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sexta-feira, outubro 04, 2019

Após polêmica, CNMP valida permuta de promotor do MP-BA prestes a se aposentar


por Cláudia Cardozo
Após polêmica, CNMP valida permuta de promotor do MP-BA prestes a se aposentar
Foto: Cláudia Cardozo / Bahia Notícias
O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), por maioria dos votos, validou a permuta entre dois membros do MP da Bahia. A permuta havia sido impugnada por promotores de Justiça, pois um dos permutantes iria se aposentar quando a troca foi requerida, o que beneficiou diretamente o promotor de Justiça André Bandeira de Melo Queiroz, o titularizando em Feira de Santana (veja aqui).  A decisão foi tomada em sessão plenária na última terça-feira (24). O procedimento começou a ser julgado no CNMP em junho deste ano, mas um pedido de vista adiou a finalização do julgamento para setembro. Na sessão plenária do dia 11 de junho, o relator destacou que o MP baiano adota “dois pesos e duas medidas”, pois impede a permuta de servidores quando um está para se aposentar e permite entre promotores.

No pedido de impugnação, os autores alegaram que a permuta era um ato simulado, contrário ao interesse público, pois o promotor de Justiça Nilson Souza, que atuava em Feira de Santana, já estava prestes a se aposentar. André Bandeira, que atuava em Barreiras, seria beneficiado com o ato, com pouco mais de oito anos de carreira no MP, mesmo não figurando entre os mais antigos para ser transferido. Os autores afirmam que o ato prejudicou mais de 100 promotores que desejavam se transferir para Feira de Santana, e que tal permuta violou “critérios preestabelecidos para movimentação na carreira e os princípios que regem a Administração Pública, em especial os da moralidade e da impessoalidade”.

O ato chegou a ser impugnado perante o Conselho Superior do Ministério Público da Bahia (MP-BA), mas a permuta foi mantida, pois o órgão já havia permitido situações parecidas em momentos anteriores. O MP-BA, em sua defesa, sustentou que não houve ofensa ao princípio da moralidade, pois foram observados requisitos legais, além de precedentes do Conselho Superior sobre a matéria. Ademais, frisaram que a Lei Complementar Estadual nº 11/1996 não veda a permuta nas circunstâncias dos autos e, ainda, que não há qualquer ato normativo local que regulamente a matéria, haja vista a revogação da Resolução nº 007/2003 pelo Ministério Público baiano. O MP-BA ainda declarou que os dois membros eram titulares de comarca de entrância final, e por isso não houve prejuízo a terceiros. Ainda defendeu que a remoção por permuta se funda no interesse dos membros que a requerem, conciliando o interesse público com o particular, de modo que a aplicação de restrições não estabelecidas em lei implica violação ao princípio da proporcionalidade. O MP ainda pontuou que os permutados não chegaram a exercer o ofício nas promotorias. Nilson foi aposentado e André Bandeira foi designado para atuar como auxiliar na Corregedoria do CNMP desde janeiro de 2018. Ele é primo do conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho.

De acordo com o relator, Valter Shuenquener de Araújo, a permuta pode ser conceituada como o “deslocamento recíproco de dois agentes públicos, em atividade, que almejam a troca de suas lotações, um com o outro, condicionada à oportunidade e à conveniência administrativa que, inegavelmente, caracteriza-se pela ausência de prejuízos ao serviço público”. Para ele, entretanto, é necessário que os permutantes atuem nas localidades permutadas, “caso contrário, ter-se-ia a remoção simples, em que, ao final do deslocamento, somente uma das lotações é necessariamente preenchida”. O conselheiro foi mais preciso em seu voto ao dizer que, o que houve, na prática, foi uma “remoção em via única, em que somente um dos promotores exercerá suas atribuições na localidade do outro”. Considerou que as provas demonstram que o promotor Nilson jamais quis exercer atividade em Barreiras, pois antes mesmo de efetuar a permuta, informou a Coordenação do Escritório Regional do Ministério Público de Feira de Santana que não participaria do Plantão designado para o dia 27 de abril de 2019, por estar na iminência de ingressar com o pedido de aposentadoria. Após a concessão da permuta, também em abril, ele pediu antecipação das férias para o período de 4 a 23 do mesmo mês. A aposentadoria foi publicada no dia 30 de abril deste ano. 

O promotor de Justiça Alexandre Cruz, ex-presidente da Associação dos Membros do Ministério Público da Bahia (Ampeb), representou os autores na sessão plenária. Ele afirmou que a permuta deveria ter sido negada pelo MP-BA, por ser “escancaradamente simulada”, já que o promotor Nilson “anunciava aos quatro cantos que se aposentaria”. Cruz ainda informou que, mesmo com o deferimento da liminar pelo conselheiro Valter Shuenquener de Araújo para suspender a permuta, o MP-BA permitiu a manobra entre os promotores de Justiça. A simulação, para Alexandre Cruz, fica constatada pelo fato que Nilson nunca compareceu a Barreiras, enviou um e-mail para concretizar a permuta, pediu férias, e depois se aposentou. Ele ainda questionou como uma permuta pode “resultar em vacância” em uma promotoria no Oeste da Bahia e informou que a permuta poderia ter sido negada por ausência de interesse público. “Uma pessoa foi escolhida para ser agraciada com a vaga de um promotor de Justiça que seria aposentado”, declarou. Alexandre Cruz ainda sinalizou que o promotor de Justiça André Bandeira é o último ocupante da quinta última parte da lista de antiguidade de entrância final e foi agraciado com uma vaga ocupada por um promotor de Justiça com mais de 20 anos de carreira. “Não me parece honesto atalhar a carreira, buscar soluções criativas para burlar a lei e criar um sistema paralelo de provimento de vagas no MP da Bahia”, afirmou. Cruz ainda avaliou que, desta forma, o MP-BA não terá controle sobre a motivação que enseja a escolha de um determinado membro para receber a vaga de quem vai se aposentar.

O promotor de Justiça Cristiano Chaves fez sustentação oral pelo MP da Bahia, a pedido da procuradora-geral de Justiça, Ediene Lousado. Ele declarou que a lei não proíbe permuta, mas torna isso um ato privado que não poderia ser regulamentado. Informou que, de 16 casos de permutas julgadas no CNMP, quatro envolviam aposentadoria de um dos membros e os atos foram mantidos, permitindo as permutas. Um dos casos aconteceu na Bahia em 2012.  No âmbito do MP-BA, foram 32 permutas, envolvendo 64 membros, e não houve nulidades.

O relator, até aquela sessão, havia entendido que o ato era simulado, conforme o entendimento do CNMP de 2017. Valter Shuenquener declarou que a permissão de permutas com membro prestes a se aposentar estimula o “patrimonialismo e o sujeito colocará a promotoria no rol de patrimônio dele". “Não foi o que aconteceu, mas pode estimular esse tipo de situação, o que vai se aposentar escolher o amigo ou que lhe traga vantagens para ocupar o lugar", analisou. Declarou no voto que “a ausência de proibição expressa na lei não confere ao administrador um cheque em branco para realizar tudo o que pretender, mormente porquanto o texto constitucional pode veicular normas contrárias ao comportamento adotado”. O conselheiro Gustavo Rocha propôs uma modulação para que, a partir deste caso, o CNMP não permitisse mais permutas com pessoas em via de se aposentar, mas que permutas proferidas antes não fossem canceladas. A maioria dos conselheiros, até aquele momento, acompanhou o voto do conselheiro Gustavo, por isso o relator cassou a liminar que suspendia a permuta dos promotores baianos. Posteriormente, o conselheiro Luciano Nunes pediu vista.

Na sessão do dia 24 de setembro, o voto vista foi liberado. O conselheiro Luciano Nunes, logo de início, declarou que “talvez o conselheiro Bandeira esteja impedido neste caso”, por ser primo de André. Bandeira acompanhou o voto de Gustavo. Para Nunes, o caso não deveria ser visto como permuta por ato simulado, por não envolver duas questões: dolo de ambas as partes e a intenção de prejudicar terceiros. Luciano reiterou que o MP-BA já permitia esse tipo de permuta há muito tempo. O relator pediu para fazer um esclarecimento que posteriormente modificou o voto e suprimiu a avaliação de que houvera simulação, substituindo por uma prática da instituição baiana. Luciano Nunes afirmou que “o ato jurídico é perfeito e válido” e, por isso, entendeu que as permutas deveriam ser mantidas como foram pelo Conselho Superior do MP-BA. Valter Shuenquener salientou que, enquanto não houver um regramento sobre a questão, será permitido novas permutas envolvendo pessoas a se aposentar. “O meu medo é que esse julgamento não possa gerar um efeito positivo, que, a meu ver, o Conselho deve evitar que permuta como esta, em que a pessoa que faz a permuta nem vai para o outro local, pois se aposentará antes. Eu espero que isso não se repita no MP brasileiro”, declarou. “Se for improcedente, não poderemos recomendar nada”, ponderou, acrescentando que a proibição passaria a valer a partir desta decisão. “Essa era a posição vencedora até hoje”, reclamou diante das mudanças de posicionamento. Na coleta de votos, alguns conselheiros mudaram o voto para julgar a ação improcedente, como o corregedor Orlando Rochadel e o conselheiro Leonardo Accioly. O CNMP deverá criar uma norma para regular a permuta após a decisão.

Bahia Notícias

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