
Ilustração de Takeshi Gondo (ohoje.com)
Malu Gaspar
O Globo
O governo Lula já fez mais de 40 exonerações, entre demissões oficializadas no Diário Oficial da União (DOU) e mudanças anunciadas na máquina federal desde que a articulação política do Palácio do Planalto iniciou uma faxina nos cargos controlados por partidos do Centrão. O movimento faz parte de uma represália da gestão do PT pela derrubada da Medida Provisória que aumentava impostos para ampliar a arrecadação da União.
Segundo levantamento da equipe da coluna, até a noite da última sexta-feira (17) a limpa atingiu cargos em estruturas estatais estratégicas para as legendas como superintendências de ministérios, o Departamento Nacional de Obras contra a Seca (DNOCS), a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
TROCAS – Completam a lista o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a Agência Nacional de Mineração (ANM) e até a Zona Franca de Manaus – sem contar as trocas nas vice-presidências da Caixa Econômica Federal, ainda não oficializadas pelo governo Lula mas dadas como certa no Planalto.
De acordo com auxiliares do presidente ouvidos sob reserva pela equipe do blog, novas exonerações devem ser oficializadas ao longo da próxima semana nestes órgãos e em outras instâncias, como o Ibama e o ICMBio, ligados ao Ministério do Meio Ambiente, a Companhia de Desenvolvimento do Vale do Rio São Francisco (Codevasf), vinculada à pasta da Integração e Desenvolvimento Regional.
As mudanças atingem indicados pelo União Brasil, MDB, PP, Republicanos e PSD, que controlam dez ministérios se consideradas as pastas das Comunicações e da Integração e Desenvolvimento Regional, comandadas por indicados pelo presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (AP), uma das principais lideranças do União.
FREIO DE ARRUMAÇÃO – Por ora, à exceção da estrutura da Caixa, o freio de arrumação se concentrou em cargos de segundo e terceiro escalão que garantem ao bloco capilaridade na máquina do governo.
O ministério que mais acumulou exonerações até o momento é o da Integração e Desenvolvimento Regional, controlado por Waldez Góes. Foram oito demissões até o fechamento da reportagem no DNOCS e na Sudene que derrubaram indicações do Republicanos, PP, PSD e União Brasil. Já a pasta da Agricultura demitiu indicados pelo PSD, entre eles cinco superintendentes do ministério em Minas Gerais, Pará, Paraná, Maranhão e Tocantins.
CRIMES ELEITORAIS – No DNIT, o governo exonerou o superintendente da estatal em Roraima, Igo Gomes Brasil, indicado pela deputada Helena Lima (MDB-RR). No final de julho, os dois foram alvos de uma operação da Polícia Federal (PF) no âmbito de uma investigação que apura supostos crimes eleitorais no estado – mas só agora Gomes está sendo demitido. O departamento é vinculado ao Ministério dos Transportes, comandado por Renan Filho (MDB).
A operação ganhou notoriedade nacional por ter mirado também o presidente da CBF, Samir Xaud, que é roraimense. A entidade, contudo, não é investigada neste processo. Além das exonerações que estão por vir, o número de baixas para o Centrão na Esplanada de Lula tende a ser ainda maior. Isso porque os indicados demitidos costumam sair muitas vezes junto de equipes inteiras subordinadas a seus cargos
CRISE NA BASE – Enquanto MDB, PSD e Republicanos mantêm os planos de integrar o governo Lula até a pré-campanha eleitoral, o União Brasil e o PP, que tentam formar uma federação na Justiça Eleitoral, anunciaram no início de setembro o desembarque da Esplanada.
Os ministros Celso Sabino (Turismo) e André Fufuca (Esportes), filiados às respectivas legendas, perderam o comando das siglas em seus estados após anunciarem que não deixarão suas pastas. Sabino responde a um processo interno e pode ser expulso do União.
A tensão na base do governo elevou a temperatura da crise em Brasília e culminou na derrubada da MP quatro meses após outra derrota humilhante na Câmara dos Deputados no projeto que buscava aumentar o próprio IOF, o que pressionou o Planalto a rever a relação com o Centrão.
ORIENTAÇÃO – A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, chegou a declarar em entrevista ao O Globo que a orientação da articulação política é demitir quem não tem votado com o governo e manter os cargos de aliados que se comprometerem desde já com a reeleição de Lula em 2026. “Quem está sendo leal ao governo tem que ser valorizado e quem não está não tem por que ficar”, resumiu a ministra.
As exonerações já eram cogitadas desde o início de agosto, quando o presidente Lula chamou os líderes de partidos do Centrão e cobrou fidelidade às pautas do governo após a derrota na votação da MP que aumentava o IOF. Mas a equação demanda um jogo de equilíbrio no Congresso. Além da coalizão eleitoral das eleições do ano que vem, o governo ainda tem pautas prioritárias a serem votadas pelo Legislativo como o fim da escala 6×1 e a PEC da Segurança Pública, vitrines para a corrida presidencial que se avizinha.
RECOMPOSIÇÃO – Aprovada com o apoio de 493 entre 513 deputados, a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil, por sua vez, ainda pode voltar para a Câmara caso sofra alterações no Senado. Além disso, a equipe econômica liderada por Fernando Haddad precisa recompor o orçamento após a derrubada da MP alternativa ao reajuste ao IOF.
É neste cenário sinuoso que se dará a recomposição da base aliada deflagrada pela onda de exonerações da última semana, o que pressionará ainda mais a habilidade da articulação política do governo em negociar votos no Congresso.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Lula da Silva está jogando fora a própria reeleição. Sem o apoio do Centrão, ele perde até para Michelle, que é uma nulidade política. (C.N.)