Carlos Chagas
É bom o governo prestar atenção na mais recente farpa enviada pelo ministro Gilmar Mendes sobre o presidente Lula, exortando a Justiça Eleitoral a agir com critério único diante das representações contra abusos praticados nas campanhas, inclusive sua antecipação. O presidente do Supremo Tribunal Federal criticou a hipótese de padrões diferentes nesses julgamentos, quer dizer, rigor excessivo quando se trata de processos contra parlamentares e prefeitos, mas leniência dali para cima.
O recado foi direto, pois as declarações de Gilmar Mendes coincidiram com mais uma denúncia do PSDB e do DEM, esta semana, contra o presidente Lula e Dilma Rousseff, precisamente por antecipação da campanha.
O primeiro-companheiro e a ministra tomam pouco cuidado quando, em viagens pelo país, inauguram e fiscalizam obras. Nada tem de sutis as referências do Lula à continuidade dos programas em desenvolvimento e até as afirmações sobre haver chegado a vez de uma mulher assumir o palácio do Planalto. A candidata, por sua vez, aceita a carapuça dourada e comporta-se como num ringue de boxe, atacando os tucanos e demais adversários.
Não passa pela cabeça de ninguém que o Tribunal Superior Eleitoral venha considerar o presidente culpado e determine a cassação do seu mandato. No auge da popularidade, nem com dinamite ele seria afastado. Até porque, qualquer sentença daquela corte seria submetida ao Supremo Tribunal Federal, onde, dos onze ministros, o Lula já nomeou sete. Mesmo assim, um sinal foi enviado por Gilmar Mendes. Resta saber se vai ser recebido.
Lamentos em profusão
Brasília foi criada para não ter representação política. Seria apenas a casa do presidente da República, com um prefeito nomeado. O tempo passou, o prefeito virou governador, o Congresso estabeleceu que a capital federal elegeria oito deputados federais, três senadores e, depois, disporia de uma Câmara Legislativa.
Durante décadas elites frustradas de São Paulo e do Rio, principalmente, denegriam Brasília pelo fato de precisarem vir aqui cuidar de seus interesses. Chegaram a chamar a cidade de “Ilha da Fantasia” e até de covil de ratos, esquecidos de que os ratos vinham de fora, muitos chegando às terças-feiras e saindo às quintas.
Desafortunadamente, porém, aqui foi sendo criada uma classe política à imagem e semelhança das outras, de fora. Muita demagogia, corrupção e lambanças, apesar de haver gente séria na política local. Mas também há ratos em profusão. Chegamos ao limite máximo com o escândalo do mensalão do governo Arruda.
Por conta disso, muita gente sustenta a necessidade de uma volta ao passado. Só que não dá para extinguir a representação política da capital do país. O remédio seria, a curto prazo, a intervenção federal. A longo, que a população votasse bem. Duas missões impossíveis a lamentar?
Quarenta anos atrás
Foi no começo de 1970. Era presidente da República o general Garrastazu Médici, e técnico da seleção brasileira de futebol, João Saldanha. Completavam-se os preparativos para a Copa do Mundo a realizar-se no México quando os radicais de sempre, incrustados no governo, lembraram-se de que Saldanha era do Partido Comunista. Começou uma campanha para afastá-lo. O presidente Médici integrou-se nela ao sugerir que o Dario, “peito de aço”, deveria ser o centro-avante do time, no lugar do Tostão. O técnico respondeu com o que pareceu um sacrilégio contra o regime: “eu não me meto na composição do ministério, o presidente que não se meta na minha escalação.” Foi demitido, ou melhor, dissolvido, mesmo protestando que não era sorvete. Veio o Zagalo, que convocou o Dario, ainda que só o fizesse entrar no finalzinho dos jogos. O Brasil foi tri-campeão.
A história se conta a propósito da constatação de que os tempos mudaram. O presidente Lula não dá o menor palpite na seleção, mesmo entendendo mais de futebol do que o antecessor. Ou será que suas referências recentes às qualidades de Ronaldo Fenômeno encobrem alguma intenção? Mesmo assim, não sendo o Dunga comunista, nada se repetirá.
Opiniões divididas
No ministério, formaram-se dois partidos. Um, liderado pelo assessor internacional Marco Aurélio Garcia, interpreta a queda na popularidade do presidente Barack Obama, dos Estados Unidos, pelo não cumprimento de suas promessas de campanha, como fechar a prisão de Guantánamo e retirar os soldados do Iraque e do Afeganistão.
Outros, com o ministro Celso Amorim à frente, achando que a baixa de Obama nas pesquisas deve-se aos seus esforços para implantar um novo e revolucionário plano de saúde em seu país, visando atender os menos favorecidos.
Como em matéria de política externa o presidente Lula parece muito mais interessado no que acaba de acontecer no Chile, a discussão sobre os Estados Unidos é apenas acadêmica.
Fonte: Tribuna da Imprensa