Publicado em 18 de janeiro de 2025 por Tribuna da Internet
Fabiano Lana
Estadão
Temos uma nova fake news na praça, e de teor oficial: sustentar que o governo federal é excelente, que oferece serviços satisfatórios à população, que nos colocou novamente na rota do desenvolvimento e da democracia, mas a população em sua esmagadora maioria só não tem consciência desses magníficos fatos porque está com a sua percepção turvada pelas fake news estimuladas pelas bigh techs, como a Meta de Mark Zuckerberg ou o “X” de Elon Musk, trumpistas – logo, gente má.
Um corolário desse tipo de pensamento auto ilusório é colocar a culpa nos próprios problemas como se fosse algo de ajuste de “comunicação” para enfrentar essas big techs. Como se questões de sentimentos em relação à gestão, algo de uma complexidade e profundidade significativas, tivesse a ver sobretudo com propaganda.
PERSEGUIÇÃO – O resultado dessa soma de autoenganos tem sido querer criminalizar, censurar ou mesmo perseguir politicamente quem não possui essa visão rósea da administração Luiz Inácio Lula da Silva.
A questão da taxação do Pix e a resposta que se pretender dar a essa fragorosa derrota política do governo, por meio da punição severa a quem reagiu, mesmo que seja por meio de desconfianças e insinuações, se encaixa nessa visão autoritária e enganosa dos fatos.
ELEVAR A RECEITA – O vídeo do deputado Nikolas Ferreira criticando a acesso da Receita à movimentações via Pix acima de R$ 5 mil chegou a mais de 200 milhões de views não devido a fake news, crimes, ou teorias da conspiração como “auxílio deliberado da Meta para aumentar a visualização” (outra fake news).
Mas porque a sociedade, majoritariamente, tem percebido que o governo está obcecado em aumentar a arrecadação buscando qualquer brecha disponível. O fato tornou-se um prato cheio para um parlamentar oportunista e com amplo domínio do modus operandi das redes.
BOATARIAS – Como o PT bem sabe, por ser mestre no assunto ao longo de sua trajetória até bem recentemente, fake news sempre foi parte do debate político. E que considerar versões divergentes sobre um acontecimento como fake news também faz parte da luta política.
Muitas vezes, quando se quer coibir “fake news”, o que se pretende, na verdade, é restringir opiniões e informações que não corroborem a versão oficial das coisas. É o que estão buscando fazer quando clamam por regulação e controle.
De fato, é angustiante para um presidente que já foi quase unanimidade nacional, no ano de 2010, imaginar que hoje mal consegue agradar a metade do eleitorado. Talvez um pouco menos.
DIAGNÓSTICO MELHOR – Não dá para entender que boas notícias na economia, como baixo índice de desemprego e um crescimento do PIB pouco acima de 3% não levem à consagração popular.
Pior que hoje não é mais possível colocar a culpa nos tucanos, no ex-presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, ou mesmo na Rede Globo. É preciso encontrar outro inimigo.
Mas ao invés de jogar a responsabilidade em desafetos físicos ou jurídicos não seria melhor ter um diagnóstico mais preciso e sincero das circunstâncias? Imaginar, por exemplo, que uma parcela da sociedade, quando prospera, acredita que seja mérito próprio e não do governo de plantão, caso do segmento evangélico? Que certos posicionamentos, seja na área internacional, seja na questão de valores, não encontram mais aderência na população brasileira?
OUTROS FATORES – Admitir que se fale demais para convertidos e não com aqueles que ainda veem o governo com desconfiança? Que muitas vezes até os que apoiaram o presidente Lula no segundo turno de 2022, alegando querer evitar o mal maior, são gratuitamente agredidos.
Que mesmo o estilo deslumbrado da primeira-dama e seu alto custo na estrutura de governo pode ser uma âncora na aprovação. Que a leniência com a inflação pode ser um fator de corrosão de popularidade?
Será que as falas do presidente Lula, em geral longas e autocongratulatórias, não têm mais o poder de encantar como era antigamente, num mundo dos cortes rápidos das redes sociais? É preciso investigar tudo isso.
VOTO DO POBRE – Lembrar, por exemplo, que Lula venceu apenas nas faixas de renda de até dois salários mínimos. O que levaria a conclusão, lógica, de que quanto maior o acesso à internet maior a rejeição ao governo – e talvez por isso o banho que o petismo leve nas redes e qualquer tentativa de coibir o debate seria contraprodutiva.
O que se vê nas redes é consequência de um estado de espírito de quem por lá frequenta, não exatamente uma manipulação perversa de um algoritmo.
Enfim, sem preconceitos e ideias preconcebidas, entender as razões do mal humor da população para tentar buscar a solução correta. E admitir que o governo é medíocre, no sentido do termo de “estar apenas na média”, sem entregas ou realizações vistosas.
AINDA É FAVORITO – É preciso lembrar também que neste momento, devido às divisões no campo político adversário, o presidente Lula, mesmo com números insatisfatórios de aprovação, segue como favorito para as eleições de 2026 – o que pode mudar caso os erros de diagnóstico continuem.
Por último, mas não menos relevante: na crise do Pix o deputado bolsonarista Nikolas, evangélico, de 28 anos, passou a ter mais seguidores nas redes do que o presidente Lula, com décadas de trajetória política.
Melhor do que tentar cassar ou prender o rapaz, talvez seja preferível se aprofundar nas suas técnicas e meios e buscar algum aprendizado nisso – para neutralizar movimentos como o dele na política, na comunicação correta, e não na polícia.