Foto: Leonardo Sá/Arquivo/Agência Senado
Congresso Nacional12 de março de 2025 | 07:37Reforma do Código Civil não deixa viúva desamparada, diz jurista
A proposta de atualização do Código Civil que tramita no Congresso Nacional aumenta a lista de bens que farão parte do patrimônio comum dos casais, nas uniões no regime de comunhão parcial, e que, portanto, serão divididas com o cônjuge em caso de divórcio ou ficarão como parte da herança na morte do companheiro.
Essa relação passaria a incluir salários, pensões, dividendos, FGTS, investimentos em previdência privada e quotas ou ações de empresas adquiridas durante o casamento ou união estável.
Em relação à participação de empresa adquirida antes do relacionamento, o cônjuge terá direito à valorização ocorrida durante o período de convivência, incluindo lucros reinvestidos.
Para quem está no regime de separação total de bens, a proposta inova ao prever que o trabalho na residência da família e os cuidados com os filhos darão direito a uma compensação a ser fixada pelo juiz em caso de divórcio ou morte.
O projeto também institui a divisão, respeitada a proporcionalidade do gasto, do que foi comprado com o dinheiro dos dois, mas registrado apenas no nome de uma das pessoas do casal. Com isso, evita-se que a pessoa contribua para a compra de um imóvel, mas fique sem nada na partilha por causa do regime de separação.
O advogado Flávio Tartuce, relator da proposta de revisão do código entregue ao Parlamento por uma comissão de juristas no ano passado, afirma que essas mudanças ajudam a compensar a retirada dos cônjuges da lista daqueles que terão direito aos bens adquiridos pelo falecido antes do casamento —no caso da comunhão parcial.
Os recursos anteriores à união, agora, serão divididos exclusivamente entre os descendentes —ou ascendentes, na ausência de filhos. Nesse caso, será retomada a regra vigente até 2002, data da última atualização do código.
O fim da concorrência na herança também afeta quem está no regime de separação total de bens. Nesse caso, o viúvo ou viúva concorre atualmente com os descendentes em relação a todo o patrimônio, situação que contribuiu para aumentar a judicialização das sucessões familiares, segundo Tartuce.
“Por isso, a comissão entendeu que seria melhor substituir a concorrência [na sucessão] pela atribuição dos bens em vida ao cônjuge”, afirma o advogado.
A proposta também prevê que o Judiciário pode determinar usufruto sobre determinados bens da herança para garantir a subsistência do cônjuge ou convivente que comprovar insuficiência de recursos ou patrimônio —até ele ter recursos para se manter ou formar nova família. Por exemplo, determinar que fique com rendas de aluguéis ou de cotas societárias, mesmo que a propriedade desses ativos seja transferida para os filhos na sucessão.
Além disso, o projeto mantém o “direito real de habitação”, ou seja, prevê que o cônjuge ou convivente que residia com o autor da herança poderá ficar no imóvel de moradia da família, qualquer que seja o regime do relacionamento.
A proposta acrescenta que é garantido ao ex-cônjuge, no caso de divórcio, permanecer na residência se com ele residirem filhos menores ou incapazes —ou se a pessoa se dedicou aos cuidados da família e não desempenha atividade remunerada.
“Não é verdade que as viúvas vão ficar desamparadas. Elas ao menos terão o direito real de habitação sobre o imóvel do casal e o usufruto sobre bens do falecido, se precisarem. Nunca haverá desamparo, mesmo se houver exclusão [da herança] por testamento”, afirma o jurista.
Tartuce diz que as mudanças também evitam manobras que permitem reduzir os bens que podem ficar com o cônjuge em caso de divórcio ou herança. Por exemplo, colocar esses ativos em nome de uma empresa. Pode haver ainda dificuldade em acessar recursos de pessoas que trabalham como pessoa jurídica, o que acontece também no caso de motoristas e aplicativos e microempreendedores.
Ele diz que a comissão de juristas, composta também por mulheres, teve preocupação com a questão de gênero ao elaborar a proposta.
“Hoje, todo mundo coloca tudo em nome da empresa, e a mulher fica sem nada. Então aumentamos a meação na comunhão parcial, algo sem precedentes. A proposta tira essa concorrência na sucessão, mas aumenta os direitos do cônjuge em vida por meio da meação. Aí não tem disputa sucessória, já é meio a meio”, afirma o jurista.
As sugestões de alteração no Código Civil foram apresentadas formalmente como um projeto de lei (PL nº 4/2025) pelo ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) em janeiro deste ano.
Eduardo Cucolo/Folhapress