Foto: Saulo Cruz/Arquivo/Agência Senado
O ex-presidente Jair Bolsonaro27 de março de 2025 | 06:59Delação, penas, divergências; entenda julgamento de Bolsonaro no STF e próximos passos
O STF (Supremo Tribunal Federal) tornou réus, por unanimidade, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete acusados nesta quarta-feira (26) após a conclusão do julgamento da denúncia da trama golpista na Primeira Turma da corte.
Os cinco ministros do colegiado decidiram pela admissibilidade das acusações feitas pela PGR (Procuradoria-Geral da República), como pediu o relator do caso, Alexandre de Moraes. O magistrado argumentou haver materialidade e indícios razoáveis de que Bolsonaro liderou esforços para evitar a posse de Lula (PT) em 2022.
Apesar disso, Luiz Fux expressou divergência com o colega da corte mesmo votando pelo recebimento da denúncia. Ele diz que proporá uma revisão da dosimetria de penas dos condenados pelos ataques de 8 de janeiro e também opinou pela análise da ação penal no plenário, com todos os 11 ministros.
Entenda o julgamento e saiba quais são os próximos passos do processo contra Bolsonaro no STF:
Julgamento
O primeiro dia de análise do caso foi dedicado às sustentações orais das partes (30 minutos para a PGR e duas horas para as defesas) e a discussão de teses sobre o andamento do processo levantadas pelos advogados.
Todos os pontos apresentados foram negados: os principais eram a anulação do acordo de colaboração premiada do tenente-coronel Mauro Cid, a declaração de incompetência da Primeira Turma para julgar o caso, com redirecionando para o plenário.
Já o segundo dia ficou com o mérito das acusações, ou seja, se havia indícios suficientes para tornar os acusados em réus ou não. Os ministros avaliam se havia uma mínima evidência de participação dos denunciados que seja suficiente para a abertura de um processo.
Admissibilidade da denúncia
Os magistrados da corte acompanharam Moraes, que entendeu ver materialidade e indícios razoáveis na acusação.
O ministro argumenta que a denúncia narra a coordenação, por Bolsonaro, de integrantes do governo para construírem uma narrativa de desinformação e agressividade contra as instituições. Entendeu, também, que o ex-presidente tinha conhecimento da chamada “minuta do golpe”.
Além de Bolsonaro, serão tornados réus Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-chefe da Abin), Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), Augusto Heleno (ex-ministro do GSI), Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).
Divergências de Fux
Apesar de a decisão sobre o caso ter sido tomada por unanimidade, Luiz Fux apresentou algumas divergências em relação à dosimetria de penas dos condenados pelo 8 de janeiro e a análise da denúncia pelo plenário da corte.
Ele afirmou ser necessário praticar o “exercício de humildade judicial” e disse que os casos dos ataques golpistas tem sido julgados com “violenta emoção”. Citando o caso de Débora Rodrigues dos Santos, que usou um batom para escrever “perdeu, mané” na estátua da Justiça, ele defendeu a revisão de penas dos denunciados.
Sobre a possibilidade da Primeira Turma julgar a trama golpista, Fux foi o único a discordar e pedir para o caso seja levado ao plenário. Quando o Supremo decidiu, em 2023, deixar as ações penais com as turmas, ele já tinha apresentado relutância com essa proposta.
Delação de Mauro Cid
Outro ponto de discordância entre os ministros envolveu a manutenção do acordo de delação premiada de Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin deram indícios de que a delação pode ser reavaliada diante do vaivém do militar em depoimentos. “Este não é o momento próprio, mas vejo com muita reserva nove delações de um mesmo colaborador, cada hora apresentando uma novidade”, afirmou Fux.
Próximos passos
Com a denúncia considerada admissível pela corte, inicia-se o andamento do processo penal propriamente dito —antes, ocorria apenas a fase de investigação, realizada pela PGR e pela Polícia Federal.
A primeira etapa é a instrutória, quando são colhidas mais provas e novos depoimentos, indicados tanto pela acusação quanto pela defesa, são realizados. Depois, a Primeira Turma da corte decidirá pela condenação ou absolvição. Isso deve acontecer até o final deste ano, para evitar que a decisão ocorra em ano de eleição.
Ao fim, as partes podem apresentar recursos à decisão. As penas previstas para Bolsonaro chegam a mais de 40 anos de reclusão.
Isso dificultaria ainda mais a situação eleitoral do ex-presidente, que já está inelegível até 2030 por decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por uso eleitoral do desfile de 7 de setembro e por difundir mentiras sobre a urna eletrônica em reunião com embaixadores.
O que disse Bolsonaro
O ex-presidente, que acompanhou o primeiro dia de julgamento na primeira fila da sessão, escreveu em rede social que a Justiça quer tirá-lo da disputa eleitoral em 2026 e que há um “teatro processual”.
“A julgar pelo que lemos na imprensa, estamos diante de um julgamento com data, alvo e resultado definidos de antemão. Algo que seria um teatro processual disfarçado de Justiça —não um processo penal, mas um projeto de poder que tem por objetivo interferir na dinâmica política e eleitoral do país.”
Folhapress