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quarta-feira, março 02, 2022

Guerra na Ucrânia: como russos já estão sentindo as sanções econômicas impostas ao país




O rublo despencou em relação ao dólar e outras moedas nos últimos dias

Por Anastasia Stognei e Simon Fraser, em Moscou e em Londres

"Se eu pudesse ir embora da Rússia agora, eu faria. Mas não posso deixar meu emprego", diz Andrey, um designer industrial de 31 anos.

Ele não terá como pagar o empréstimo que tomou no banco para comprar sua casa em Moscou agora que as taxas de juros dispararam.

Milhões de russos como ele estão começando a sentir o efeito das sanções econômicas destinadas a punir o país por invadir a vizinha Ucrânia.

"Estou tentando encontrar novos clientes no exterior o mais rápido possível e sair da Rússia com o dinheiro que estava economizando para a primeira parcela da casa. (...) Estou com medo aqui — pessoas foram presas por falarem contra 'a linha do partido'. Eu estou com vergonha e nem votei nas pessoas que estão no poder."

Como outros entrevistados nesta reportagem, não estamos usando seu nome completo ou mostrando seu rosto por motivos de segurança. Alguns nomes foram alterados.

'Sanções econômicas foram criadas em apoio à Ucrânia'

As sanções que agora atingem a Rússia estão sendo chamadas por muitos de guerra econômica — elas visam isolar o país e criar uma profunda recessão. Os líderes de países como EUA e Reino Unido esperam que as medidas inéditas façam o Kremlin mudar de ideia.

Os russos comuns enfrentam a perda de suas economias. Suas vidas já estão sendo interrompidas.

As sanções contra alguns bancos russos impedir que eles usem Visa e Mastercard e, consequentemente, Apple Pay e Google Pay.

O gerente de projetos Daria, de 35 anos, disse que isso o impossibilita de usar o metrô de Moscou.

"Sempre paguei com meu telefone, mas agora simplesmente não funciona. Outras pessoas estão tendo o mesmo problema. Descobrimos que as catracas são operadas pelo banco VTB que está sob sanções e não consegue aceitar Google Pay e Apple Pay. Eu tive que comprar um cartão de metrô", disse ele à BBC. "Também não pude pagar em uma loja hoje, pelo mesmo motivo."

'Pagar viagens de metrô e compras em lojas agora é mais difícil para os russos'

Na segunda-feira (28/2), a Rússia mais que dobrou sua taxa de juros para 20% em depois que a cotação do rublo despencou por causa das sanções. A Bolsa de Valores russa permanece fechada em meio a temores de uma venda em massa de ações.

O Kremlin diz que tem recursos suficientes para resistir às sanções, mas especialistas têm demonstrado ceticismo em relação à real capacidade do governo russo.

No fim de semana, o Banco Central russo pediu calma à população em meio a temores de que haja uma corrida aos bancos — o que acontece quando muitas pessoas tentam sacar dinheiro ao mesmo tempo.

"Não há dólares, nem rublos — nada! Bem, há rublos, mas não estou interessado neles", disse Anton (nome alterado), que tem quase 20 anos e estava na fila de um caixa eletrônico em Moscou.

"Eu não sei o que fazer agora. Eu tenho medo de que estejamos nos transformando na Coreia do Norte ou no Irã agora."

Comprar moeda estrangeira custa aos russos cerca de 50% a mais do que custava há uma semana — nas raras vezes em que eles conseguem ter acesso a elas.

No início de 2022, um dólar era negociado por cerca de 75 rublos e um euro por 80. A guerra ajudou a estabelecer novos recordes: na segunda-feira, um dólar chegou a custar 113 rublos e um euro, 127.

Para os russos, a cotação do rublo-dólar é uma questão delicada há tempos.

Na década de 1990, após o colapso da União Soviética, o dólar era a única moeda forte com a qual os russos podiam contar — a aposta mais segura era manter suas economias em dólar debaixo do colchão.

Quando o governo do presidente Boris Yeltsin decretou calote da dívida russa em 1998, aqueles que estavam com seu dinheiro embaixo do colchão sentiram que haviam feito a coisa certa.

Mas na década seguinte várias medidas do Banco Central ajudaram a tranquilizar os russos sobre o valor do rublo. Os depósitos em moeda russa começaram a crescer, assim como a quantidade de dinheiro que os russos investem nas ações de empresas russas.

No entanto, sempre que há alguma incerteza, os russos sempre correm para o caixa eletrônico mais próximo para sacar dólares.

E desta vez não foi diferente.

Assim que a guerra estourou na Ucrânia na semana passada, os russos lotaram os caixas eletrônicos, lembrando-se das lições aprendidas em crises anteriores.

Ilya (nome alterado), que está na casa dos 30 anos, acabou de pagar o financiamento de sua casa em Moscou. Ele diz que agora não pode se mudar "tão cedo".

"Quando a operação em Donbas começou, eu fui ao caixa eletrônico e saquei as economias que tinha no Sberbank em dólares. Agora eu literalmente as guardo debaixo do travesseiro."

"O resto das minhas economias ainda está no banco: metade em dólares e o resto em rublos. Se as coisas piorarem, vou sacar tudo. Eu estou com medo porque acho que vamos ter uma onda de assaltos. Mas é o que é."

Vídeos e fotos nas redes sociais mostraram longas filas se formando em caixas eletrônicos e casas de câmbio em toda a Rússia nos últimos dias, com pessoas preocupadas que seus cartões bancários possam parar de funcionar ou que limites sejam colocados na quantidade de dinheiro que podem sacar.

Dólares e euros começaram a se esgotar algumas horas após a invasão. Desde então, quantidades muito limitadas dessas moedas estão disponíveis. E há um limite de quantos rublos se pode sacar.

De pé em uma fila em Moscou, Evgeny (nome alterado), de 45 anos, disse que queria sacar dinheiro para pagar o financiamento de sua casa.

"Todo mundo que conheço está ansioso. Todo mundo está estressado. Não tenho dúvidas de que a vida vai piorar. A guerra é horrível."

"Eu acho que todos os países são hipócritas e agora os 'países grandes' estão medindo forças, tentando provar qual deles é mais legal que o outro. E todas as pessoas estão sofrendo."

Marat, de 35 anos, diz: "Hoje é o primeiro dia em que decidi sacar dinheiro e não tive problemas. Eu saquei rublos por precaução. Eu não sou muito bom em fazer previsões, mas suspeito que nossa vida vai piorar. O tempo dirá."

'É mais fácil sacar em rublos do que em dólares, mas o dinheiro vale menos'

O problema do dinheiro não se limita a Moscou: as pessoas estão buscando dólares ou euros em lugares como Perm, Kostroma, Belgorod e outras cidades, informa a BBC Russian (serviço de notícias em idioma russo da BBC).

Um especialista em TI anônimo até criou um bot do Telegram que verifica automaticamente se há euros ou dólares nos caixas eletrônicos do Tinkoff, um banco privado popular, e compartilha a localização do ponto com assinantes.

Muitos estão tentando pré-encomendar dinheiro por meio de seus aplicativos de bancos, um recurso do sistema bancário da Rússia, que é bastante desenvolvido.

Na noite de domingo (27/2), quando as sanções contra as reservas do Banco Central russo foram anunciadas, ainda era possível usar um aplicativo para encomendar um dólar por até 140 rublos e um euro por até 150.

Mas na segunda-feira, os clientes do maior banco estatal da Rússia, o Sberbank, disseram à BBC Russian que não conseguiam mais encomendar dinheiro pelo aplicativo — seria preciso ir ao escritório e assinar um formulário.

'No Sberbank, os dólares precisam ser solicitados mediante um formulário preenchido pessoalmente'

Os bancos negam que haja problemas de liquidez — e os analistas concordam que é mais provável que a escassez de dinheiro nos caixas eletrônicos reflita uma tentativa de evitar uma corrida aos bancos.

O Kremlin disse que a Rússia estava pronta para enfrentar sanções, embora não tenha dito se as empresas receberão ajuda extra, como aconteceu durante a pandemia.

Mas os russos comuns — muitos dos quais se informam por meios de comunicação controlados pelo Estado, que repetem o discurso do Kremlin — vão começar em breve a perceber diferenças em suas vidas.

Os moradores de Moscou já estão relatando algumas filas em supermercados, com as pessoas pensando em estocar mercadorias que podem ser escassas devido a aumentos de preços ou restrições comerciais.

As empresas russas podem acabar cortando horas ou interrompendo sua produção à medida que as sanções começarem a fazer efeito. Além da desvalorização de suas economias, prevê-se que muitos russos possam perder seus empregos jà medida que a economia russa está sendo cortada dos mercados financeiros globais.

Para os russos, tudo isso traz de volta memórias do que aconteceu quando Putin anexou a Crimeia em 2014 e houve filas de horas na frente dos bancos.

Na época, as casas de câmbio tiveram que comprar às pressas novas placas eletrônicas com cinco dígitos, quando as antigas já não tinham mais espaço para informar a cotação.

Naquela época, um dólar normalmente custava de 30 a 35 rublos — uma quantia impensável nos dias de hoje.

Colaborou Amalia Zatari, em Moscou

BBC Brasil

Como Putin está mudando a Europa




Invasão da Ucrânia gera pequena revolução na União Europeia. Nunca antes países europeus renunciaram a princípios políticos e tradições ideológicas tão rapidamente como nos últimos dias.

Por Barbara Wesel

A guerra do presidente russo, Vladimir Putin, contra a Ucrânia desencadeou uma série de consequências não intencionais: uniu a Europa, pôs fim a bajulações econômicas e políticas de alguns países da União Europeia (UE), levou muitos de seus velhos amigos à clandestinidade e pôs um fim temporário às disputas mesquinhas.

O entusiasmo pela nova unidade pode ser temporário, pois o preço para as duras sanções ainda não foi pago. No entanto, a guerra de Putin é como um elixir da longa vida para a UE, vacas sagradas estão sendo abatidas e um novo vento sopra pelo bloco.

França: populistas perdem terreno

Desde que tomou posse, o presidente francês, Emmanuel Macron, tem pregado que a Europa deve se tornar mais autônoma economicamente e ser capaz de se defender. Seus colegas no bloco não o apoiavam. Agora está ficando claro o quanto Macron estava certo.

Entretanto, ele também tem que admitir erros: durante muito tempo, o francês havia cortejado Putin e acreditava que ele estava preocupado com a cooperação e o respeito na Europa. Após a  última e fracassada tentativa de negociar com o Kremlin, Macron se sentiu enganado.

Seus adversários políticos, no entanto, têm que renunciar a seu ídolo Putin da noite para o dia e não querem ser lembrados de seus tweets embaraçosos de antes. Até então, a linha pró-Putin do velho esquerdista Jean-Luc Melenchon, da populista de direita Marine Le Pen e seu rival de extrema-direita Eric Zemmour não desempenharam nenhum papel na campanha eleitoral.

Agora fotos de 2017 ao lado de Putin ficaram altamente embaraçosas para Le Pen. Naquele ano, sua campanha eleitoral recebeu doações do presidente russo. Um vídeo de Zemmour nas mídias sociais, onde ele elogiou Putin como um gênio e um francês quase virtual, é agora um sucesso negativo. E Melenchon admite que estava errado a respeito do russo. Todos os três estão agora se contendo e falando sobre paz.

Hungria: Orban muda de ideia

O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, havia se tornado um problema na UE nos últimos anos. Cada vez mais autoritário, corrupto e antidemocrata convencido, o húngaro tem causado discórdia e torpedeado decisões conjuntas. O desmantelamento do Estado de direito na Hungria o colocou em rota de colisão com Bruxelas. E sua total rejeição dos refugiados impediu uma política migratória comum.

Mas no fim de semana Orban foi à cidade fronteiriça de Beresegsurany, onde refugiados da Ucrânia atravessam a fronteira, para acolhê-los e prometer-lhes a ajuda da Hungria. É verdade que muitos que chegam ali pertencem à minoria húngara dos Cárpatos, mas Orban teve que retroceder nesta questão.

Orban está agora preso entre anos de proximidade com Putin e o ultraje europeu pela guerra na Ucrânia. Há apenas algumas semanas, ele havia visitado o Kremlin, quando declarou a exigência de garantias de segurança legítimas e as sanções da UE como contraproducentes. Então, no sábado passado, seu porta-voz anunciou que Budapeste apoiaria todas as sanções contra a Rússia. Viktor Orban não conseguirá retroceder tão rapidamente o quanto exigem as próximas eleições em abril, pois a opinião pública na Hungria é pró-Ucrânia.

As neutras Suécia e Finlândia

Desde a Segunda Guerra Mundial, os suecos têm considerado sua neutralidade como o mais alto bem. Em princípio, o país evita tomar partido e se distingue como negociador neutro na comunidade mundial. Agora, a primeira-ministra Magdalene Andersson declarou que entregaria capacetes, coletes de proteção e 5 mil armas antitanque à Ucrânia.

"Tomamos nossas próprias decisões em matéria de política de segurança", respondeu Andersson às ameaças de Putin sobre o suposto preço alto que Suécia e Finlândia teriam que pagar caso aderissem à Otan.

A Finlândia também reagiu friamente às ameaças de Putin. Lá, o não alinhamento imposto e a influência política do Kremlin após a Segunda Guerra Mundial são agora vistos de forma crítica. E, pela primeira vez, uma maioria de 53% dos entrevistados apoia agora que o país ingresse na Otan.  O desejo de proteção pela aliança militar ocidental parece mais importante do que a antiga tradição de neutralidade.

E quando perguntado sobre uma possível "finlandização" da Ucrânia, o ex-primeiro-ministro Alexander Stubb nega: "O termo é traumático para nós", seria um retorno às regras da Guerra Fria e não uma boa solução para a Ucrânia. "Finlandização" remete à época na década de 1970 quando a Finlândia fez concessões à União Soviética para manter uma política de boa vizinhança.

Alemanha: Fim de velhos princípios

"A Alemanha está assumindo seu papel como potência global" escreveu a agência de notícias Reuters nesta segunda-feira (28/02), resumindo os comentários mundiais expressando entusiasmo e espanto na virada histórica do chanceler federal alemão, Olaf Scholz, no domingo.

Da noite para o dia, ele removeu todas as crenças de décadas da política alemã: sim às armas para a Ucrânia, sim a uma Bundeswehr pronta para a ação, sim ao aumento dos gastos com a defesa e não à dependência energética da Rússia, não aos que entendem Putin e apologistas de seu governo autoritário.

A tradução inglesa do discurso de Scholz foi compartilhada como pão quente no Twitter entre os observadores anglo-saxões, tão grande foi o assombro com a reviravolta em Berlim. O chefe de governo alemão jogou no lixo cerca de 30 anos de política alemã em relação à Rússia, especialmente a de seu próprio partido. No dia seguinte, a política externa e de segurança da República Federal da Alemanha está irreconhecível.

Reações em outros países

O presidente tcheco, Milos Zeman, durante anos um ardente apoiador do presidente Putin, agora chama seu antigo amigo de "lunático que deve ser isolado" e que põe em perigo a paz na Europa.

O populista italiano de direita Matteo Salvini, que se deixou fotografar mais de uma vez usando uma camiseta estampando Putin, tenta apagar antigos elogios ao presidente russo nas mídias sociais e colocou flores na embaixada ucraniana em Roma.

Após a anexação da Crimeia, o ex-primeiro-ministro escocês Alex Salmond ainda havia elogiado Putin como um patriota russo. Agora, ele suspendeu seu talk show no canal de propaganda russo RT até que a paz seja restaurada.

O ex-candidato presidencial francês François Fillon, o ex-chanceler austríaco Christian Kern e outros renunciaram a seus cargos em empresas estatais russas em protesto. Somente o ex-chanceler alemão Gerhard Schröder permanece com seu cargo na Gazprom, falando que houve "erros de ambos os lados".

E por último: o premiê búlgaro Kiril Petkov demitiu seu ministro da Defesa porque ele se recusiou a definir o conflito na Ucrânia como "guerra".

Deutsche Welle

Ataques a mísseis deixam mortos e feridos nas duas maiores cidades da Ucrânia; veja os últimos acontecimentos da guerra




Ataque à maior torre de TV da capital ucraniana.

Cinco pessoas morreram em um ataque das forças militares da Rússia a uma torre de TV em Kiev na terça-feira (1/3), sexto dia da invasão russa no país.

A estrutura fica próxima de um memorial do Holocausto em homenagem às vítimas do Babi Yar, um dos maiores massacres de judeus na Segunda Guerra.

"Qual é a razão de escrever 'nunca de novo' por 80 anos se o mundo permanece em silêncio quando uma bomba cai no mesmo lugar de Babi Yar? Ao menos cinco mortos. A história se repete", escreveu o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, no Twitter.

A capital permanece nas mãos da Ucrânia, mas segue sendo duramente atacada, enquanto um enorme comboio militar russo, de 64 km de extensão, avança lentamente em direção à cidade.

O comboio está neste momento a cerca de 30 km de distância.

Na tarde de terça-feira, a Rússia alertou que realizará ataques a sedes dos serviços de segurança em Kiev para "evitar ataques de informação contra a Rússia" e disse que civis devem evacuar esses locais.

Confira a seguir os acontecimentos mais recentes e importantes da guerra.

'O centro de Kharkiv, a segunda maior cidade da Ucrânia, foi alvo de ataque a míssil na manhã de terça-feira. Um prédio do governo regional, localizado no coração da Praça da Liberdade, foi atingido pela explosão'.

Ao menos 10 pessoas morreram e 35 ficaram feridas, segundo as autoridades locais.

Na foto abaixo, é possível ver os socorristas removendo os destroços do edifício atingido. Ppessoas foram retiradas dos escombros, de acordo com o Serviço de Emergência do Estado da Ucrânia.

'Equipes de resgate fazem buscas nos escombros dos prédiso após o ataque'

Um teatro e uma sala de concertos, ambos localizados na Praça da Liberdade de Kharkiv, também foram atingidos por mísseis e foguetes russos.

A Praça da Liberdade é a segunda maior localizada no centro de uma cidade na Europa e é considerada um marco da cidade.

Kharkiv tem sido fortemente bombardeada há dias, e 16 pessoas foram mortas antes do ataque de terça-feira, disse Zelensky.

O presidente da Ucrânia classificou os ataques à cidade como "terrorismo de Estado".

O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia tuitou um vídeo da explosão na Praça da Liberdade (veja abaixo) e acusou o presidente russo, Vladimir Putin, de crimes de guerra.

Moradores da cidade disseram à BBC que estão com muito medo de saírem de seus bunkers ou casas.Os trens de evacuação estão circulando, mas as informações são escassas, e nem todos podem chegar à estação com segurança.

Ataques a outras cidades ucranianas

O Pentágono disse que os russos ainda não tomaram a cidade portuária de Mariupol, considerada estratégica. No entanto, conquistaram o controle da cidade portuária de Berdyansk e Melitopol mais a oeste.

Nas redes sociais, vídeos que foram checados pela BBC mostram prédios residenciais destruídos na cidade de Borodyanka, a noroeste de Kiev.

Em um trecho, um homem fala: "Não há tropas aqui, apenas moradores comuns de Borodyanka - avós, avôs, crianças. As pessoas estão se abrigando nos sótãos".

O vídeo abaixo mostra um parquinho para crianças enquanto uma testemunha diz que de três a quatro bombas foram lançadas de um avião.

Há relatos ainda de que o centro regional de Kherson, no sul da Ucrânia, está cercado por tropas russas.

A cidade, localizada perto da Crimeia, controlada por Moscou, foi alvo de um ataque terrestre no início da terça-feira, de acordo com testemunhas.

"A cidade está realmente cercada, há muitos soldados russos e equipamentos militares por todos os lados, eles montaram postos de controle nas saídas", disse a jornalista Alena Panina, de Kherson, à emissora nacional Ukraine 24.

As autoridades ucranianas confirmaram também que pelo menos 70 soldados foram mortos no domingo (27/2) em um ataque russo à base militar de Okhtyrka, na região de Sumy, que está atualmente sob cerco das tropas russas.

A foto abaixo foi compartilhada pela autoridade local da região de Sumy, Dmytro Zhyvytskyi. E mostra os esforços dos socorristas tentando encontrar sobreviventes em meio aos escombros.

'Equipes de resgate procuram sobreviventes em meio aos escombros na base militar de Okhtyrka'

Zelensky: 'Não podemos lidar com isso sozinhos'

A partir de um bunker na capital, Volodymyr Zelensky deu entrevistas à rede de televisão americana CNN e à agência de notícias Reuters.

Ele afirmou ser preciso que os ataques russos sejam interrompidos para que as negociações de cessar-fogo avancem de fato.

Zelensky disse que "a Ucrânia lutará mais forte do que qualquer um", mas que não pode administrar a guerra contra a Rússia por conta própria.

O presidente ucraniano, que emergiu como uma figura símbolo da defesa do país, disse que as negociações de cessar-fogo só poderiam ser levadas a sério se os combates parassem primeiro.

"Se você fizer isso, e ambos os lados fizerem isso, significa que eles [Rússia] estão prontos para a paz", disse ele.

"Se eles não estiverem prontos [sic], significa que você está apenas perdendo tempo. Vamos ver [se eles estão prontos]."

'Volodymyr Zelensky falou a veículos de mídia ocidentais'

Presidente ucraniano é ovacionado no Parlamento europeu

Zelensky falou ao Parlamento europeu por teleconferência e reforçou o pedido para que a Ucrânia se torne membro da União Europeia (UE).

"Nestes últimos dias, não sei mais como cumprimentar as pessoas. Não posso dizer bom dia ou boa noite, porque para alguns este é o último dia", disse ele.

"Estamos tendo que enfrentar a dura realidade, as pessoas estão morrendo todos os dias. Acho que hoje essas vidas estão sendo sacrificadas por valores, direitos, liberdade e igualdade dos quais você se beneficia."

"A opção europeia da Ucrânia é o caminho em que estamos nos empenhando hoje. Eu gostaria de ouvir de vocês que a escolha da Ucrânia também é sua."

"A UE será muito mais forte conosco. Mostramos nossa força e que somos iguais. Vocês podem nos provar que estão do nosso lado, que não vão desistir de nós."

O presidente ucraniano foi aplaudido de pé pelos presentes.

'Zelensky falou ao Parlamento europeu por teleconferência'

Pentágono: 'Forças russas avançam mais lentamente do que planejado'

Autoridades de Defesa dos Estados Unidos disseram que a operação da Rússia avançou muito mais lentamente do que o planejado e, agora, enfrenta escassez de suprimentos.

"Eles estão ficando literalmente sem combustível e começando a ficar sem comida para suas tropas", disse um funcionário à agência de notícias AFP.

O funcionário também disse que há sinais de problemas na moral da força russa, que conta com um grande número de soldados recrutados.

"Nem todos eles estavam aparentemente totalmente treinados e preparados, ou mesmo cientes de que seriam enviados para uma operação de combate."

O Pentágono disse que as forças russas ainda não assumiram o controle dos céus da Ucrânia depois de seis dias, nem atingiram alvos importantes, como Kharkiv ou Mariupol.

O Pentágono acrescentou que:

    A Rússia lançou cerca de 400 mísseis, mas o sistema de defesa antimísseis ucraniano continua funcionando;

    Lançadores que poderiam ser usados para armas termobáricas foram vistos dentro da Ucrânia, mas a inteligência dos EUA não pode confirmar se alguma arma termobárica está no país;

    Cerca de 80% das tropas russas que cercaram a Ucrânia estão agora dentro do país.

Presidentes da Ucrânia e EUA conversam por telefone

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, conversou por meia hora com Zelensky por telefone sobre a invasão russa.

Os dois discutiram sanções contra a Rússia e assistência militar à Ucrânia, disse Zelensky em um tuíte.

O presidente americano também tuitou sobre a ligação.

Diplomatas boicotam ministro russo na ONU

Durante reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, mais de cem diplomatas de 40 países abandonaram a sessão quando o chanceler russo, Sergei Lavrov, discursava por teleconferência.

O boicote foi um protesto contra a guerra travada por Moscou. O representante do Brasil permaneceu no plenário.

Na mesma reunião, o secretário norte-americano de Estado, Antony Blinken, questionou a participação russa no conselho.

"Alguém pode razoavelmente questionar se um Estado-membro da ONU que tenta invadir outro Estado-membro - enquanto comete abusos de direitos humanos e causa grande sofrimento humanitário - deve ter direito de permanecer nesses conselho."

Belarus não vai se juntar à invasão, diz Lushenko

O presidente da Belarus, Alexander Lukashenko, disse à mídia estatal que suas forças não se juntarão às tropas russas na invasão da Ucrânia.

Lukashenko, que é um aliado do presidente russo, disse que o "Exército bielorrusso não está participando de uma ação militar, e nunca o fez".

"Podemos provar isso para qualquer um. Mais do que isso, a liderança russa nunca levantou essa questão conosco - nosso envolvimento no conflito armado. E não pretendemos participar dessa operação especial na Ucrânia no futuro. Não há necessidade disso."

Na segunda-feira (28/2), surgiram temores de que Lukashenko estava se preparando para enviar uma força militar para se juntar ao ataque.

Um porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Ned Price, disse que a Rússia "zombou" da soberania da Belarus ao lançar sua invasão da Ucrânia a partir do território bielorrusso.

Reino Unido anuncia sanções contra Belarus

O Reino Unido está impondo sanções à Belarus, anunciou o governo britânico.

A secretária de Relações Exteriores, Liz Truss, disse que as sanções estão sendo lançadas contra indivíduos e organizações por causa do papel que o país está desempenhando na invasão da Ucrânia.

"O regime de Lukashenko ajuda ativamente e é cúmplice da invasão ilegal da Rússia e sentirá as consequências econômicas de seu apoio a Putin", disse Truss.

Mais de 660 mil ucranianos já fugiram do país

A agência de refugiados da ONU diz que mais de 660 mil pessoas - a maioria delas mulheres e crianças - deixaram a Ucrânia desde o início da guerra.

Shabia Mantoo, porta-voz da agência, disse que há relatos de pessoas esperando até 60 horas para entrar na Polônia, enquanto as filas na fronteira romena chegam a 20 km.

FIA decide que pilotos russos continuarão a competir

O órgão regulador do automobilismo, a FIA, decidiu que os pilotos russos podem continuar a competir em eventos globais, embora não sob a bandeira russa.

O mesmo se aplica aos pilotos bielorrussos devido ao apoio de Minsk à invasão da Ucrânia.

A decisão permitirá que o piloto russo Nikita Mazepin corra na F1 nesta temporada com a equipe Haas.

Os competidores dos dois países hastearão uma bandeira neutra e devem assumir "compromisso específico e adesão aos princípios de paz e neutralidade política da FIA, até novo aviso", disse o órgão.

A FIA também anunciou que cancelaria o próximo evento da Intercontinental Drifting Cup que seria realizado em Sochi, na Rússia, neste verão.

Ucrânia vai vender 'títulos de guerra' para financiar Forças Armadas

O governo da Ucrânia disse que planeja vender títulos para financiar suas Forças Armadas, enquanto elas defendem o país da invasão russa.

Pelo Twitter, o Ministério das Finanças da Ucrânia informou que cada título de um ano teria um valor nominal de 1.000 hryvnias, moeda local (cerca de R$ 172) e que a taxa de juros oferecida aos investidores seria "determinada no leilão".

"Os rendimentos dos títulos serão usados ​​para atender às necessidades das Forças Armadas da Ucrânia", acrescentou.

ONU deve votar resolução em reunião de emergência

Diplomatas esperam para a quarta-feira uma votação de um projeto de resolução das Nações Unidas a respeito da guerra.

As negociações ocorrem meio a uma reunião de emergência da Assembleia Geral que foi convocada pelo Conselho de Segurança da ONU.

'ONU deve votar resolução sobre guerra na Ucrânia'

O encontro, que começou na segunda-feira (28/2), reúne seus 193 países-membros.

Esta é apenas a 11ª sessão especial de emergência da Assembleia Geral da ONU desde a primeira, em 1956. A natureza rara desta reunião ressalta a enorme preocupação em torno desta crise.

A expectativa é que a resolução seja aprovada, embora ela tenha um valor mais simbólico porque as medidas previstas por ela não serão vinculativas.

BBC Brasil

Com discurso duro contra Putin e anúncio de mais sanções, Biden tem seu 1º Estado da União




Presidente Joe Biden no Congresso para seu discurso do Estado da União. 

Pronunciamento é tradicional e acontece anualmente. É o momento em que o presidente dos EUA visita o Congresso americano para apresentar seus principais projetos para o ano.

Por Fabio Manzano

O presidente americano, Joe Biden, endureceu o seu discurso contra Vladimir Putin e anunciou mais sanções à Rússia pela guerra na Ucrânia, nesta terça-feira (1º), em seu primeiro Estado da União, tradicional pronunciamento que acontece uma vez por ano no Congresso dos Estados Unidos.

"Há 6 dias, Vladimir Putin, da Rússia, achou que iria abalar as próprias fundações do mundo livre, pensando que poderia fazê-lo se curvar aos seus caminhos ameaçadores, mas ele teve um erro de cálculo, ele se deparou com o povo ucraniano", disse Biden.

O americano citou o discurso do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, ao Parlamento Europeu e agradeceu a presença da embaixadora ucraniana em Washington, Oksana Markarova, que foi aplaudida de pé por membros do Congresso e convidados.

    "Estamos com o povo ucraniano", disse Biden.

'Embaixadora da Ucrânia nos EUA foi aplaudida de pé durante discurso de Joe Biden'

"Ao longo de nossa história, aprendemos esta lição: quando os ditadores não pagam o preço por sua agressão, eles causam mais caos", disse Biden. "Eles continuam se movendo. E os custos e ameaças para os EUA e o mundo continuam aumentando."

Biden defendeu a importância da diplomacia americana e da aliança militar Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), formada pelos EUA e mais 29 países. Ele disse ainda que os EUA vão proteger "cada polegada de território da Otan".

    O que é a Otan, qual significado da sigla, países membros e objetivos

"É por isso que a Aliança da Otan foi criada, para garantir a paz e a estabilidade na Europa após a Segunda Guerra Mundial. Os EUA são membros junto com outras 29 nações. Isso importa. A diplomacia americana é importante."

Biden: 'Os EUA vão proteger cada polegada de território da Otan'

"A guerra de Putin foi premeditada e não provocada [...] Ele achou que o Ocidente e a Otan iriam se dividir. Ele pensou que poderia nos dividir. Ele estava errado", disse o presidente dos EUA.

    "Para todos os americanos, serei honesto com vocês, como sempre prometi que seria", disse Biden. "Um ditador russo, invadindo um país estrangeiro, tem custos em todo o mundo."

Mais sanções contra Putin

Biden anunciou o fechamento do espaço aéreo americano para voos russos e uma série de sanções econômicas "robustas" que vão "machucar".

    "Putin sabe que está isolado como jamais esteve, e nós estamos juntos. Juntos com nossos aliados estamos agora garantindo as sanções poderosas contra eles", disse o americano

Ele garantiu, no entanto, que vai proteger empresas e consumidores americanos dos efeitos colaterais. Para isso, ele anunciou a liberação dos estoques de emergência de petróleo dos EUA e aliados. Serão ao todo 60 milhões de barris, destes, 30 milhões apenas das reservas americanas.

    "E estamos prontos para fazer mais, se necessário, junto com nossos aliados", disse Biden. "As ações vão mostrar a Putin que ele ficou mais fraco e o resto do mundo ficou mais forte."

O presidente americano disse ainda que o Departamento de Justiça dos EUA vai investigar e punir oligarcas russos envolvidos em atividades criminosas.

"Hoje eu digo aos oligarcas russos e líderes corruptos que roubaram bilhões de dólares deste regime violento, não mais", disse o americano. "Estamos nos unindo aos nossos aliados europeus para encontrar e apreender seus iates, apartamentos de luxo, jatos particulares. Estamos atrás de seus ganhos ilegítimos."

Aplausos e homenagens

O presidente americano uniu os dois partidos – Republicanos e Democratas – ao anunciar as medidas contra Putin e os oligarcas russos.

Assim que informou sobre as medidas mais recentes contra a Rússia, Biden foi aplaudido por ambos os lados do Congresso americano, apesar de o governo Biden não conseguir unanimidade nos seus assuntos de política interna – como o pacote de infraestrutura.

Em geral, os congressistas aproveitam o Estado da União para enviar mensagens simbólicas ao governo. Neste ano, muitos deles vestiram as cores azul e amarelo, as mesmas da bandeira da Ucrânia, para demonstrar apoio a esta nação e à resposta dos EUA a esta guerra.

Economia e infraestrutura

Além da guerra na Ucrânia, Biden também discursou sobre temas da sua agenda interna. O presidente voltou a defender seus plano de infraestrutura, que encontram resistência no Congresso.

    "Deixemos de de falar sobre semanas de infraestrutura. Teremos uma década de infraestrutura", disse o democrata.

O presidente também apresentou sua proposta para combater a inflação nos EUA, uma preocupação que se agravou durante a pandemia.

    "Meu plano para combater a inflação reduzirá seus custos e diminuirá o déficit", dirá Biden.

"Temos uma escolha", disse o democrata. "Uma maneira de combater a inflação é reduzir os salários e tornar os americanos mais pobres. Tenho um plano melhor para combater a inflação."

"Reduza seus custos, não seus salários. Faça mais carros e semicondutores nos EUA. Mais infraestrutura e inovação nos EUA", disse o presidente.

Direito ao voto e 1ª negra na Suprema Corte

O presidente americano fez um apelo ao Senado para que passe a lei de liberdade de voto, apelidada de lei John Louis.

Ele reforçou o direito ao voto como um direito fundamental e disse que ele vem sendo tolhido por leis estaduais que dificultam os votos principalmente para as comunidades mais vulneráveis.

Biden falou também da indicação de Ketanji Brown Jackson, sua primeira juíza para a Suprema Corte, uma mulher negra, que deverá passar pela aprovação do Congresso.

Jackson deverá assumir a cadeira do ministro Stephen Breyer, que também foi homenageado durante o Estado da União.

Pandemia da Covid-19

O presidente americano começou o discurso celebrando que neste ano ele pôde ser feito de forma presencial, com o relaxamento das medidas para a Covid-19.

Nos EUA, diversos estados já vêm retirando a obrigatoriedade do uso de máscaras até mesmo em ambientes internos por conta do avanço da vacinação.

    "Hoje à noite posso dizer que estamos avançando com segurança de volta a rotinas mais normais", disse Biden.

O presidente ainda lembrou das vítimas da pandemia, e disse que é preciso "ficar em guarda" e continuar a combater o vírus para evitar novas variantes.

"Nunca vamos desistir de vacinar mais americanos", disse o democrata. Nos EUA, 65,2% da população está totalmente vacinada, segundo a plataforma Our World in Data.

Ele disse ainda que o país está prestes a aprovar a vacinação para crianças com menos de cinco anos, e que os cientistas "trabalham duro" para desenvolver tratamentos antivirais.

O que é o Estado da União?

É o discurso do presidente que ocorre todos os anos em uma sessão conjunta do Congresso americano. Nele, o chefe de Estado e de governo presta esclarecimentos aos parlamentares, militares e integrantes da Suprema Corte sobre a atual situação dos EUA e os planos e prioridades do ano.

O primeiro discurso sobre o Estado da União foi pronunciado por George Washington em 8 de janeiro de 1790.

Tradicionalmente, o presidente norte-americano pede esforços a deputados e senadores para aprovar projetos que o chefe de governo acredita ser importante.

AP / G1

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"Putin está cometendo um erro histórico".




Madeleine (foto) visitou o então presidente interino da Rússia no Kremlin, em 2000, e registrou suas impressões: 'Putin é pequeno e pálido (...), quase tão frio quanto um réptil'

Por Madeleine Albright*

No início de 2000, tornei-me a primeira autoridade-sênior dos Estados Unidos a encontra-se com Vladimir Putin em sua nova função como presidente-interino da Rússia. Nós, no governo Clinton, não sabíamos muito a respeito de Putin na época - somente que ele havia iniciado sua carreira na KGB. Eu esperava que a reunião me ajudasse a conhecer o homem e avaliar o que sua súbita ascensão poderia significar para as relações EUA-Rússia, que haviam se deteriorado em meio à guerra na Chechênia. Sentada a uma pequena mesa junto a Putin no Kremlin, fiquei imediatamente impressionada com o contraste entre ele e seu bombástico antecessor, Boris Yeltsin.

Enquanto Yeltsin havia persuadido, rugido e adulado, Putin falava sem demonstrar emoção nem soar nenhuma nota de sua determinação em reavivar a Rússia economicamente e esmagar os rebeldes chechenos. Voando de volta para os EUA, registrei minhas impressões. “Putin é pequeno e pálido”, escrevi, “quase tão frio quanto um réptil”. Ele alegava entender por que o Muro de Berlim tinha de cair, mas não esperava que a União Soviética colapsasse totalmente. “Putin está envergonhado com o que aconteceu com seu país e determinado a restaurar sua grandeza.”

Nos meses recentes, enquanto Putin concentrava tropas nas fronteiras da vizinha Ucrânia, aquela reunião de quase três horas com ele veio à minha memória. Depois de chamar o estatuto de Estado da Ucrânia de ficção, Putin assinou um decreto reconhecendo as duas regiões controladas por separatistas na Ucrânia e enviou tropas para lá.

A revisionista e absurda asserção de Putin de que a Ucrânia é “inteiramente criada pela Rússia” e foi efetivamente roubada do Império Russo é totalmente destinada a se alinhar à sua pervertida visão de mundo. Mais perturbador para mim: Foi sua tentativa de estabelecer o pretexto para uma invasão total.

Nos ímpares 20 anos que se passaram desde que nos encontramos, Putin traçou seu curso evitando desenvolvimentos democráticos à cartilha de Stálin. Ele acumulou poder político e econômico - cooptando ou esmagando possíveis competidores - enquanto pressionou para restabelecer uma esfera de domínio russo em partes da antiga URSS. Como outros autoritários, ele equipara seu próprio bem-estar ao da pátria e oposição a traição. Putin está certo de que os americanos espelham tanto seu cinismo quanto sua sanha pelo poder; e de que num mundo em que todos estão mentindo, ele não tem nenhuma obrigação de dizer a verdade. Por acreditar que os EUA dominam sua própria região pela força, ele crê que a Rússia tem o mesmo direito.

Putin buscou por anos rebrilhar a reputação internacional de seu país, expandir o poderio militar e econômico da Rússia, enfraquecer a Otan e dividir a Europa (enquanto incita uma barreira entre os europeus e os EUA). A Ucrânia faz parte disso tudo.

Em vez de pavimentar o caminho russo à grandeza, invadir a Ucrânia comprovaria a infâmia de Putin, ao deixar seu país isolado diplomaticamente, incapacitado economicamente e vulnerável estrategicamente, em face a uma aliança ocidental mais forte e mais unida.

Ele já acionou esse mecanismo ao anunciar na segunda-feira sua decisão de reconhecer os dois enclaves separatistas na Ucrânia e enviar “tropas de paz” russas para as regiões. Agora ele exige que Kiev reconheça a reivindicação russa pela Crimeia e entregue seu armamento avançado.

As ações de Putin desencadearam sanções massivas, e mais virão se ele lançar um ataque total e tentar tomar a Ucrânia inteira. Isso devastaria não apenas a economia russa, mas também o estreito círculo de comparsas corruptos de Putin - que, em troca, poderiam desafiar sua liderança. O que certamente será uma guerra sangrenta e catastrófica drenará os recursos da Rússia e cobrará vidas russas - ao mesmo tempo que criará um incentivo urgente para a Europa se livrar de sua perigosa dependência da energia russa. (Isso já começou, com a manobra alemã para impedir a certificação do gasoduto Nord Stream 2).

Tamanho ato de agressão quase certamente faria com que a Otan reforçasse significativamente seu flanco oriental e considerasse estacionar forças permanentemente nos Estados bálticos, na Polônia e na Romênia. (O presidente Joe Biden afirmou na terça-feira que está enviando mais soldados para os países Bálticos.) E isso geraria uma feroz resistência armada na Ucrânia, com forte apoio do Ocidente. Um esforço bipartidário já está em andamento para cunhar uma resposta legislativa que incluiria aumentar a ajuda letal à Ucrânia. Seria muito além de uma repetição da anexação da Crimeia, em 2014; trataria-se um cenário que remeteria à malfadada ocupação soviética do Afeganistão, nos anos 80.

Biden e outros líderes ocidentais deixaram isso muito claro rodada após rodada de diplomacia furiosa. Mas mesmo se o Ocidente for de alguma maneira capaz de dissuadir Putin de uma guerra total - hipótese longe de estar garantida neste momento - é importante lembrar que a competição preferida dele não é o xadrez, como assumem alguns, mas o judô. Podemos esperar que ele persista em buscar uma chance de aumentar sua influência e atacar no futuro. Caberá aos EUA e seus amigos negar-lhe essa oportunidade sustentando uma vigorosa resposta diplomática e aumentando o apoio econômico e militar à Ucrânia.

Apesar de que Putin jamais, segundo minha experiência, admitirá estar cometendo um erro, ele tem demonstrado que é capaz tanto de paciência quanto de pragmatismo. Ele também é certamente consciente de que a atual confrontação o deixou ainda mais dependente da China; ele sabe que a Rússia é incapaz de prosperar sem algum laço com o Ocidente. “Claro que gosto de comida chinesa. É divertido usar os palitinhos”, disse-me ele em nosso primeiro encontro. “Mas isso não passa de uma trivialidade. Não é nossa mentalidade, que é europeia. A Rússia tem de integrar firmemente o Ocidente.”

Putin deve saber que a Rússia não se sairia necessariamente bem de uma segunda Guerra Fria - mesmo com suas armas nucleares. Aliados fortes dos EUA podem ser encontrados em quase todos os continentes. Os amigos de Putin, enquanto isso, incluem tipos como Bashar Assad, Alexander Lukashenko e Kim Jong-un.

Se Putin sente-se encurralado num canto do ringue, ele só pode culpar a si mesmo. Como Biden notou, os EUA não têm nenhum desejo de desestabilizar a Rússia nem privar o país de suas aspirações legítimas. Este é o motivo de Washington e seus aliados terem se oferecido para negociar com Moscou a respeito de uma ampla gama de temas de segurança. Mas os EUA têm de insistir para que a Rússia aja em acordo com padrões internacionais aplicáveis para todos os países.

Putin e seu homólogo chinês, Xi Jinping, gostam de afirmar que vivemos atualmente num mundo multipolar. Ainda que isso seja evidente, não significa que grandes potências tenham direito de fatiar o planeta em esferas de influência como os impérios coloniais fizeram séculos atrás.

A Ucrânia tem direito à sua soberania, não importa quem sejam seus vizinhos. Na era moderna, grandes países aceitam isso - e Putin também deve aceitar. Essa é a mensagem que sustenta a recente diplomacia ocidental. E define a diferença entre um mundo governado pelo estado de direito e um mundo sem regras.

*Ex-secretária de Estado dos EUA entre 1997 e 2001

O Estado de São Paulo

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