Época
Um mensalão de R$ 150 mil?
Integrantes do Ministério Público do Distrito Federal estão sob suspeita desde que a Operação Caixa de Pandora, deflagrada pela Polícia Federal em novembro, revelou um grande esquema de corrupção no governo de José Roberto Arruda. As suspeitas são fundamentadas em um depoimento do delegado Durval Barbosa – delator e principal informante da PF – em que ele descreve o suposto pagamento de propinas ao procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bandarra, e à promotora de Justiça Deborah Guerner. Em depoimento, ele relatou, com riqueza de detalhes, como o Ministério Público aprovou, em três anos de governo Arruda, cinco prorrogações, sem licitação, dos contratos de coleta de lixo no Distrito Federal, um negócio de cerca de R$ 760 milhões por ano.
Às procuradoras da República, Durval descreveu uma reunião em que o governador Arruda teria afirmado que, por conta do negócio do lixo, pagava propina de R$ 150 mil por mês ao procurador Bandarra. Presente à reunião, o advogado Aristides Junqueira – ex-procurador-geral da República, que atuou na defesa de Durval – teria reagido à afirmação de Arruda: “Governador, o senhor me desculpe, mas tenho muita resistência em acreditar que um procurador-geral de Justiça e presidente do Conselho de Ministérios Públicos se envolveria em coisas tão pequenas e mancharia sua biografia por isso”. Segundo Durval, Arruda encerrou o assunto com a seguinte resposta a Aristides: “Pois não duvide, quem paga sou eu. Quando atrasa, ele cobra de mim pessoalmente”.
Depois de Arruda ter assumido o governo, um site de Brasília publicou uma denúncia sobre o esquema do lixo. Por meio de Cláudia Marques – uma assessora de Arruda –, Deborah pediu a Durval, responsável nos últimos dez anos pelos contratos do governo do DF com empresas de informática, para sumir com a denúncia. No depoimento, Durval diz que, com a ajuda de especialistas em segurança de informática, conseguiu apagar a publicação. Por conta do episódio, Durval diz ter obtido o reconhecimento dos promotores e foi escolhido por Arruda para fazer os pagamentos das propinas aos integrantes do MP.
Voos turbulentos
Confirmou-se na semana passada que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva possui uma razoável capacidade de criar problemas sem necessidade. Na cerimônia do 7 de setembro de 2009, a Aeronáutica foi surpreendida pela revelação de que Lula havia aberto negociações diretas com o presidente da França, Nicolas Sarkozy, para adquirir 36 caças Rafale da empresa Dassault. Como outras duas empresas disputavam a mesma licitação, a sueca SAAB, que faz o avião Gripen, e a Boeing, que oferece o F-18, a descoberta criou um constrangimento supersônico entre os concorrentes, até porque a preferência francesa foi confirmada pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim.
O problema é que Lula não foi apenas indiscreto e atropelou um debate que até então ocorria em ambiente de indispensável segredo. Descobriu-se também que, conforme a análise militar, o melhor avião era outro, o Gripen. A segunda opção era o F-18. Já o escolhido pelo governo fora rebaixado para um modesto terceiro lugar. Descobriu-se a divergência na semana passada, quando a Folha de S.Paulo publicou um relatório técnico da Força Aérea Brasileira (FAB) revelando a escolha da caserna. Na condição de comandante em chefe das Forças Armadas, Lula terá a palavra final na decisão. Mas qualquer que seja sua opção, criou-se um impasse. Se não escolher o Gripen, será acusado de atropelar critérios técnicos. Se escolher o sueco, vai parecer um recuo.
Istoé
Caça ao vazamento
Um compromisso delicado aguarda o presidente Lula na volta de suas férias, nos próximos dias. Da praia do Guarujá, no litoral paulista, onde passou a semana passada, ele convocou para uma reunião o ministro da Defesa, Nelson Jobim, o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, e o brigadeiro Dirceu Tondolo Nolo, responsável pela Copac, comissão que coordena o programa FX-2, que resultará na bilionária compra de 36 jatos de combate para a Força Aérea Brasileira (FAB). Lula e Jobim querem saber como um relatório indicando o caça Gripen NG, da empresa sueca Saab, como o favorito dos militares para vencer a concorrência – disputada também pelo francês Rafale, da Dassault, e o americano F-18 Super Hornet, da Boeing – vazou para a imprensa no início da semana passada, constrangendo o presidente e o ministro e acirrando uma crise entre eles e os comandos das Forças Armadas.
O documento passou nas mãos de Saito e Jobim, que mandou os militares elaborarem uma nova versão, sem o ranking. Isso foi feito, mas o documento anterior, em vez de ser destruído, acabou vazando. Para o consultor de segurança nacional Salvador Ghelfi Raza, da Universidade de Defesa dos EUA, braço acadêmico do Pentágono, vazamentos como esse devem ser apurados. “É preciso investigar para saber se há uma manipulação do resultado da concorrência por interesses escusos”, afirma. O fato é que está em curso uma poderosa guerra de lobbies, envolvendo os maiores fabricantes mundiais, para abocanhar um contrato de até R$ 10 bilhões. Até que se prove o contrário, não há nada de ilegal na atuação desses grupos de pressão. No entanto, algumas vezes os interesses parecem difusos.
Um vice enrolado demais
O governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira (PMDB), interessado em antecipar sua campanha ao Senado, havia marcado solenidade na terça-feira 5 para transferir o comando do Estado para o vice-governador, Leonel Pavan (PSDB). A cerimônia teve que ser adiada. Antes mesmo da posse, as acusações contra o vice motivaram o PSOL a entrar com um pedido de impeachment na Assembleia Legislativa. Pavan foi obrigado a recuar porque não se sentiu em condições de assumir o cargo.
O temor não é gratuito. O vice-governador de Santa Catarina é citado em três operações da Polícia Federal sobre lavagem de dinheiro do narcotráfico, corrupção e fraudes em licitações milionárias. A queda de Pavan na preferência do eleitor ganhou força em dezembro, quando foi indiciado pela Polícia Federal depois de aparecer em escutas telefônicas e vídeos gravados na Operação Transparência, que investigou um esquema para beneficiar a Arrows Petróleo, empresa petrolífica carioca, em licitações.
A Arrows tem dívidas milionárias com o Fisco, mesmo assim obteve na Secretaria Estadual de Fazenda de Santa Catarina a documentação exigida para entrar em um edital. Segundo a PF, Pavan teria sido o intermediário para ajudar a Arrows. O caso foi parar no Ministério Público e o procurador-geral de Justiça, Gercino Gomes Neto, num despacho de sete páginas, apresentou denúncia contra Pavan. O vice admite que tentou intermediar a renegociação de um débito da petroleira Arrows, mas, em sua defesa, diz que a operação não foi concluída.
Em 2008, a Operação Influenza prendeu uma quadrilha especializada em operações cambiais ilegais e fraudes em licitações. As escutas, obtidas por ISTOÉ, mostram que Pavan tinha contato com o empresário apontado como o chefe da quadrilha, Francisco Carlos Ramos. O nome de Pavan também apareceu na Operação Zapata, deflagrada pela PF em 2006 para prender o traficante internacional Lúcio Rueda-Busto, que no Brasil usava o nome de Ernesto Plascência. Um dos cabeças do Cartel de Juarez, no México, Plascência coordenava a exportação de US$ 200 milhões mensais de cocaína para os Estados Unidos. O Brasil era utilizado como base do esquema. O dinheiro era lavado com imóveis no Balneário Camboriú (SC), onde Pavan foi prefeito três vezes.
Eles não deveriam estar aqui
O mito de que o Brasil é um país imune aos desastres naturais foi abaixo com as chuvas que colheram a vida de 138 brasileiros e causaram prejuízos de mais de R$ 1 bilhão desde o início de dezembro. Abaixo foram também as justificativas confortáveis e conformistas de que tragédias como as de Angra dos Reis (RJ), Cunha (SP) e de tantas outras cidades brasileiras ao longo das últimas décadas são fruto único e exclusivo de simples fatalidades causadas pelas incontroláveis forças da natureza. Não são. As mudanças climáticas que mobilizam o mundo deixaram de ser uma previsão e há fartura de tecnologia para se saber que casas encravadas na encosta de uma região com índices pluviométricos historicamente elevados têm uma probabilidade razoável de simplesmente ser carregadas com chuvas intensas. O clima mudou, e a tendência é de que histórias trágicas como as relatadas nessa primeira semana de 2010 se repitam com cada vez mais frequência, caso o poder público continue atribuindo aos céus a culpa pelos seus mortos.
Veja
Caças suecos x franceses: colisão política à vista
Quando o presidente Lula retornar a Brasília nesta semana, depois de ter passado o recesso de ano-novo refrescando-se nas águas tranquilas da Praia de Inema, na Bahia, pousará sem paraquedas na primeira encrenca política de 2010. Os brigadeiros da Força Aérea finalmente encerraram a licitação para escolher qual modelo de caça substituirá a envelhecida frota do país – e fizeram o favor de optar pelo avião que o presidente não quer. Após meses de exaustivos testes em voo e de criteriosas análises tecnológicas dos caças Rafale, da França, F-18 Super Hornet, dos Estados Unidos, e Gripen, da Suécia, os militares decidiram-se pelo último.
Trata-se de um investimento estratosférico: o governo pretende gastar cerca de 10 bilhões de reais na compra de 36 caças. São 10 bilhões de motivos para barulho, como ficou evidente na semana passada depois da revelação do relatório técnico da Aeronáutica. Para os militares, que tiveram o apoio sigiloso da Embraer, os aviões escolhidos constituem o melhor negócio porque são mais baratos, mais eficientes, gastariam menos quando fossem à oficina e, sobretudo, permitiriam a transferência integral de alta tecnologia à Força Aérea e também à Embraer. O único defeito: são aviões suecos, não franceses.
Fonte: Congressoemfoco
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