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sábado, dezembro 11, 2010

Ingratos e ressentidos

Carlos Chagas

Queixava-se o então presidente Juscelino Kubitschek que, ao nomear um ministro, fazia dez ressentidos e um ingrato. Dilma Rousseff ainda não precisa levar o comentário ao pé-da-letra porque ingratos, propriamente, ainda não apareceram. Por enquanto, os escolhidos estão manifestando agradecimentos, lealdade e bons propósitos. A presidente eleita não perderá por esperar, no entanto. Quando começarem as disputas internas por espaço, muitos sentimentos mudarão em sua equipe. A razão é simples: esse é o ministério da redundância. Montes de atribuições estão emboladas nas diversas pastas, tanto na economia quanto na administração e, pelo jeito, também na política externa. No governo Lula tem sido assim, mas para o mandato de Dilma as previsões parecem maiores. É bom poupar o constrangimento de fulanizações, por enquanto, já que entre os escolhidos, tudo é festa. Em alguns meses veremos quem briga com quem.

Quanto aos ressentidos, a conversa é outra. Na nova bancada do PMDB na Câmara o que mais se ouve são referências aos “ministeriozinhos” oferecidos ao partido. Não devem ser levadas a sério as explosões de que “ela vai ver quando encaminhar seus primeiros projetos”, até porque o ministério não está completo e só agora abre-se a temporada de caça aos cargos de segundo escalão, muitos deles tão apetitosos quanto os de primeiro. Também no PT registram-se queixas e reclamações, para não falar nos penduricalhos. De qualquer forma, importando menos o volume de ingratos e ressentidos, tem sido sempre assim desde que o mundo é mundo.

FAZER MAIS COM MENOS

O presidente Lula deu sinais de não haver gostado do diagnóstico da nova ministra do Planejamento, Mirian Belchior, de que a meta será “fazer mais com menos”. Ele mesmo tem dito não ter conseguido fazer tudo o que pretendia, mas pronunciada por outra pessoa a proposta adquire características de desafio.

Tanto no jantar com o PMDB quanto no café-da-manhã com o PT, esta semana, o presidente deixou escapar farpas variadas contra os dois partidos e até, sutilmente, sobre o futuro. O episódio do corte ou diminuição do ritmo das obras do PAC foi sintomático. O primeiro-companheiro não admite e não terá gostado das observações de Guido Mantega, que ele mesmo sugeriu a Dilma para permanecer na Fazenda. Paulo Bernardo tentou botar panos quentes mas não obteve pleno sucesso.

SINAIS DE TEMPESTADE

Nada que diga respeito ao Brasil, mas como somos um continente, não uma ilha, é bom prestar atenção. Sobe a temperatura na Europa. Depois da Grécia, França, Espanha, Itália e outros países, agora é na Inglaterra que a população vai para as ruas protestar, com os estudantes à frente. E com toda razão, diga-se, porque os respectivos governos apelam para a milenar solução de sacrificar os menos favorecidos para enfrentar a crise econômica. Tanto faz se são conservadores, trabalhistas, socialistas ou que outros rótulos tenham, todos programam e até já executam medidas como demissões, redução de salários, extinção de benefícios e aumento de impostos.

Em Londres, não escaparam sequer o príncipe de Gales e sua consorte, apavorados com a manifestação em torno de seu carro de luxo. Também, vão triplicar o custo dos cursos superiores, aumentar anuidades, cortar investimentos no ensino público e elevar tarifas, conforme já aprovado da Câmara dos Comuns. Nada, porém, em matéria de taxar um pouco mais o lucro das empresas. Um dia a casa cai.

PROBLEMA A ENFRENTAR

Basta folhear jornais e revistas ou assistir a televisão. Multiplicou-se a propaganda de venda de automóveis. E pegou. A produção aumentou, coisa até salutar porque mais empregos são criados e mais dinheiro circula no mercado de crédito. O diabo é que milhares de veículos são incorporados à frota nacional, todos os dias. Não haverá estradas, viadutos e túneis em número suficiente para abrigar essa avalancha. Nem ruas, garagens e estacionamentos. Muito menos recursos do governo para atender à demanda. Os transportes públicos seriam a solução, mas haverá que enfrentar a indústria automobilística.
Fonte: Tribuna da Imprensa

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