Carlos Alberto Sardenberg
O Globo
Quer saber? O Banco Central tem razão. A queda da taxa básica de juros está logo ali. Mas ainda faltam algumas coisas. Foi o que disse o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) ao cabo da reunião de quarta-feira passada, quando manteve a taxa em 13,75% ao ano. Comparando o último comunicado aos anteriores, há pelo menos quatro indicações de que o início da queda de juros está quase lá:
1) O Copom vinha repetindo que poderia ter de elevar o juro básico se as projeções indicassem desvio mais forte em relação às metas de inflação. Não diz mais, sinal de que não espera uma deterioração do quadro;
2) Entre os diversos cenários com que trabalhava, o Copom incluía uma versão considerando os juros de 13,75% mantidos por um longo período à frente. Também foi suprimida. Não está mais no horizonte do BC nem a alta dos juros básicos, nem sua manutenção nos atuais 13,75%;
3) O cenário de referência passou a ser aquele delineado no Boletim Focus. Esse boletim faz parte do ritual do regime de metas de inflação e funciona assim: departamentos técnicos de bancos, economistas-chefes de corretoras e fundos de investimentos, pessoal das consultorias e instituições de ensino e pesquisa rodam seus cenários macroeconômicos e enviam para o BC toda sexta-feira.
BOLETIM FOCUS – O BC tabula isso tudo e publica o resumo na sua página, às segundas-feiras pela manhã. Trata-se, portanto, da visão do pessoal de fora do governo. Visão que o BC considerou em seu cenário de referência.
A última versão do boletim projeta o quê? Que a taxa básica de juros chegará ao final deste ano em 12,25% ao ano. A taxa hoje é 13,75%, e o Copom tem mais quatro reuniões até o final deste ano. De 0,25 em 0,25 de queda, chega-se a dezembro justamente naqueles 12,25%. Claro, não quer dizer que acontecerá exatamente assim. Mas quer dizer, sim, que esperar o início da queda dos juros a partir de agosto faz sentido;
O Copom manifestou-se satisfeito com a redução da inflação verificada até agora, consequência da manutenção dos juros em patamar elevado desde agosto. Acrescentou que atuará daqui em diante com parcimônia — palavra utilizada outras vezes para sinalizar que o movimento na taxa básica seria de 0,25 ponto percentual por vez.
FATOS E RISCOS – Ao mesmo tempo, o Copom também indicou o que falta para a materialização daquele cenário. Não disse bem assim — na linguagem própria, falou de fatos e riscos.
Fatos: a redução da inflação é mais lenta do que se esperava. Os núcleos do IPCA permanecem mais elevados do que seria desejável. A inflação cheia, em 12 meses, tem caído nos últimos meses, mas volta a subir no segundo semestre.
E há pelo menos dois riscos a notar. O primeiro está no arcabouço fiscal, a proposta do governo para controlar as contas e evitar o crescimento exagerado da dívida pública. A coisa avançou, mas ainda está em votação no Congresso. Aliás, o Senado piorou a versão que saiu da Câmara, abrindo espaço para mais gastos. E o governo, o Executivo, já colocou em marcha diversos programas que, justos ou não, levam a forte aumento de despesas.
METAS DA INFLAÇÃO – O outro risco — e deste o BC não fala, mas a gente pode intuir — está no Conselho Monetário Nacional, o CMN. É integrado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC. Tem reunião marcada para o próximo dia 29, com tema crucial: confirmar (ou não) as metas de inflação para 2024 e 25 (no momento fixadas em 3%) e definir o objetivo para 2026.
Onde está o risco? A começar pelo presidente Lula, muita gente dentro do governo acha que meta de 3% é muito apertada para um país emergente. Não faltam comentários de que “um pouco” de inflação não faz mal. Quanto seria? Não se sabe. Mas se sabe que uma decisão do CMN elevando as metas provocará alta imediata nas expectativas de inflação, a ser consumadas nos próximos meses. Esse é o maior risco de piora do cenário.
O palavrório raivoso contra o BC atrapalha, mas é isso, palavrório mal informado.