenas uma diferença semântica. Um dos objetivos Shinzo Abe quando foi primeiro-ministro era justamente mexer nos artigos constitucionais referentes ao pacifismo institucional, superado pelas novas realidades geopolíticas. Não conseguiu. A ala “militarista”, que utiliza como um de seus instrumentos a religião shintoísta e seu culto aos ancestrais – daí a importância redobrada do templo de Yasukani – vive em tensão permanente com os “pacifistas”.

Shinzo Abe foi um razoável primeiro-ministro para o Japão, um país sem recursos naturais que tem um PIB de cinco bilhões de dólares – a terceira maior economia do mundo, um lugar que ocupa quase silenciosamente, sem um peso político compatível com a posição material. Combateu a “doença japonesa”, o crescimento anêmico ou estagnado, e originou até um neologismo, a “abeconomia”, uma política combinando estímulos fiscais, reformas estruturais e uma certa liberalidade fiscal (nada, nem de longe parecido, com as farras tropicais).

Todo assassinato político tem um aspecto especialmente chocante pelo trauma que representa para a psique nacional – e mais ainda num país como o Japão, onde reinam a veneração pela autoridade e a posição hierárquica dos superiores.

Matar um “senpai” como um ex-primeiro-ministro é atentar contra a base de um sistema de valores construído ao longo de milênios de uma história complexa na qual o período militarista da primeira metade do século XX foi um capítulo especialmente brutal que ainda está sendo assimilado.

Revista Veja

Precisamos falar sobre o PCC




Inquéritos sigilosos mostram como a facção criminosa se aproximou de integrantes do PT e avançou perigosamente sobre a politica. É fundamental que o assunto seja debatido e esclarecido na campanha eleitoral. 

Por Claudio Dantas 

Há um mês, a Polícia Civil de São Paulo cumpriu mandado de busca e apreensão na casa de Senival Moura, líder do PT na Câmara de Vereadores de São Paulo. Ele seria preso na operação, mas a Justiça negou o pedido da polícia, que o investiga por lavagem de dinheiro para o Primeiro Comando da Capital (PCC) e envolvimento no assassinato do empresário Adauto Soares Jorge, presidente da cooperativa Transunião Transportes. A empresa, que teria controle compartilhado entre o vereador petista e a organização criminosa, possui contrato de 100 milhões de reais por ano com a Prefeitura de SP, para prestar serviços na Zona Leste da capital paulista. No inquérito, ao qual Crusoé teve acesso, o delegado Vagner Alves da Cunha relata que a investigação do assassinato enveredou pela política a partir da colaboração espontânea de uma fonte ligada à vítima. Segundo o depoente, identificado apenas como “Guilherme” e cuja identidade real é mantida em sigilo absoluto, Senival seria “figura central” do esquema do PCC no transporte público alternativo em SP. Suas campanhas eleitorais, desde 2002, teriam sido bancadas pelo crime organizado.

De acordo com o colaborador, apesar de ser figura conhecida entre perueiros e “diretamente responsável” por intermediar a legalização da atividade junto à gestão da prefeita Marta Suplicy (2001-2005), Senival precisou de volumosos recursos financeiros para entrar na política. “O crime organizado foi seu primeiro financiador, oportunidade em que dois criminosos alcunhados como ‘Cunta’, já falecido, e ‘Alexandre Gordo’, que está preso há muitos anos, encarregaram-se da tomada de recursos.” Em seu relatório, o delegado identifica “Cunta” como o assaltante Ricardo Pereira dos Santos, morto em 2012 durante uma tentativa cinematográfica de roubo à transportadora de valores Protege, em SP. “Alexandre Gordo” seria o sequestrador Alexandre Ferreira Viana, preso desde 2005. “Como contrapartida ao financiamento, (Senival) criou um modelo de lavagem de dinheiro que permitiu aos criminosos ocultar os valores obtidos a partir da prática de crimes nas cooperativas de transporte regulamentadas.”

O colaborador, que parece conhecer por dentro o esquema, disse à Polícia que os alvarás de funcionamento das vans e os veículos em si eram comprados com dinheiro em espécie, de origem criminosa, e cadastrados em nome de “laranjas”, que ocupavam funções de motoristas e cobradores. “O rendimento era encaminhado posteriormente para os familiares dos criminosos e serviam para custear o estilo de vida confortável (…) Senival sempre esteve à frente da cooperativa de peruas, instaladas há muitos anos no bairro do Itaim Paulista (…) as pessoas que o sucederam no comando da cooperativa e, depois, da empresa, foram seus laranjas (…) Adauto era, sim, mais um dos laranjas”, diz Guilherme. A execução do empresário Adauto Soares Jorge teria sido determinada pelo PCC após suspeita de desvios de recursos do esquema. “Descobriu-se que Adauto estava desviando dinheiro da empresa para subsidiar uma espécie de caixa dois para as eleições de 2020, oportunidade em que Senival Moura seria diretamente privilegiado, já que tais valores seriam empregados em sua campanha à reeleição.”

A Polícia Civil afirma ainda que o ‘tribunal do crime’ do PCC sentenciou Adauto e Senival à morte, mas o vereador conseguiu obter o perdão sob a promessa de encomendar o assassinato do empresário e abrir mão de sua participação na Transunião. Antes do assassinato, o grupo criminoso teria nomeado novos diretores para o comando da empresa, um deles chamado Leonel Moreira Martins, integrante do PCC envolvido no assalto ao Banco Central em Fortaleza, em 2005, e também na fuga de 87 criminosos do Carandiru, em 2003. Os investigadores cruzaram as informações fornecidas pelo colaborador com dados extraídos do celular do empresário morto. Imagens das câmeras do estacionamento onde Adauto foi executado apontaram a participação de seu motorista, que manteve contato telefônico com o vereador petista durante o crime, segundo registros de chamadas obtidos junto às operadoras.

O IRMÃO TAMBÉM

Questionado sobre a investigação, o gabinete do vereador optou por não se manifestar. Logo após a operação, Senival foi à tribuna da Câmara para se defender. Disse que se afastou da Transunião em fevereiro de 2020 e já não teria qualquer relação com a empresa, muito menos com o crime. “Operamos com a Transunião até o dia 4 de fevereiro de 2020. No dia 5 teria uma assembleia da empresa, e eu e o Adauto Soares Jorge fomos recomendados a não participar. Quando recebi isso, achei melhor ir embora. Nós criamos essa empresa, mas me desliguei. Há muito comentário, conversa fiada e nada de apresentar os fatos reais.” À exceção de uma nota lacônica em que afirma confiar na inocência de Senival, o PT também tem mantido silêncio sobre o caso. O vereador não foi destituído da liderança do partido na Câmara e nenhum processo disciplinar foi aberto para avaliar sua conduta, apesar do histórico relacionado ao PCC. Em 2014, por exemplo, ele entrou na investigação que fisgou seu irmão, o ex-deputado estadual Luiz Moura, flagrado por policiais do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) durante reunião na sede de uma outra cooperativa, a Transcooper, também supostamente associada à facção criminosa. Na ocasião, os investigadores apuravam a onda de ataques incendiários a ônibus em São Paulo. No local do encontro, havia 18 membros regulares da facção criminosa e outros 26 com alguma passagem pela polícia. Moura só não foi levado para a delegacia porque se apresentou como parlamentar.

Os dois irmãos eram até então tratados com absoluta deferência pela cúpula do PT, o que se atribuía externamente à influência junto aos perueiros. O primeiro grão-petista a se dar conta do poder de fogo eleitoral da dupla foi Arlindo Chinaglia, que se beneficiou de votações expressivas nos currais eleitorais dos Moura. O segundo foi Jilmar Tatto, que chegou à Câmara dos Deputados com apoio da turma do transporte alternativo e virou secretário dos Transportes na gestão de Fernando Haddad (2013-2017). Quando a investigação sobre os ataques incendiários a ônibus veio à tona na pré-campanha de 2014, Tatto disse que sua relação com Luiz Moura era institucional. Mas, nas eleições de 2010, ele injetou 200 mil reais para eleger o líder dos perueiros. Não foi o único. Marta Suplicy pôs mais 30 mil reais. Também o ajudaram financeiramente Aloizio Mercadante, José Genoíno, João Paulo Cunha, Devanir Ribeiro, Cândido Vaccarezza, Carlos Zarattini e o próprio Chinaglia. Todos, naturalmente, alegaram desconhecer a ligação do parlamentar com o PCC, mas Luiz Moura, antes mesmo de se filiar ao PT, já ostentava uma ficha criminal com condenação de 12 anos de cadeia por assalto a mão armada — pena que acabou perdoada em 2005.

RISCO DE CPI

Três semanas antes da operação contra Senival, em 9 de junho, Jilmar Tatto foi removido da coordenação da campanha de Lula, sob a justificativa de que passaria a se dedicar à eleição de Haddad ao governo estadual. Nos bastidores, o PT tenta evitar a instalação, na Câmara de Vereadores de São Paulo, de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o transporte alternativo de passageiros. Outra frente, apoiada pelo bolsonarismo, tenta abrir uma investigação na Câmara dos Deputados, em Brasília. Na segunda-feira, dia 4, o tucano Carlos Sampaio protocolou requerimento para instalação de uma CPI para apurar denúncias feitas à PF pelo ex-publicitário Marcos Valério, pivô do mensalão, reveladas pela revista Veja na semana passada. Sampaio disse que começaria a recolher assinaturas dos líderes explicando a “gravidade da situação”. Ele se refere à delação de Marcos Valério, firmada há 5 anos com a Polícia Federal no âmbito da Lava Jato. Nos vídeos dos depoimentos, só agora conhecidos, Valério diz que Celso Daniel, prefeito de Santo André assassinado em 2002, havia produzido um dossiê detalhando quem estava sendo financiado de forma ilegal pelo crime organizado. “Ninguém achou esse dossiê mais”, afirmou o ex-publicitário. Além de condenado no mensalão a quase 40 anos de prisão, Valério foi alcançado em 2017 na investigação sobre o empréstimo ilegal de 12 milhões de reais obtido pelo pecuarista José Carlos Bumlai junto ao Banco Schahin, para atender ao PT. Metade do valor foi repassado ao empresário dos transportes Ronan Maria Pinto, que, segundo Valério, teria chantageado Lula para não contar detalhes de um esquema de arrecadação ilegal de recursos para financiar petistas, por meio de empresas de ônibus, lixo, transporte pirata e bingos.

As investigações da Lava Jato se limitaram ao crime de lavagem de dinheiro, pelo qual Ronan acabou condenado a cinco anos de prisão. Os autos do inquérito da Operação Carbono 14 (27.ª fase da Lava Jato), porém, são fartos de indícios que podem corroborar as declarações de Valério. O Antagonista revelou, ainda em 2015, que o Banco Schahin havia concedido 24 empréstimos irregulares, incluído o de Bumlai, num total superior a 300 milhões de reais. Entre os devedores, nunca cobrados, estavam justamente empresas de coleta de lixo e transporte público que já se beneficiaram de milionários contratos com gestões petistas em vários municípios paulistas, inclusive na capital, a partir da gestão de Marta Suplicy. Na lista, também havia empresas identificadas pela Receita como veículos para remessa de dólares ao exterior. Duas delas integrariam a rede da doleira Nelma Kodama, condenada no Petrolão e que foi presa em Portugal, em abril passado, na Operação Descobrimento, acusada de integrar esquema internacional de tráfico de drogas do PCC. Nelma é velha conhecida dos escândalos do PT, tendo sido citada na CPI dos Bingos e até nas investigações de corrupção na gestão Celso Daniel — na ocasião, ela mantinha uma casa de câmbio em Santo André. O Banco Schahin, antes de quebrar por causa daqueles empréstimos fraudulentos, foi vendido ao BMG, o mesmo que emprestou milhões ao PT via Marcos Valério, como revelaram as investigações do mensalão.

CONTADOR PREMIADO

Se as declarações do ex-publicitário à PF, que petistas chamam de requentadas, não forem suficientes para a abertura da CPI, o caso de Senival Moura tende a reavivar o debate. Mas o que a cúpula do PT teme mesmo é o avanço de outra investigação deflagrada recentemente contra João Muniz Leite, contador de Lula e também suspeito de lavar dinheiro para o Primeiro Comando da Capital. Uma semana após a operação contra Senival, o Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos (Denarc) pediu à Justiça o sequestro de bens de Muniz Leite e de sua mulher, que, segundo as investigações, ganharam 55 vezes em loterias federais somente em 2021. Em uma das vezes, ele dividiu um prêmio de 40 milhões de reais da Mega Sena com o traficante Anselmo Becheli Santa Fausta, o Cara Preta, de quem também era contador. Principal fornecedor de drogas do PCC, o traficante foi morto em dezembro passado, num caso rumoroso envolvendo a lavagem de até 2 bilhões de reais em criptomoedas. Os policiais desconfiam que o dinheiro da loteria foi usado por Cara Preta para comprar, além de imóveis e veículos de luxo, uma empresa de transporte paulista, a UPBus, em parceria com outros cinco integrantes do PCC e 18 de seus familiares.

A tese de que o contador Muniz Leite atuaria apenas como “laranja” do líder do PCC é reforçada por uma recente ação de cobrança contra ele, em cujas contas a Justiça paulista nada encontrou. Segundo o delegado Fernando Santiago, do Denarc, ele abriu, a mando de Cara Preta, várias empresas de fachada, usadas para ocultar a origem dos recursos ilícitos. Na operação contra Muniz Leite, Cara Preta e outros criminosos, foram apreendidos vários ônibus da UPBus, que, assim como a Transunião e a Transcooper, mantém contrato (600 milhões de reais) com a Prefeitura de São Paulo. As três empresas supostamente controladas pelo PCC (UPBus, Transunião e Transcooper/Pêssego Transportes) fazem parte do grupo de 14 cooperativas que tiveram seus contratos renovados pela Prefeitura em 2017, de forma emergencial. A contratação se deu por atraso no lançamento da nova licitação, desde que o edital elaborado na gestão Haddad/Tatto foi suspenso por decisão judicial, devido a uma série de impropriedades.

Curiosamente, o contador de Cara Preta também foi responsável por abrir empresas de Roberto Teixeira, compadre e advogado de Lula, e dos filhos do ex-presidente. Os mais recentes CNPJs de Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, e sua esposa Renata foram providenciados por ele, responsável também pelas declarações anuais de IR do petista há mais de 15 anos. Como profissional autônomo, Muniz Leite pode ter diversos clientes e estes não têm como saber de eventual envolvimento do contador com alguém do mundo do crime. Mas causa surpresa que Lula tenha mantido o profissional, mesmo após sua exposição na Lava Jato. Muniz Leite foi acusado pelo MPF no Paraná de forjar recibos de aluguel para justificar o uso, pelo ex-presidente, de um apartamento contíguo ao seu em São Bernardo do Campo, registrado em nome de Glaucos da Costa Marques, primo do mesmo Bumlai envolvido no repasse a Ronan Maria Pinto. O enredo fica ainda mais complexo quando se descobre que o contador também integrou o quadro societário de uma empresa de Cláudio Rocha Júnior, um dos integrantes da quadrilha de Nelma Kodama que foi preso em abril, em Portugal. De acordo com a Polícia Federal, Rocha Júnior integraria o primeiro escalão do esquema de tráfico internacional e lavagem de dinheiro comandado pelo PCC na América do Sul, na Europa, nos Estados Unidos e na Austrália. Ele seria um dos donos da carga de quase 600 kg de cocaína apreendida na fuselagem de um jato fretado em Cascais, Portugal. Outra coincidência é que uma segunda empresa de Rocha Júnior, citada na Lava Jato, teve como sócios o próprio Glaucos Costa Marques e o advogado Fábio Haruo Tsukamoto, sócio de Luís Cláudio Lula da Silva, outro filho de Lula.

Revista Crusoé

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