Publicado em 10 de março de 2025 por Tribuna da Internet

Lula seguia os conselhos de Delfim e não tem mais guru
Elio Gaspari
O Globo
Diante da carestia dos alimentos, Delfim poderia mostrar a Lula como é possível fabricar quedas artificiais ou momentâneas de preços. Poderia, sobretudo, mostrar que algumas medidas servem para nada.
Confrontados com a carestia, presidentes e hierarcas passam por duas fases. Na primeira, culpam o povo que compra gêneros caros (Lula já queimou essa etapa). Na segunda, acreditam em medidas pontuais (Lula entrou nesse estágio).
SOLUÇÕES MÁGICAS – Delfim alertaria o presidente contra os colaboradores que oferecem soluções mágicas. Nesse ramo, ele superou o grande Houdini, mas não acreditava nos próprios truques. Ele conhecia as limitações do poder de Brasília e por isso tornou-se um valioso conselheiro longe dela.
Na quinta-feira, o vice-presidente Geraldo Alckmin reuniu hierarcas para anunciar medidas de combate à carestia. Repetiu-se o cenário do anúncio do pacote de contenção de gastos, anunciado por Haddad. Estava todo mundo lá, menos Lula. Como disse um sábio à época, se fosse para dar certo, Lula faria o anúncio.
Lula não dispõe mais dos conselhos de Delfim e está diante de um processo de fritura de Fernando Haddad, seu ministro da Fazenda. Trata-se de uma fritura especial. Há quem traga o óleo e também a frigideira, mas falta o sujeito que controla o fogão e ele é o presidente da República.
EXEMPLO DE PALOCCI – Lula não fritou Antonio Palocci no seu primeiro mandato, apesar dos sinais emitidos por Dilma Rousseff, chefe de sua Casa Civil (hoje, quem está na cadeira é Rui Costa, com sua malquerença em relação a Haddad).
Como ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento, Delfim mandou na economia até 1985. Deixou o governo com a inflação em 224% enquanto cantava-se “o povo está a fim da cabeça do Delfim” (ele tinha na sua sala um Delfim sem cabeça emoldurado).
Depois que ele foi embora, fritaram-se nove ministros da Fazenda, até que Itamar Franco colocou Fernando Henrique Cardoso na cadeira. Ambos sabiam o que fazer, a inflação foi derrubada e o Brasil voltou a ter uma moeda, o real. Fritar ministros era fácil. Difícil era decidir o que fazer.
Graças ao Banco Central, a inflação está contida, mas a carestia está solta e o governo, sem saber o que fazer, mostra que sabe organizar eventos. No de quinta-feira, o som das perguntas falhava.