Certificado Lei geral de proteção de dados

Certificado Lei geral de proteção de dados
Certificado Lei geral de proteção de dados

quarta-feira, maio 16, 2007

Leia a íntegra da entrevista

BRASÍLIA - Eis a integra da entrevista coletiva concedida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ontem, conforme transcrição divulgada pela Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto
ABERTURA: PALAVRAS DO PRESIDENTE LULA - "Bom dia. Vocês estão lembrados que no final do ano passado eu disse que nós íamos melhorar a relação com a imprensa e, portanto, íamos estabelecer uma nova dinâmica nessa relação com a imprensa. Mas antes de abrir para as perguntas, eu gostaria de dizer para vocês que, de vez em quando, eu me pergunto sobre o papel de uma reeleição. O que um presidente da República deve fazer com o seu segundo mandato? Isso tem me levado a algumas reflexões sobre o período 2007/2010. Nós cumprimos uma primeira etapa que, eu acredito, foi uma etapa exitosa.
Eu disse que não vou falar mais de comparações do nosso governo com outros governos, agora eu preciso me comparar 2003/2006, 2007/2010. E eu penso que o resultado que nós obtivemos no primeiro mandato me permite dizer para vocês o seguinte: o Brasil de 2007 é um outro País. Hoje vocês não têm mais que perguntar a mim sobre estabilidade econômica, vocês não têm mais que perguntar a mim sobre credibilidade externa, sobre dívida externa, sobre reservas, sobre crescimento da economia, sobre estabilidade e vulnerabilidade, porque essas coisas estão praticamente resolvidas.
Quando eu digo que estão praticamente resolvidas é porque o Brasil se preparou no primeiro mandato para dar um salto de qualidade no segundo mandato. No segundo mandato nós precisamos fazer aquilo que não foi possível fazer no primeiro mandato, com um pouco mais de sabedoria, com um pouco mais de experiência, para que a gente colha resultados melhores e possa deixar para o sucessor um Brasil infinitamente mais equilibrado, mais desenvolvido, em melhores condições do que aquele Brasil que nós recebemos em 2003, e que outros receberam em outros períodos da história brasileira.
Eu tenho dito sempre que o Brasil teve dezenas de oportunidades na sua história, não foram poucas. Eu mesmo, na minha vida sindical, vivi momentos em que a gente acreditava que era daquela vez que o Brasil ia dar certo e, de repente, um mês, dois meses, três meses depois, nós acordávamos com o Brasil não dando certo, porque se fazia experiências acadêmicas na economia brasileira.
Nós resolvemos tomar a decisão de não fazer experiências acadêmicas, ou seja, nós resolvemos colocar em prática aquilo que uma dona de casa coloca em prática na sua casa: ela recebe o seu salário no final do mês, o salário do seu marido ou dos filhos, se senta à mesa, contabiliza o que tem que pagar, contabiliza o que tem que comprar e só gasta exatamente aquilo que for possível gastar, só come exatamente aquilo que for possível comer e, assim, as pessoas ajustadas conseguem sobreviver dignamente.
Nós fizemos isso e o resultado é que nós vivemos o melhor momento da economia de toda a história da República. São muitos os fatores favoráveis na economia brasileira, e nós entendemos que por isso só, nós poderemos fazer um segundo mandato pensando em outras coisas, como o PAC, por exemplo, que lançamos no dia 22 de janeiro, como o PDE que nós lançamos no mês seguinte e outros programas que nós vamos lançar.
Daqui para a frente nós vamos ter um programa especial para a juventude brasileira, vamos ter uma proposta para segurança pública, vamos ter uma proposta para a agricultura, vamos ter proposta para as indústrias que hoje sofrem problemas de exportação ou por conta do câmbio, dizem alguns, ou por conta da concorrência internacional com a China. Então, agora nós estamos preparados para fazer aquilo que não foi feito no primeiro mandato. E isso porque nós consolidamos, em primeiro lugar, a política econômica e, junto com a política econômica, nós consolidamos a nossa política internacional.
É sabido, mesmo por aqueles que não querem concordar ou que teimam em não concordar, que o Brasil nunca teve uma relação internacional tão privilegiada como a que nós temos hoje. Com a criação do G-20 em Cancun, nós consolidamos um Bloco, não apenas de países emergentes, representativos do ponto de vista da economia, mas também do ponto de vista da sua força política nos fóruns internacionais, e também da grande quantidade de populações que representam esses países, como China, Índia, Brasil e África do Sul, o que nos permite ter uma inserção no G-8 e nos permite ter uma inserção na OMC, coisa que nós não tínhamos há um tempo.
Hoje, eu acho que não haverá nenhuma discussão sobre acordos internacionais, envolvendo tanto a reforma de organismos multilaterais como a questão da Rodada de Doha, do acordo da OMC que o Brasil não seja levado em conta e que o G-20 não seja levado em conta.
Depois de consolidado, uma outra coisa fundamental para o Brasil foi a sua relação na América do Sul e a sua ação na América Latina. Para algumas pessoas que não acreditavam nisso, hoje a relação comercial do Brasil com a América Latina é maior do que a sua relação comercial com os Estados Unidos e com a Europa, embora a relação comercial com os Estados Unidos e com a Europa tenha crescido, em média, 20% em todo esse período. E qual foi o milagre que aconteceu? O milagre foi que todas as economias do continente cresceram e, ao mesmo tempo, nós deixamos de estar de costas voltadas uns para os outros e resolvemos estabelecer uma parceria.
Bem, tudo isso foi possível porque também combinamos internamente uma coisa que era impossível de combinar. E vocês, jornalistas que cobrem o Congresso Nacional ou que cobrem a política do Palácio há muitos anos - nem todos cobrem há muitos anos, porque a maioria é gente nova - sabem perfeitamente bem que no Brasil era impossível se pensar em crescimento das exportações com crescimento do mercado interno. Era impossível, parecia que não combinava, havia a doutrina que dizia que não dava certo, e nós estamos provando que é possível, primeiro, crescer com inflação baixa, coisa que na história do Brasil também era impossível.
De vez em quando eu vejo as pessoas lembrarem o período Juscelino, em que a economia cresceu, em média, 7%, mas a inflação era, em média, 23%. De vez em quando eu vejo as pessoas lembrarem do milagre brasileiro que, em 73, se cresceu 14% ao ano, mas a inflação normalmente era acima de 20%. E nós conseguimos combinar o crescimento econômico sustentável com a inflação altamente controlada, o crescimento das exportações, o crescimento das importações e o crescimento do mercado interno.
Esses fatores, por si só, demonstram que nós podemos, em seguida, fazer uma política social que, sem dúvida nenhuma, foi a política social mais bem-feita que já fizemos neste País. E por uma razão simples: nenhum milagre começa pelo cadastro. Ou seja, nós tínhamos um problema no cadastro já que poucas vezes o cadastro foi levado a sério. E o cadastro é a condição básica para que as políticas sociais do governo cheguem a quem precisa e, mesmo assim, nós estamos arriscados a cometer erros, porque nem todo mundo que se cadastra, se cadastra com a fidelidade que o programa exige.
De qualquer forma, os resultados estão aí para quem quiser acompanhar, e não existe hoje, no mundo, um programa de sucesso como o Programa Bolsa Família, que atende as pessoas, combinado com o Programa Luz para Todos, que é um sucesso, eu diria, extraordinário. Bem, por que tudo isso foi possível? Isso foi possível porque em nenhum momento - e vocês acompanharam os quatro anos do meu mandato - eu permiti que qualquer sintoma de crise política adentrasse o Palácio do Planalto ou mexesse particularmente comigo. Isso foi possível trabalhar, quanto mais as coisas aconteciam, mais eu trabalhava e, depois, nós colhemos o resultado.
Esse próximo período é um período de muito mais tranqüilidade. Eu acho que hoje não fazemos mais a política estigmatizados pelo ódio entre situação e oposição. Nós construímos uma base aliada no Congresso, através de uma coalizão com os partidos políticos de sustentação da base, que é muito mais sólida do que a que tínhamos construído no ano passado.
As pessoas no Brasil, e eu, estamos aprendendo a estabelecer coalizão política, pensando no longo prazo e não apenas pensando em cada votação ou em cada momento.
E isso me permite dizer para vocês que eu vou poder cuidar com muito mais carinho, no próximo período, do nosso País. Cuidar para fazer as coisas acontecerem, cuidar para fazer com que a economia cresça, cuidar para fazer com que haja mais distribuição de renda, cuidar para que haja mais emprego neste País. Tudo isso agora é possível.
E eu tenho consciência de que, muitas vezes, o papel da oposição, às vezes, é não reconhecer as virtudes do governo como muitas vezes, nós também não reconhecemos a situação de outros. Um tempo desses, eu estava conversando com um líder político, e ele me dizia: "Porque o PT, em determinado tempo, fazia assim". Eu falei: pois é, vocês estão fazendo hoje exatamente o que o PT fazia há algum tempo atrás.
Se nós aprendermos as lições que a história nos ensina, nós vamos poder trabalhar de forma muito mais unificada na diversidade, separando o que que é o momento do embate político de campanha eleitoral com o momento político de fazer oposição, de consolidação partidária no Brasil, sem confundir isso com a situação dos projetos que são pertinentes aos interesses brasileiros.
É por isso que eu sou agradecido à Câmara dos Deputados que em tão pouco tempo votou todas as medidas que nós mandamos, do PAC. E o Senado já votou duas. Eu não tenho dúvida nenhuma de que o Senado votará as outras medidas que nós precisamos que sejam votadas, como se votou na Câmara, para que o PAC atinja a sua plenitude jurídica, a sua plenitude administrativa, a sua plenitude de financiamento, que é isso que o Brasil espera do governo, espera da oposição e espera de todos nós. Por isso, eu quero me colocar à disposição de vocês, para que comecemos as perguntas, porque já falei demais."
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: A primeira pessoa a fazer pergunta, a primeira jornalista, é Martha Correa, da "TVJB". Eu queria chamar logo o Celso Teixeira, da "TV Record". Cada um ocupa um microfone e assim, à medida em que quem já fez a pergunta e ouviu a resposta, vai sendo substituído. Então, por favor, a Martha e o Celso.
JORNALISTA MARTHA CORREA - TVJB: Bom dia, Presidente. A minha pergunta é em relação ao anteprojeto de greve que o governo está enviando ao Congresso. O senhor, como líder sindical, protagonizou as greves mais importantes do País na época da ditadura militar. O partido do senhor estimulou greves em governos passados. Eu pergunto: como é que o senhor se sente com o seu passado, o senhor que ajudou a escrever a história do sindicalismo brasileiro, e agora escreve a história do Brasil? Como é que o senhor se sente ao enviar esse pacote, esse projeto que endurece as regras a sindicalistas, dizendo que o senhor está transformando os servidores públicos em foras-da-lei? Obrigada.
PRESIDENTE: Talvez, Martha, eu me sinta à vontade exatamente porque fui dirigente sindical e exatamente porque fiz parte das greves mais importantes que aconteceram neste País no final da década de 70 e no começo de década de 80. Todo mundo sabe que o meu comportamento com relação à greve não é um comportamento de presidente da República. Eu sempre discuti com os meus companheiros servidores públicos que a greve no setor público não deveria ser feita como se faz a greve numa fábrica.
A greve no setor de transporte coletivo não pode ser feita como se faz numa fábrica, a greve da saúde não pode ser feita como se faz numa fábrica, a greve de professores não pode ser feita como se faz numa fábrica, porque quando nós fazemos uma greve numa fábrica, quando um trabalhador faz uma greve num comércio ou numa fábrica, o que ele está fazendo?
Ele está tentando causar um prejuízo econômico ao patrão para que o patrão possa ceder às suas reivindicações e, aí, ele voltar a trabalhar. No caso do servidor público não tem patrão e o prejudicado, na verdade, não é o governo, é o povo brasileiro.
Quando a área da saúde entra em greve, sobretudo na área de pronto-socorro, quem paga, as vítimas são os pobres, porque os ricos não vão em pronto-socorro e não vão a hospitais púbicos.
Quando nós fazemos uma greve no ensino fundamental, não tem filho de rico no ensino fundamental público, só filhos dos pobres. Quando nós fazemos uma greve no metrô ou no ônibus, quem paga são os pobres que têm que trabalhar de manhã, não são os ricos que pegam ônibus. Nós não queremos proibir que haja greve, pelo contrário. Primeiro, nós não temos o projeto ainda, nós vamos fazer um projeto para mandar. E vamos discuti-lo com as centrais sindicais, porque no nosso governo as coisas são discutidas com quem de direito.
Na verdade, é uma decisão a ser tomada pelo Supremo Tribunal Federal, que ainda não tomou porque um dos ministros pediu vistas do processo. E nós estamos pensando em mandar um projeto para o Congresso Nacional depois de discutirmos com as centrais sindicais, com os sindicatos de servidores públicos, apenas para estabelecer responsabilidades. Ou seja, nós queremos ao mesmo tempo em que discutimos esse assuntos com eles, regulamentar também o contrato coletivo de trabalho para garantir ao servidor público que ele seja tratado democraticamente como qualquer servidor é tratado em qualquer parte do mundo.
O que não é possível, e nenhum brasileiro pode aceitar, é alguém fazer 90 dias de greve e receber os dias parados, porque, aí, deixa de ser greve e passa a ser férias.
Quando eu entrava em greve, eu sabia que a cada dia de greve eu perdia o domingo. Eu sabia que com um determinado número de dias de greve eu perdia o Fundo de Garantia, eu perdia o 13º, eu perdia as férias. Então, quando eu determinava uma greve, eu sabia que era uma disputa em que eu podia ganhar e podia perder. Mas algumas categorias entram em greve e ficam 40, 50, 60, 80, 90, 100 dias de greve e recebem o pagamento. Você pode chamar isso de greve? Não. Isso, na verdade, são férias, na minha concepção sindical.
Então, o que eu quero é apenas responsabilizar o direito de greve. Todos nós temos direito de fazer greve, mas todos nós sabemos que a gente pode ganhar ou pode perder. Um jeito de você decidir fazer greve com mais seriedade é você saber que não são férias, que você vai perder os dias em que você não trabalhou. Afinal de contas, você ganha pelos dias que você trabalha e não pelos dias que você fica em casa.
Então, nós vamos fazer isso, Martha, com a maior tranqüilidade, isso vai ser discutido com os dirigentes sindicais do setor público e do setor privado, porque o que nós queremos é regulamentar tanto o direito de greve quanto o direito dos trabalhadores na sua contratação coletiva do trabalho. Longe de mim prejudicar algum trabalhador. Mas, também longe de mim não fazer as discussões sérias que este País tem que fazer.
Eu me lembro de um governador que, em 1997, encontrou comigo chorando. Fazia 96 dias que os professores da rede pública estavam em greve e ele mandou para a Justiça, para descontar os dias, e a Justiça deu que ele tinha que pagar os dias, enquanto nós, na iniciativa privada, várias vezes entramos com processo para ganhar os dias e nunca nos deram uma hora de greve. Então, o que nós queremos é isso: responsabilizar o direito de greve no Brasil e, ao mesmo tempo, garantir o direito do contrato coletivo de trabalho para o servidor público brasileiro.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Por favor, antes do Celso fazer a sua pergunta, o Sandro Lima.
JORNALISTA CELSO TEIXEIRA, TV RECORD: Presidente, bom dia. Eu vou trazer um assunto e vou ousar discordar do senhor, porque consideramos que nunca esteve tão na ordem do dia a discussão sobre a legalização do aborto. A questão não é se as pessoas são a favor ou contra, a questão é se o debate sobre a legalização deve acontecer ou não. Por que eu considero que está na ordem do dia? O Ministro da Saúde do senhor, o novo Ministro, disse que esse é um debate que a sociedade deve fazer porque é um problema de saúde pública.
O México aprovou uma legislação nesse sentido há pouco tempo, o Papa esteve aqui e defendeu questões, inclusive a excomunhão de políticos que defendam a legalização do aborto, e há um plebiscito no Senado para ser aprovado. Então, eu gostaria de saber do senhor, Presidente, qual é o caminho que o senhor considera para esse assunto? O debate deve acontecer de que maneira e qual é a posição do senhor, como cidadão e como Presidente, em relação à legalização do aborto?
PRESIDENTE: Eu já disse, Celso, em 1982, quando fui candidato a governador de São Paulo, em 1989, quando fui candidato a presidente da República, em 1994, quando fui outra vez candidato, em 1998, quando fui outra vez candidato - você vê que há vantagem em perder muita eleição porque disputa muita eleição - disse em 2002, e disse também em 2006, e vou dizer agora para você, Celso. Eu tenho um comportamento: como cidadão, sou contra o aborto. E não acredito que tenha uma mulher neste País que seja favorável ao aborto, como se o aborto fosse uma coisa que as pessoas quisessem fazer porque querem fazer. Agora como chefe de Estado, eu sou favorável que o aborto seja tratado como uma questão de saúde pública, porque é preciso que o Estado dê atenção a pessoas que tiveram gravidez indesejada. É importante saber como é a vida das pessoas, como é que uma menina de 16, 17 anos, às vezes, até por falta de orientação, ficou grávida, a família não quer o filho, e, muitas vezes, o pai a toca de casa ou, muitas vezes, o namorado a abandona.
Então, o Estado, diante desses fatos, tem que tratar como uma questão de saúde pública, porque eu conheço casos de pessoas que perfuraram o útero com agulha de tricô, eu conheço casos de pessoas que tomaram chá de caroço de abacate, eu conheço casos de pessoas que colocaram fuligem para ver se abortavam, e essas pessoas terminavam morrendo. Então, o Estado tem que ter responsabilidade. Agora, se o Congresso Nacional quiser fazer um debate, se os partidos políticos, a sociedade civil, quiserem organizar um debate, todo e qualquer debate será bem-vindo.
Aliás, poderia ser feito pela televisão, a televisão brasileira poderia se abrir para um tema desses, quem é contra, quem é a favor. O Papa defendeu um conceito da igreja brasileira uma visão da igreja internacional, como tem outras pessoas que defendem a mesma visão por outras razões. Eu tenho a minha visão e ela continua inalterada. Eu sou contra o aborto, sou favorável que haja o debate e acho que o Estado tem que tratar o assunto como uma questão de saúde pública.
Agora, é importante que as pessoas debatam, qual é o problema? Na discussão que eu tive no Fórum Nacional de TVs Públicas, eu disse que a TV pública poderia fazer um debate que, muitas vezes, a televisão normal não faz. Não se trata de ser contra ou a favor. Trata-se de juntar os especialistas do País, que são favoráveis e que são contra, e fazer esse debate para que a sociedade seja politizada.
O que eu defendo, na verdade? Se nós tivéssemos um programa correto de educação sexual nas escolas e dentro de casa certamente a gente teria muito menos aborto do que temos hoje. Acontece que, muitas vezes, os pais não conversam com os filhos e não conversam porque não estão preparados, nem com os filhos, nem com as filhas. Nas escolas não se ensina, nas igrejas não se ensina, então, as pessoas ficam vulneráveis e, às vezes, engravidam sem querer engravidar. Então, vamos fazer esse debate Certamente o governo participará desse debate, não ficará fora. Agora, a minha posição é exatamente essa.
JORNALISTA CELSO TEIXEIRA - TV RECORD: Presidente, quando o senhor fala que "é uma questão de saúde pública", o senhor está falando que o senhor acha que deve haver uma legislação sobre o assunto?
PRESIDENTE: Já tem legislação sobre o assunto. A legislação brasileira já define os casos em que a pessoa pode fazer o aborto.
JORNALISTA CELSO TEIXEIRA - TV RECORD: O senhor acha que essa legislação deve ser ampliada, Presidente?
PRESIDENTE: Eu acho que essa legislação não trata da veracidade dos acontecimentos no País. Todos vocês sabem, todo cidadão católico ou não, cristão ou não, sabe que existe no Brasil uma quantidade exagerada de jovens, de pessoas que praticam abortos, porque tiveram uma gravidez indesejada, não é apenas porque foram violentadas. Às vezes, ficaram grávidas e não querem ter um filho. Ora, quando essas pessoas se encontram nessa situação, o poder público faz o quê? Abandona? Deixa essas pessoas tentarem experiências com o seu pouco conhecimento? Ou o Estado intervém para ajudar essas pessoas a terem um tratamento adequado? Eu defendo que o Estado dê um tratamento adequado.
JORNALISTA CELSO TEIXEIRA - TV RECORD: Obrigado, Presidente.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Próxima pergunta, do Sandro Lima. Eu queria chamar logo a Luciana para ocupar, aqui, o microfone.
JORNALISTA SANDRO LIMA - CORREIO BRAZILIENSE: Bom dia Presidente. Nós sabemos que o Congresso Nacional é que vai decidir se o senhor poderá concorrer ou não a um terceiro mandato consecutivo em 2010. Mas, antes que a Constituição permita, o senhor não é obrigado a disputar. O senhor pode decidir não disputar ainda que a lei lhe dê esse direito. Sua posição, historicamente, tem sido contra a reeleição, o senhor tem a oportunidade de esclarecer esse assunto de 2010 de uma vez por todas. Presidente, o senhor garante que não vai disputar um terceiro mandato em 2010, mesmo que a lei permita? O senhor assume publicamente, aqui, esse compromisso?
PRESIDENTE: Bom, quem tem que explicar é quem inventou isso. Eu, na verdade, tenho dito o seguinte: eu não brinco com democracia, e aqui no Brasil todos nós aprendemos que não se pode brincar com democracia. Eu fui contra a reeleição até o momento em que a lei perdurou, e eu fui obrigado a ser candidato à reeleição porque a situação política exigia que eu fosse o candidato.
Eu quero dizer para vocês: sou contra e não serei candidato em 2010. Não é por nada não, é porque a Constituição não permite, a lei não permite e eu acho imprudente alguém tentar apresentar qualquer mudança, permitindo um terceiro mandato. Eu tenho dito aos partidos políticos que eu não posso falar mais disso este ano. Mas, se tiver prudência dos partidos políticos, a melhor reforma política que poderia acontecer seria acabar com a reeleição, aprovar um mandato de cinco anos. E se a pessoa fez um bom governo, cinco anos depois de ausência ela poderia voltar e concorrer a uma nova eleição. Mas então está definido, meu filho, por não brincar com a democracia, não serei nem pensarei, nem cogitarei qualquer hipótese de terceiro mandato. Eu já era contra o segundo, imagine o terceiro.
JORNALISTA SANDRO LIMA - CORREIO BRAZILIENSE: Mesmo que um deputado apresente a ...
PRESIDENTE: Acabei de dizer. Acho imprudência e a minha orientação para a base é de que ninguém apresente qualquer projeto, o que eu acho uma provocação à democracia brasileira.
JORNALISTA SANDRO LIMA - CORREIO BRASILIENSE: Obrigado
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Por favor, antes da Luciana fazer a sua pergunta, eu queria chamar a Luíza Damé.
JORNALISTA LUCIANA VERDOLIN - JOVEM PAN: Bom dia, Presidente. Ontem o senhor disse que a greve do Ibama não prejudicaria o andamento das obras do PAC. A gente vê aí uma discussão, entre os Ministérios, de que precisa sair logo a questão das licenças ambientais do rio Madeira, porque senão a gente vai ter problema, mais para a frente, de energia elétrica. Não é uma forma de pressionar o Ibama, quando o Ministério de Minas e Energia fala que se não tiver o licenciamento das usinas o governo vai investir em termelétrica, que é muito mais poluente, e não seria um desenvolvimento a qualquer custo, que a ministra Dilma Rousseff disse que não vai ser feito, que ninguém vai passar por cima de questões ambientais e que o desenvolvimento será feito, mas com responsabilidade?
PRESIDENTE: Essa pergunta me permite explicar duas coisas. Por que o Ibama está em greve? Houve redução do salário do Ibama? Alguém foi mandado embora? Alguém foi trocado de função? Não. Apenas porque a Ministra deu um sinal de que, depois de tantos anos de existência do Ibama, era preciso que houvesse uma modernização do Ibama. Eu compreendo que as pessoas e todos nós, inclusive vocês da imprensa, temos medo de mudanças
Eu me lembro que quando Oswaldo Cruz criou o remédio para combater a febre amarela, no Rio de Janeiro, queriam linchá-lo. Eu me lembro que até hoje, quando a gente quer combater a dengue e monta mutirões para visitar as casas e pedir para não deixarem garrafa, não deixarem pneu, tem quem não abra a porta da casa para as pessoas entrarem para ver quando, na verdade, o responsável é a pessoa que deveria limpar a própria casa, porque não existe comprimido, não existe vacina. O que existe é um processo de limpeza que cada um tem que fazer.
Então, por que o Ibama está em greve? Eu não sei, eu só sei que a ministra Marina, depois de quatro anos de experiência no Ministério, propôs fazer mudanças, separar o que é licenciamento daquilo que é preservação dos parques, porque não adianta você demarcar parques e depois não colocar ninguém para cuidar disso, não ter dinheiro para transformar aquilo numa área de lazer. E nós estamos transformando isso. Foi isso que ela fez a mudança. As pessoas deveriam pelo menos permitir que as mudanças fossem introduzidas para saber se alguém vai ter prejuízo ou não.
Segundo, eu acho que não vai prejudicar o que nós estamos fazendo. Vocês estão lembrados que, na entrevista do PAC a ministra Dilma falou da hidrelétrica de Estreito, que tinha um problema. Já não tem mais problema, já foi resolvido o problema da hidrelétrica de Estreito, ela vai ser feita e logo, logo estará havendo licitação para que os empresários comecem a obra. A mesma coisa, a hidrelétrica do rio Madeira. O que nós queremos na Santo Antônio e na Jirau? Veja, são duas hidrelétricas importantes para o País, são obras que vão custar acima de 9 bilhões de reais, são obras que vão gerar acima de 3 mil e 500 megawatts, cada uma delas, e são obras necessárias para o futuro deste País, a partir de 2012.
O que eu não posso é deixar o governo em 2010 e o meu sucesso pegar um apagão. Nós temos que trabalhar pensando dois, três, quatro, cinco, seis anos para a frente, para que a gente possa resolver o problema. E obviamente que dizer "não vai faltar energia" significa a gente tentar fazer todas as usinas hidrelétricas não-poluentes, renováveis e as mais baratas. Se não der certo, quais são as alternativas que nós temos? Nós temos eólica, nós temos biomassa, nós temos termelétrica a carvão, a gás, a óleo diesel e a óleo combustível e temos energia nuclear. Não existe outra hipótese.
Agora, eu vou dar um dado para você ver como este País, às vezes, deixa de discutir os temas sérios. Você sabia que o estudo da hidrelétrica de Belo Monte ficou proibido 20 anos por uma liminar? Não é fazer a hidrelétrica, alguém entrou com uma liminar proibindo que os estudos fossem feitos, por 20 anos. Nós conseguimos agora derrubar a liminar e estamos fazendo o estudo. Ora, se para fazer uma hidrelétrica com 11 mil megawatts precisa de um lago muito grande, vamos fazer com seis, com sete, com cinco, com oito, mas vamos fazer e vamos discutir, porque nós não queremos fazer uma hidrelétrica depredando o meio ambiente. Só tem sentido fazer se a gente combinar a produção de energia com o cuidado ambiental neste País.
Nós já resolvemos vários problemas da Santo Antonio e de Jirau, tem agora os problemas do Bagre. Se vocês saírem daqui e foram até Ipu, vocês vão perceber que lá foi feito um canal para que os peixes pratiquem a piracema, de 112 metros de altura, 112 ou 122, não tenho o número exato, mas são mais de 112 metros de altura. Um canal onde na época da piracema os peixes sobem, fazem o que têm que fazer e voltam, ou seja, em Santo Antonio e Jirau a escada que nós temos que fazer é de menos de 20 metros. Então, os peixes vão poder transitar livremente, fazer a piracema sobre a escada, procurar um afluente, e nós queremos preservar. Por isso é que não temos problema de discutir. Nós vamos discutir, mas queremos fazer as duas hidrelétricas combinando um projeto perfeito e bom com um projeto ambiental perfeito e bom, porque é isso que precisamos deixar para os nossos filhos.
Eu queria dar um dado para vocês. Eu acho que muitas vezes nós, leigos, discutimos assuntos sem saber a importância da coisa. O megawatt/hora de energia hidráulica custa 40 dólares; o megawatt/hora de energia da termelétrica de carvão custa 48 dólares, o megawatt/hora do gás natural custa 54 dólares; o megawatt/hora da energia nuclear custa 140 dólares, o megawatt/hora da eólica custa 145 dólares, o megawatt/hora do óleo combustível custa 230 dólares, e o megawatt/hora do óleo diesel custa 310 dólares.
Está colocado que a hidráulica é a mais barata, a menos poluente e, por isso, nós precisamos ter o cuidado de fazê-la com o maior carinho possível. Foi por isso que criamos um conselho gestor no PAC, que é para a gente discutir semanalmente quinzenalmente, mensalmente. Quando tem divergência, essa divergência acaba quando chega à minha mesa.
A Dilma e a Marina, a Dilma e o Ministro dos Transportes a Dilma e o Ministro da Economia podem discutir o que quiserem. Vai ter um momento em que o assunto chegará à minha mesa. E na minha mesa há decisão e nós executamos aquilo. É isso que nós vamos fazer, por isso nós podemos afirmar ao povo brasileiro que não teremos apagão, porque vamos fazer tudo o que for necessário fazer neste País, dentro da lei e da ordem, dentro do respeito às instituições que nós mesmos criamos.
Eu vou dar um outro dado para você, que é importante para a imprensa ter em conta. O potencial hidráulico do Brasil é de 264 mil megawatts. Isso equivale a um potencial de 76 bilhões e 948 milhões de barris de petróleo. É importante saber que a nossa reserva hoje é de 16 bilhões. Portanto, o que nós temos de energia hidráulica poderia ser quatro vezes mais o que nós temos de reserva de petróleo hoje.
Então, na hora em que os ministros não tiverem solução, nós levamos para o Conselho Nacional de Política Energética e, aí, o Conselho de Política Energética decide e está tudo resolvido.
Eu posso te dizer que o Brasil não terá apagão e que iremos fazer o que temos que fazer neste País para ter energia. As hipóteses, eu disse a você: citei o preço do megawatt/hora, portanto, temos uma escolha para fazer. E essa é a vantagem de ser governo: quando você é oposição, pode passar 10 anos discutindo. O governo, muitas vezes, tem 10 dias para decidir, e nós vamos decidir.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes da Luíza Damé fazer a sua pergunta, eu queria chamar o Guilherme Menezes para ocupar o microfone aqui na minha frente.
JORNALISTA LUÍZA DAMÉ - O GLOBO: Bom dia, Presidente. O governo vai ter, pela frente, uma votação difícil e polêmica no Congresso, que é a prorrogação da DRU e da CPMF. Eu gostaria que o senhor fizesse uma análise sob dois aspectos: primeiro, os governadores prometem, ameaçam endurecer a votação se o governo não ceder em alguns pontos, especialmente na questão da divisão da arrecadação da DRU. Em que ponto o senhor pode ceder para atender os governadores? E o segundo ponto é que setores da base aliada ameaçam não votar projetos importantes para o País, preferencialmente DRU e CPMF, se não for resolvida a questão das nomeações para o segundo escalão. Quando isso deve ser resolvido e como é possível atender os 11 partidos aliados na divisão do segundo escalão?
PRESIDENTE: Primeiro, mesmo que eu tivesse o acordo feito com os governadores, eu não poderia te falar. Sabe por quê? Porque nós tivemos uma primeira reunião com os governadores no dia 6 de março. De lá para cá, o Ministro da Fazenda e o Ministro do Planejamento têm trabalhado as reivindicações dos governadores, obviamente que algumas serão atendidas. Eu estou pensando que, para o próximo mês, eu devo convocar os governadores para uma reunião, não tem data, mas eu espero que seja no próximo mês.
Na próxima semana, o ministro Guido Mantega vai me apresentar uma primeira avaliação das coisas com que ele acha que é possível concordar, e eu não acredito que os governadores estejam fazendo qualquer pressão.
Os governadores estão fazendo aquilo que é papel deles. Eles querem levar mais dinheiro para os seus estados, como os prefeitos querem levar mais dinheiro para os municípios, e isso não é nenhum problema maior. Isso é um problema da democracia, é um problema da existência dos entes federativos, e nós precisamos apenas fazer essa combinação perfeita. E você sabe da relação... Eu duvido - aí eu vou dizer pela primeira vez - que tenha havido um momento em que o presidente da República teve a relação que nós temos com os governadores, e vamos estabelecer essa relação com todos os partidos, eu não quero saber quem é do PSDB, quem é do PFL, quem é do PT, quem é do PCdoB, quem é do PDT. Eu quero saber é que são governadores que têm compromissos com o seu povo, que têm pleitos a fazer e, dentro do possível, o governo vai atender essas pessoas. Essa é a primeira parte.
Todo mundo sabe, em sã consciência, que o Estado brasileiro não pode viver sem a CPMF e sem a DRU. Todo mundo sabe, porque se alguém tirar dinheiro da CPMF, nós vamos ter que tirar dinheiro do Orçamento e cortar o Orçamento. Esse é um dado concreto e objetivo, e as pessoas não podem... Eu digo isso de cátedra, porque de vez em quando, quando você é oposição, você vota pensando em prejudicar quem está no governo. E muitas vezes você esquece que você pode ser o governo e que a atitude pode lhe prejudicar no ano seguinte. Então, agir com responsabilidade é a única coisa que eu peço, nesse aspecto, para todos os congressistas.
A terceira e última coisa: não existe votação por nomeação de cargo. Quem quiser votar contra, atrás de nomeação de cargo, pode votar contra. O que eu estou propondo aos partidos políticos e, graças a Deus, estamos construindo uma harmonia, é construir uma coalizão neste País, que é diferente de distribuição de cargos. Se bem que os partidos políticos da base precisam ocupar os cargos que podem ocupar, mas não pode ser essa a condição "sine qua non" para que a gente monte essa coalizão.
A coalizão tem que ser - vocês gostaram do "sine qua non" - montada, tem que ser preparada, para a gente construir um projeto para este País, e não para construir uma votação. Vocês sabem que nós temos tido uma relação, a mais harmoniosa, com os partidos políticos. Toda semana temos reunião com o Conselho Político, que são os líderes mais os presidentes dos partidos. Eu tenho participado da maioria delas e vou participar de tantas quantas eu puder participar para que a gente construa, definitivamente neste País o hábito da coalizão. E você sabe que eu tenho disposição de conversar também com os líderes da oposição.
Essa é a coisa interessante de quem não está pensando em nova eleição. Eu estou mais leve, eu posso te dizer que tiraram das minhas costas uns 30 quilos, porque você fica pensando na eleição e as pessoas que estão atrás de você ficam pensando na eleição. Eu não tenho que pensar nas eleições, o problema agora é de quem quer ser candidato em 2010, não é meu. Então, eu quero conversar com todos os partidos políticos.
Eu tive uma conversa com o presidente do PSDB e foi uma conversa interessante, foi uma conversa importante. O PSDB não precisa deixar de ser oposição ao governo, afinal de contas, todo partido pode fazer as críticas que quiser, é um direito de exercer o seu papel de partido de oposição. Agora, não pode haver confusão quando se trata de um projeto importante, de interesse do País. Aí não estarão me prejudicando, estarão prejudicando pessoas que não estão nem próximas da Presidência da República.
Essa combinação é que eu quero construir, e posso te garantir que estou com toda a disposição de conversar com todas as forças políticas, tenho conversado com senadores de vários partidos da oposição e acho que nós estamos nos dando bem. Agora muitas vezes, é mais difícil do que eu gostaria que fosse, porque o exercício da democracia é difícil.
Imagine se para escrever o artigo que você vai escrever desta entrevista, você tivesse que fazer um debate dentro da redação com 30 jornalistas que não participaram, como seria mais difícil. Seria muito mais difícil porque pessoas que nem vieram aqui iriam dizer para você: "isso aqui você não pode publicar" ou "isso aqui você tem que carregar na tinta".
A democracia é isso. Às vezes eu mando um projeto para o Congresso Nacional que eu penso ser perfeito, mas quando chega lá um deputado acha que não é e faz uma emenda. Às vezes a emenda é para melhorar e nós precisamos aprender que isso é a melhor coisa que pode acontecer no mundo, é o exercício da democracia, porque este País viveu alguns anos em que o exercício da democracia não acontecia no nosso cotidiano e era bem pior. Poderia ser mais fácil para quem estava no governo, mas era muito pior par a sociedade.
Nós somos políticos para quê? Para enfrentar dificuldades, para debater, para enfrentar diversidades. Hoje eu estou muito mais à vontade para enfrentar tudo isso, inclusive aprovar a CPMF, aprovar a DRU com a base aliada, com os partidos de oposição e com o apoio dos governadores. Podem ficar certos de que isso vai acontecer.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes do Guilherme Menezes, do SBT, fazer a sua pergunta, eu queria chamar o Leandro Fortes, da Carta Capital, para ocupar o outro microfone.
JORNALISTA GUILHERME MENEZES - SBT: Bom dia, Presidente. O assunto ainda é a sucessão. O senhor acaba de dizer que tem mais de três anos de mandato pela frente. O segundo mandato mal começou, mas a gente sabe que em política, quem não faz estratégia não colhe lá na frente, e o senhor, com certeza, não vai abrir mão do seu papel de líder político e de querer influenciar a política brasileira, ninguém tem dúvida disso.
Então, a pergunta que eu faço é a seguinte: o senhor estaria disposto ou o senhor acha que um presidente eleito pelo PT está obrigado a apoiar um candidato do PT ou o apoio do senhor poderia estar ligado à lógica da montagem da sua base política que privou o PT de algum espaço para beneficiar os aliados? Quem o senhor vai apoiar, na medida em que o senhor descartou a possibilidade da terceira eleição?
PRESIDENTE: Primeiro, nenhum partido privou o PT de algum espaço. O PT tem o privilégio de ter o cargo mais importante da República, que é o de presidente, mais do que isso é querer muita coisa. Além disso, todos os partidos participam do governo em função da proporcionalidade da sua representação na sociedade brasileira, e o candidato que sairá da base deverá ser discutido entre todos os partidos que compõem a base.
Eu digo sempre o seguinte: eu quero terminar o meu mandato em 2010 na condição daquele que os candidatos chamem para ir para o palanque, porque é duro você terminar um mandato e ninguém te chamar para nada, as pessoas te esconderem, fingirem que você não é do partido, não citarem o seu nome, não o convocarem para a televisão. Eu quero ser um presidente diferente.
Quando chegar a eleição de 2010, eu quero estar tão afiado que as pessoas vão pedir para eu ir ao palanque: "Vamos lá Lula, vamos fazer um comiciozinho não sei das quantas". É assim que eu quero terminar o meu mandato e é para isso que eu vou trabalhar. A base vai ter um candidato e esse candidato, na minha opinião, deve ser tirado de um consenso da base para que a gente possa disputar as eleições.
JORNALISTA GUILHERME MENEZES - SBT: Não precisa ser alguém do PT?
PRESIDENTE: Necessariamente não. Se eu estou dizendo que é um candidato da base, e a base tem vários partidos políticos, vai ser um candidato da base, de dentro da base. Hoje a gente erra só se quiser, porque você tem pesquisa, você tem estudo científico que pode dizer: olha, quem tem mais possibilidade é esse, quem tem possibilidade de crescer é esse, quem vai crescer é aquele, e preparar o tipo de discurso que as pessoas têm que fazer. Hoje, uma campanha tem métodos científicos importantes. E eu acho que nós estamos numa condição favorável.
O que eu posso dizer para vocês é que toda a minha expectativa e tudo o que eu acredito que vai acontecer é que nós terminaremos o segundo mandato numa condição eminentemente mais favorável do que terminamos o mandato de 2006. E o Brasil estará economicamente, politicamente e socialmente infinitamente melhor do que esteve em 2006. Portanto, as condições serão muito mais favoráveis.
Obviamente que sempre haverá alguém jogando uma casca de banana, sempre haverá alguém jogando uma pedra, mas isso faz parte da política. O que eu preciso é colocar um sapato com umas travinhas para não escorregar nas cascas de banana que me jogam todo santo dia. Eu também aprendi muito, também fiquei calejado, também aprendi a saber quem é quem na política brasileira e acho que por isso eu estou mais tranqüilo para fazer as coisas corretas.
JORNALISTA GUILHERME MENEZES - SBT: O senhor faz sucessor?
PRESIDENTE: Meu Deus do céu, eu esqueci de perguntar para o Papa, mas eu posso dizer para vocês que eu quero fazer o sucessor e por uma razão muito simples: porque eu quero que tenha continuidade o que nós estamos fazendo no País. Só isso. Eu trabalho para fazer. Agora, entre trabalhar para fazer e dizer que vou fazer, não tenho esse poder.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes do Leandro Fortes, da Carta Capital, fazer a pergunta, eu queria chamar o Paulo de Tarso, do Valor Econômico, para ocupar este microfone.
JORNALISTA LEANDRO FORTES, CARTA CAPITAL: Presidente, bom dia. Sobre esse hábito de coalizão ao qual o senhor se referiu, eu queria lhe fazer uma pergunta específica sobre isso. No início do segundo mandato, o senhor trouxe para o governo, por exemplo, o deputado Geddel Vieira Lima, que lhe desancava sem maiores pudores durante a crise política do mensalão em 2005/2006. Recentemente o senhor surpreendeu a todos trazendo também o professor Mangabeira Unger, que não só lhe desencava publicamente como também escreveu um artigo pedindo o seu impeachment, por nomeá-lo, designá-lo como chefe do governo mais corrupto da história.
Então, eu lhe pergunto: essa coalizão feita nesses termos, essa coalizão feita a qualquer custo, levada, enfim, a todas as conseqüências por conta da governabilidade, do exercício da governabilidade, primeiro, se ela lhe provoca algum desconforto em relação a esses nomes. E, segundo, se o senhor não acha que isso vai acabar lhe criando mais problemas do que soluções, ao longo do seu mandato.
PRESIDENTE: Uma coisa importante que temos que meditar é se nós, cidadãs e cidadãos brasileiros, respeitamos o resultado das eleições ou se vamos ficar discordando, porque as pessoas que nós queríamos que fossem eleitas não foram. O presidente da República, no exercício do seu mandato, não governa com as forças que gostaria de governar, ele governa com as forças vivas que compõem as organizações políticas da sociedade civil e dos partidos políticos. Isso vale para um prefeito, vale para um governador e vale para o presidente da República.
Segundo, obviamente que quando você faz aliança política ela tem preço, e eu vou lhe dar um exemplo. Eu perdi três eleições, e cada eleição que eu perdia, eu perdia por 15%. Chegou um dia em que alguém me convenceu de que eu não precisava mais ficar fazendo discurso para agradar o PT, que eu não precisava mais ficar fazendo discurso para agradar os 30% ou 35% que eu tive em todas as eleições.
Era preciso que eu me preparasse para ter do meu lado os 15% que faltavam. E eu me preparei e ganhei a eleição. Da mesma forma, na hora em que você vai montar a coalizão, eu não fiz acordo com pessoas individualmente, eu fiz acordo com partidos políticos e, portanto, cabe ao partido político indicar as pessoas que vão fazer parte do governo, desde que as pessoas - e todo mundo que é indicado passa por um critério que pode ter ou não problema - estejam aptas para exercer a sua função.
Ora, eu queria fazer a coalizão porque queria o PMDB como um todo e não o PMDB fracionado. Eu queria o PMDB na sua totalidade, com os seus deputados, com os seus senadores e com a direção do partido. Eu não queria um PMDB que tivesse 40 deputados de um lado, 40 deputados do outro, 10 senadores de um lado, 10 senadores do outro.
Eu queria o todo do PMDB, como eu quero o todo do PR, como eu quero o todo do PRTB, e assim a gente monta o governo. Se essas pessoas forem me dar problema, as do PT e as que não são do PT, os partidos irão tomar posições em relação a elas. Até agora todas estão a contento. O fato de a pessoa ter sido contra o presidente da República em outro período, ela tinha que ser contra porque não fazia parte da coalizão.
Agora, ela faz parte da coalizão e você vai ver essa pessoa, pelo Brasil afora, defendendo o governo e defendendo o presidente Lula. A mesma coisa, o Mangabeira Unger, que vem para um trabalho específico de pensar este País para o ano de 2022, que é o ano em que a gente completa 200 anos de Independência. Eu pretendo apresentar um projeto para o Brasil, quero mandar esse projeto para a Câmara dos Deputados e para o Senado para que seja votado e possa parecer quase que uma espécie de constituinte de obras. Qualquer pessoa que vier a governar este País, poderá fazer a obra que lhe der na cabeça, mas tem aquelas obras que são prioritárias, são necessárias para o País.
Ora, na medida em que o partido do Mangabeira Unger, que tinha o vice-presidente da República e tem o vice da República, o indica para uma função que eu queria criar, ótimo. Vamos ver o que o Mangabeira vai fazer daqui para frente, vamos ver o que os ministros vão fazer daqui para frente. O que fizeram para trás, faz parte do passado.
A segunda coisa, meu querido, é a seguinte: muita gente vai engolir o que disse do governo, com muita tranqüilidade. Nada como um pouco do passar do tempo para as coisas irem se assentando. E todo ser humano é plausível de erro As pessoas podem errar. Eu já fiz julgamento precipitado de quantas coisas? Eu me lembro que quando o Sarney lançou a Ferrovia Norte-Sul, eu me esgoelava no Congresso Nacional contra a Ferrovia Norte-Sul, eu e outras pessoas. Tanto é verdade que ela ficou, de 1987 até agora, com apenas 215 quilômetros construídos. Eu, que era contra em 1987, já fiz em quatro anos mais do que todos os presidentes que começaram em 1987.
Então, eu penso que o ser humano é assim: nós falamos uma coisa hoje, amanhã percebemos que estamos errados e humildemente temos que reconhecer que erramos, pedir desculpas do que fizemos, fazer autocrítica e tocar o barco para frente. O que a gente não pode é ficar com o passado como se fosse uma espada na cabeça das pessoas, sem permitir que elas possam evoluir.
Esses dias eu peguei um estudo sobre o que diziam da hidrelétrica de Itaipu. Se vocês puderem, peçam aos dirigentes de Itaipu para mandar, e vocês vão ver que coisa fantástica. Lá estão dizendo que vai ter tremor, lá estão dizendo que vai aumentar a ventania, lá estão dizendo que vai acontecer uma série de coisas que não aconteceram desde 1974.
Então, na política é a mesma coisa. As pessoas dizem uma coisa hoje, amanhã têm que reconhecer que erraram. E eu acho que graças a Deus, o mundo é assim. Graças a Deus, nós temos inteligência para não ser os donos da verdade e ser uma espécie de metamorfose ambulante, mudando sempre, nos aprimorando sempre para melhorar sempre. O que eu posso te garantir é que eu continuo, hoje, o mesmo Lula de janeiro de 2003.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes do Paulo de Tarso, do Valor Econômico, fazer a sua pergunta, eu queria chamar o Jorge Svartzman, da Agência France Presse.
JORNALISTA PAULO DE TARSO - VALOR ECONÔMICO: Presidente, bom dia. Um dos cenários econômicos que parece consolidado é a questão do câmbio. Com o dólar a cerca de 2 reais, e com a classificação do Brasil como investment grade, a tendência é que o real fique ainda mais valorizado perante a moeda americana. A nossa pergunta é: que medidas o governo vai apresentar aos empresários brasileiros que estão perdendo competitividade no exterior, com esse cenário?
PRESIDENTE: Primeiro, se eu pudesse te responder com essa facilidade toda, eu já teria feito o que tem que ser feito. Primeiro, nós temos que reconhecer uma coisa que o ministro Guido Mantega disse para vocês, outro dia, em uma entrevista. A gente fica dizendo que o real está valorizado sem reconhecer que o dólar está se desvalorizando diante de quase todas as moedas do mundo. Segundo, nós não podemos resolver o problema do câmbio como alguns querem que a gente resolva: "Ah, cria o câmbio para agricultura, cria o câmbio-soja, o câmbio-automóvel, o câmbio-parafuso", não dá. O câmbio vai continuar sendo flutuante e vai se ajustar. Já faz algum tempo que ele está na casa dos 2% e vai se ajustar.
O que nós precisamos é ter medidas tributárias para que a gente possa permitir que as empresas brasileiras que produzem e competem com um produto, normalmente chinês, no mercado internacional e estão perdendo competitividade, possam ter mais competitividade. Ao mesmo tempo, nós temos que incentivar essas empresas a adotarem inovação tecnológica, porque seremos mais competitivos com mais tecnologia moderna. É isso que temos que fazer.
O dólar vai se ajustar na medida em que a gente comece a importar mais bens de capital, na medida em que a gente comece a reduzir a taxa de juros, que está sendo reduzida e vai continuar sendo reduzida. Agora, não tem milagre. Eu quero dizer para as pessoas que estão perdendo competitividade que o governo fará a sua parte. O governo pode aumentar a alíquota de produtos importados, pela OMC nós poderemos chegar até 35% na taxação de determinados produtos. Já fizemos isso no setor têxtil, poderemos fazer para outros setores.
Nós poderemos criar políticas para estudar a desoneração de alguns setores aqui dentro, mas não tem como o governo, num passe de mágica, dizer: olha, para esse setor sobreviver, o dólar vai ser tanto. Não tem, o que nós precisamos saber é que não estamos competindo com a Alemanha ou com os Estados Unidos, estamos competindo com a China e as condições da China, do ponto de vista da relação trabalho/capital, é muito mais favorável do que a relação aqui dentro do Brasil.
Por isso é que eu votei para que a China fosse transformada em economia de mercado. Por quê? Nós precisamos levar a China para a OMC e fazer com que a China faça um debate junto com todos os demais países que concorrem com ela, o que não pode é a China ficar de fora, do jeito que está hoje. Mas eu estou tranqüilo e acho que o câmbio, veja, não adianta a gente ficar nervoso não, faz seis meses que eu discuto a questão do câmbio neste País, com amplos setores da sociedade, com empresários dos mais diferentes setores, e não tem milagre.
De vez em quando eu pergunto para as pessoas: vocês querem o câmbio fixo? Não. Então, meu caro, vamos deixá-lo flutuar. Vamos tratar de ordenar um aumento das importações brasileiras para que a gente tenha menos dólares, a política de juros vai sendo reduzida, nós vamos ter menos dólares. Agora, na medida em que o Brasil vai consolidando a sua economia, podem ficar certos de que nós vamos precisar aprender que mais dólares vão entrar aqui.
Veja que interessante, acabou o tempo em que os homens da economia deste País precisavam correr todo final de ano para Washington para conseguir uma migalhazinha do FMI para fechar a nossa conta. Nós, agora, estamos tentando ver como gastar um pouco dessa quantidade de dólar que temos, porque uma reserva de 125 bilhões de dólares, um saldo comercial de mais de 40 bilhões de dólares, um superávit de conta corrente de mais 14 bilhões de dólares, inflação baixa, é tudo o que os brasileiros não estavam preparados e graças a Deus nós conquistamos tudo isso. Agora, é continuar andando sem emoções e sem inventar, fazendo o que tem que ser feito.
JORNALISTA PAULO DE TARSO - VALOR ECONÔMICO: Mas tem prazo para essas medidas, Presidente?
PRESIDENTE: Não, não tem prazo. Veja, essas coisas nós vamos discutindo. Veja que nós estamos discutindo desoneração. Nesses últimos meses, você vai perceber que até o final de 2006 nós desoneramos praticamente 22 bilhões de reais neste País. A construção civil não estaria crescendo como está se nós não tivéssemos adotado um pacote para a construção civil.
Nós acreditamos que com o PAC, com outras medidas que vamos tomar, a economia vai crescer ainda mais, nós vamos gastar um pouco dos dólares que temos aí. Se antes a gente corria atrás para pegar dólar, e o banco tinha que vender dólar para baixar o preço, hoje nós estamos comprando para o dólar não baixar e estamos comprando muitos dólares. Eu quero que a gente, ao invés de ficar comprando dólares, aumente a importação de bens de capital para modernizar a indústria nacional. É isso que vai dar à indústria nacional competitividade, para que a gente possa disputar com os mercados mais desenvolvidos.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes do Jorge Svartzman, da "Agência France Presse" fazer a sua pergunta, eu queria chamar o Marcos Roberto Silva, da "Rede TV" para ocupar este microfone aqui.
JORNALISTA JORGE SVARTZMAN - AGÊNCIA FRANCE PRESSE: Bom dia, Presidente. Eu ouvi muitas vezes o senhor falar, dizer que o Brasil não é um país imperialista, mas temos o Evo Morales que lidera simbolicamente a ocupação das usinas da Petrobras; temos o presidente Fidel Castro e Hugo Chávez, que consideram o plano do biocombustível bom só para os monopólios; temos líderes no Paraguai, que consideram que o Brasil pega energia barata de Itaipu. Então, eu queria saber como o senhor avalia essas atitudes e se considera que elas podem ameaçar ou enfraquecer a integração regional, nos termos que o senhor a concebe.
PRESIDENTE: Você poderia falar dos líderes brasileiros que também não concordam com muitas coisas que o Brasil faz. Você poderia dizer que, entre Argentina e Brasil, tem argentino que não gosta do Brasil e tem brasileiro que não gosta da Argentina. Você poderia pegar 500 exemplos de coisas para mostrar que nós temos problemas, mas isso também faz parte do processo democrático.
Historicamente esses países todos viram o Brasil como um país imperialista, ou seja, é o maior país do continente a maior economia do continente, o país mais desenvolvido. Então era normal que os países de menor poder econômico e de menor desenvolvimento vissem no Brasil uma espécie de imperialista, ou seja, tudo o que acontece de ruim é culpa do Brasil.
Quando chegamos à Presidência da República e, logo em seguida, foi eleito o Kirchner, foi eleito o Nicanor, e foram eleitos outros presidentes da América do Sul, estabelecemos entre nós a idéia de que era preciso construir uma outra dimensão da política de integração para a América do Sul, de que gostaríamos de construir uma parceria e não uma hegemonia, mas também não poderíamos esquecer os problemas que temos.
Veja, por exemplo, os problemas das divergências entre a Argentina e o Uruguai, e nem por isso eles deixam de ser dois países irmãos. Afinal de contas, são quantos milhões de uruguaios que moram na Argentina? São 400 mil brasileiros que moram no Paraguai, são 100 mil bolivianos que moram no Brasil.
Então, nós temos que levar em conta a existência de algo que supere as nossas divergências do século XIX, para que a gente possa construir as convergências do século XXI. Isso está claro. Agora, o fato de isso estar claro no nosso discurso não me faz cego diante da necessidade histórica da Bolívia ser dona do seu gás. É importante lembrar que não foi decisão do Evo Morales. Antes do Evo tomar posse, um plebiscito na Bolívia, com mais de 90%, decidiu que o gás seria nacionalizado.
Na hora em que o Evo achou que era importante comprar a refinaria da Petrobrás, a Petrobrás resolveu vender e fizeram um acordo, para mim está tranqüilo. Eu acho que a riqueza mineral da Bolívia é da Bolívia, ele a vende para nós se quiser vender. Nós temos contrato. O que eu quero é que quando estabelecermos um contrato, esse contrato seja respeitado. E não é um problema com o Brasil.
Veja que o problema que acontece com o Brasil acontece com a Argentina e acontece, na seqüência, com o Chile, porque na hora em que falta gás na Argentina, falta gás no Chile. Na hora em que fecha o gás no Brasil, é só o Brasil que é prejudicado.
Até agora não temos problema com o gás da Bolívia, até agora o Brasil está recebendo, o Brasil está trabalhando dentro do Plangás para que o Brasil seja auto-suficiente na produção de gás. E vamos manter a nossa relação com a Argentina, com o Paraguai.
Eu viajei, esses dias, quatro horas com o presidente Nicanor, e eu dizia a ele: é importante ter em conta que um tratado internacional, ou nós o respeitamos ou, na hora em que a gente começar a quebrar esses tratados internacionais, a relação entre Estados ficará difícil de ser feita. Agora, eu não posso impedir que as pessoas encontrem um culpado para os seus problemas.
Durante muito tempo, todo discurso que eu fazia era de que o imperialismo americano era o responsável pela minha pobreza, o imperialismo americano era responsável pelo meu analfabetismo. E, de repente, eu descobri que o problema não é do imperialismo desse ou daquele, o problema é do imperialismo da nossa elite, que durante séculos governou os países deste continente e não fez nenhuma política de distribuição de riqueza não pensou o desenvolvimento do País e não fez os investimentos necessários. Então, para que ficar culpando os outros, se a gente poderia olhar para dentro do nosso umbigo e perceber que o defeito está em nós mesmos?
JORNALISTA JORGE SVARTZMAN - AGÊNCIA FRANCE PRESSE: A impressão é de que essa posição foi ouvida pelos seus interlocutores, pelo Chávez, pelo Evo Morales?
PRESIDENTE: Veja, eu não tenho ilusão de que essas compreensões são demoradas. O Chávez tem sido um parceiro inestimável do Brasil, sob todos os aspectos. O fato de alguém se posicionar contra o biocombustível é um problema de quem se posiciona contra. O Chávez é comprador de etanol do Brasil, como outros países serão compradores de etanol de outros países do mundo. Quando eu penso no biodiesel e no etanol, fico olhando o Nordeste brasileiro, fico olhando o Vale do Jequitinhonha, fico olhando os países da América Central, que serão os beneficiários de uma nova matriz energética.
Mas a minha cabeça fica voltada para o continente africano, porque é a grande chance de o continente africano se desenvolver, na hora em que o mundo desenvolvido resolver introduzir 10% ou 15% de álcool na gasolina, ou introduzir, nos seus caminhões e nos seus carros, o óleo diesel produzido de oleaginosa, já que somente nós temos terra, sol e gente para trabalhar. Isso é quase um milagre, e eu acho que o mundo vai se curvar diante disso.
Eu, agora, vou para o G-8, e a discussão lá é sobre o aquecimento global. Então, vamos desaquecer o Planeta utilizando mais álcool e mais biodiesel, vamos desaquecer o Planeta plantando mais girassol, plantando mais mamona, plantando coisas que possam significar o seqüestro de carbono, porque até agora, o dinheiro que prometeram para os países pobres, não deram. O Brasil não aceita lição porque o Brasil tem a ensinar.
Nós, em dois anos, reduzimos o desmatamento na Amazônia em 52%, e vamos continuar diminuindo o desmatamento porque a Amazônia, não só é nossa, como queremos que ela seja preservada na sua maioria, porque é de interesse soberano deste País. Mas tem outro remédio: se as empresas quiserem deixar de utilizar combustível fóssil e utilizar combustível vegetal, os países pobres do mundo estão de braços abertos oferecendo terra, água, sol, tecnologia e mão-de-obra qualificada para que a gente possa mudar o Planeta.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes do Marcos Roberto, da Rede TV, fazer a sua pergunta, eu queria chamar o Fernando Rodrigues para ocupar o outro microfone.
JORNALISTA MARCOS ROBERTO SILVA - REDE TV: Bom dia, Presidente. A respeito do crescimento do plantio da cana-de-açúcar para produção do etanol, eu queria saber como o governo brasileiro vai agir para evitar a exploração da mão-de-obra escrava que, atualmente, é utilizada nessas lavouras a queimada da cana antes do corte, que acaba provocando o fechamento de aeroportos pelo País afora, e exatamente como conter esse desmatamento que pode até voltar a acelerar. O senhor disse que teve uma redução e pode voltar a acelerar por conta dos usineiros que querem mais lucros.
PRESIDENTE: Esses dias eu disse ao Ministro da Agricultura, disse à ministra Dilma Rousseff e disse a dois empresários do setor do álcool que encontrei em São Paulo que agora que já consolidamos o álcool, no mundo, pelo menos conceitualmente como uma matriz energética de qualidade excepcional, é preciso que a gente dê o segundo passo para discutir a humanização do setor da cana neste País, estabelecer uma discussão com os empresários e com os trabalhadores para humanizar, para criar melhores condições de trabalho para que as pessoas possam ser profissionais e cidadãos na sua plenitude. Esse é o segundo passo que vamos dar.
Agora, preste atenção em uma coisa: nós temos outros ingredientes a nos preocupar com relação a isso. Nós estamos pensando, e está dentro do PAC, a construção do aqueduto que sai aqui da região Centro-Oeste e vai até o porto de Santos. Nós estamos vendo projetos e mais projetos, são mais de 76 novas usinas a serem instaladas no País. O biodiesel está crescendo de forma, eu diria, extraordinária, mais do que a gente imaginava que fosse crescer. Nós imaginávamos que iríamos chegar em 2008 a 840 milhões de litros de biodiesel produzidos, que é a quantidade necessária para introduzir o B-2 no óleo diesel, e já atingimos essas metas agora, numa demonstração de que, quando a coisa é boa, ela foge do controle esquemático, porque muita gente quer produzir. O que estamos discutindo, agora, com a Petrobras? Nós precisamos dar dois passos. Nós precisamos estabelecer uma espécie, eu diria, de estoque regulador do álcool no Brasil, porque na medida em que a gente começa a fornecer o álcool para outros países do mundo, aumenta a nossa responsabilidade, ou seja, para convencer um país a introduzir o etanol na sua matriz energética, você precisa garantir o suprimento, você não pode brincar.
Na hora em que você também convence o mundo a introduzir o biodiesel, você precisa ter empresas que façam o controle do estoque regulador e ninguém mais competente do que a Petrobras para isso. Ao mesmo tempo, nós precisamos tomar cuidado para não permitir que gente de outros países do mundo comece a comprar toda a terra brasileira para produzir cana. Então, tudo isso são coisas que temos que cuidar daqui para a frente, ao mesmo tempo em que vamos cuidar da humanização do capital.
Na questão do biodiesel, esta semana teve uma reunião da qual eu não pude participar. Eu pedi para a Dilma convocar uma reunião porque como é um programa novo, nós não podemos permitir no biodiesel que a gente cometa os mesmos erros que foram cometidos na cana-de-açúcar durante muito tempo neste País. Nós temos Estados em que a coisa está mais ou menos organizada, nós temos cidades em que os sindicatos têm um peso maior e temos cidades em que o sindicato está fragilizado.
Então, o que nós precisamos agora é fazer a discussão que temos que fazer. Antes a gente não podia, porque ora parecia que o setor estava quebrado, ora parecia que não estava. Vocês estão lembrados que a gente não produzia mais nenhum carro a álcool. Agora, com o sucesso do flex fuel e a certeza de que o álcool virou uma matriz energética definitiva neste País, e pode vir a ser em outros países do mundo, sem querer forçar... se alguém tiver muito petróleo e quiser utilizar petróleo, tudo bem, não tem nenhum problema, nós não queremos que as pessoas deixem de utilizar petróleo, o que nós queremos dizer é o seguinte: querem despoluir o Planeta? Querem diminuir o aquecimento do Planeta? Querem melhorar a qualidade do ar? Usem combustível renovável e o Brasil quer ser parceiro de vocês. Por isso eu, com muito orgulho, sou garoto propaganda disso. Eu vou ao G-8 agora, e quando eles abrirem a boca para discutir a questão do aquecimento global, eu vou estar lá com o meu pacotinho de biodiesel e de álcool para dizer: estão aqui, vocês querem diminuir, estão aqui o pinhão manso, a mamona, a soja, o caroço de algodão, o caroço de dendê. Não vai faltar motivação para eles adotarem uma outra política energética no mundo.
JORNALISTA MARCOS ROBERTO SILVA - REDE TV: Agora, Presidente, para garantir que essa mão-de-obra tenha a segurança de que não vai ter mão-de-obra escrava, é possível que o governo envie para o Congresso alguma medida, algum projeto de lei para ser discutido?
PRESIDENTE: Primeiro, seria ótimo que fosse resolvido entre os sindicatos de trabalhadores e os empresários. Se isso não for resolvido, o governo pode ser o indutor dessas conversas. Segundo, se tiver algum problema, tem que ter a fiscalização do Ministério do Trabalho. Se for necessário fazer uma lei, nós mesmo proporemos a lei, o movimento sindical propõe ou a bancada de sustentação propõe, mas o que eu vou te dizer é isso: nós vamos abrir uma nova etapa de discussão para humanizar o mundo do trabalho no setor do álcool e do açúcar no Brasil.
JORNALISTA MARCOS ROBERTO SILVA - REDE TV: Obrigado, Presidente.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes do Fernando Rodrigues, da Folha de São Paulo, fazer a sua pergunta, eu queria chamar o Fábio Pannuzio, da Band/BandNews, a ocupar este microfone.
JORNALISTA FERNANDO RODRIGUES - FOLHA DE SÃO PAULO: Presidente, eu queria fazer uma pergunta sobre a crise aérea. Teve um acidente trágico no ano passado, que levou 154 vidas. Agora, mais de meio ano depois, quem utiliza os serviços aéreos no Brasil ainda sente os efeitos dessa crise, com atrasos recorrentes, às vezes mais, às vezes menos, mas a situação ainda não se normalizou. Durante a sua campanha eleitoral em 2006, o senhor usou, entre outros elementos da sua campanha, as obras nos aeroportos em todo o País, realizadas pela Infraero. A Infraero é uma estatal federal, este ano a gente está conhecendo os seus números, e ela teve um aumento de mais de 200% no gasto de propaganda que fez sobre as obras que realiza em relação ao governo anterior. A pergunta para o senhor é a seguinte: durante a sua campanha eleitoral em 2006, o senhor foi informado pelos seus assessores ou sabia que talvez os investimentos realizados no setor aéreo eram insuficientes para deixar o País precavido de uma eventual crise com o setor de controle aéreo?
PRESIDENTE: Fernando Rodrigues, eu penso que para a gente ser justo, precisamos separar essa pergunta em várias outras perguntas. Não vamos confundir o acidente do avião da Gol com o Legacy como um problema dos aeroportos, até porque eles se chocaram no ar. Vamos ver o que aconteceu. Eu não tenho ainda o resultado final da investigação e nem deveria ter porque me parece que, depois de tudo que foi feito aqui, eles ainda têm que mandar para uma comissão especial não sei de onde. E nessas coisas eu penso que a gente não deve ficar adivinhando o que aconteceu. Nós tivemos um acidente, por conta desse acidente tivemos acusações de vários lados e, depois dessas acusações, o resultado foi que houve uma insatisfação nos setores de controladores, nos setores de manutenção, e nós começamos a ter problemas nos aeroportos brasileiros, ainda não ligados às pistas ou às obras brasileiras, mas ligados pura e simplesmente a um sistema de controle aéreo no Brasil.
Eu mesmo fiz várias reuniões com o comandante da Aeronáutica, com o Ministro da Defesa. Detectávamos um problema, consertávamos o problema e tinha outro. Chegamos à conclusão de que tinha um problema de gestão, que era preciso mudar essa questão. E depois percebíamos que o problema era mais complicado porque os controladores, o aumento que eles queriam ter, a gente não podia dar, porque além de ser controladores, eram sargentos e nós deveríamos estender o aumento para todos os sargentos do Brasil, das três Forças, o que era impossível fazer
Bem, aí começa a discussão se eles vão ser militares se vão ser civis, que vocês acompanharam e publicaram. E a divergência foi: vamos discutir se são civis ou militares. E a conclusão é a seguinte: eu estava em Washington quando chegou aquele momento da greve deles. Às 10h da noite, em Washington, liguei para o ministro Paulo Bernardo e falei: Paulo Bernardo, acabe com essa greve, não quero greve aí porque as pessoas já estão sofrendo muito, é preciso respeitar os usuários. O Paulo Bernardo foi lá e disse que ia negociar e assumiu o compromisso de não puni-los. E isso nós cumprimos. Eles não foram punidos por nós, estão sendo investigados por IPM, pela própria Aeronáutica. Uma coisa de que eu não tinha conhecimento prático, eu não sou controlador, portanto, não sei o que acontece dentro da sala de controle ou do Cindacta. Eu não sou especialista. O que fiz? Eu chamei o comandante da Aeronáutica, o brigadeiro Saito, e falei: brigadeiro, este é um problema seu, resolva com os controladores, não dá para ficar nessa discussão. E até agora está mais ou menos tranqüilo.
Agora é importante, Fernando, que a gente atente para uma coisa. Nós tivemos um problema no Brasil que, muitas vezes, não é levado em conta, que foi a crise da Varig. A Varig, que era a maior empresa brasileira, deixou de existir e os aeroportos ficaram quase órfãos de uma empresa dessa magnitude, aqui e fora do País. Depois, nós temos um crescimento de passageiros do turismo da ordem de 20% ao ano. Nós estamos vendo as promoções que as empresas estão fazendo. Um dia desses até me assustei: R$ 90 uma passagem para o cidadão vir a Brasília. Aí descobrimos o overbooking que a TAM fez no final do ano passado. Então, houve um conjunto de coisas que foram criando um problemão de magnitude quase incontrolável.
Eu penso que estamos resolvendo tudo isso que aconteceu, vamos resolver com tranqüilidade. Faz algum tempo que está tranqüilo e vamos resolver o problema dos aeroportos brasileiros. Estamos com obras contratadas em quase todos os aeroportos. Para não ficar prejulgando ninguém vamos ver o seguinte: quando foi inaugurado o aeroporto de Cumbica, em São Paulo, ele foi construído exatamente para tirar os aviões do centro de São Paulo, portanto, do aeroporto de Congonhas. Quando foi construído o aeroporto de Confins, ele foi construído para tirar os passageiros do aeroporto da Pampulha. Quando foi construído o Galeão, foi para tirar a quantidade de vôos do aeroporto Santos Dumont. O que aconteceu, na verdade? Os vôos que, três ou quatro anos após a inauguração de Cumbica, tinham sido transferidos para Cumbica, foram voltando gradativamente. E hoje, por exemplo, Congonhas, de lá saem aviões para toda parte do Brasil, quando antes era só para ponte aérea. Então, você tinha a mesma pista que havia há 30 anos atrás. Obviamente que vai ter problema.
Então, nós vamos continuar reformando os aeroportos brasileiros. No final do mês vou reinaugurar o aeroporto de Santos Dumont. Estamos fazendo obras em todos os Estados brasileiros e vamos continuar fazendo. E, naquele que for necessário, vamos tentar fazer uma terceira pista. Eu vou dar um exemplo para você, que é paulista também. Quando foi inaugurada a rodovia Bandeirantes, lá para os idos de 1970, quando foi inaugurada a faixa do meio, que vai até Campinas, ela foi deixada para que fosse construído um trem-bala ligando o aeroporto de Viracopos ao centro de São Paulo. Não tem nem o trem-bala, nem a ferrovia, nem foi modernizado o aeroporto de Viracopos. Então, nós estamos sendo vítimas da falta de planejamento histórica neste País, e nós agora temos que recuperar e criar condições para os aeroportos funcionarem. Se em algum momento a Infraero gastou dinheiro a mais em publicidade, ora, tem um monte de instâncias para julgá-la. Sobre a publicidade, eu li uma carta que o Franklin mandou para a Folha de São Paulo explicando isso.
No mais, vamos continuar trabalhando nos aeroportos brasileiros, porque eles precisam. E hoje, o tráfego aéreo é tão intenso que, se a gente quisesse fechar Congonhas e mandar todo mundo para Cumbica, Cumbica não teria condições de suportar, porque precisa também de uma terceira pista. E nós precisamos arrumar um dinheirinho e colocar um novo PACzinho para poder fazer. É assim que a gente vai consertar para você viajar mais tranqüilo, entre o Rio e São Paulo, sem problemas.
JORNALISTA FERNANDO RODRIGUES - FOLHA DE SÃO PAULO: Só uma pequena observação, à qual eu gostaria que o senhor se referisse O senhor estava há quatro anos na Presidência da República e esse episódio da crise ocorreu no final do seu primeiro mandato. Eu queria que o senhor dissesse: se houve alguma falha gerencial ou administrativa para que o senhor não fosse informado desse problema, que apareceu como se fosse do nada.
PRESIDENTE: Eu vou dizer uma coisa: quando eu digo que a história vai julgar, é porque quando há julgamentos precipitados a gente cria confusão desnecessária. Quando aconteceu o acidente aéreo, a primeira coisa escrita neste País, era que tinha um apagão aéreo entre o Estado do Pará e o Estado do Amazonas. E foi no meio do apagão que aconteceu o acidente. Ora, se tinha um problema de apagão, supõe-se que os culpados eram os controladores, ou seja, julgamento precipitado ao dizer que tinha um apagão; julgamento precipitado em culpar os controladores. Então, o que um presidente da República tem que fazer? Ao invés de ficar dando opinião sobre o que aconteceu, eu prefiro esperar o resultado final das investigações. Eu, teoricamente, fui informado pela Aeronáutica de que não tinha apagão. O que pode ter havido foi desobediência à ordem de vôo. Eu sou, Fernando, até pelo cargo que exerço, prudente em não condenar, a priori, ninguém. Se daqui a alguns dias tiver o resultado final, vocês todos da imprensa serão os primeiros a saber o que aconteceu, sem o intuito de punir quem quer que seja mas com o intuito de informar a opinião pública brasileira do que aconteceu. E aí a justiça vai cuidar do resto. É assim que tem que ser o procedimento.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes do Fábio Pannunzio, da TV Bandeirantes, fazer a sua pergunta, eu queria chamar Zileide Silva, da TV Globo, para ocupar o microfone de lá.
JORNALISTA FÁBIO PANNUNZIO - BAND/BAND NEWS: Presidente, bom dia. Tudo bem? Presidente, a gente não tem nenhuma dificuldade em entender o cenário que o senhor apresenta para a gente quando se refere, por exemplo, aos resultados da economia. Os números falam por eles mesmos: 125 bilhões no caixa, 40 bilhões de superávit comercial e todos os outros dados que o senhor citou aqui, um novo status de confiabilidade. Então, o País que o senhor projeta aqui é um país que vai muito bem, seguindo seu rumo, essa coisa toda, e a gente acredita nisso. Eu gostaria de saber do senhor qual é a dificuldade que o senhor tem em explicar a mesma coisa ao Copom, do Banco Central, que ainda continua cobrando juros de agiota, quer dizer, os juros mais caros do mundo, juros além dos da Turquia. Qual é o problema?
PRESIDENTE: Fantástico. Uma coisa engraçada é o seguinte: faz quanto tempo que vocês, da imprensa, não vêem uma faixa na rua "Fora FMI"? Não vêem. Ora, eu não quero interferir no Copom porque eu acredito que, quanto mais autonomia tiver o Banco Central, melhor é para o País, e eu acho que não precisa mandar uma lei para o Congresso Nacional estabelecendo essa autonomia. Eu quero mostrar que é possível um presidente da República, responsável, não ter ingerência nas decisões do Banco Central, quando se trata de discutir assuntos da política monetária brasileira, para o bem ou para o mal. Quero lembrar a vocês que faltava um mês para a eleição para a prefeitura de São Paulo, em 2004, e os juros aumentaram. Não pensem que eu não recebi dezenas de telefonemas: "Presidente, pelo amor de Deus, interfira, fale com o Meirelles, não deixe os juros subirem". Meu caro, não seriam as eleições de São Paulo que iriam me fazer ter um comportamento inadequado, como não seria a eleição do Brasil que iria me fazer ter um comportamento inadequado. Meus adversários falavam todos os dias: "não, porque os juros estão altos, porque os juros estão altos". Sabe por quê? Porque, quando as pessoas viram oposição, elas colocam uma tapa nos olhos e se esquecem de quanto eram os juros quando elas governaram este País.
Então, hoje, eu estou convencido de que nós temos a taxa de juros mais baixa dos últimos anos, com tendência - tendência não, porque o nome não é bonito - com viés de baixar, é assim que o Banco Central fala, e nós vamos baixando, mês a mês, ou seja, a cada 45 dias vamos baixando, baixando, sem que haja tensão pré-Copom como existia há algum tempo. Nada de tensão pré-Copom. Vamos manter o Banco Central funcionando do jeito que está funcionando, as coisas estão bem, a economia está crescendo vai crescer mais ainda, vai gerar mais empregos e o juro vai cair, o juro vai chegar a um patamar que, eu diria, é aquele que todo mundo sonha: juros compatíveis com os juros internacionais de países com quem o Brasil compete. Esse é o nosso desejo. Agora, sem fazer nenhuma estupidez, nenhum ato de bravata. A inflação está controlada "Meireles, o negócio é o seguinte: baixa logo três pontos, os juros". Não vou fazer isso, porque, durante 27 anos da minha vida vivi recebendo salário e eu sei que quando a inflação aumentar, o prejudicado sou eu. E mais prejudicados ainda serão os trabalhadores que ganham o salário mínimo, os que recebem o Bolsa Família ou os que recebem auxílio-doença. Então, a partir do controle da inflação, a partir da estabilidade econômica, a partir da seriedade fiscal, o juro vai caindo.
E como você é muito jovem e eu pretendo viver o meu mandato inteiro aqui, você vai perceber que vai chegar um dia em que você não vai me fazer mais nenhuma pergunta de juros. Eu quero saber quando a gente não tiver mais problema de juros, não tiver mais problema de crescimento econômico, qual será a pergunta que vocês farão para mim?
JORNALISTA FÁBIO PANNUNZIO - BAND/BANDNEWS: Como esse dia não chegou ainda, Presidente, eu tenho uma complementação.
PRESIDENTE: Já chegou. Eu pergunto se você viveu algum momento em que a economia esteve tão bem organizada como está agora.
JORNALISTA FÁBIO PANNUNZIO - BAND/BANDNEWS: Eu estou dizendo que eu vejo o cenário, mas que tenho muita dificuldade em entender como é que o Banco Central não enxerga isso. Mas eu não quero discutir com o senhor.
PRESIDENTE: Ele enxerga. Mas se você for ao BNDES e pegar juros a 6,5%, não vai pagar a taxa Selic. Se você for buscar dinheiro em dólar, você vai pagar cinco vezes menos que a taxa Selic. Então, não tome dinheiro emprestado com base na taxa Selic, procure outras fontes de financiamento que o próprio governo oferece.
JORNALISTA FÁBIO PANNUNZIO - BAND/BANDNEWS: Presidente, só para complementar, me parece que o status a que o Brasil chegou não combina muito com essa condição de política monetária. O senhor disse o seguinte: "eu não vou ligar para o Meirelles para pedir 3%". Mas não dá vontade?
PRESIDENTE: Dá. Oh, rapaz, dá vontade, mas eu estou convencido de que nós estamos no caminho certo. Agora, isso aqui é como se fosse uma maratona, eu estou vendo a faixa de chegada lá. Eu já estou atingindo a minha perfeição e posso chegar em primeiro lugar. Se eu me meter a forçar um pouco o ritmo, eu posso ter uma distensão e cair antes de chegar em primeiro lugar, ou pode aparecer um daqueles caras que segurou o brasileiro lá e não deixou ele chegar na frente. Então, vamos devagar que eu pretendo entregar para você, no final do meu mandato, o País mais sólido que você já viveu em toda a sua vida.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes da Zileide Silva, da TV Globo, fazer a pergunta, eu queria chamar a Tânia Monteiro, do Estadão, para ocupar este microfone.
JORNALISTA ZILEIDE SILVA - TV GLOBO: Bom dia, Presidente. Governadores e prefeitos reclamam muito dos rigores da Lei de Responsabilidade Fiscal e das regras de rolagem da dívida. Agora o equilíbrio fiscal é apontado por muitos especialistas como a principal, como a maior conquista da economia brasileira nos últimos anos. No entanto, nos últimos meses, alguns ministros acenaram com a possibilidade de mudanças para aliviar esse aperto. Que tipo de mudança, presidente, o senhor poderia oferecer, se é que o senhor concorda com alguma mudança, sem comprometer o equilíbrio fiscal?
PRESIDENTE: Você sabe que a perfeição do ser humano e a perfeição dos entes federados acontece exatamente quando uns querem dar mais, outros querem dar menos, um exige mais e outros exigem menos. Primeiro, eu quero dizer para você que é normal que os governadores queiram mais dinheiro e queiram mais capacidade de endividamento.
Também é importante encarar como a coisa mais normal do mundo o tesoureiro do País sentar em cima do dinheiro e falar: "aqui ninguém tasca", é assim. Se eu pegar um governador que quer aumentar a sua capacidade de endividamento e colocá-lo na Fazenda, na semana seguinte ele estará sentado em cima do cofre, com o mesmo discurso que o Guido está fazendo hoje, porque é da prática e da responsabilidade de quem cuida de finanças. Isso você pode pegar pela sua mãe, na sua casa, que certamente é quem cuida das finanças, ou pela mãe de cada um, é ela quem diz para o filho: "eu não vou dar o dinheiro, você está pedindo 20, você vai ter 10; você está pedindo 10, vai ter 5", e de vez em quando, o pai tenta afrouxar do outro lado. Então, esses exemplos, e todo mundo entende o que eu estou falando, é o que acontece na economia brasileira.
Os governadores querem aumentar a sua capacidade de endividamento. Eu sou favorável por quê? Porque nós temos duas leis. Nós temos uma lei que é anterior à Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece a regra que estamos impondo aos governadores hoje. E a Lei de Responsabilidade Fiscal tem uma flexibilidade maior. Ora, o nosso desafio é fazer esse ajuste sem permitir que, ao criar condições para que um prefeito ou um estado tenha um pouco mais de capacidade de investimento, a gente volte a permitir a famosa "farra do boi", que acontecia neste País durante séculos e séculos, em que os Estados deviam quatro ou cinco vezes o que arrecadavam, e os governadores, num mandato de quatro anos, faziam dívidas que precisaria 20 anos para pagar. Essa irresponsabilidade não voltará mais. Posso te afirmar, Zileide, que essa irresponsabilidade não voltará, mas ao mesmo tempo eu tenho idéia de flexibilizar um pouco.
Só quero discutir com o Guido, com o Paulo Bernardo e com os governadores qual é o limite dessa flexibilização, sem criar nenhum problema futuro para este País. Esse negócio de endividamento é como cartão de crédito: se as pessoas têm que colocar a mão no bolso e tirar um centavo para gastar, contam até 10; mas se não têm que tirar, usam o cartão de crédito, se estão no exterior, vão só passando o cartãozinho na máquina, esquecendo-se de que um dia têm que pagar. E quando vão pagar é que descobrem a desgraça que foi feita. Nós não iremos permitir isso.
Eu quero fazer um acordo com os governadores, quero ver o limite das possibilidades que nós podemos acertar com eles, mas sem permitir que as pessoas voltem às gastanças tradicionais neste País.
JORNALISTA ZILEIDE SILVA - TV GLOBO: Também não tem um prazo, não é Presidente, para esse ajuste?
PRESIDENTE: Tudo isso tem prazo, eu não posso dar uma data para você, Zileide, porque eu tive uma reunião no dia 6 de março, houve uma proposta de que nós voltássemos a nos reunir a cada quatro meses. Teoricamente, essa reunião seria até o dia 6 de julho. Eu não sei se será antes ou não, o Guido está preparando. Na semana que vem, eu vou conversar com o ministro Guido Mantega e na hora em que estiver pronto, nós vamos chamar a comissão de governadores, vamos discutir e ver se estamos prontos para fazer uma nova reunião.
JORNALISTA ZILEIDE SILVA - TV GLOBO: Obrigada, Presidente.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Antes da Tânia Monteiro, que é a penúltima a fazer a sua pergunta, eu queria chamar a Carla Corrêa, do Jornal do Brasil, para ocupar o outro microfone.
JORNALISTA TÂNIA MONTEIRO - O ESTADO DE SÃO PAULO: Presidente, têm-se falado muito da aproximação do PT com o PSDB, do governo com o PSDB. Eu queria saber do senhor o que há de concreto em relação a essa aproximação; se ela, por exemplo, pode levar o senhor a apoiar o Aécio em 2010 e, quem sabe, já que o senhor disse que não tem 2010 para o senhor, poderá voltar em 2014, seria possível?
PRESIDENTE: Eu não posso contar a história para vocês, mas eu me lembro que o Juscelino Kubitschek, quando deixou a Presidência da República, sonhava que cinco anos depois ele voltaria pelos braços do povo e foi cassado. Não voltou nunca mais.
Eu não trabalho com a hipótese de voltar à Presidência da República. Primeiro, eu tenho que cumprir o meu mandato que está no começo. Então, só cinco minutos de insanidade é que me permitiriam ficar discutindo oito anos para a frente. Segundo, eu acho que um ex-presidente da República precisa virar conselheiro dele mesmo. Um ex-presidente da República não pode ficar dando palpite. Se for chamado para alguma coisa, diga o que pensa, mas ele precisa parar. Depois que você chegou aqui, você não tem nada mais alto do que isso, é o máximo. Então, você se recolhe, vai cuidar da família, vai cuidar dos netos, vai fazer conferência, vai fazer alguma coisa. Bom, eu penso assim.
Agora, com relação à candidatura do PSDB, eu sempre tive uma boa relação com o PSDB. Eu não gosto de voltar à história, mas é importante lembrar que, em 1994, se não fosse o Plano Real o PSDB teria indicado o vice na minha chapa, e não foram poucas as reuniões que nós fizemos para que isso acontecesse. Depois, veio o Plano Real, ele foi uma novidade importante para o País, e aí o PSDB teve candidato e ganhou as eleições de mim. Eu mantenho relações muito boas com muita gente do PSDB, com o Serra, com o Aécio, com o Tasso Jereissati e com outros membros do PSDB. Ora, se em algum momento eles radicalizaram e criaram mais transtorno do que deveriam criar, é um problema de avaliação deles. Nós disputamos as eleições e eles detectaram que o povo não estava combinado com aquilo que eles tentaram fazer com o governo. Isso não impediu, em nenhum momento, que eu tivesse disposição para conversar com o PSDB e vou continuar conversando.
Agora, a partir daí, Tânia, a gente dá um passo adiante e diz: "o candidato pode ser do PSDB?" Eu só posso te dizer o seguinte: a base do governo terá candidato. Quem vai ser? Não sei. É tão cedo. Nós vamos ter, no ano que vem, eleições para prefeito, e cada eleição nas capitais é quase uma eleição nacional. Vamos aguardar para ver. Eu só posso te garantir que a base do governo terá candidato e eu espero estar com saúde plena e com credibilidade na sociedade para fazer campanha em palanques espalhados por este País afora. Agora, vamos ver qual é o comportamento do PSDB nisso tudo.
Eu acho que muita coisa vai acontecer no Brasil para melhor. Acho que o PFL vai deixar de ser tão nervoso, acho que as pessoas vão aprendendo que o povo não quer saber de muita confusão, o povo quer que o País dê certo. A única coisa que o povo deseja é que a gente tenha a responsabilidade de fazer o Brasil dar certo. O povo quer comer mais, quer estudar mais, quer morar bem, quer ter mais segurança. É esse o desafio que está colocado para nós e essa é a proposta que eu tenho para os companheiros da situação e da oposição.
O PAC está aí, o PDE está aí e outras medidas vão sair para que a gente possa ordenar, aproveitar este momento em que o ódio não predomina na política brasileira para tentar criar as condições de o Brasil melhorar ainda mais, melhorar os indicadores sociais melhorar a questão da educação, porque nós vamos fazer uma revolução na educação brasileira, pode acreditar. Nós vamos fazer coisas, eu diria, que há muitos e muitos anos não são feitas neste País, porque nós conquistamos este momento de fazer isso.
Então, se você quiser, eu posso definir que daqui para frente eu serei um grande conversador, não conservador. Conversador, e aí vale para todas as forças políticas.
JORNALISTA TÂNIA MONTEIRO - O ESTADO DE SÃO PAULO: E ainda dá para conversar com o presidente Fernando Henrique?
PRESIDENTE: De vez em quando, eu vejo o presidente Fernando Henrique Cardoso dizer que eu não o convidei. É importante lembrar que ele também só me convidou depois que eu fui derrotado em 1998, e eu sempre tive relação de amizade com o Fernando Henrique Cardoso. Eu não tenho por que não conversar com ele. Se ele acha que eu errei em não convidá-lo, não será por falta de convite que a gente não vai conversar. Obviamente que nós acabamos de sair de uma eleição, eu também não quero que ninguém venha conversar comigo, achando que está capitulando, eu não quero isso. Eu quero respeitar o direito do PSDB ser oposição, quero respeitar o direito deles fazerem as críticas que tiverem que fazer, mas também quero que eles respeitem a vontade que eu tenho de tê-los como adversários e não como inimigos.
MINISTRO FRANKLIN MARTINS: Agora, Carla Corrêa, do Jornal do Brasil, fará a última pergunta.
JORNALISTA CARLA CORRÊA - JORNAL DO BRASIL: Presidente, em 2005, na primeira coletiva que o senhor deu, em que o senhor conversou com a gente nesse formato, o senhor falou da importância que seria juntar o governo federal com os governos estaduais, com os municípios, para desenhar uma estratégia de combate à violência. Dois anos se passaram, desde então, e as mais enérgicas demonstrações de força nesse sentido vieram do outro lado, do crime organizado. A gente teve ondas de criminalidade crescente no Rio de Janeiro, em São Paulo. A primeira vez que o senhor falou, o senhor estava se referindo ao Rio de Janeiro. E eu queria saber do senhor o que está faltando. Onde foram parar aquelas políticas que o senhor sempre defendeu, de empregabilidade do jovem, a escola em tempo integral para manter o jovem longe da violência? O que faltou, nesses dois anos que se passaram, já que o governo ainda não conseguiu dar uma resposta efetiva para a violência? Hoje dia, de qualquer forma, é um ponto fraco do seu governo, as pesquisas de opinião pública dizem isso. O povo está insatisfeito com essa questão da segurança pública. O que faltou para dar essa resposta até agora?
PRESIDENTE: Primeiro, vamos colocar as coisas no seu devido lugar. Hoje, com muito mais tranqüilidade que ontem e, quem sabe amanhã com mais tranqüilidade do que hoje, na questão da segurança pública, o governo federal não é o foco principal, nós somos a força auxiliar do sistema de segurança pública que é, majoritariamente, controlado pelos governos dos Estados.
Você sabe que, com exceção da polícia federal, que muitas vezes para entrar em determinado tipo de coisa que acontece no estado, tem que pedir autorização, normalmente a ação é da polícia estadual e da polícia civil. O governo federal só entra quando é pedido, como entramos no Espírito Santo, como entramos no Rio de Janeiro. Agora mesmo o governador Sérgio Cabral pediu e nós fomos lá para que ele colocasse no papel as coisas que eles precisavam do governo federal para que a gente não tivesse uma ação que fosse considerada intervenção no Estado
Eu sei que o problema da segurança é delicado, eu sei que o problema da segurança envolve, sobretudo, uma parte da juventude brasileira com a qual nós estamos trabalhando. Não foram poucas as coisas que criamos para a juventude brasileira. Nós criamos a Secretaria Nacional, criamos o Conselho da Juventude, temos programas da juventude atendendo quase 900 mil jovens, pagando auxílio, uma ajuda de custos, seja no ProJovem, seja no Escola de Fábrica, seja no Consórcio da Juventude, seja no Soldado Cidadão, para que esse jovem possa voltar a estudar.
Eu tenho consciência, e foi um dos assuntos que conversei com o papa, que nós vamos precisar não apenas discutir a questão da juventude, mas discutir também a questão da família brasileira, porque eu acho que há um processo de desagregação da estrutura social a partir da desagregação da estrutura familiar em muitos lugares deste País.
E o ministro Tarso Genro vai, até o final do mês, me apresentar as diretrizes para um novo programa de segurança pública, que só pode dar resultado se for feito combinado com os governadores e, portanto, combinado com a nossa Secretaria de Segurança Nacional, com as secretarias de segurança de cada estado. Eu acho que é um conjunto de coisas que precisamos fazer e a primeira delas é tentar recuperar a juventude brasileira, recuperar, sobretudo, aquele estoque que está aí e é resultado de toda a política dos anos 80, jovens de 24, 20 anos, que estão sem estudar, que estão desempregados. É um estoque muito grande, nós podemos cuidar com muito mais facilidade das crianças de hoje para quando virarem adolescentes, não caírem na criminalidade ou no banditismo. E nós precisamos trabalhar com todas as forças da sociedade. E eu digo: o Estado não tem competência de resolver esse problema sozinho, é preciso envolver todas as forças da sociedade brasileira, todos os entes federativos, tudo que é órgão da sociedade estar organizado para que a gente dê uma resposta a essa questão da juventude brasileira. E a questão da violência não está só ligada à questão da juventude. É uma questão de tempo você combater o crime organizado, estar melhor preparado, investir mais na inteligência. Nós estamos fazendo.
Quando chegar o PAN, nós vamos ter um modelo de uma coisa que está sendo preparada para os Jogos e que vai ficar no Rio de Janeiro depois que terminar o PAN. Então, o Rio poderá virar uma espécie de início da virada na política de segurança pública do nosso País, sabendo que por mais que a gente fizer, vamos levar muitos anos para resolver o problema da segurança pública no Brasil, que está ligado a outros fatores, a começar pelos problemas sociais. E não apenas os problemas sociais, as condições de moradia, a qualidade da convivência que as pessoas estão tendo no seio familiar e também o tratamento que o Estado tem que dar aos lugares que mais precisam da sua presença.
Por isso é que no PAC colocamos, dos 40 bilhões de reais que estamos destinando para saneamento básico e urbanização de favelas, estamos priorizando as regiões metropolitanas, que são consideradas as mais nervosas do País. É ali, naquele espaço, que não tem escola, não tem o poder público, não tem saúde, que o cidadão se vê abandonado pelo Estado brasileiro. Então, vamos começar com essa experiência na região metropolitana para ver se a gente consegue, não só gerar emprego, mas melhorar a vida e criar as condições de o Estado estar presente nos lugares onde até agora esteve desaparecido. E quando o Estado desaparece, o crime organizado aparece, o narcotráfico aparece, oferecendo coisas que o Estado brasileiro poderia oferecer. É uma tarefa difícil, não é fácil. Portanto, não vale mais qualquer político fazer discurso fácil com relação à segurança pública, porque todos que fazem discurso fácil, são desmentidos três meses depois das eleições.
Eu vi um jovem nos Estados Unidos fazer o que fez em uma escola, matar 32 jovens, e fico imaginando que o problema não é só de segurança pública, o problema também é da qualidade da formação do ser humano que estamos recebendo no mundo, do que estamos dando.
JORNALISTA CARLA CORRÊA - JORNAL DO BRASIL: O que vai acontecer, então, no Pan, vai ser uma espécie de carta de apresentação, um laboratório do que vai ser a política de segurança pública?
PRESIDENTE: Eu não utilizaria o termo carta de apresentação. Eu diria que é uma experiência que estamos fazendo, possivelmente a mais importante na área de segurança pública, e que não tem sentido fazer apenas para dar garantia ao Pan, mas para ficar no Rio de Janeiro depois que os nossos atletas forem embora. E dali quem sabe, a gente ter formado, com a participação da sociedade civil... você está lembrada que eu fui ao Rio de Janeiro participar de um evento com mais de 10 mil jovens que estão se preparando para ajudar a tomar conta de todos os problemas que envolvem, inclusive, a segurança no Rio de Janeiro. Eu estou convencido de que uma parte do problema se dará com a melhor formação do nosso povo.
FRANKLIN MARTINS: Carla, muito obrigado pela sua última pergunta Foi a décima quinta pergunta. Eu queria agradecer em nome da Secretaria de Imprensa da Presidência, a participação de todos vocês. Não sei se o Presidente ainda quer falar sobre algum assunto que ficou fora.
PRESIDENTE: Não, quero só agradecer a vocês. Acho que vale a pena fazer isso. O Franklin, portanto, está incumbido de fazer o que outros não puderam fazer, por minha causa. Como eu já disse a vocês, estou muito mais flexível neste segundo mandato. Aproveitem. Muito obrigado."
Fonte: Tribuna da Imprensa

Greve de servidores é comparada a férias

BRASÍLIA - Greve de servidor público não pode ser feita como se fosse greve de trabalhador de fábrica. Para estabelecer essa diferença e não permitir que os funcionários façam greves de até cem dias como se estivessem "de férias", o presidente Lula confirmou ontem que o governo vai encaminhar ao Congresso um projeto de Lei Complementar para regulamentar as paralisações no serviço público.
"Eu quero apenas responsabilizar o direito de greve". Lula confirmou, durante a entrevista coletiva concedida ontem no Planalto, que o governo vai fazer a regulamentação e, ao mesmo tempo, garantir o direito do contrato coletivo de trabalho da categoria.
O presidente disse que, como ex-líder sindical, que comandou tantas greves históricas no País, não se sente constrangido de apresentar este tipo de proposta, porque entende que a greve no setor público "tem de ser decida com mais seriedade, sabendo que não são férias, que você vai perder os dias em que você não trabalhou".
Outro argumento do presidente em favor da regulamentação foi este: "no caso do servidor público não tem patrão e o prejudicado, na verdade, não é o governo, é o povo brasileiro", declarou ele, justificando que, no setor privado, a greve é para dar prejuízo ao patrão.
Quando há greve em hospital, transporte público e escola, por exemplo, afirmou, "quem sai perdendo é a parte pobre da população". O projeto de regulamentação do direito de greve, preparado pelo governo está sob análise da Casa Civil, desde segunda-feira.
Ontem, na entrevista, Lula garantiu que o seu texto será discutido com as centrais sindicais. Só que, desde já, advertiu que "o que não é possível, e nenhum brasileiro pode aceitar, é alguém fazer 90 dias de greve e receber os dias parados, porque, aí, deixa de ser greve e passa a ser férias".
"Proibir, não"
Segundo Lula, não é intenção do governo proibir greve de funcionários públicos. "Nós não queremos proibir que haja greve, pelo contrário", comentou o presidente, reiterando que vai discuti-lo com as centrais sindicais "porque no nosso governo as coisas são discutidas com quem de direito".
E justificou: "nós queremos, ao mesmo tempo em que discutimos esse assuntos com eles, regulamentar também o contrato coletivo de trabalho para garantir ao servidor público que ele seja tratado democraticamente como qualquer servidor é tratado em qualquer parte do mundo".
Ao criticar as longas greves no serviço público, Lula afirmou que é preciso "responsabilizar" o direito de greve. "Todos nós temos direito de fazer greve, mas todos nós sabemos que a gente pode ganhar ou pode perder. Um jeito de você decidir fazer greve com mais seriedade é você saber que não são férias, que você vai perder os dias em que você não trabalhou", afirmou ele, acrescentando que, "afinal de contas, você ganha pelos dias que você trabalha e não pelos dias que você fica em casa".
Depois de reiterar que sempre discutiu com os "seus companheiros servidores públicos que a greve no setor público não deveria ser feita como se faz a greve numa fábrica", Lula insistiu que está querendo regulamentar tanto o direito de greve quanto o direito dos trabalhadores na sua contratação coletiva do trabalho.
"Longe de mim prejudicar algum trabalhador, mas, também, longe de mim não fazer as discussões sérias que este País tem que fazer", avisou.
Ibama
O presidente aproveitou para criticar ainda a greve dos servidores do Ibama, deflagrada em protesto contra divisão do órgão em dois, separando o que é licenciamento daquilo que é preservação ambiental.
"Por que o Ibama está em greve? Houve redução do salário do Ibama? Alguém foi mandado embora? Alguém foi trocado de função? Não. Apenas porque a ministra (Marina Silva, do Meio Ambiente) deu um sinal de que, depois de tantos anos de existência do Ibama, era preciso que houvesse uma modernização do Ibama", desabafou, ressalvando que compreendia que todas as pessoas têm medo de mudanças.
Fonte: Tribuna da Imprensa

Base está dividida sobre candidatura única

BRASÍLIA - A afirmação do presidente Lula sobre a candidatura única provocou divergências na base. O deputado petista Cândido Vaccarezza (SP) pregou uma candidatura do PT à sucessão de Lula. "O presidente está no papel dele de defender a continuidade do governo. Acredito que o melhor caminho é que o nome seja do PT, porque é o partido que reúne as melhores condições de manter unida a coalizão. Temos bons nomes e eu destaco a ex-prefeita e ministra Marta Suplicy", afirmou Vaccarezza.
Lula falou em candidato único no momento em que o bloco governista PSB-PDT-PCdoB na Câmara avança na idéia de uma candidatura própria em 2010 e tem como principal opção o ex-ministro e deputado Ciro Gomes (PSB-CE). "Meu bloco está na mesma perspectiva do presidente", afirmou Ciro, sem, no entanto, falar em projeto pessoal.
"Sou capaz de citar uns 20 nomes (de presidenciáveis)", brincou o ex-ministro. "O presidente está sinceramente empenhado em bem governar e essa discussão estéril e impertinente, para ele, só atrapalha. Ele diz que não será candidato para encerrar essa especulação cruel", disse Ciro, duas vezes candidato a presidente, em 1998 e 2002.
O deputado acredita, no entanto, que "existe um favoritismo natural do outro lado (oposição), por causa da possível união Minas Gerais-São Paulo", referindo-se aos governadores tucanos Aécio Neves e José Serra. Sobre a possibilidade de uma aproximação de Aécio com o PT, Ciro comentou: "Aí, ficaria muito melhor."
Diplomático, um dos vice-líderes do governo na Câmara, Henrique Fontana (RS), disse que o momento não é de discutir nomes, mas de "consolidar a coalizão". "O presidente sabe que o PT tem força e candidatos em condições de presidir o País, mas não podemos ter arrogância", afirmou.
Na linha de não provocar atrito com os aliados, Fontana citou Ciro Gomes como um dos possíveis candidatos. O petista acrescentou outras alternativas, todas do PT: "O Tarso Genro, o Patrus Ananias, a Marta, a Dilma Rousseff, o Jaques Wagner."
Fonte: Tribuna da Imprensa

Lula: vão ter de engolir críticas

BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, em sua primeira coletiva no segundo mandato, que muitos oposicionistas e críticos "vão ter que engolir" o que disseram sobre seu governo. Ao responder a uma pergunta sobre fato de ter nomeado para os cargos de ministros da Integração Nacional e de Ações de Longo Prazo, respectivamente, o deputado Geddel Vieira Lima (PMDB) e o professor de Harvard Mangabeira Unger, que sempre o criticaram, Lula afirmou que o passado não pode ser uma "espada" que impeça as pessoas de evoluírem.
"Muito gente vai ter de engolir o que disse do governo. Com muita tranqüilidade: nada como o passar de algum tempo para as coisas irem se acertando." Em tom descontraído, o presidente citou, mais uma vez, a expressão "metamorfose ambulante", do roqueiro Raul Seixas, para justificar o fato de estar agora se aliando a antigos adversários. "Temos que ser uma metamorfose ambulante, nos aprimorando sempre."
Lula disse que, apesar das mudanças, mantém as mesmas posições do passado: "Eu continuo o mesmo Lula de 2003." Em referência à escolha do peemedebista Geddel para ser ministro, ele disse que toda aliança política tem um preço e que queria o PMDB "como um todo" no governo, e não um partido "fracionado". "O presidente não governa com as forças que gostaria, mas com as forças vivas da sociedade e dos partidos políticos."
Lula lembrou das três eleições presidenciais que perdeu com uma diferença de cerca de 15%. "Alguém me convenceu de que não precisava mais fazer discursos para agradar ao PT e aos 30% (do eleitorado) que sempre tive nas eleições. Eu me preparei para os 15% que faltavam."
Constituinte de obras
Sobre Mangabeira Unger, que chegou a pedir seu impeachment e a afirmar que Lula era o presidente mais corrupto da História do Brasil, o presidente disse que o professor de Harvard trabalhará em um projeto para "pensar o País até 2022", ano do bicentenário da Independência. Segundo o presidente da República, o governo apresentará ao Congresso um projeto que chamou de "uma espécie de Constituinte de obras", no qual serão definidos os projetos prioritários para o País.
Na primeira entrevista coletiva do segundo mandato, concedida seis meses depois de ganhar a reeleição, em outubro do ano passado, e ter dito que ia "melhorar a relação com a imprensa" e ter mais conversas com os jornalistas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu uma candidatura única da coalizão governista na disputa presidencial de 2010.
Os partidos aliados se mostraram animados a lançar seus próprios candidatos. "A declaração do presidente coincide com o que eu tenho dito, que é natural uma candidatura da coalizão. Eu luto para que o candidato seja do PMDB e buscarei fazer com que seja a vez do partido. O futuro vai dizer", afirmou o presidente nacional do PMDB, deputado Michel Temer (SP).
Fonte: Tribuna da Imprensa

Radicalismo do PT impediu aliança com PSDB em 1994

BRASÍLIA - A aliança entre o PSDB e o PT para a eleição presidencial de 1994 só não se viabilizou por causa do radicalismo do PT, afirmou o presidente tucano, senador Tasso Jereissati (CE), que seria o candidato a vice-presidente na chapa do petista Luiz Inácio Lula da Silva se tudo tivesse dado certo.
Ontem, em entrevista coletiva, Lula lembrou o fato e as sucessivas conversas que líderes políticos dos dois partidos fizeram na tentativa de concretizar um acordo eleitoral. "Ele só errou a data", disse o senador, revelando que os sucessivos encontros, até semanais, que mantivera com Lula ocorreram em 1992. PSDB e PT estavam afinados na CPI que investigou as denúncias de corrupção do governo Collor.
"Começou a nascer a possibilidade de uma aliança dada a essa proximidade. Esse acordo eleitoral era natural já que estávamos trabalhando juntos na CPI. Começamos a perceber que tínhamos pontos em comum", revelou Tasso, que recentemente foi recebido em audiência por Lula.
Ontem, o presidente Lula citou o nome do senador ao mencionar que tem amigos no PSDB. Outros parlamentares do PSDB confirmaram que o nome cogitado para vice de Lula era Tasso, uma liderança em ascensão no Nordeste que ocupava a presidência do partido.
No entanto, a aliança entre tucanos e petistas não vingou por conta da posição radical do PT. Inicialmente os petistas se recusaram a participar do governo Itamar Franco, após o afastamento de Collor. A petista Luiza Erundina saiu do partido para participar do ministério.
No cargo de ministro da Fazenda, o nome do tucano Fernando Henrique Cardoso começou a crescer. Ao mesmo tempo em que o PT se afastava do PSDB, o PFL, ao perceber que o Plano Real iria fortalecer o ministro, acertou a aliança com os tucanos.
O PT, por sua vez, liderou a campanha contra o Plano Real, lançado em 7 de dezembro de 1993. Mesmo entre os economistas e técnicos que formularam o programa econômico havia dúvidas sobre as condições políticas para a sua implantação. Uma reunião que varou a madrugada, realizada em Brasília, decidiu pelo lançamento do Plano Real.
Naquele momento, lembrou Tasso Jereissati, ficou claro que se o programa de estabilização desse certo, Fernando Henrique seria o candidato natural ao Planalto. "Jogamos o destino do PSDB naquele programa. E o PT virou oposição", enfatizou o senador.
Fonte: Tribuna da Imprensa

segunda-feira, maio 14, 2007

Bento 16 e a guerra na igreja

Existem duas posições claramente opostas que, na prática, podem se entrelaçar LEONARDO BOFF AS GUERRAS não existem apenas no mundo. Dentro da igreja há também uma guerra de baixa intensidade. Ela faz muitas vítimas, com os instrumentos adequados da guerra religiosa, escondidos sob palavras, não raro, piedosas e espirituais. Só para dar um exemplo pessoal: quando fui condenado pelo então cardeal Joseph Ratzinger em 1985 por causa do meu livro "Igreja: carisma e poder", foi-me imposto o que ele denominou de "silêncio obsequioso". Esse eufemismo implicava muita violência: deposição de cátedra, remoção de editor religioso da Vozes, da redação da "Revista Eclesiástica Brasileira", proibição severa de falar, dar entrevistas, escrever e publicar sobre qualquer assunto. Objetivamente "obsequioso" não possui nada de obsequioso. O mesmo ocorreu com o teólogo da libertação Jon Sobrino, de El Salvador, condenado em fevereiro deste ano. Recebeu apenas uma "notificação". Esta inocente palavra, "notificatio", esconde violência porque ele não pode mais falar, nem dar aulas, conceder entrevistas e acompanhar qualquer trabalho pastoral. O vitimado por uma condenação é "moralmente" morto, pois vem colocado sob suspeita geral, tolhido, isolado e psicologicamente submetido a graves transtornos, o que levou a alguns a terem neuroses e a um deles, famoso, perseguido por idéias de suicídio. Nós fomos, no mínimo, caçados e anulados, pois um teólogo possui apenas como instrumento de trabalho a palavra escrita e falada. E estas lhe foram seqüestradas, coisa que conhecemos das ditaduras militares. O que foi escrito acima parece irrelevante, pois é algo pessoal, mas não deixa de ser ilustrativo da guerra religiosa vigente dentro da Igreja. Nela o então cardeal Ratzinger era general. Hoje como papa é o comandante em chefe. Qual é este embate? É importante referi-lo para entender palavras e advertências do papa e a partir de que modelo de teologia e de Igreja constrói o seu discurso. Dito de uma forma simplificadora, mas real: há na igreja duas opções claramente opostas, o que não impede que, na prática, possam se entrelaçar. Face ao mundo, à cultura e à sociedade há a atitude de confronto ou de diálogo. A partir da Reforma no século 16 predominou na Igreja Católica romana a atitude de confronto: primeiro com as Igrejas protestantes (evangélicas) e depois com a modernidade. Face à Reforma houve excomunhões, e face à modernidade, anátemas e condenações de coisas que nos parecem até risíveis: contra a ciência, a democracia, os direitos humanos, a industrialização. A Igreja se havia transformado numa fortaleza contra as vagas de reformismo, secularismo, modernismo e relativismo. Missão da igreja, segundo esse modelo do confronto, é testemunhar as verdades eternas, anunciar a Cristo como o único Redentor da humanidade e a Igreja sua única e exclusiva mediadora, fora da qual não há salvação. Em seu documento de 2000, Dominus Jesus, o cardeal Ratzinger reafirma tal visão com a máxima clareza e laivos de fundamentalismo. Tudo é centralizado no Cristo. Esta atitude belicosa predominou até os anos 60 do século passado quando foi eleito um papa ancião, quase desconhecido, mas cheio de coração e bom senso, João 23. Seu propósito era passar do anátema ao diálogo. Quis escancarar as portas e janelas da Igreja para arejá-la. Considerava blasfêmia contra o Espírito Santo imaginar que os modernos só pensam erros e praticam o mal. Há bondade no mundo, como há maldade na Igreja. Importa é dialogar, intercambiar e aprender um do outro. A Igreja que evangeliza deve ela mesma ser evangelizada por tudo aquilo que de bom, honesto, verdadeiro e sagrado puder ser identificado na história humana. Deus mesmo chega sempre antes do missionário, pois o Espírito Criador sopra onde quiser e está sempre presente nas buscas humanas suscitando bondade, justiça, compaixão e amor em todos. A figura do Espírito ganha centralidade. Fruto da opção pelo diálogo foi o Concílio Vaticano 2º (1962-1965), que representou um acerto de contas com a Reforma pelo ecumenismo e com a modernidade pelo mútuo reconhecimento e pela colaboração em vista de algo maior que a própria Igreja, uma humanidade mais dignificada e uma Terra mais cuidada. Este "aggiornamento" trouxe grande vitalidade em toda a Igreja, especialmente na América Latina, que criou espaço para aquilo que se chamou de Igreja da base ou da libertação e da Teologia da Libertação. Mas acirrou também as frentes. Grupos conservadores, especialmente incrustados na burocracia do Vaticano, conseguiram se articular e organizaram um movimento de restauração, de volta à grande tradição. Este grupo foi enormemente reforçado sob João Paulo 2º, que vinha da resistência polonesa ao marxismo. Chamou como braço direito e principal conselheiro, seu amigo, o teólogo Joseph Ratzinger, elevando-o diretamente ao cardinalato e fazendo-o presidente da Congregação para a Doutrina da Fé, a ex-Inquisição. Aí se processou de forma sistemática, vinda de cima, uma verdadeira Contra-Reforma Católica. O próprio cardeal Ratzinger no seu conhecido "Rapporto sulla fede", de 1985, um verdadeiro balanço da fé, dizia claramente: "A restauração que propiciamos busca um novo equilíbrio depois dos exageros e de uma abertura indiscriminada ao mundo". Ele elaborou teologicamente a opção pelo confronto a partir de sua formação de base, o agostinismo, sobre o qual fez duas teses minuciosamente trabalhadas. Notoriamente Santo Agostinho opera um dualismo na visão do mundo e da Igreja. Por um lado está a cidade de Deus e por outro a cidade dos homens, por uma parte a natureza decaída e por outra, a graça sobrenatural. O Adão decaído não pode redimir-se por si mesmo, seja pelo trabalho religioso e ético (heresia do pelagianismo) seja por seu empenho social e cultural. Precisa do Redentor. Ele se continua e se faz presente pela Igreja, sem a qual nada ganha altura sobrenatural e se salva. Em razão desta chave de leitura, o papa Bento 16 se confronta com a modernidade, vendo nela a arrogância do homem buscando sua emancipação por próprias forças. Por mais valores que ela possa apresentar, não são suficientes, pois não alcançam o nível sobrenatural, único caráter realmente emancipador. Nela vê mais que tudo secularismo, materialismo e relativismo. Essa é também sua dificuldade com a Teologia da Libertação. A libertação social, econômica e política que pretendemos, segundo ele, não é verdadeira libertação, porque não passa pela mediação do sobrenatural. Para concluir, se o atual papa tivesse assumido uma teologia do Espírito, coisa ausente em sua produção teológica, teria uma leitura menos pessimista da modernidade. No atual momento se dá o forte embate entre essas duas opções. A Igreja latino-americana pende mais pela opção do diálogo. Esta é mais adequada à cultura brasileira que não é fundamentalista nem dogmática, mas profundamente relacional e dialogal com todas as correntes espirituais. Somos naturalmente sincréticos na convicção de que em todos os caminhos espirituais há bondade para além dos desvios e que, definitivamente, tudo acaba em Deus. Não parece ser esta a opção de Bento 16: seus discursos enfatizam a construção da Igreja em sua forte identidade para que seu testemunho seja vigoroso e possa levar valores perenes a um mundo carente deles, como se viu claramente em seu discurso aos bispos brasileiros na catedral de São Paulo. Essa Igreja é necessariamente de poucos, coisa reafirmada pelo teólogo Ratzinger em muitas de suas obras. Mas esses poucos devem ser santos, zelosos e comprometido com a missão de orientar e conduzir os muitos, sem se deixar contaminar por eles e pelo mundo. Ocorre que esses poucos nem sempre são bons. Haja vista os padres pedófilos. Por isso, a Igreja precisa renunciar a certa arrogância, ser mais humilde e confiar que o Espírito e o Cristo cósmico dirijam seus passos e os da humanidade por caminhos com sentido e vida. LEONARDO BOFF é teólogo da libertação e escritor. Em 1985, foi condenado pelo então cardeal Joseph Ratzinger ao "silêncio obsequioso" enviado por Antonio Carlos - heteroliberal

CEGUEIRA, LENTIDÃO E IMPUNIDADE

Por SOARES 14/05/2007 às 10:02
Há muito que se discute a necessidade de uma reforma profunda tanto na Justiça como instituição, quanto na legislação penal brasileira, defasada e construída para privilegiar os ricos e poderosos. O problema é que, a exemplo do que acontece com a reforma tributária e da reforma política, que também não andam, falta determinação política para coloca-las em prática.
CEGUEIRA, LENTIDÃO E IMPUNIDADE Dizem que a Justiça é cega. Pois no Brasil, sabemos todos, alem de cega ela é lenta. Lenta em prejuízo dos pobres e lenta em benefício dos ricos e poderosos. O cidadão pobre, para fazer valer algum direito ofendido, tem que se submeter a uma maratona que costuma durar anos ou até décadas, e muitas vezes, termina como causa perdida.O cidadão rico, especialmente agentes públicos do alto escalão dos três poderes, quando apanhado em alguma ilicitude, e , por isto, indiciado, conta com a lentidão da Justiça para escapar ileso, ao final do processo. Apesar de algumas arbitrariedades cometidas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal em seus trabalhos de investigação, e da suspeita de uso político partidário das investigações por parte da PF, é inegável que a ação destes dois órgãos tem tido um saldo positivo no sentido de combater, tanto as diversas máfias que agem na iniciativa privada, quanto a corrupção endêmica que assola o poder público. A estes dois órgãos tem se somado, de modo menos freqüente, a ação investigativa de alguns poucos parlamentares nas diversas CPIs do Congresso, no sentido de produzir relatórios esclarecedores a respeito do comportamento pouco ético de órgãos e de agentes públicos. O fato é que a PF investiga e prende preventivamente, o MP investiga e denuncia, as CPIs investigam e produzem relatórios. Mas quando todo este material vai para a Justiça inicia-se um processo marcado pela morosidade, pela procrastinação, pela infinidade de recursos, pelas chicanas jurídicas, que, na maioria absoluta dos casos, termina na impunidade dos agentes públicos denunciados. Em Minas, por exemplo, o Promotor Gilvan Alves Franco, ex-coordenador da Procuradoria de Combate a Crimes Praticados por Prefeitos, conhece bem esta realidade, e se declara impotente. Em seis anos e meio, buscou a punição de agentes públicos em centenas de casos no Estado. Em vão. Segundo ele, em entrevista ao jornal O Tempo (06/05/07), ?...não tem prefeito preso em MG, onde existem 853 municípios. E foram centenas de processos. Eles vão sempre recorrendo, até que caímos na impunidade?.De fato, a lentidão da Justiça leva à prescrição da maioria dos processos e o trabalho de meses feito pelo MP ou pela PF vão para o espaço.A única punição que recebem os réus é a execração pública quando os casos ganham notoriedade. Porque caso contrário, nem isto. Há muito que se discute a necessidade de uma reforma profunda tanto na Justiça como instituição, quanto na legislação penal brasileira, defasada e construída para privilegiar os ricos e poderosos. O problema é que, a exemplo do que acontece com a reforma tributária e da reforma política, que também não andam, falta determinação política para coloca-las em prática. E esta determinação inexiste, certamente porque este estado de coisas beneficia, com a impunidade eterna, grande parte daqueles que se utilizam da carreira política para propósitos escusos. De fato, o Congresso Nacional, constitucionalmente responsável pelas reformas institucionais necessárias, não tem demonstrado nos últimos anos, nem aptidão, nem autoridade moral para implementa-las, ocupado que está por criminosos que usam o mandato parlamentar como mais um instrumento de impunidade. E também por um corporativismo velado, que faz com que todos se sintam navegantes de um mesmo barco e impede que se efetuem as mudanças necessárias para que a Justiça se torne mais ágil e mais eficaz Enquanto isso, somos confrontados diariamente com relatos sobre criminosos de colarinho branco impunes, protegidos pela morosidade ,beneficiados pelos artifícios jurídicos, pela onda interminável de recursos, pela chuva de liminares e por decisões arbitrárias de juizes venais. 100507 LEIA MAIS EM : http://blogdofasoares.blogspot.com/
Email:: fasoares15@bol.com.br URL:: http://blogdofasoares.blogspot.com/

Jornalistas também têm direito à liberdade de expressão

Por Sindicato dos Jornalistas Profissionais de GO 14/05/2007 às 17:18
Nota de Protesto 12/05/2007 Jornalistas também têm direito à liberdade de expressão
A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de Goiás (SJPG) vêm a público protestar contra a demissão arbitrária de 28 jornalistas do jornal Diário da Manhã, de Goiânia, ocorrida na tarde de sexta-feira, dia 11/05. Protestamos também contra o constrangimento público e o assédio moral aos quais os profissionais foram submetidos. Os jornalistas foram demitidos por terem exercido o direito de se expressarem livremente, previsto na Constituição brasileira e falsamente defendido pela maioria dos empresários da comunicação. Pacificamente, sem usar palavras, vestiram-se de preto para expressar seu descontentamente com o atraso no pagamento de seus salários. Autoritariamente, o senhor Batista Custódio, dono das empresas Unigraf e Centro-Oeste, mantenedoras do Diário da Manhã, mandou que os descontentes fossem demitidos. Tão descabido quanto as demissões arbitrárias, foi o comportamento do dono do jornal e, infelizmente, de jornalistas ocupantes de cargos superiores, que se prestaram ao triste papel de assediar moralmente os colegas. Muitos jornalistas foram procurados por seus chefes imediatos para que trocassem de roupa e fossem se desculpar junto ao patrão. Era a forma de salvarem seus empregos. Todos foram obrigados a sair da redação imediatamente após o anúncio da demissão em massa. Os jornalistas que não haviam aderido ao protesto e os que preferiram salvar seus empregos foram obrigados a usar um adesivo confeccionado pela empresa com o significado "Eu amo o DM" (a palavra amo foi substituída no adesivo por um coração). Os jornalistas que ocupam cargos de chefia foram obrigados, ainda, a assumir a responsabilidade pela demissão dos colegas, em nota publicada na primeira página do Diário da Manhã do dia 12. Causou-nos espanto a reação despropositada e desproporcional da empresa, que reconheceu de público, na referida nota, que o protesto dos jornalistas era compreensível. De fato, ao trabalhador é facultado receber pelo seu trabalho. Os jornalistas do Diário da Manhã não receberam os salários de janeiro e fevereiro. Receberam o salário de março, mas foram informados de que não havia previsão para o pagamento do salário de abril. Estranhamente, o dono da empresa não admite que seus funcionários sequer fiquem descontentes com os atrasos constantes do pagamento de salários. Age como se o errado fosse o trabalhador e não ele próprio, que deixa de cumprir suas obrigações legais e éticas. Batista Custódio tenta estabelecer uma relação de compadrio com os jornalistas, em vez de preservar a relação de trabalho. É prática constante da empresa pagar seus profissionais parceladamente, por meio de "vales", que não são adiantamentos, mas pagamentos de salários atrasados. Os "vales", concedidos pessoalmente como se fosse um favor, constrangem os jornalistas e obviamente não suprem suas necessidades materiais. Muitos são os que estão sem energia em casa ou sem telefone. Igualmente, são muitos os endividados. A FENAJ e o SJPG repudiam essa situação constrangedora a qual os jornalistas do Diário da Manhã são submetidos, ao mesmo tempo em que prestam sua total solidariedade ao grupo que corajosamente decidiu lutar por seus direitos e que, por isso, foi covardemente demitido. As medidas legais para garantir os direitos dos jornalistas foram tomadas. Por fim, reiteramos a necessidade de todos jornalistas do Brasil lutarem contra a precarização das relações de trabalho no mundo do jornalismo e pelos direitos dos trabalhadores, incluído o direito à livre expressão. Goiânia, 12 de maio de 2007 Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Goiás Federação Nacional dos Jornalistas

Em destaque

Lula quer compensar Brito e Elmar após Motta consolidar apoios e deve rever ministério

  Foto: Reprodução/Redes sociais Lula entre Elmar e Brito durante o Círio de Nazaré de 2024 31 de outubro de 2024 | 21:30 Lula quer compensa...

Mais visitadas