Carlos Chagas
Na noite de terça-feira, depois da surpresa que foi o anúncio de Gleisi Hoffmann para a Casa Civil, caciques e índios do PMDB refugiaram-se no palácio do Jaburu, para jantar a convite de Michel Temer. Todos com pintura de guerra, para falar mal de Dilma Rousseff. Não faltou sequer José Sarney. Como admitir que tivessem passado a tarde tentando salvar Antônio Palocci, imaginando agradar a presidente, quando desde a véspera ela já havia convidado a senadora pelo Paraná para substituí-lo?
Tratava-se de uma desconsideração com o vice-presidente, avisado meia hora antes do anúncio formal, mas, pior ainda, da evidência de que o PMDB continuava à margem de qualquer participação nas decisões de governo. Como ficaram até às quatro da madrugada, imagina-se que não tenham usado o tempo apenas para lamentos e más referências a Dilma. Traçaram uma estratégia de reação que poderá começar na próxima semana, no Congresso, com a votação do projeto que limita as medidas provisórias e a aprovação integral, no Senado, do novo Código Florestal, inclusive o perdão aos desmatadores.
O PMDB está em pé-de-guerra com o palácio do Planalto, abrindo-se a hipótese de fumarem o cachimbo da paz apenas se o partido for aquinhoado com nomeações aos montes, para o segundo escalão da administração federal. Não basta ter nomeado o ex-governador do Paraná, Orlando Pessutti, para o conselho de administração de uma estatal qualquer.
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As refeições continuaram na ordem do dia como palco para choro e ranger de dentes na base parlamentar aliada. Porque horas depois, na quarta-feira, foi o PT que se reuniu em almoço na casa do presidente da Câmara, Marco Maia. A posse de Gleisi aconteceria pouco depois e Marco Maia nem compareceu. Não apenas os filés com fritas foram estraçalhados pelos companheiros. O comportamento da presidente Dilma Rousseff, também.
Da mesma forma que o PMDB, o PT não foi consultado e muito menos participou da escolha da nova inquilina da Casa Civil. Haviam os petistas se negado a expedir nota de solidariedade a Palocci, sendo preciso sangue frio para não terem produzido um texto de desagrado diante da nomeação da senadora para a Casa Civil. Ignora-se qual o troco a ser engendrado pelo PT, mas boa coisa não será, ao menos no relacionamento com a presidente. Talvez manter distância de Gleisi, quem sabe entregarem às piranhas Luis Sérgio, da Coordenação Política.
Em suma, os dois maiores partidos de apoio ao governo frustraram-se ao perceber que a presidente os ignorou, rejeitando a submissão e demonstrando que quem governa é ela. Até o ex-presidente Lula encolheu-se, elogiando sem entusiasmo a nomeação de Gleisi mas disposto a dar um tempo para ver onde as coisas irão parar.
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POLÍTICA DE RESULTADOS
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Quase ao mesmo tempo morreram um padre e um motorista de ônibus. Recebidos por São Pedro na porta do céu, o dono das chaves decidiu conduzi-los às novas moradas. Passaram por ruas cheias de casas modestas, até casebres, foram andando por bairros de classe média e, depois, até jardins cheios de luxuosas mansões. Diante de uma delas, São Pedro virou-se para o motorista e anunciou que era ali que ele iria morar. O padre ficou feliz, porque se um simples motorista recebia aquele prêmio, ele então deveria merecer uma catedral como residência. Ao contrário, porém, foi levado de volta para o bairro dos pobres e surpreendeu-se ao ganhar uma habitação de apenas quarto e sala, sem jardim. Resolveu tomar satisfações e o Apóstolo argumentou que, no céu, tinha entrado em vigor a política de resultados. E explicou: ele, padre, quando começava seus sermões, via a igreja esvaziar-se ou, pior ainda, os fiéis dormirem a sono solto.
Enquanto isso o motorista, assim que arrancava para seu trajeto, levava montes de passageiros a rezar com o maior entusiasmo, apelando para a Divina Providência e pedindo pela própria vida a cada semáforo avançado, cruzamento desrespeitado ou pista esburacada onde o condutor pisava no acelerador. Quem, então havia contribuído para que chegasse ao céu o maior número de orações?
Essa historinha se conta a propósito dos ministros que entram no gabinete da presidente Dilma Rousseff… �
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LIÇÕES PARA O MUNDO
Raras vezes tem feito tanto frio no país. São Paulo daqui a pouco marcará zero grau. No Sul multiplicam-se as geadas e a neve já chegou. Até em Brasília os termômetros chegam a doze graus, nas madrugadas. Será esse o resultado do aquecimento global?
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Na economia o fenômeno parece o mesmo. Enquanto na Europa nações passam apertadas, obrigando-se a apertar o cinto e sacrificar suas massas com as fórmulas do FMI de aumento de impostos, demissões em massa e redução de salários, entre nós aumenta o fluxo de entrada dólares, a inflação cai e os menos favorecidos ganham reajuste no salário-família. Estamos em outro mundo ou logo chegará o calor sufocante?
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COBERTOR CURTO�
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Chegou a circular em certos meios acadêmicos que para resolver a questão da coordenação política, Dilma Rousseff poderia deslocar Nelson Jobim da Defesa para o ministério ocupado por Luís Sérgio. Um nome de peso, sob todos os sentidos, ainda que a hipótese lembrasse a história do cobertor curto, por não ser fácil encontrar alguém para comandar as forças armadas com tanta competência como o atual ministro. A menos se a presidente aplicasse a formula do Lula, que nomeou o vice José Alencar para a Defesa, numa hora de falta de opções, solução que deu certo. Agora, como convidar o vice Michel Temer? De que forma ele reagiria?
Fonte: Tribuna da Imprensa