Depois de assistir o noticiário na TV ontem à noite, mantive o seguinte diálogo com minha esposa:
- Por que o Ministro do STJ suspendeu a ação penal contra diretores da empreiteira Camargo Correa?
- Basicamente, por motivos relacionados ainda ao Inquérito Policial e ao início da investigação.
- Como assim?
- Seguinte: segundo Ministro, a investigação teve início com base em carta anônima e isto fere o princípio constitucional que veda o anonimato. Além disso, também segundo o Ministro, a escuta telefônica também não teria atendido as exigências legais, pois a ordem teve uma abrangência muito ampla, podendo ferir a intimidade de quem não era parte, além de ter se arrastado por 14 meses.
- Entendi. Mas tenho ainda uma dúvida: e se as provas colhidas durante a investigação apontarem para a existência de crime? Neste caso, punir o crime não seria mais importante do que o detalhe do anonimato da primeira denúncia?
- Não. Nesta hipótese, a investigação somente aconteceu porque houve a denúncia anônima, entendeu? Assim, sem denúncia anônima não teria havido investigação e sem investigação não teriam sido descobertos crimes... O problema reside exatamente na origem de tudo.
- Está claro. Então, nesta lógica, com base em denúncia anônima através de serviços do tipo “disque denúncia” nenhuma ação penal pode mais prosseguir?
- Não é o caso de “não pode mais prosseguir”. Na verdade, nunca pode depois da Constituição de 1988...
- Mas todos sabem que a polícia arromba portas, invade casas, aplica flagrante, efetua prisões, apreende drogas e outros objetos tudo como base em denúncia anônima.
- É verdade. Também é verdade que em muitos casos a ação prossegue normalmente...
- Por que?
- Olhe, uma Ação Penal tem início com a uma Denúncia do Ministério Público normalmente baseado em um Inquérito Policial. Então, mesmo de posse de um Inquérito com indiciamento, o Promotor de Justiça poderia deixar de oferecer a Denúncia. Da mesma forma, o Juiz de Direito pode deixar de receber a Denúncia do Ministério Público se entender que houve ofensa a princípios constitucionais, por exemplo.
- Mas por que todos os Promotores e Juízes não fazem assim se a Constituição serve para todos?
- Depende do entendimento de cada um sobre a aplicação dos princípios constitucionais, ou seja, sua forma de interpretar. Entendeu?
- Entendi. Mas também se não tiver um bom advogado...
- É verdade. O advogado é essencial, pois sem ele o caso não é apreciado pelo Tribunal.
- Então, em tese, o Ministro está certo?
- Em tese, sim. Não sei o que consta dos autos e só posso falar em tese. O problema é que fica parecendo para a população que houve um favorecimento aos diretores de uma grande construtora...
- Mas a culpa é da justiça que não aplica a mesma Constituição para todos, parecendo que existe uma excelente Constituição para os ricos e esquecem-se dela quando os acusados são pobres. O problema é este: para os ricos, os princípios constitucionais; para os pobres, casa invadida, prisão em flagrante e penitenciária. Assim não dá! Isto é um absurdo!
- Você quem está dizendo...
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