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quinta-feira, junho 09, 2022

Na Colômbia, a terceira via surpreende a polarização e passa ao segundo turno




Rodolfo Hernández tirou do segundo turno o atual presidente

Por Marcus André Mello

Na Colômbia, um outsider pode ser provavelmente eleito presidente. E isso em um país marcado por um partidarismo sem paralelo na região. Mas um olhar atento revela que esse resultado não é paradoxal. Três fatores marcam historicamente o sistema político colombiano. O primeiro é que dois partidos —  Conservador e Liberal — dominaram a política por um século e meio, engendrando um hiperpartidarismo peculiar.

A excepcional animosidade entre eles levou a confrontos com mais de 100 mil mortos, em 1902, e 170 mil mortos entre 1948 e 1960 (no episódio conhecido como La Violencia, o qual gerou uma especialidade temática: a “violentologia”). E isso antes da criação das Farc (1964).

PARTILHA DO PODER – No entanto, em 1958, os dois partidos fizeram um pacto formal de partilha de poder após derrubarem o general Rojas Pinilla (1953-1957), que ascendeu ao poder através de um golpe. O pacto envolvia a paridade partidária nos ministérios e cargos públicos; Presidência rotativa, a cada quatro anos; quórum para aprovação de leis de 66% etc. Durou 16 anos.

O segundo fator é que historicamente os militares quase não cumpriram papel político no conflito partidário (o golpe de Rojas Pinilla é exceção). Os confrontos armados davam-se entre milícias de caudilhos regionais. O monopólio da violência era mais marcadamente partidário que estatal.

O terceiro motivo é o fato de que nunca surgiu um Perón, um Vargas, um Cárdenas, um Ibáñez; ou seja, lideranças ou partidos que incorporassem politicamente as novas massas urbanas. Gaetán, símbolo da renovação (“Yo non soy um hombre, soy el pueblo”), foi assassinado, ao que se seguiu o Bogotazo (mais de mil mortos) deflagrando La Violencia. O país não renovou suas elites políticas, permanecendo com estruturas partidárias e dinastias políticas herdadas do século 19.

PERPETUAÇÃO DAS ELITES – Paradoxalmente, o instrumento que pacificou o país por duas décadas causou sua debacle. Ausência histórica do populismo e pacto consorciativo marcaram também a Venezuela, que teve o Pacto de Punto Fijo no mesmo ano (1958). A reação a esses pactos também teve semelhanças: foi denunciado por outsiders como um arranjo excludente que permitia a perpetuação de elites corruptas no poder. As Farc e o bolivarianismo são as versões radicalizadas dessa reação.

O conflito entre combater ou negociar com a guerrilha provocou cisão interna no partido Liberal em 2002. Uma ala uniu-se aos conservadores e garantiu a vitória de Uribe, ex-liberal que criou seu próprio partido. Agora, o sucesso inesperado de uma liderança individual levou ao colapso do bipartidarismo, mas não do sistema partidário.

A vitória de um candidato outsider, sem partido forte nem base congressual, isso, sim, pode fazê-lo.

Nota do blog Tribuna da Internet – O outsider colombiano, que podemos chamar de terceira via, é Rodolfo Hernandez, que tinha apenas 10% das intenções de voto, mas disparou na reta final e chegou a 28,2%.  O atual presidente, Iván Duque, que tentava a reeleição, ficou em terceiro lugar. Agora, como o segundo turno é sempre uma nova eleição, a terceira via tem chances reais de quebrar a polarização na Colômbia, no próximo dia 19. (C.N.)

Folha de São Paulo / Tribuna da Internet

Presidentes fiéis à sua história




Mais do que escolhas ideológicas, o exercício do poder parece refletir a experiência de vida de cada um.

Por Nicolau da Rocha Cavalcanti* (foto)

O antigo adágio de inspiração aristotélica, operari sequitur esse (o atuar segue o ser), continua plenamente vigente na política brasileira. Ao menos em relação aos presidentes da República neste século, não há nenhum motivo para surpresa. Todos eles – Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro, até aqui – foram rigorosamente coerentes com sua história de vida prévia ao cargo. O poder não mudou nenhum deles.

Mais do que escolhas político-ideológicas, o modo como cada um exerceu o poder parece refletir, com surpreendente exatidão, sua respectiva formação profissional e humana, sua experiência de vida, sua bagagem cultural. Sociólogo, o presidente Fernando Henrique teve uma especial percepção dos temas de longo prazo do País e fez deles a prioridade de seu governo. É um perfil de governante muito necessário, cujos frutos podem ser observados décadas depois, mas raro em democracias de massa. Não é nada fácil que a maioria do eleitorado abrace uma proposta de governo não imediatista. Mais um mérito, portanto, do Plano Real: não apenas acabou com a inflação, como forneceu as condições políticas para a eleição de alguém cujo olhar tende a ver além do próprio mandato.

Líder sindical, o presidente Lula teve uma excepcional percepção das questões com impacto imediato na vida da população, bem como dos interesses políticos vigentes no período. Soube construir, tal como havia feito durante toda a sua vida sindical, um governo de composição, agregando forças políticas muito díspares. Sendo a política não apenas futuro, mas presente, com Lula, o cidadão sentiu-se cuidado pelo governo federal de uma forma nova.

Economista de matriz desenvolvimentista e com uma vida dedicada a causas políticas, a presidente Dilma manifestou um raríssimo compromisso partidário no exercício do poder. No Palácio do Planalto, fez o que sempre havia feito ao longo de sua vida: fidelidade e entrega incansáveis às ideias do estatuto do seu grupo político, sem medo das críticas e dos eventuais riscos políticos.

Professor de Direito Constitucional e com uma vida voltada à negociação política, o presidente Temer captou extraordinariamente os limites e possibilidades do cargo de presidente. E soube ampliar essas possibilidades por meio de uma estreita relação com o Legislativo. Seus dois anos e meio na Presidência da República foram estrita continuidade de sua vida política no Congresso.

De igual forma, os três anos e meio do presidente Bolsonaro podem ser vistos como fidedigna expressão do que sempre foi Jair Bolsonaro. Não há motivo para perplexidade. Suas ideias e métodos continuam exatamente os mesmos. Mudaram as circunstâncias e o alcance de suas ações.

Engana-se quem pensa em Jair Bolsonaro como um capitão do Exército. Certamente, sua vivência no meio militar, nos anos da ditadura, o influenciou, mas ele nunca atuou de fato como um militar, nem no Congresso nem durante o período em que esteve no Exército. Na avaliação de Ernesto Geisel, Jair Bolsonaro foi um “mau militar”. O paradoxo não é trivial: aquele que utilizou e utiliza politicamente o saudosismo da ditadura foi sempre desprezado pelas lideranças do regime militar.

A distância entre o comportamento das Forças Armadas e o de Jair Bolsonaro ficou nítida, por exemplo, na pandemia. Os militares entenderam os riscos da covid e atuaram em consequência. Mais do que um tema de saúde pública, Bolsonaro viu na emergência sanitária uma questão de sobrevivência política. Convicto de que a oposição usaria a pandemia para tentar derrubá-lo do poder, optou por negar a gravidade da covid. Quando isso era impossível, tratou a doença como um destino inevitável.

Esse olhar peculiar reflete a história de Jair Bolsonaro antes da Presidência da República. Mais, expressa sua identidade: ele sempre foi um lobo solitário da política. Sem recursos, sem um sobrenome conhecido e sem vínculos políticos, sua vida pública foi invariavelmente uma construção individual. Sob essa perspectiva, por mais alto que se possa chegar, nada é estável. A tensão é contínua. Não há espaço para a confiança, mesmo entre os mais próximos. A primeira alternativa é sempre o ataque.

No Palácio do Planalto, Jair Bolsonaro mantém o mesmo comportamento dos anos 80 do século passado: testa ações que capturem a pauta pública e lhe deem visibilidade. Antes, anunciava que explodiria bombas em quartel; agora, ameaça o processo eleitoral. Por seguir essa tática, foi preso no Exército. Por insistir na mesma tática, chegou ao Congresso e, anos depois, ao Palácio do Planalto. Por que iria parar com ela agora, justamente quando tem mais audiência? Só a interrompe quando está no limite da sobrevivência política, como ocorreu no dia 9 de setembro de 2021.

Neste ano eleitoral, analisar a história dos possíveis candidatos – e como ela influenciou a estrutura mental de cada um – pode evitar surpresas. Também ajuda a vislumbrar, de forma um pouco mais concreta, o que nos espera nos próximos meses. Operari sequitur esse.

*Advogado e jornalista

O Estado de São Paulo

Família Trump deverá depor a partir 15 de julho em NY por fraude fiscal




O ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e seus filhos Donald Jr e Ivanka foram citados para prestar depoimento a partir de 15 de julho no caso sobre fraude fiscal instruído pela procuradoria de Nova York, informaram nesta quarta-feira (8) fontes judiciais.

A procuradora do estado de Nova York, Letitia James, e sua equipe de investigadores prosseguirão com o interrogatório "na semana seguinte", segundo um documento da Justiça.

Trump e seus filhos Donald Jr e Ivanka têm até 13 de junho para apresentar um recurso à máxima instância judicial de Nova York.

O trio tentou, de todas as maneiras, evitar o interrogatório sob juramento pelo caso de evasão fiscal instruído pela procuradora democrata James, alegando que o processo está motivado politicamente.

O juiz estadual de Nova York Arthur Engoron ditou em fevereiro que os três têm que testemunhar e rejeitou uma demanda dos Trump para anular as citações de James.

Desde 2019, James investiga o ex-presidente e a Organização Trump por uma possível fraude e tentou interrogá-lo por meses.

Em janeiro, a procuradora disse que sua investigação havia encontrado provas que sugerem uma avaliação fraudulenta de diversos ativos e a tergiversação desses valores para pagar menos impostos.

Os Trump, por sua vez, negam qualquer irregularidade.

No mês passado, o ex-presidente pagou 110.000 dólares de multa por se recusar a entregar evidências e documentos aos investigadores.

A investigação de James é uma das muitas batalhas judiciais nas quais está imerso o magnata e político de 75 anos, o que pode complicar suas eventuais aspirações de concorrer nas eleições presidenciais de 2024.

A Organização Trump também está sendo investigada pelo promotor do distrito de Manhattan por possível crime fiscal e fraude de seguros.

Em julho do ano passado, a Organização Trump e seu então diretor financeiro Allen Weisselberg se declararam inocentes, em um tribunal de Nova York, de 15 acusações de fraude e evasão fiscal.

O julgamento está previsto para acontecer este ano.

Até agora, Trump ainda não confirmou sua intenção de concorrer novamente à indicação do Partido Republicano na corrida pela Casa Branca.

AFP / Estado de Minas

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PEC dos combustíveis não auxilia quem mais precisa - Editorial




Toda a fuzarca governamental, com sua PEC, se esfarelará diante de novos aumentos de combustíveis

Depois de longos meses sem dedicar-se seriamente ao problema dos aumentos dos preços da comida, da energia e dos combustíveis, o presidente Jair Bolsonaro decidiu ressarcir Estados que desonerem o diesel e o gás de cozinha, além de compensá-los por eventuais perdas da redução das alíquotas do ICMS previstas em projeto aprovado na Câmara e sob exame do Senado. No primeiro caso, não parece existir outro país em que isso exija mudança na Constituição. Mas a PEC só existirá se o Senado aprovar a redução à média de 17%, das alíquotas de telecomunicações, combustíveis, energia elétrica e transporte urbano, constantes do PLP 18.

Poucas horas após a decisão do presidente, ao lado dos políticos que comandam a Câmara, Arthur Lira, e o Senado, Rodrigo Pacheco, economistas do Fundo Monetário Internacional divulgaram uma nota sobre o que consideram mais adequado e menos adequado na tarefa de mitigar os aumentos da energia e da comida, com base em uma amostra de 134 países, embora reconheça que cada país faz o que pode. A nota não menciona medidas tomadas pelo Brasil, embora o pacote do governo vá na direção oposta da julgada mais sensata pelos técnicos do Fundo.

Em geral, a nota aconselha que não se tente evitar o repasse dos aumentos dos preços dos alimentos, energia e combustíveis, mas que se aja para aliviar os estragos que causam à parcela da população mais afetada pelos reajustes, via política fiscal. Gastos com comida, por exemplo, são 16% da despesas da população dos países ricos, 28% dos emergentes e 44% dos países pobres. Tem sido responsável por 40% da alta dos índices de preços nos países emergentes em 2022.

Mas os preços têm influência decisiva para calibrar a demanda e o aumento da oferta e não se deve perder isso de vista. Como vários economistas no Brasil, os do FMI preferem a corte de impostos e a subsídios, transferências diretas e focadas, que alcancem os mais vulneráveis e que têm um custo menor. Preocupado em ganhar as eleições, Bolsonaro quer zerar todos os impostos sobre o diesel e diminuir os da gasolina, que têm alta elasticidade-renda, isto é, quanto mais alto o preço menor o consumo. Seu pacote não discrimina o caminhoneiro, e endinheirados proprietários de SUVs e quem não tem carro, nem nada.

Em quase metade de 26 das 31 economias desenvolvidas, se preferiu transferências diretas e indiretas de recursos (vouchers e desconto nas contas de luz e gás) para famílias com crianças e as que dependem da seguridade social, por exemplo. Na amostra de 103 países emergentes e pobres a preferência recaiu sobre redução de impostos sobre o consumo (24%) e congelamento ou subsídios de preços (18%).

Evitar o repasse de preços é caro, dizem os técnicos do FMI. Focalizar as medidas é melhor. Em vez de reduzir a tributação da energia (o que até pode ser feito quando a carga de tributos é muito alta, como no Brasil), é mais produtivo dar descontos nos preços até certo limite de renda. A escolha depende da situação fiscal do país e da capilaridade e profundidade do sistema de atendimento social, algo em que o Brasil têm experiência e meios para realizar. A Nigéria, por exemplo, usou dados do censo e um mapa com imagens de alta resolução de satélites para selecionar os benefícios nas áreas urbanas mais pobres. Togo usou dados biométricos e telefônicos dos eleitores para transferir recursos via plataforma digital.

É desaconselhável reduzir impostos de energia e comida, diz a nota, porque esses setores, que em geral praticam tarifas ad valorem, têm maiores receitas com aumentos de preços inelásticos. Esse excesso de receita deveria ser usado seletivamente para ajudar os mais pobres, e não se evaporar e aliviar as contas das famílias mais afluentes.

A PEC do governo custará cerca de R$ 40 bilhões, quase a mesma quantia (R$ 49 bilhões) que permitiu dobrar o valor do Auxílio Brasil (ex-Bolsa Família), enquanto os Estados falam em perdas de R$ 80 bilhões (1% do PIB). O ressarcimento aos Estados será feito fora do teto de gastos, mas esse é um defeito menor, se os recursos fossem destinados a minorar a insegurança alimentar e os pesados fardos dos mais pobres.

Toda a fuzarca governamental, com sua PEC, se esfarelará diante de novos aumentos de combustíveis. A queda da tributação pode ter impacto relevante na inflação, embora temporário, isto é, incluir o período eleitoral e favorecer o candidato Jair Bolsonaro - sua única preocupação com esse assunto.

Valor Econômico

'Alô, alô, marciano!': Bolsonaro em pânico




Por Vera Magalhães 

À medida que vê o corredor à sua frente se estreitar, Jair Bolsonaro dá mais sinais de pânico mal dissimulado, roubando o diagnóstico sempre preciso de Caetano Veloso.

Todas as promessas fake que esquadrinhei neste espaço na semana passada vão caindo por terra: com cara acabrunhada, o presidente em desespero admitiu que não haverá reajuste dos servidores no final das contas. Quem sabe em 2023, pessoal?

Para tentar operar alguma mágica que baixe o preço dos combustíveis, arrancou a fórceps uma fórmula que Paulo Guedes, mais desnorteado que o chefe, não sabe se custará R$ 25 bilhões ou R$ 50 bilhões. Tudo bem, para um governo que não planeja e que já mandou às favas qualquer escrúpulo liberal que um dia tenha tido, algo custar um tanto ou seu dobro é o de menos.

A tal compensação, que ninguém sabe quanto custará aos estados que aceitem comprar um terreno na Lua — ou em Marte, já que o presidente também anda ameaçando prender marcianos por aí —, não se sabe também quando nem como será paga.

É sempre didático fazer um exercício com o (e)leitor: se fosse Guido Mantega a dizer que algo pode custar entre R$ 25 bilhões e R$ 50 bilhões, que nome isso ganharia? Populismo fiscal, heterodoxia, nova matriz econômica, pedalada. Pois é o mesmo. Guedes exercita toda essa nomenclatura todos os dias.

Se fosse Dilma que perguntasse a convidados de uma solenidade no Palácio do Planalto se ela poderia prender um marciano, isso viraria meme, figurinha, clipe no YouTube, esquete de grupos de humor.

No desespero apoplético em que se encontra, Bolsonaro é ainda mais perigoso. Na semana passada, cantou vitória diante da mãozinha que seu indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Kassio Nunes Marques, deu para tentar anular uma importante jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral contra a propagação de fake news. Não quaisquer fake news: aquelas destinadas a descredenciar o processo eletrônico de votação. A decisão do TSE era de outubro de 2021. Mas a liminar de Kassio veio um dia depois de Alexandre de Moraes falar da importância da jurisprudência.

Restabelecida a decisão graças a um cerco feito pela maioria do STF, a que a dupla Nunes Marques e André Mendonça ainda tentou se opor, mas se viu vencida, Bolsonaro estrebuchou como nunca antes.

Disse que foi-se o tempo em que cumpria decisões do STF. Apenas escancarou sua real intenção ao conceder um inédito indulto individual a um aliado que atentou contra o Estado Democrático de Direito. Mais grave: deixou claro o muito que ainda é capaz de fazer daqui por diante.

O presidente não deixará que as eleições transcorram em normalidade. Tumultuará todas as fases: convenções, debates, campanha nas redes e, principalmente, votação, apuração e transição.

Agora, diante da possibilidade concreta de ser derrotado pelo ex-presidente Lula ainda no primeiro turno, lança a narrativa segundo a qual qualquer resultado que não seja sua própria vitória antecipada terá sido fraude.

Diante desses ataques cada vez mais destemperados, ministros do STF, senadores e candidatos avaliam que o período crítico de caos institucional se dará entre 2 de outubro, dia do primeiro turno, e a posse do futuro presidente.

Ninguém acredita que ele terá sucesso no golpe que delira implementar. Não haverá apoio popular ou da mídia, internacional e empresarial, essenciais em 1964, última ruptura democrática que houve no Brasil. O protagonismo militar de então ainda é uma incógnita agora. Principalmente porque os generais deverão olhar para esses outros atores ausentes da equação e entender o grau de aventura que seria dar guarida à sanha golpista de Bolsonaro.

Restará a ele tentar prender um marciano quando fracassar sua versão tropical da invasão do Capitólio.

O Globo

Cinco nomes e um destino




Com o Supremo e o TSE atuando de modo tão elíptico, a Justiça dá consistência à polarização com dois preferidos e os demais fantoches.

Por Paulo Delgado* (foto)

Deixando-se manejar por uma eleição flashback, o Brasil concede ao passado poder sobre o futuro. Levado pelo êxtase ou a aventura, a reflexão não tem tido prioridade entre nós. Só as pesquisas contam, como ideologia.

As pesquisas nunca gostaram de Ciro. E já desconfiam de Simone. Fingem não ver Luiz Felipe. Gostavam de Marina, até que Dilma espalhou que os verdes eram banqueiros – registraram a indignidade na margem de erro. Largaram Aécio jogando as fichas no capitalismo de cassino que produziu 2018.

Lá atrás, queriam Collor e, por odiar Brizola, ajudaram Lula a contragosto. Calado duas vezes por FHC, ele se reciclou, arrumou um guru, amigo das pesquisas, para ensaboar a fera e fazer a pedra virar flor. As pesquisas fingiram não ver Bolsonaro e escondiam que evitavam Haddad. No fundo, não queriam Ciro e botaram a culpa em Juiz de Fora. Alckmin, que é médico e afável, não visitou o esfaqueado no hospital, ajudando-o a consolidar a imagem de desprezado.

Nenhuma diferença metodológica ou técnica explica a variação dos números das pesquisas. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ajuda na confusão por só exigir o carimbo burocrático de “registrada”, dando credibilidade ao submundo da amostra. Pesquisa é ideologia, eleitor é que é utopia.

Com o Supremo e o tribunal eleitoral atuando de maneira tão elíptica, espalhando ânsias malogradas por aí, a Justiça dá consistência à polarização com dois preferidos e os demais fantoches. Sem clareza jurídica estrutural e estável, criando jurisprudência de casta, ministros concedem privilégios aristocráticos a políticos processados, produzindo este estado de coisas. Ameaçam o País com o rigor da lei – saudades de Brossard (não quero o rigor da lei, basta a lei) – e empurram o eleitor, coelho apressado de Alice, para a festa do corta-cabeça.

A vaidade unilateral de querer prevalecer sozinho cingiu o País. E o mesmo naipe arbitrário do poder monocrático se espalhou como doença. O Supremo, como instituição, precisa se proteger contra si mesmo, se não quer ver suas decisões tênues como clarão de fósforo riscado. A crise dos democratas é maior do que a da democracia.

Pesquisa como ideologia enfia o eleitor no funil de sua falta de parâmetros. Embrulha os resultados em tantos labirintos que lembram leis e linguiça, melhor não ver o processo de fabricação.

A superficialidade da eleição tira o Brasil da roda do tempo com seu baixo padrão de disputa do voto. Olhando o mar de pesquisas, é possível observar que se dirige mais aos candidatos fora da curva, que insistem no debate, contrários ao “rejeitor” – o eleitor da rejeição, não o da escolha.

O desejo de distinção pode conter mais insinceridade do que divergência. Entre Lula e Bolsonaro, notórias biografias distintas, são grandes as afinidades sobre mando, base parlamentar, gastos, guerra, papel do Estado, idolatria. Têm apoiadores sinceros que aceitam que seus governos estejam dentro de si mesmos, como efígie que fará o que quiser. Porém, insistindo em bulir com o brasileiro, podem se surpreender com a exaustão do antagonismo deste longo estímulo negativo que instiga o povo.

A semelhança de estratégia é que produz competição tão encarniçada. Borboleta e caranguejo, harmonia na bizarrice. Poderão vencer um ao outro, mas não conseguirão extrair força do voto para fazer acontecer. Terminada a apuração, a mágica evapora em governos requentados.

Ciro, Simone ou Luiz Felipe podem fazer o Brasil iniciar um novo ciclo. Com eles, a energia autêntica da novidade política retira das urnas a força constitucional de mudança e reforma.

Ciro é enfático e seguro, coerente conhecedor dos desafios, traído em sua boa-fé, não perde a fé, segue como um Robinson Crusoé. Quem luta contra a corrente parece um injustificado por não oferecer perspectivas mais cobiçáveis que tranquilizam apressados e interesseiros. Sua influência benéfica é justamente esta, não deixar o País cair na inércia do lugar-comum que o tem feito chegar sempre atrasado ao mundo civilizado.

Simone é altiva e doce e, com sua coragem, prova que o Brasil não é indigno de viver uma outra experiência estética no exercício do poder. Não é autoritária em seus valores, jovialidade autêntica, uma outra alegria mais pluralista, com a fé e não a cor de igrejas em conflito. É, também, capaz de enfrentar a overdose de moralismo ideológico, a invisibilidade das ideias no poder e o viés antiocidental em curso na campanha.

Luiz Felipe quer ser um presidente ousado e barato, pois sabe que uma boa auditoria resolveria bem muitos problemas do Estado brasileiro, abismo do dinheiro do contribuinte. Não se faz passar por pessoa que não é. Parece disposto a desafiar o blefe da mesmice e ampliar o horizonte do País.

Tomando caminhos já conhecidos, o Brasil mais se bifurca. E se a marca da eleição é a rejeição que outro caminho tomar? Lembro poesias consagradas. Diante da encruzilhada, não seja duas pessoas, uma influenciando a outra. Busque o caminho menos pisado, isso fará toda a diferença no futuro. Pense na existência, sem ironia ou cansaço, vá por onde te levem teus próprios passos.

*Sociólogo. 

O Estado de São Paulo

Improviso e demagogia na jogada do ICMS - Editorial




Em encenação grotesca, em que levou chá de cadeira de Lira e Pacheco, Bolsonaro anuncia medidas inúteis contra alta dos combustíveis e custosas para Estados

Bem alimentado, bem alojado no Palácio do Planalto, bem assistido quando digere mal um camarão e com tempo de sobra para motociatas e passeios de jet ski, o presidente Jair Bolsonaro vem tratando os preços da gasolina e do diesel como os maiores e mais prementes problemas dos brasileiros. Têm relevância, de fato, mas quase desaparecem quando confrontados com o desemprego, a perda de renda, os preços da comida, o custo da saúde, as escolas sem banheiros, a falta de professores, a violência rotineira e as moradias em áreas de risco, para citar apenas os pesadelos mais noticiados no dia a dia. Nenhum desses problemas será resolvido com o mero corte de tributos, como o IPI e o ICMS, mas o presidente, seus ministros e seus parceiros do Centrão insistem nesse remédio – inútil, custoso e desastroso para os governos, para os serviços prestados à população e para a maioria das famílias.

Além de grotesco, foi assustador o espetáculo protagonizado pelo presidente Bolsonaro na segunda-feira à noite, quando anunciou planos de redução de impostos federais e estaduais para baratear combustíveis, energia elétrica, transportes públicos e serviços de comunicação. Reduzida a pronunciamentos de autoridades, embora devesse ter sido uma entrevista coletiva, a manifestação foi um indisfarçável evento eleitoral. Igualmente indisfarçável foi sua improvisação.

Bolsonaro e ministros chegaram em primeiro lugar e esperaram por vários minutos o aparecimento dos presidentes da Câmara e do Senado, numa inversão dos padrões protocolares. Durante a apresentação, o advogado da família Bolsonaro, Frederick Wassef, circulou por trás das autoridades e ficou junto de ministros, durante algum tempo. Ninguém explicou sua presença no anúncio-comício. Mas o evento suscitou outras questões importantes para quem se preocupa com os aspectos mais prosaicos da administração pública.

Quanto o governo federal terá de pagar aos Estados para compensar as perdas de receita do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)? De onde virá esse dinheiro? Que garantia terão os governadores de receber essa compensação? Nenhuma resposta satisfatória foi apresentada durante as falas das autoridades. O ministro da Economia mencionou, depois dos discursos e já na saída, um possível custo de até R$ 50 bilhões.

O dinheiro poderá sair da receita de privatização da Eletrobras – uma fonte ainda incerta – ou dos dividendos da Petrobras. Esses detalhes confirmam claramente a improvisação do lance eleitoral. Além disso, a transferência da verba aos Estados implicará um rompimento do teto de gastos. Para realizar esse dispêndio, o Executivo federal dependerá da aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) – mais um fator de insegurança. A palavra improviso tem um sentido muito menos nobre, neste caso, do que quando aplicada a um lance genial de um grande jogador de futebol ou à execução de um trecho de jazz por um músico de talento notável.

Empenhados em limitar o uso do ICMS pelos governos estaduais, líderes do Centrão, como o presidente da Câmara, participam da jogada eleitoral do presidente Jair Bolsonaro. Também fazem o próprio jogo, é claro, e com isso atropelam os valores federativos e comprometem a capacidade administrativa de governadores e prefeitos (municípios têm direito a uma parte do maior tributo estadual). Podem reduzir temporariamente os preços de combustíveis e de alguns serviços, mas sem impedir novos aumentos, porque estes independem dos impostos indiretos. Quando se considera este ponto, fica ainda mais ostensiva a trapaça envolvida na manobra de Bolsonaro e de seus parceiros.

Se estivessem de fato empenhados em favorecer os mais vulneráveis, presidente e Centrão poderiam formular, por exemplo, um esquema de subsídio ao gás de cozinha ou ao transporte público. Mas, se Bolsonaro tivesse esse tipo de preocupação, o Brasil teria chegado ao quarto ano de seu mandato com desemprego muito menor, inflação mais contida e nenhum centavo consumido num orçamento secreto. 

O Estado de São Paulo

O mais novo capítulo da crise institucional


Fernando Francischini


Críticas às urnas denotam receio com solidez da candidatura

Por Fernando Exman

Antes mesmo de emergir na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) o caso do deputado estadual bolsonarista Fernando Francischini, do União Brasil do Paraná, era crescente a apreensão daqueles que monitoram a voltagem das relações entre o Executivo e o Judiciário.

São frequentes os curtos-circuitos, quase sempre provocados pela elevação da tensão por parte do presidente Jair Bolsonaro, embora também seja preciso observar as movimentações do outro lado da Praça dos Três Poderes.

Foi-se o tempo em que integrantes da cúpula do Judiciário diziam que o conceito de “crise institucional” era uma criação artificial de quem não compreendia a função do STF. Sob essa ótica, eventuais atritos seriam naturais em razão da Corte analisar, quando provocada, possíveis inconstitucionalidades nas propostas aprovadas pelo Parlamento e atos do Executivo. Uma visão que acabou sendo subjugada pela dinâmica criada pelo presidente em sua interação com os demais Poderes.

Por isso surpreendeu, positivamente, a decisão do presidente do Supremo, Luiz Fux, de retirar do plenário o julgamento sobre o marco temporal das terras indígenas. A análise seria retomada no dia 23 de junho, mas agora só deve retornar à mesa depois das eleições.

A solução saiu melhor do que o esperado. No meio militar, a torcida era para que um pedido de vista adiasse o julgamento.

Essa saída, contudo, inevitavelmente geraria desgaste político para o ministro que assumisse a missão. E o mais provável era que esta recaísse sobre a toga do ministro André Mendonça, uma vez que o outro indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a Corte, Kassio Nunes Marques, já tinha apresentado seu voto.

Tudo indicava que Nunes Marques seria derrotado, possivelmente com a companhia de Mendonça. Uma nova crise, dada como certa.

O julgamento no plenário começou em agosto do ano passado, e foi interrompido por um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. O placar estava um a um: Edson Fachin, relator do processo, havia sido contrário ao marco temporal, enquanto Nunes Marques defendera que a decisão do STF no julgamento do caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em que ele fora adotado, deveria prevalecer.

O tema é complexo. Merece ser analisado com cautela, algo que não tem como ocorrer em meio à campanha eleitoral.

Defendido por ruralistas e pelo governo federal, o chamado marco temporal estabelece que os povos originários só podem reivindicar territórios que já estavam ocupados por eles até a data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988. Para esse lado da disputa, seria o melhor instrumento para dar segurança jurídica, previsibilidade e estabilidade às atividades econômicas - e às relações sociais - em áreas com potenciais conflitos.

Ambientalistas, indigenistas e a Procuradoria-Geral da República (PGR) rechaçam a tese. Até porque muitas comunidades indígenas não estavam na posse das suas terras quando a Constituição foi promulgada justamente porque haviam sido expulsas. Nesse sentido, não haveria como se falar em um prazo para a proteção dos povos originários, seu modo de vida e cultura. A derrota do governo era dada como certa.

O que mais preocupava setores das Forças Armadas eram as potenciais conturbações sociais nas regiões afetadas pela decisão. A situação poderia ficar ainda mais delicada se o presidente cumprisse a promessa que vinha fazendo a ruralistas e à sua base eleitoral: por mais de uma vez ele sinalizou que não respeitaria uma decisão do STF que reconhecesse o marco temporal para a demarcação de terras indígenas. E voltou a dizer isso no último discurso que fez no Palácio do Planalto, o qual chamou atenção pelo seu nervosismo.

Isso tudo num momento em que nem estava no radar a angustiante notícia do desaparecimento do indigenista Bruno Araújo Pereira, servidor da Fundação Nacional do Índio (Funai), e do jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do jornal britânico “The Guardian”. Eles estavam no Vale do Javari, na Amazônia, numa área conhecida pela concentração de povos isolados e pela atuação de grupos criminosos invasores. Até agora não foram encontrados.

Outra data aguardada com atenção é o dia 20, quando ocorrerá a próxima reunião da Comissão de Transparência das Eleições (CTE) criada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Representantes do governo argumentam não saber exatamente qual a pauta do encontro. Apontam o risco de ocorrer algum tipo de desentendimento entre os participantes, depois dos recentes atritos entre o Ministério da Defesa e o TSE. Além disso, causou desconforto entre autoridades do governo as recentes reuniões do presidente do tribunal, Edson Fachin, com embaixadores e líderes religiosos.

Soma-se, agora, a decisão da Segunda Turma do STF em relação a Francischini. Uma punição que pode servir de exemplo para futuras ações desse mesmo tipo, eventualmente até mesmo contra o próprio Bolsonaro.

Aliado de primeira hora do chefe do Poder Executivo, o deputado estadual teve o mandato cassado pelo TSE porque declarou em uma transmissão na internet que as urnas haviam sido fraudadas para impedir a vitória de Bolsonaro. A mentira foi dita numa “live” no dia do primeiro turno das eleições de 2018.

Mas, não é só isso que atordoa o presidente. Seus aliados no Congresso têm demonstrado grande preocupação com os resultados das pesquisas eleitorais, e pressionam para que a campanha seja levada a sério.

Eles podem até concordar com as críticas aos rumos do julgamento do marco temporal, tema sensível para a bancada ruralista. Ou temer a amplitude do alcance que a decisão sobre Francischini pode vir a ter.

No entanto, existe no Centrão um incômodo com a sua insistência em criticar as urnas eletrônicas e um sistema eleitoral internacionalmente reconhecido. O temor é que se cristalize a imagem segundo a qual Bolsonaro está com medo de perder.

Valor Econômico

A ressaca do premiê - Editorial




Em meio a escândalo das festas, Boris Johnson se segura a custo no Reino Unido

Após meses se equilibrando numa corda bamba política, o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, conseguiu, ao menos por ora, pousar os pés em terra firme.

Na segunda (6), o premiê logrou permanecer no comando do país, ao vencer o voto de desconfiança que sua própria agremiação, o Partido Conservador, havia convocado contra ele devido ao escândalo desencadeado pela revelação de uma série de festas no interior da residência oficial durante as restrições provocadas pela pandemia.

Para haver a deliberação, era necessário que no mínimo 54 correligionários (15% da bancada) solicitassem o escrutínio a um órgão conhecido como Comitê 1922 —o que se verificou no domingo.

Na votação do dia seguinte, porém, Johnson prevaleceu com alguma folga, vencendo por 211 votos a 148 —ele precisava do apoio de ao menos 180 dos 359 parlamentares do partido para manter o cargo.

Apesar do triunfo, o histórico recente se afigura pouco animador para o premiê. Sua antecessora, a também conservadora Theresa May, venceu em 2018 votação idêntica apenas para, seis meses depois, renunciar em meio às dificuldades da saída da União Europeia.

Mesmo que Johnson logre permanecer no posto até o fim, parece claro que a credibilidade adquirida pela esmagadora vitória em 2019 pulverizou-se desde que o escândalo veio à tona.

Foi particularmente constrangedor para o premiê o relatório interno produzido por uma alta autoridade governamental e tornado público no final de maio.

Num momento em que quase todo o comércio estava fechado e os encontros eram limitados a duas pessoas, em locais abertos e a dois metros de distância, a residência oficial abrigava animadas festas madrugada adentro.

Ao todo, segundo o relatório, 83 pessoas ligadas ao governo participaram das pândegas, e o premiê esteve presente em oito delas.

A impopularidade de Johnson, já evidenciada por pesquisas de opinião e pela oposição de seus correligionários, ficou publicamente demonstrada na última sexta (3), durante as celebrações do Jubileu de Platina da rainha Elizabeth 2ª, quando o premiê recebeu uma sonora vaia ao chegar a um dos eventos da comemoração.

Johnson pode ter conseguido afastar a espada de Dâmocles que pendia sobre sua cabeça, mas vai se convertendo numa espécie de morto-vivo da política britânica.

Folha de São Paulo

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