Carlos Chagas
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A nova ministra da Coordenação Política tomou posse segunda-feira, entre beijinhos, evoés e alvíssaras de toda a base parlamentar do governo, apesar da cara feia de muitos líderes. Ideli Salvatti prometeu composição, diálogo e entendimento. Pois já no dia seguinte, terça-feira, o PT deu sinais de desentrosamento, ou melhor, foi ao contrário: Ideli anunciou que a presidente Dilma tinha voltado atrás e agora aprovava a proposta do sigilo eterno para certos documentos oficiais, exatamente como querem os ex-presidentes José Sarney e Fernando Collor.
Hoje, o PT estrilou e seus líderes no Senado e na Câmara anunciaram que as bancadas continuarão se posicionando contra o sigilo eterno. Aqui para nós, não há explicação para o recuo de Dilma, se é que Ideli traduziu corretamente suas instruções. Ou será que, à maneira de Sarney e Collor, a presidente também pretende produzir documentos ou tomar posições documentadas que precisam fugir do conhecimento da História e do futuro?
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HÁ 50 ANOS, MANDAVAM BOMBARDEAR O PIRATINI�
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Nesses dias em que se discute a validade ou não do sigilo eterno para documentos oficiais, seria oportuna a liberação, pelas forças armadas, de todos os telegramas e comunicados expedidos há 50 anos pelos três ministros militares, mandando bombardear a sede do governo do Rio Grande do Sul. Lá se encontrava a resistência afinal vitoriosa do governador Leonel Brizola pela posse do vice-presidente João Goulart, em seguida à renúncia do presidente Jânio Quadros. As ordens dos golpistas eram para acabar com a campanha da legalidade com petardos incendiários.
Dessa documentação secreta e sigilosa, tivemos conhecimento dias depois, mas seria bom conhecê-la na íntegra, inclusive o episódio em que os sargentos desarmaram os caças, na Base Aérea de Canoas, impedindo os oficiais de executarem o bombardeio. Será que os ex-presidentes José Sarney e Fernando Collor, além da presidente Dilma Rousseff, querem conservar em segredo ou apagar da memória nacional uma das páginas mais libertárias de nossa História? Porque eles são favoráveis ao sigilo eterno.
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MUDANÇA NÃO FECHOU A GOELA DOS FISIOLOGISTAS.
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As primeiras reuniões da nova coordenadora política do governo com as lideranças dos partidos da base parlamentar oficial estão servindo para confirmar o impasse. Deputados e senadores que apóiam o palácio do Planalto continuam sustentando que sem nomeações e liberação de verbas de emendas individuais ao orçamento, nada feito. Vão votar contra o governo ou, pelo menos, criar empecilhos à aprovação de projetos da forma como pretende a presidente Dilma Rousseff.
Pelo jeito, não está adiantando a doce postura adotada pela ministra Ideli Salvatti em seus entendimentos com os líderes. Logo chegará a hora dela voltar a ser o que era quando senadora, ríspida, falando grosso e dando murros na mesa. Certos grupos só entendem mesmo essa linguagem.
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SE ARREPENDIMENTO MATASSE, LULA ESTARIA DOENTE�
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Semanas atrás, quando se discutia a escolha do novo presidente do PT, houve quem sugerisse o nome do Lula, que já é presidente de honra do partido. Só ele poderia controlar os diversos grupos em que os companheiros se dividem, bem como refrear os ímpetos fisiológicos de parte das bancadas. O ex-presidente fez que não ouviu a sugestão, nem quis saber do encargo. Afinal, os oito anos de governo foram sufocantes, ele tinha direito a um repouso mais do que merecido.
O problema é que de lá para cá, com a designação de Rui Falcão para presidir o PT, as dificuldades aumentaram. O partido continua julgando-se condômino do poder transferido para Dilma Rousseff, que não pode concordar em submeter-se, muito menos a dividir responsabilidades apenas dela dependentes.
O resultado aí está: nem o Lula quer mais servir de bombeiro para resfriar os companheiros. Adiou uma viagem à Itália, por motivos óbvios, já que seria hostilizado pelos italianos, depois da absolvição de Césare Batistti. Mas estará planejando novas vilegiaturas para escapar da crise. Lá no fundo, porém, muita gente garante estar arrependido. Na presidência do PT um simples murro na mesa enquadraria tudo.
Fonte: Tribuna da Imprensa