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segunda-feira, julho 04, 2022

A Confederação do Equador, que desafiou dom Pedro 1º em 1824




Movimento separatista, que eclodiu há 198 anos, reuniu Pernambuco e outras províncias em reação ao autoritarismo do imperador

Por Gabriel Araújo 

Não se contavam nem sete anos desde que a província de Pernambuco havia instituído uma república no episódio que ficou conhecido como Revolução Pernambucana quando uma nova revolta em Recife proclamou a independência da região frente ao Império.

Em 2 de julho de 1824, há exatos 198 anos, eclodiu a Confederação do Equador, movimento de caráter federalista e republicano que iniciou um novo capítulo no processo da independência do Brasil.

Segundo o historiador Marcus Carvalho, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco, a base que sustenta o ciclo revolucionário da independência é o constitucionalismo. Ele lembra alguns momentos históricos que antecederam a Confederação do Equador e que contribuem para a compreensão do movimento.

O primeiro deles foi a já mencionada Revolução Pernambucana. Durante cerca de 75 dias, a insurreição de 1817 estabeleceu um governo autônomo que irradiava do Recife e alcançava porções de Alagoas, Rio Grande do Norte, Paraíba e Ceará.

O segundo momento relevante citado por Carvalho é a Revolução Liberal do Porto, em 1820, em Portugal. Além de exigir o retorno imediato da família real à metrópole, com dom João 6º à frente, parte expressiva da elite lusa defendia a instituição de uma carta constitucional que limitasse os poderes do rei.

De acordo com o historiador, uma das primeiras medidas decorrentes da Revolução do Porto foi a anistia aos presos políticos, que permitiu o retorno à província dos revolucionários de 1817.

Outra consequência foi a demissão dos governadores régios, ou seja, dirigentes da Coroa que comandavam as províncias no Brasil. "A Revolução do Porto autorizou as câmaras municipais das províncias a eleger o governo local, uma medida de repercussão impressionante", diz. Em Pernambuco, o eleito foi Gervásio Pires Ferreira, um dos revolucionários anistiados.

De 1820 a 1824, uma série de acontecimentos culminou na emancipação do Brasil de Portugal. Na época, estavam em jogo ideias e posicionamentos políticos: seja a partir da articulação capitaneada pelo então regente Pedro no sudeste do território, que resultou na independência política e na sua coroação, seja por meio da guerra que ocorria na Bahia, responsável pela expulsão dos portugueses na região.

"A ideia de uma república nessa faixa norte [do território] não é uma ideia frágil", afirma o historiador Marcelo Cheche, professor da Universidade Estadual do Maranhão (Uema). "A discussão básica era saber o que forma uma nação. A soberania reside na Constituição ou no imperador?"

Cheche continua: "Se reside no imperador, estamos falando de um modelo monárquico muito mais centralizado e com menos autonomia para cada província que compõe essa união. Se o modelo reside na Constituição, estamos pensando numa monarquia, de certa forma, federativa."

Marcus Carvalho lembra que, depois da proclamação da independência, em 1822, formou-se a assembleia constituinte no Rio de Janeiro, encarregada de redigir uma Constituição para o Império.

"Em 1823, dom Pedro deu um golpe de estado, fechando a constituinte com tropas e baionetas", diz Carvalho. O gesto autoritário desmoralizou a junta monarquista que até então governava Pernambuco. Estava frustrado o projeto de uma monarquia constitucional que conservasse, no limite, certa autonomia das províncias —era um projeto inspirado no federalismo dos Estados Unidos.

O embate entre monarquistas e republicanos deu o tom nas províncias do norte (não se usava ainda a divisão Norte e Nordeste), como mostra a acirrada rivalidade entre os diferentes grupos políticos em Pernambuco.

Entre os liberais da época, dois personagens se destacaram: o político Manuel de Carvalho Pais de Andrade, eleito presidente da província em janeiro de 1824, e Frei Caneca, um dos líderes da Confederação do Equador.

"Uma província não tinha direito de obrigar outra província a coisa alguma, por menor que fosse", escreveu Frei Caneca à época no jornal Typhis Pernambucano, como destaca o site Itinerários Virtuais da Independência, do Senado Federal. Cada província, dizia ele, deveria poder "escolher a forma de governo que julgasse mais apropriada às suas circunstâncias".

Dom Pedro, por outro lado, insistia na centralização. Ignorou a eleição de Pais de Andrade, pedindo a recondução ao cargo de Francisco Pais Barreto.

O imbróglio nascido a partir desse impasse resultou, entre outros fatores, na proclamação da independência de Pernambuco, em 2 de julho de 1824, e no envio de emissários para que as províncias vizinhas se juntassem na recém-formada Confederação.

"Embora seja muito cultuada em Pernambuco e, em algum grau, no Ceará, a Confederação do Equador, enquanto possibilidade, abrangia toda essa faixa norte do território", diz Marcelo Cheche.

DERROTA E REPRESSÃO

Diferentemente de 1817, 1824 não teve tanto apoio dos senhores de engenho da região. "As elites, principalmente do norte, aprenderam com a Revolução Pernambucana que um bom acordo entre elas é melhor que uma insurreição popular", diz o professor da Universidade Estadual do Maranhão.

A reação do Império também foi determinante para a queda da Confederação do Equador. Para reprimir a rebelião, Dom Pedro enviou o lorde escocês Thomas Cochrane, que bloqueou o porto do Recife e, no final de agosto, bombardeou a cidade para forçar uma rendição.

Os revoltosos tentaram resistir tendo Ceará e Paraíba como bases. Entretanto, caíram nos meses seguintes e enfrentaram uma forte repressão.

Marcus Carvalho chama a atenção para a execução de padres, conhecidos na época como "enviados de Deus na Terra". Os carrascos, porém, se negaram a enforcar Frei Caneca, que havia sido condenado à morte pelo Império. Joaquim da Silva Rabelo, o Frei Caneca, foi fuzilado mais adiante, em 13 de janeiro de 1825, na fortaleza das Cinco Pontas, no Recife.

Folha de São Paulo

FAB intercepta no MS aeronave com 500 quilos de cocaína




A Força Aérea Brasileira (FAB) interceptou, por volta das 12h3O deste domingo (3), no Estado do Mato Grosso do Sul, uma aeronave de pequeno porte que transportava 500 quilos de drogas. Segundo o comunicado divulgado pela FAB, o avião entrou no espaço aéreo brasileiro sem autorização e foi classificado mo suspeito Dois caças A-29 Super Tucano da FAB foram empregados na missão, realizada em conjunto com a Polícia Federal (PF)

Os agentes tentaram contato com o piloto, mas não obtiveram nenhuma informação dele. O avião, sem contato com o controle, descumpriu todas as medidas de policiamento realizadas, mostrando-se hostil. Como ele não obedeceu a nenhuma das ordens, os militares efetuaram então um tiro de detenção, que tem objetivo de atingir o alvo.

Após a execução do tiro de detenção, a aeronave, que não tinha plano de voo e entrou no espaço aéreo do Brasil pela fronteira do Mato Grosso do Sul, fez pouso forçado no Estado de São Paulo, entre as cidades de Jales e Pontalinda.

Ainda de acordo com a FAB, duas pessoas fugiram do local do pouso forçado antes da chegada dos policiais e na aeronave foram encontrados cerca de 500 quilos de pasta-base de cocaína.

Estadão / Dinheiro Rural

Entrevista: José Murilo de Carvalho:‘Tenentismo levou ao generalismo dos anos 60’




Pesquisador aponta que jovens oficiais que queriam reformar a República passaram mais tarde ao campo conservador e apoiaram golpes em 45, 54 e 64

Por Wilson Tosta 

RIO – O tempo e os expurgos domaram o ímpeto reformista dos tenentes dos anos 1920 e os levaram ao campo conservador, aponta o historiador José Murilo de Carvalho, no aniversário de cem anos do dramático massacre dos 18 do Forte, marco inicial do tenentismo. Adesões à esquerda e à direita e expulsões causadas por mais de 80 revoltas afastaram muitos jovens oficiais da corrente reformadora, aponta. Quem daquela corrente ficou na vida militar ativa aderiu ao projeto do general Pedro Aurélio de Góes Monteiro – repressor dos oficiais reformistas em 1924 e chefe da Revolução de 1930 – de fazer do Exército um ator político.

 “A maioria dos tenentes enquadrou-se e passou a fazer parte do establishment militar”, explica. Segundo ele, muitos desses oficiais “foram escalando a hierarquia militar” e passaram a atuar no campo conservador. “Vários deles estiveram presentes nos golpes de 1945, 1954, 1961, 1964.”

José Murilo lembra que o presidente Arthur da Costa e Silva, segundo presidente da ditadura militar e um ex-tenente dos anos 20, ligava explicitamente o golpe de 1964 a 1922. Expoente da “linha dura”, Costa e Silva foi contra devolver o poder aos civis após a derrubada do presidente João Goulart – em 1968, assinou o Ato Institucional Número 5. Como ele, outros ex-tenentes apoiaram o movimento civil-militar que destruiu a República populista e implodiu o regime democrático pós-1945 no Brasil.

“O tenentismo fez um logo percurso cujo ponto final foi o “generalismo” dos anos 60, incluindo o golpe de 1964 que teve o apoio de vários deles”, diz ele. 

A seguir, a entrevista de José Murilo ao Estadão.

Os oficiais que lideraram o tenentismo eram um grupo relativamente pequeno de jovens militares, que se voltaram contra o sistema político dominante há um século. O que explica que tenham tido tanta influência no Brasil, nos anos seguintes à Revolta de 22?

Como reconheceu Góes Monteiro, os “tenentes” da década de 1920 incluíam capitães para baixo. Foram derrotados em 1922 e em 1924. Centenas foram expulsos da corporação, mas pegaram carona na revolta de 1930, cujo chefe militar era o próprio Góes que os combatera em 1924. Muitos voltaram à corporação, onde de início eram chamados de melancias, verdes por fora, vermelhos por dentro. Permaneceram atuantes até o golpe de 1964 que apoiaram.

O que diferenciava aquele grupo de tenentes e capitães que participaram da Revolta de 1922 de seus antecedentes que derrubaram o Império, mais de 30 anos antes?

Os “tenentes” de 1889 formavam um grupo de sonhadores enfeitiçados pela doutrina positivista que lhes era ensinada pelo tenente-coronel Benjamin Constant. Passadas as turbulências da década de 1890, causadas pela Revolta da Armada, pela Revolta Federalista e pela guerra de Canudos, um delírio do fanatismo dos tenentes endossado por Floriano Peixoto. Campos Sales organizou as oligarquias estaduais e restabeleceu a hegemonia civil num pacto que durou três décadas.

Qual foi a relação, se é que existiu, entre o movimento militar que derrubou o Império, a República da Espada, com Deodoro e Floriano, o militarismo político de Hermes da Fonseca e o tenentismo dos anos 20 e 30?

A única relação era familiar: Hermes era sobrinho de Deodoro. Ele não era militarista, como Rui Barbosa tentou pintá-lo – fake-news... Em política, era pau mandado de Pinheiro Machado. Mas, no que se refere ao Exército, adotou política de modernização e profissionalização da corporação mandando oficiais estagiarem no Exército alemão.

Em quais aspectos desses eventos podemos identificar uma continuidade, se é que ela existiu?

O tenentismo fez um logo percurso cujo ponto final foi o “generalismo” dos anos 1960, incluindo o golpe de 1964 que teve o apoio de vários deles. Entre as lideranças golpistas estavam Juarez Távora, Eduardo Gomes, Cordeiro de Farias, Juraci Magalhães, Nelson de Melo, os dois Etchegoyen, João Alberto, para citar alguns. Sobretudo, estava Costa e Silva, líder da linha dura, que se opôs a devolver o governo aos civis após a derrubada de Goulart. Ele chegou a ligar explicitamente 1964 a 1922. Os tenentes, então generais, opunham-se ao trabalhismo de Vargas e tinham aderido ao anticomunismo incentivado pela Guerra Fria.

Há quem identifique a ascensão dos tenentes com a emergência das classes médias urbanas no Brasil. O senhor concorda?

As revoltas tenentistas dos anos 1920 foram exclusivamente militares. O que se pode alegar é que o arranjo oligárquico estava fazendo água, sobretudo nas cidades. Arthur Bernardes, eleito em 1922, teve que tomar posse com apoio da Polícia Militar de Minas e governou boa parte do tempo sob estado de sítio. Em termos de imagem pública, havia admiração pela coragem dos jovens que lutaram até a morte na areia de Copacabana e dos que compuseram a Coluna Miguel Costa-Prestes que girou pelo País sem ser derrotada.

Relatos sobre a Revolta de 22 transcrevem declarações que mostram um certo messianismo dos oficiais que participaram do levante. Enquanto iam para o confronto suicida com as tropas do governo, em Copacabana, os militares diziam que se dirigiam para a morte, que precisavam resgatar a honra da farda etc. O que explica essa disposição?

Não diria messianismo. Boa parte da reação dos tenentes teve a ver com a ideia de honra – dizia-se pundonor – que faz parte do ethos militar de qualquer exército. No exército alemão, resolviam-se questões de honra pelo duelo. Morria tanto oficial que tiveram que proibir a prática. Em 1922, houve enorme agitação entre jovens oficiais contra uma carta atribuída falsamente a Artur Bernardes na qual o autor se referia ao marechal Hermes como um “sargentão sem compostura” e mandava comprá-lo com todos os seus galões. O reformismo pregado por Juarez Távora misturou-se ao revanchismo contra Artur Bernardes, representante da república oligárquica.

Esse messianismo continuou com os militares ao longo da República?

O ímpeto dos tenentes de reformar a República oligárquica continuou por um tempo em união com civis no Clube e 3 de Outubro. Mas o Clube logo perdeu força, muitos tenentes foram sendo promovidos, uns aderiram à Ação Integralista Brasileira, outros à Aliança Nacional Libertadora. Os que ficaram foram aderindo ao projeto de Góes Monteiro de fazer do Exército um ator político relevante, se não hegemônico, e foram escalando a hierarquia militar passando a atuar no campo conservador. Vários deles estiveram presentes nos golpes de 1945, 1954, 1961, 1964.

Em quais outros episódios esse messianismo ou sentido de missão se manifestou, na atuação dos tenentes? Esse sentimento ainda está presente nos militares brasileiros de hoje?

Entre 1930 e 1939, houve 88 manifestações de militares, incluindo generais, tenentes e praças. Os sargentos lideraram várias delas. Como consequência, houve grandes expurgos de alto a baixo da hierarquia, facilitando a tarefa reformista de Góis. A maioria dos tenentes enquadrou-se e passou a fazer parte do establishment militar. Uns poucos mantiveram a postura reformista, se não revolucionária, nas revoltas de 1935, de cunho comunista, da Aliança Nacional Libertadora, ANL, e de 1938, fascista, Ação Integralista Brasileira. Foram derrotados. Não vejo messianismo no comportamento dos tenentes. Há hoje no Exército um senso de tutela sobre a República que proclamou no golpe de 1889, sem participação popular e contra a posição da Armada.

Quais foram as consequências políticas da Revolta de 1922?

Foi indício e fator de agravamento da crise da Primeira República, dominada pelas oligarquias estaduais. A década apresentou vários outros sintomas de malaise, como a Semana de Arte Moderna, a fundação do Partido Comunista, ambos em 1922, o uso do Estado de Sitio. O arranjo oligárquico fazia água. O movimento de 1930 foi liderado por dois estados importantes que venceram usando suas polícias militares. A República era um fruto maduro, como o era o Império em 1889.

Há quem diga que o Império só foi encerrado pela eclosão do tenentismo, que atingiu em cheio a política da Primeira República, que guardaria elementos oligárquicos remanescentes do regime imperial. O senhor concorda?

Não concordo. O Império caiu por esgotamento do sistema do Poder Moderador que não servia mais às oligarquias agrárias. Se a República não fosse proclamada por golpe militar, ela o seria por uma Constituinte, como queriam os republicanos civis. O golpe adiou por alguns anos (até Campos Sales) a consolidação do novo regime. O Exército, avesso aos políticos, não tinha força para sustentar um governo só com base militar.

Podemos dizer que a República brasileira nasceu tardiamente, em 1922, em Copacabana?

A República brasileira ainda está por nascer, se vai nascer algum dia.

O Estado de São Paulo

PEC Kamikaze expõe a covardia do Senado




Enquanto a maior preocupação dos políticos for a perpetuação no poder, continuaremos atolados em um lamaçal de pobreza e populismo. 

Por Lygia Maria 

Você prefere estar certo ou ser feliz? "Feliz" no sentido de agradar a audiência e evitar embates para obter ganho ou prazer. Pessoas corajosas preferem estar certas. Políticos brasileiros preferem ser felizes. E o que faz o político brasileiro feliz? Ganhar eleição. Comprovamos isso com a votação da PEC 1, apelidada de "PEC Kamikaze".

PEC libera a ampliação de bilhões em gastos do governo para auxílio aos mais pobres. Parece bonito na teoria, mas, na prática, não passa de estratagema eleitoreiro para furar o teto de gastos. A médio e longo prazos, compromete-se o futuro das contas públicas, gerando desconfiança de investidores, aumento do dólar, dos juros e da inflação.

Mas temos uma oposição para barrar essas medidas tresloucadas, certo? Errado. Apenas um senador votou contra e 72 votaram a favor, incluindo a bancada do PT. Lula disse em vídeo que a medida é eleitoreira, mas aprovou. Dissonância cognitiva como método de propaganda política: o PT afirmou que foi uma vitória, já que senadores reclamaram da proposta, mas, sabe-se lá por qual motivo, votaram a favor.

Nós sabemos o motivo: ganhar eleições. Ninguém quer ser tachado de ter votado contra uma medida para ajudar pobres —já que a maioria da população entende patavinas de economia. Enquanto a maior preocupação dos políticos for se perpetuar no poder, o Brasil continuará na lama, obrigado a escolher entre o populista de direita e o de esquerda nas eleições.

Na série "The Crown", a personagem da rainha Elizabeth critica a primeira ministra Margaret Thatcher por fazer inimigos na direita, no centro e na esquerda. Mas Thatcher diz que isso não é demérito, é uma honra, e cita um poema de Charles Mackey: "Quem se misturou na briga do dever, deve ter feito inimigos. Se não tem nenhum, pequeno é o trabalho que fez. Você nunca virou o errado para o certo. Você foi um covarde na luta". Hoje, sabemos, temos 72 senadores covardes, que preferiram estar felizes em vez de fazer o certo.

Folha de São Paulo

O cristianismo está longe de ser mera opressão, horror e ignorância.




Estando Deus já morto, e o bem derrotado, o mal repousa vitorioso, mas depressivo. 

Por Luiz Felipe Pondé (foto)  

As religiões são corpos culturais e históricos que se espraiam por vários territórios das humanidades. Para além do campo da fé, da liturgia, dos textos sagrados e dos rituais em si, as religiões produzem de forma profunda uma série de elementos dinâmicos que interagem com a cultura, a política, a filosofia e mesmo com as ciências humanas e biológicas. Podemos resumir esses elementos como o componente intelectual das religiões. Sua peculiar forma de inteligência.

Essa inteligência que mescla, muitas vezes, crenças no sobrenatural e fé numa dimensão transcendente tem um gosto particular e uma capacidade precisa de refletir sobre a natureza humana —componentes do comportamento e da vida subjetiva que se repetem ao longo dos milênios e que temos acesso através de textos e documento arqueológicos— e seus condicionamentos históricos e sociais.

Um exemplo particular é aquele da literatura de ficção. No terreno do cristianismo os casos se multiplicam. Fiódor Dostoiévski (1821-1881) é um dos mais famosos. Outro, também traduzido no Brasil, graças ao trabalho da editora É Realizações, é o escritor francês católico Georges Bernanos (1888-1948).

Ao contrário do que pensa nossa vã filosofia, o cristianismo está longe de ser uma mera produção de opressão, horror e ignorância. De dentro da mais profunda fé emergem formas contundentes de análise da natureza humana que calam fundo no coração daqueles que não mentem constantemente sobre nossa condição desamparada.

Desde o padre Donissan, personagem central do conhecido "Sob o Sol de Satã", escrito entre 1918 e 1923, passando pela Mouchette (Mosquinha), personagem feminino do mesmo romance, Bernanos descreve de forma "naturalista" os efeitos da presença de Satanás na vida do corpo e da alma de ambos os personagens.

Mouchette, menina bela e sensual, derrete sobre o desespero e a mentira, enquanto Donissan, padre jovem e com fama de pouco inteligente e desajeitado desde o seminário menor, recebe como suposto carisma (conceito que descreve a missão dada por Deus a uma criatura humana) viver o resto da vida sob a tutela de Satã como seu "íntimo". Seu processo peculiar de derretimento sob o sol de Satã será o risco do orgulho de querer provar para si mesmo e para sua comunidade que ele seria um santo.

Já no outro muito conhecido "Diário de um Pároco de Aldeia" de 1936, Bernanos, através do diário de um miserável padre bêbado de uma pequena vila esquecida do mundo, nos revela como o mal pode se recolher e se manifestar, de forma silenciosa e invasiva, como uma poeira que invisivelmente pousa sobre nossos dentes imagem do próprio Bernanos. O tédio ao longo da vida é esse mal em forma de poeira.

"Monsieur Ouine", escrito entre 1931 e 1943, publicado pela primeira vez no Rio de Janeiro —durante a Segunda Guerra Mundial, Bernanos se mudou com sua família para Barbacena em Minas Gerais— e, posteriormente, em 1946, pela editora Plon em Paris, é considerado pela crítica especializada, ainda que seja um romance muito menos conhecido do grande público, como a maior obra escrita por Bernanos.

Nos termos que François Angelier escreve no prefácio à edição de 2019 pela editora L’Arbre Vengeur, cujo título é "Monsiuer Ouine ou o Apóstolo do Vazio —em tradução direta do francês—, o romance descreveria o momento histórico em que, estando Deus já morto e o bem derrotado, o mal repousa sobre si mesmo, vitorioso mas depressivo, mergulhado numa forma de "preguiça do coração", expressão de Walter Benjamin.

Satanás, mergulhado na "morosa quietude do tédio", à beira da acídia, sem mais nenhum antagonista, soçobra na apatia da depressão. Uma fina psicologia no mal, em inação dissolutiva do mundo e das pessoas à sua volta, percorre como um calafrio a narrativa do romance.

Nas palavras de Bernanos, o que resta da autêntica aristocracia —de alma— repousa sobre alguns camponeses silenciosos "que enfrentam a dureza da passagem das horas, que permanecem imóveis, através dos que balançam à sua volta, de pé como uma árvore ou um muro, sustentando o bem".

Folha de São Paulo

República avacalhada - Editorial




À medida que a eleição se aproxima, intensifica-se ofensiva de Bolsonaro contra princípios republicanos, com agressões cada vez mais absurdas e indecorosas. É preciso frear o retrocesso

Ao tomar posse, o presidente Jair Bolsonaro prometeu respeitar a Constituição de 1988. Mas o que ele tem feito, ao longo desses três anos e meio, é o exato oposto do compromisso assumido no dia 1.º de janeiro de 2019, numa avacalhação sem precedentes da República. 

É um quadro gravíssimo, que se deteriora progressivamente, sem nenhum pudor, sem nenhum limite, sem nenhum respeito às regras do exercício de poder num Estado Democrático de Direito. Para piorar, a resistência a Jair Bolsonaro mostra-se muito aquém da gravidade e da dimensão dos ataques. Tal é a frequência de absurdos, que todos – órgãos de controle, partidos políticos e sociedade civil organizada, incluindo a própria opinião pública – parecem um tanto anestesiados com a esculhambação promovida cotidianamente pelo bolsonarismo. É preciso defender, com brios renovados, a integridade da República.

Elencar os ataques do governo Bolsonaro à legalidade e ao espírito republicano é tarefa inglória. Toda semana há uma nova agressão mais absurda, mais escrachada, mais indecorosa. Agora, o País tem assistido ao desenrolar da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 1/2022, que, a rigor, merece ser chamada de PEC da Reeleição de Bolsonaro. O governo quer mexer na Constituição para poder dar dinheiro em ano eleitoral aos caminhoneiros. E ainda tenta impor a manobra atropelando todos os ritos legislativos, de forma a impedir o debate e o amadurecimento do tema.

A desfaçatez é de tal ordem que a PEC 1/2022 propõe incluir, como dispositivo constitucional, o reconhecimento de “estado de emergência” no País até o fim do ano. A única emergência que motiva essa PEC é a situação de Jair Bolsonaro nas pesquisas de intenção de voto. E os bolsonaristas ainda dizem que admiram os Estados Unidos com sua Constituição enxuta e pouco emendada. Na célebre definição de La Rochefoucauld, a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude.

Entre os ataques do governo de Jair Bolsonaro contra a República, observam-se violações da legislação eleitoral e ambiental, violências contra o princípio federativo, tentativas de subjugar os órgãos de controle, manobras para dificultar a transparência dos atos da administração federal, ações para intimidar e censurar opositores políticos, manipulação de programas sociais para fins partidários, agressões contra o Judiciário e sua independência, campanha difamatória contra as urnas eletrônicas e a Justiça Eleitoral, uso da máquina pública – em especial, da Receita Federal e Polícia Federal – para atender a interesses familiares, criação e difusão de desinformação, tentativas de interferência nas polícias estaduais, deturpação do sistema tributário para fins eleitorais, opacidade da gestão orçamentária e desprezo pelas regras de responsabilidade fiscal e pela segurança jurídica, com a PEC dos Precatórios. Isso sem falar das suspeitas de corrupção envolvendo os Ministérios da Educação e da Saúde, com denúncias de superfaturamento desde compra de vacina contra a covid até licitação de ônibus rurais escolares, além de toda atuação negacionista, desorientadora e desumana de Jair Bolsonaro na pandemia.

É a República ultrajada, como se não houvesse Constituição ou lei, como se o exercício do poder fosse mero arbítrio, como se tudo, rigorosamente tudo, estivesse à disposição dos interesses particulares do inquilino do Palácio do Planalto. Simplesmente, não é assim que funciona no Estado Democrático de Direito. Há separação de Poderes e delimitação de competências. Há normas que regem o funcionamento de cada cargo público.

É uma tremenda obviedade, mas com Jair Bolsonaro é necessário que se diga. A posse na Presidência da República não dá autorização para destruir o Estado brasileiro. Não é fácil acompanhar o ritmo de ataques contra a Constituição e o bom funcionamento da máquina pública operado pelo governo federal, mas é preciso resistir. Não basta contar os dias até 1.º de janeiro de 2023. Todos – órgãos de controle, partidos políticos e sociedade civil organizada – precisam atuar e frear o retrocesso. Há um País a ser preservado.

O Estado de São Paulo

Cloaca nacional


Pedro Guimarães e Bolsonaro


Por Dorrit Harazim 

Bom seria se existisse um GPS capaz de localizar o lixão humano onde o presidente Jair Bolsonaro cata suas pessoas de confiança, de apoio ou de afeição amoral. É que urge desinfetar essa cloaca nacional, de onde a cada dia pipocam novos ou velhos seres acanalhados. Ora é o Nelson Piquet de sempre, vil e requentado, inabilitado a qualquer convívio em sociedade. Ora é o deputado Daniel Silveira, golpista de estimação do Planalto, agraciado com a Ordem do Mérito do Livro da Biblioteca Nacional — Silveira é aquele fortinho que arrebenta tornozeleiras eletrônicas e fica por isso mesmo. Ora é o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, exilado “a pedido” com todo um baú de bíblias e falcatruas aguardando explicações.

No capítulo desta semana, será preciso chafurdar além do protagonista principal. Não que ele seja menor. Desde a primeira infância do governo Bolsonaro, Pedro Guimarães presidiu com cobiça a Caixa Econômica Federal, o maior banco público da América Latina (3.407 agências). Dado o conjunto de sua obra como predador sexual, foi colecionando apelidos junto aos quase 85 mil empregados que comandava, nenhum deles afetuoso. O mais explícito, “Pedro Garagem”, veio a público no arrastão de denúncias que forçaram sua renúncia ao cargo na quarta-feira. Explica-se: numa das centenas de viagens oficiais que empreendeu pelo país, Guimarães teria ordenado o aluguel de um carro preto blindado em Teresina (Piauí) e dispensado o motorista, alegando precisar conversar em privado com a funcionária da Caixa que o acompanhava. À distância, o motorista filmou o carro sacolejante, e o resto é o resto. Melhor dizendo, a extensão e a capilaridade do “resto” ainda não foram mapeadas, mas tem tudo para ser sórdido — já se sabe que a cultura da violência na CEF, com assédio moral e sexual por parte do chefão, era conhecida, tolerada e acobertada por seus chefetes. O segundo no comando, Celso Leonardo Barbosa, fazia o tipo fortão MMA. Também já foi denunciado e terá de procurar trabalho alhures.

A fila de demissões, entre coniventes ou omissos, deve se alongar à medida que novas denúncias se amontoam. Uma vez destravado o medo — medo físico, terror psicológico, ameaça de perda do emprego —, as denunciantes iniciais incentivam outras tantas abusadas e humilhadas em público por Pedro Guimarães. Este merece uma menção especial por covardia público-privada. Na manhã de quinta-feira, já defenestrado do poder, participou da apresentação do Plano Safra no Palácio do Planalto escudando-se na própria mulher.

— Quero agradecer a presença da minha esposa, acho que de uma maneira muito clara, são quase 20 anos juntos, duas filhas, uma vida pautada pela ética —discursou.

Quanta baixeza socorrer-se na família em vez de protegê-la.

Agora é a vez de Ministério Público, Justiça do Trabalho e Tribunal de Contas mostrarem espinha dorsal. Até agora, quem honrou essa responsabilidade foi o jornalismo. Coube à cuidadosa apuração de Rodrigo Rangel, com Fabio Leite e Jeniffer Gularte, do portal Metrópoles, revelar ao Brasil o que donos e próximos do poder brasiliense já sabiam, mas fingiam que não era com eles.

— A investigação sigilosa em curso no Ministério Público Federal começou quando nossa apuração já estava bem encaminhada. Eu diria até que essa investigação oficial é consequência da investigação jornalística, porque foi durante a apuração da reportagem que as mulheres se sentiram suficientemente encorajadas a contar também às autoridades o que viveram — conta Rangel.

Ele tem razão. Sem a teimosa atuação da imprensa profissional em tempos bolsonaristas, inóspitos à realidade e avessos à transparência, o pastor Milton Ribeiro ainda estaria ministro; a menina catarinense engravidada por estupro entraria na 32ª semana de pavor gestacional; Pedro Guimarães continuaria às soltas farejando inimigos, imaginando conspirações internas e escolhendo vítimas. Tudo sob a proteção silenciosa do presidente da República. Ah, sim: o GPS aponta para Jair Bolsonaro como epicentro predador da decência nacional.

O Globo

Como funciona o estelionato eleitoral




Pacotão da PEC dos Bilhões pode adiar recessão que tem previsão de início neste trimestre

Por Vinicius Torres Freire

A PEC dos Bilhões vai dar mais dinheiro a pelo menos 20 milhões de famílias. As leis que mexeram em impostos estaduais e federais vão diminuir um tiquinho das contas de luz e o custo de encher o tanque de todo o mundo.

Discute-se se tais dinheiros vão melhorar a avaliação de Jair Bolsonaro. Mas poderiam também evitar que a economia entre no vermelho? Nas previsões mais reputadas da praça, ou de costume menos erradas, o PIB começaria a cair neste terceiro trimestre.

Se a ideia de PIB parece abstrata, considere-se então a taxa de desemprego. Naquelas previsões, a taxa de desemprego aumentaria daqui até dezembro. O desemprego em geral cai ao longo do ano. Costuma aumentar apenas em recessões.

As reduções de impostos e o gasto extra com auxílios podem aumentar a renda disponível das famílias de R$ 37 bilhões a R$ 52 bilhões no terceiro trimestre (até logo antes da eleição), na hipótese de a redução de tributos sobre combustíveis chegar inteira ao consumidor. A variação da estimativa se deve ao fato de que os novos benefícios talvez não sejam pagos já em julho.

Não é pouco dinheiro. A liberação do saque parcial do FGTS e a antecipação do 13º dos benefícios do INSS devem ter aumentado a renda total em R$ 86 bilhões no segundo trimestre. Pode ser que os recursos do pacotão da PEC compensem parte dos estragos previstos para a segunda metade do ano. Estragos haverá.

Tende a ser cada vez menor o efeito da reabertura da economia depois do fim das restrições sanitárias oficiais. A poupança das famílias cai. As taxas de juros ficam mais salgadas. O vento a favor da economia mundial vai passando —no primeiro trimestre, evitou que o PIB brasileiro ficasse no vermelho.

Na média de maio, o dólar custou R$ 4,96. Na semana passada, havia voltado à casa de R$ 5,30. As taxas de juros no atacadão de dinheiro aumentaram. É tanto o efeito do mercado mundial azedo quanto de coisas como a PEC dos Bilhões.

Mas pode ser que as coisas não fiquem logo tão ruins. Países que vendem commodities (comida, petróleo, minérios), como o Brasil, podem sofrer menos com a baixa da economia mundial, ao menos de imediato.

O número de pessoas ocupadas cresce além do previsto. O salário médio continua um horror, ainda quase 6% menor do que no ano passado, mas vem despiorando (a baixa anual era de quase 9% em novembro de 2021). A massa de rendimentos (soma dos rendimentos do trabalho de todo mundo) vem aumentando também desde novembro, ora em alta de 4,6% ao ano. Em maio, o número de pessoas com algum tipo de trabalho era 9,4 milhões maior do que em maio de 2021.

A confiança de empresários e consumidores cresceu ainda em junho, segundo a FGV. O ânimo nem chegou ao nível de otimismo, mas ainda aumenta.

Sim, senhora, a situação social é horrível, mas estamos falando aqui de despioras, de melhoras relativas a partir do fundo do poço.

É possível que os dinheiros do estelionato eleitoral de Bolsonaro, aliás ratificado pela oposição da esquerda à direita, não bastem para compensar o vento frio e contrário que começa a soprar neste terceiro trimestre. De resto, pode ser que essas previsões estejam erradas. Afinal, as estimativas de alta do PIB em 2022 feitas por gente mais reputada vão de 0,9% a 1,8%. Muita diferença, mesmo para uma mixaria de crescimento.

Ainda assim, é razoável especular que o adiamento da recessão e a PEC dos Bilhões possam fazer algum efeito eleitoral. Quem sabe rendam a Bolsonaro dois pares de pontos nas pesquisas, o bastante para evitar derrota no primeiro turno. A piora da crise fica para 2023. É o estelionato eleitoral.

Folha de São Paulo

Fim do tripé do governo




Queda de Pedro Guimarães da CEF encerra núcleo ideológico no primeiro escalão

Por Eliane Cantanhêde (esq.)

Ao se esborrachar na Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães foi praticamente a última cara dos ideológicos no primeiro escalão. Jair Bolsonaro elegeu-se com o tripé militar/policial, evangélico e ideológico, mas logo no primeiro ano de governo o “núcleo conservador” levou um safanão e quem passou a dar as ordens foi o Centrão. A “nova política” foi escanteada no Congresso e vem sendo empurrada para o terceiro e quarto escalões.

Já à deriva, os ideológicos afundaram de vez com a morte de Olavo de Carvalho. Sem chances, o diplomata Ernesto Araújo, defenestrado do Itamaraty, tenta assumir o papel de Carvalho com sua lenga-lenga apocalíptica sobre o fim do Ocidente, contra a China e a favor de Donald Trump. Araújo e Abraham Weintraub, ex-ministro da Educação sem poder ser, esperneiam, mas ninguém dá bola.

Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente sem jamais ter pisado antes na Amazônia, anda mais ocupado em se livrar de inquéritos sobre desvios em São Paulo e relações com madeireiras criminosas. E Damares Alves, ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, é candidata a alguma coisa no DF.

Também pastor e da cota dos ideológicos como Damares, Milton Ribeiro já foi preso e jogou o presidente na fogueira duas vezes: ao dizer que foi ele quem meteu no MEC os dois pastores mergulhados até o último fio de cabelo em negociatas e lhe passou informações privilegiadas sobre busca e apreensão.

Até os filhos Eduardo e Carlos Bolsonaro, do núcleo mais ideológico, andam mais discretos. Assim, quem manda no governo e faz qualquer coisa pela reeleição são o filho 01, senador Flávio Bolsonaro, o Centrão de Ciro Nogueira e Arthur Lira e o núcleo militar do futuro vice na chapa, general Walter Braga Netto. Enquanto eles trabalham, Bolsonaro atrapalha.

Mas, se os ideológicos sumiram no palco, continuam firmes e fortes em áreas como a Cultura, que concedeu a Medalha do Mérito do Livro para Daniel Silveira, incapaz de ler um livro, quanto mais de escrever um, mas agora ao lado de Carlos Drummond de Andrade.

Enquanto os ideológicos fazem dessas, o Centrão dá um golpe de mestre: a PEC da Reeleição, que cria o estado de emergência, faz picadinho da lei eleitoral e do teto de gastos e dá mais R$ 41 bilhões do dinheiro público para Bolsonaro recuperar as chances de vencer.

Com 33 milhões passando fome, essa é a maior urgência do Brasil. Mas só viram agora, como perguntou o senador José Serra, único com coragem para fugir da armadilha? Assim como o Senado, a Câmara vai aprovar em peso, e em tempo recorde, a tábua de salvação, não dos miseráveis, mas de Jair Bolsonaro.

O Estado de São Paulo

Uma corrida de três meses: a eleição de verdade está mal começando.




Portanto, há tempo para mudanças. A resposta sobre o que afetaria a polarização está no fato de a agenda predominante ser a da rejeição. 

Por José Casado (foto)

Efetivamente, chegamos à temporada eleitoral. Até agora tivemos ensaios, treinos, pré-temporadas e afins, que dão uma ideia do confronto, mas ainda não definem o resultado das urnas. A campanha vai aquecendo por etapas e só em setembro tomará conta do cenário nacional. Muitos têm como fato dado a polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Lula (PT). E que Lula é o favorito nas intenções de voto. Claramente, a situação aponta nessa direção. Contudo, as eleições costumam ser cheias de surpresas.

Considerando que temos três meses pela frente até o pleito, duas questões devem ser postas. A primeira é se há tempo para mudanças. A segunda é sobre o que pode mudar as tendências hoje verificadas. Vamos tentar responder às duas perguntas. O primeiro aspecto a ser considerado é o fator tempo. Três meses é uma eternidade em um processo eleitoral.

O segundo aspecto a ser considerado refere-se à agenda. Em 2018, a escolha de Bolsonaro foi mais uma aposta afirmativa na renovação do que na rejeição específica ao universo “lulopetista”. Hoje a pauta eleitoral se sustenta na rejeição que ambos os candidatos despertam no eleitorado. A predominância de uma elevada rejeição combinada a três meses de campanha pode abrir brechas para alterações. Bolsonaro perde parte do seu eleitorado de 2018 para Lula. Por outro lado, o antipetismo continua relevante para manter a competitividade do presidente. Lula e Bolsonaro são uma espécie de nêmesis um do outro. Uma eleição com muita rejeição termina gerando uma adesão não engajada ao escolhido. E isso abre a possibilidade de transformar a polarização de hoje em uma incerteza.

Para reforçar um quadro de potencial mudança, tanto Bolsonaro quanto Lula não perdem a oportunidade de praticar o “sincericídio”, que, em doses significativas, pode ser mortal. Lula flerta com o perigo ao mencionar a sua intervenção em favor de sequestradores. Assusta ao se posicionar pela regulamentação da mídia e pela revogação de reformas. Bolsonaro não perde a oportunidade de dar opiniões sem avaliar seus impactos. Não cansa de desagradar ao eleitor de centro, que não está engajado em sua pauta. Outro aspecto reside no fato de Bolsonaro gastar mais tempo atacando inimigos incompreensíveis para boa parte do eleitorado, como o TSE, o STF e a Petrobras, em vez de divulgar suas realizações.

Ambos disputam uma corrida para ver quem erra menos. Mas parece que não estão preocupados com isso. O favoritismo de Lula é inconteste, porém a resiliência de sua candidatura será posta à prova nos próximos três meses, quando os ataques ao passado do PT forem explorados. Já Bolsonaro tem o desafio de conquistar votos que se perderam ao longo de sua gestão. Medidas como aumentar o Auxílio Brasil e dar subsídio aos combustíveis devem ajudá-­lo. Mas podem não ser suficientes se não houver uma modificação nas narrativas.

Portanto, há tempo para mudanças. A resposta sobre o que afetaria a polarização está no fato de a agenda predominante ser a da rejeição, os ponteiros estarem excessivamente expostos a polêmicas e haver eleitores que podem trocar de opinião. Por fim, existe o acaso. A corrida eleitoral mal está começando.

Revista Veja

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