Publicado em 5 de novembro de 2022 por Tribuna da Internet

Charge do Pelicano (Arquivo Google)
Pedro do Coutto
Como era esperado, as forças partidárias que apoiaram Bolsonaro ao longo do governo rapidamente estão se transferindo para apoiar o governo Lula que se instalará no país em 1º de janeiro.
O primeiro sinal foi na noite do próprio domingo pelo deputado Arthur Lira, presidente da Câmara. A segunda etapa começou no amanhecer de segunda-feira. Política é assim, marcada pela alternância do poder e, com isso, a adesão das forças em torno dos governos que surgem pelas urnas.
RENOVAÇÃO DO PODER – Foi magnífica a análise sobre o que é política feita pela jornalista Eliane Cantanhêde na tarde de quinta-feira, no último programa Raio-X das Eleições, da GloboNews. Ela destacou as modificações que se sucedem no processo democrático, principalmente no que se refere à renovação do poder. Efetivamente, os que perdem eleições não podem ter como objetivo sabotar ou obstruir o governo que passou a ser ocupado pelos adversários vitoriosos.
O exemplo negativo está nas pastas do tempo com a atuação do deputado e depois governador da Guanabara, Carlos Lacerda. Mas, também através das décadas, a atuação das forças econômicas se modificou. O fornecimento de petróleo saiu de cena e foi substituído por interesses relativos ao refino, uma vez que nesse setor o Brasil não é autossuficiente.
Há tempos, quando a Petrobras se instalava em 1953, o Brasil produzia menos de 10 mil barris por dia para um consumo de 300 mil. Um mercado de grande interesse para os fornecedores. Depois, o governo JK, combativo ao extremo até 1959, conseguiu elevar a produção para 100 mil barris por dia, um terço do consumo. No ano final do seu mandato, como em um passe de mágica, a oposição alucinada cessou. Em 1961, tomou posse Jânio Quadros; a renúncia em agosto foi um desastre e o motivo da crise que dura até hoje.
TRANSIÇÃO – Agora é um novo tempo. O grupo de trabalho da transição, conduzido pelo vice eleito, Geraldo Alckmin e por Ciro Nogueira, já se instalou e na segunda-feira começará a trabalhar efetivamente, incluindo a remoção de obstáculos deixados pelo ministro Paulo Guedes no Orçamento para 2023.
É preciso reformular verbas na Lei do Orçamento Anual, sem o que a atuação do governo em pontos essenciais se tornaria impossível. Guedes deixou o orçamento, como se dizia antigamente, numa colcha de retalhos. Dessa forma é necessário reunificar e viabilizar as partes para que o novo governo possa administrar o país. A verba orçamentária para o pagamento dos R$ 600 às famílias carentes é um deles. Paulo Guedes deixou uma situação que reduzia esse pagamento a R$ 400. Mas essa é outra questão.
Em matéria de adesão, já se verificou também a do bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal e principal proprietário da TV Record, dizendo que “é preciso perdoar Lula porque ele foi eleito pela vontade de Deus”. Matéria de Anna Virginia Balloussier, Folha de S. Paulo desta sexta-feira. Conforme escrevi recentemente, fecham-se as cortinas de um governo e abrem-se perspectivas para o ex-presidente Lula que retorna ao poder pelo voto popular.
NOVO PROJETO – O processo político, como da própria vida humana, inclusive porque a política é feita por seres humanos, continua o seu ritmo e agora no Brasil sob um novo estilo e com um novo projeto. As adesões se sucedem, as conversações em torno delas, como é natural, também avançam.
Como sustentou Geraldo Alckmin, há necessidade de pressa para que até a metade de dezembro seja aprovada a Emenda Constitucional assegurando as verbas que faltam para o novo Bolsa Família de R$ 600, para a merenda escolar, para a Saúde, para a Educação e outros programas essenciais. No O Globo, a reportagem é de Manoel Ventura, Paula Ferreira, Bruno Góes e Jennifer Gularte.
RETORNO DE RUY CASTRO – Foi um acontecimento muito positivo o restabelecimento de Ruy Castro e o seu retorno na quinta-feira à coluna na Folha de S. Paulo. Voltou ao gramado, voltou à luta pela sensibilidade, pela tradução dos fatos e pela cultura.
Conforme já dito, a sua trajetória tem iluminado gerações do país e funcionado para mostrar que a cultura se constrói e se renova, e que, a exemplo da história, também está no presente unido ao passado pela ponte encantada da percepção e do estilo, do conteúdo e da forma, pilares sobre os quais fundamentou as suas obras.
A sua incansável produção ao longo de décadas representa um avanço e uma contribuição extraordinários, sendo a tradução indispensável dos fatos que iluminam as vidas humanas. Ruy Castro é, definitivamente, um dos colunistas mais brilhantes da imprensa de todos os tempos, sobretudo porque une a forma ao conteúdo que todos nós esperamos encontrar no que é escrito a cada dia.