Carlos Chagas
O governador Roberto Requião pegou o peão na unha. É candidato à presidência da República, no caso de as bases do PMDB atropelarem a decisão das cúpulas, de apoiar Dilma Rousseff. Só uma convenção poderá determinar se haverá candidato próprio ou aliança com outra candidatura. Essa convenção acontecerá no primeiro semestre do ano que vem. Até lá, estará percorrendo o país para visitar os diretórios estaduais e sustentar a opção partidária. E não se preocupa se o presidente Lula vai gostar ou não.
Para Requião, o importante a partir de agora é apresentar ao PMDB um programa para o futuro, calcado na necessidade de limitar o capital financeiro e ampliar as conquistas sociais, com ênfase para o trabalhador. Demolir as últimas tentativas de o mercado prevalecer sobre o interesse nacional, começando pelo enquadramento do Banco Central e dos bancos públicos e privados.
Não admite que a maioria de seu partido permaneça atrás de liberação de verbas e da ocupação de postos e funções no governo do PT quando, como maior estrutura política nacional, dispõe de mais vereadores, prefeitos, deputados estaduais, governadores, deputados federais e senadores do que as demais legendas.
Lembra que o Instituto Ulysses Guimarães, presidido pelo deputado Eliseu Padilha, promoveu consulta às representações estaduais e obteve 25 manifestações favoráveis à candidatura própria. Dá menos importância ainda à tentativa malograda da direção nacional do PMDB de boicotar a campanha pela candidatura própria, acolitada por parte da mídia. Contra a natureza das coisas ninguém investe impunemente.
Começa em atmosfera adversa o vôo pilotado pelo governador do Paraná, tendo em vista a estratégia das elites nacionais, ironicamente divididas entre as candidaturas de Dilma Rousseff e José Serra, ambas tão iguais quanto o seis e o meia-dúzia. Apesar de sua amizade com os dois candidatos, o pré-candidato não vê como possam promover as mudanças de que o país necessita. Não critica o programa de governo do presidente Lula no que diz respeito ao avanço social, apesar da capitulação frente ao neoliberalismo. O bolsa-família é um programa irreversível que será continuado por quem vier a ser eleito, mas é preciso que avance.
Toda grande marcha, para Requião, parafraseando o presidente Mao, começa pelo primeiro passo, que acaba de ser dado.
Depois da informática
Terá desdobramentos essa imensa lambança tornada pública com a operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal. Porque até agora revelaram-se apenas as distribuições de dinheiro irregular tomadas de empresas especializadas em informática. Quanto terá sido arrecadado de empresas que se dedicam aos transportes públicos, à construção civil, à saúde, educação e sucedâneos.
A pergunta que se faz é se essas ações criminosas de governantes, funcionários, parlamentares e, dizem, até juízes, restringem-se a Brasília ou se dispõem de tentáculos nos diversos estados. Na maioria dos casos, só falta o cinegrafista-larápio que resolveu documentar tudo.
Um sacrilégio
Andam brincando com fogo os mensaleiros e demais bandidos empenhados na desvairada corrupção que nos assola. Porque um sacrilégio daqueles dignos do fogo eterno começa a circular pelo país. São muitas as vozes que indagam o que teria feito o tonitruante general Ernesto Geisel caso a lambança do Arruda tivesse acontecido nos idos em que governou o país. No mínimo, teria mandado recolher à cadeia todos os implicados e denunciados no mensalão do DEM. E em outros mensalões. Com ou sem garantias constitucionais, não sobraria ninguém, de governador a vice-governador, secretários, deputados, juízes e muito mais gente. Apesar de tratar-se de um ato ditatorial, quanta gente aplaudiria? É bom que os tempos do autoritarismo tenham escoado pelo ralo, mas fica a pergunta: por que a democracia carece de instrumentos para impor a ética e a honestidade?
Discussões inócuas
A comissão de Constituição e Justiça do Senado discutiu, essa semana, proposta de emenda constitucional restabelecendo a necessidade de diploma universitário para o exercício do jornalismo. A iniciativa deveu-se à incompreensível decisão do Supremo Tribunal Federal de extinguir o diploma, permitindo a quem dispuser do dom de escrever a permissão de trabalhar em jornais, revistas, rádios, televisões e toda a parafernália informativa.
Vai demorar até que o Congresso se pronuncie, mas seria fácil a qualquer parlamentar decidir a questão em dois minutos. O dom de escrever faz o escritor, que não está impedido de ter seus escritos publicados na imprensa. Mas apenas como colaborador, jamais como jornalista, que para exercer a profissão precisa de outras credenciais além de saber escrever: editar, selecionar, diagramar, apresentar – tudo a partir da aquisição de conhecimentos ordenados de história, política, economia, geografia, ética, filosofia e quanta coisa a mais? Apenas nos bancos universitários esse conjunto poderá ser recebido de forma ordenada e sistematizada, como para o advogado só na faculdade de Direito receberá lições de Direito Civil, Penal, Constitucional, Comercial, Trabalhista e muitos outros.
Alguém pensa em extinguir o diploma de advogado só porque determinado cidadão tem o dom da oratória? Ou o diploma de medicina porque o açougueiro é um craque na arte de cortar carne?
Fonte: Tribuna da Imprensa