Atitudes de Bolsonaro não acrescentaram votos à reeleição
Pedro do Coutto
Diante dos reflexos em cadeia, com origem no indulto ao deputado Daniel Silveira e com a pouca oculta investida contra o regime democrático, as últimas atitudes do presidente Jair Bolsonaro não acrescentaram votos para a sua candidatura à reeleição e, pelo contrário, terminaram prejudicando seu desempenho no quadro político do país, despertando preocupações em aliados do Centrão.
As reações dos presidente do Senado e da Câmara, Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, somadas às respostas dos ministros Edson Fachin, presidente do TSE, e Alexandre de Moraes, relator da matéria que condenou Silveira, repercutiram com intensidade na estrutura política brasileira.
FECHAMENTO DO CONGRESSO – Isso porque Silveira, ao defender a reedição do Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968, implicitamente revelou-se adversário do Congresso Nacional que ele integra como deputado. Assim agindo, ele tocou em um ponto nevrálgico tanto no quadro partidário, quanto no quadro institucional, colocando sob risco o mandato dos senadores e deputados federais, entre os quais ele se inclui. Isso de um lado.
De outro, levou à preocupação eleitores ainda indecisos sobre o desfecho das urnas de novembro, os quais, mesmo preenchendo uma facção minoritária, podem ter efeito decisivo no rumo do pleito, sobretudo quanto à perspectiva de que haverá ou não segundo turno.
No meio da tempestade, a reação do ministro Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, afirmando que não haverá interferência militar na eleição. Respondeu assim à afirmativa do próprio presidente Jair Bolsonaro que defendeu uma apuração paralela por parte das Forças Armadas. Fachin sustentou seus posicionamentos frontalmente contrário à hipótese, destacando o texto da Constituição Federal.
INDULTO – Entre as nuvens que dão o sinal da tempestade, a opinião da Advocacia Geral da União de que o ato de indulto praticado por Bolsonaro não pode ser apreciado por nenhuma instância e também por nenhum outro poder. A reportagem que destaca a resposta de Edson Fachin, edição deste sábado de O Globo, é de André de Souza, Gabriel Sabóia e Daniel Gullino.
Ao que se refere, se considerar inapreciável o ato de indulto firmado por Bolsonaro, deve-se considerar uma questão paralela, de caráter substantivo. Trata-se de se decidir, conforme o caso, sobre o conteúdo do ato, pois se uma vez tiver sido baseado num absurdo, a forma constitucional não poderá assegurar a legitimidade do indulto fixado.
HOMENAGEM – O fato essencial é que, na minha opinião, indultando Daniel Silveira, Jair Bolsonaro perdeu mais votos do que ganhou. Inclusive, tem que se levar em conta que o destaque obtido por Silveira ao ser homenageado no Planalto pelo chefe do Executivo cria problemas muito mais para os candidatos do PTB, seu partido, nas urnas de novembro, do que para os adversários que integram as outras legendas. Mas isso se ele puder ser candidato em novembro, perspectiva contestada pela própria Corte Suprema.
Enfim, pode-se concluir que o episódio, que ainda não terminou, produzirá mais efeitos negativos ao governo do que avanços junto aos grupos de extrema-direita. Daniel Silveira ao tentar intoxicar o Poder Judiciário e atentar contra ministros e contra a democracia, intoxicou-se a si mesmo, já que ele é membro de um parlamento cujo fechamento ele indiretamente defende ao destacar diretamente o conteúdo e a forma do AI-5.
PREÇO DO GÁS – Já sob novo comando, a Petrobras anunciou na sexta-feira, mais um reajuste no preço do gás natural em todo o país. A reportagem, edição de ontem de O Globo, é de Bruno Rosa, Leticia Lopes e Júlia Noia. O reajuste nas refinarias é de 19%, mas a empresa estima que o preço médio para o consumidor será de 4%. A Naturgy, concessionária do Rio, ao contrário, anunciou um aumento de 7% para os consumidores residenciais.
Esse é o terceiro aumento verificado este ano e conduz à certeza de que a mudança no comando da estatal não trouxe consigo uma nova política de preços para os consumidores. O reflexo vai se fazer sentir no poder aquisitivo da população. E na eleição, é claro.