Sebastião Nery
Ramos de Freitas, delegado e arbitrário, entrou para a história de Pernambuco, nos anos 20, como o terror das minorias marginalizadas. Ladrões, prostitutas, gays, desempregados e vadios pobres sofriam horrores nas mãos calvinistas do Dr. Freitas.
Era um delegado Padilha de Recife. Quem não trabalhava, apanhava. Quem não tinha carteira profissional, xadrez. Saía pelas ruas, dia e noite, catando gente de arrastão. Uma tarde chegaram à delegacia, presos, dois travestis. Dr. Freitas mandou buscar a palmatória enorme, grossa como um filé mal-passado, para dar uma dúzia de bolos em cada um.
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O DELEGADO
Chamou o primeiro:
- Seu nome?
- Valquíria.
- Você não tem vergonha?
- Vergonha eu tenho, doutor. Eu não tenho é gosto de mulher.
- Vocês dois trabalham? O que é que vocês são?
- Nós “semos” homossexual, Dr. Freitas.
- Nós “semos”, não. Nós somos.
- Perdão, doutor Freitas, eu não sabia que o senhor também era.
- O que, seu sem-vergonha? Duas dúzias de bolos em Valquíria.
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ITAMARACÁ
Houve pancadaria em um baile de travestis no carnaval de Recife. Todo mundo preso. A delegacia ficou florida de remelexos, lantejoulas e paetês. O delegado Freitas foi fichando um a um e mandando embora:
- Seu nome?
- Greta Garbo.
- Seu nome?
- Marilyn Monroe.
- Seu nome?
- Lourdes.
- O que, seu sem vergonha? Lourdes é o nome de minha avó. Vai ficar seis meses na prisão de Itamaracá.
Seis meses depois, o delegado mandou buscar o Lourdes para soltar:
- Seu nome?
- Freitinhas.
- O quê, seu sem vergonha? Mais seis meses na prisão de Itamaracá.
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ALKMIN
Na democracia, cada um vai para o partido que quer e ninguém tem nada com isso.Mas o partido tem que ter uma cara, um rosto, um programa.
Como bem diz o governador paulista Geraldo Alkmin, “partido é como religião. Não há religião sem fé, não há partido sem programa, sem idéias”.
A degenerescência das instituições nacionais está chegando a tal nível de desfaçatez publica que mais de 100 governadores, vice-governadores, senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos, todos recém-eleitos na oposição, de repente resolvem sair de seus partidos para apoiar o governo. E não usam uma frase sequer para alegarem suas razões.
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PSD
O “comprador-mor” dos tempos de Vila Rica no Brasil Colônia, que vinha de Portugal para fiscalizar a extração e compra do ouro, também não alegava nada. Pegava o ouro o carregava. O prefeito Kassab, de São Paulo, “comprador-mor” do novo partido, está tão seguro da insensibilidade moral do pais, que se sente dispensado de falar em qualquer programa:
- O partido não é de direita, nem de esquerda, nem de centro.
Deve ser de fundos. E ele sai pelo pais, de maleta na mão, como um mascate da política nacional, adquirindo gente com seu farnel partidário. A isso eles chamam de “novo partido”. Um partido travestido de partido.
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O “FILÓSOFO”
Essa é mais uma invenção do pais das jaboticabas. Quando não sabe bem o que a pessoa é ou faz, a imprensa o chama de “filósofo”. Um “professor” gaúcho, também não sei de quê (advogado ou lobista?), diz esta semana nas “Paginas Amarelas” da “Veja” :
- “A tentativa de proibir a publicidade de cigarro, de bebida e de alimentos parece inofensiva, mas sem publicidade a imprensa se torna dependente do governo, o que compromete a liberdade de expressão”.
É uma dose cavalar de cinismo. O pais sabe, e sabe sobretudo a saúde publica, que o controle da propaganda de cigarro diminuiu em 30% o consumo e as doenças do fumo. Agora, quando se quer limitar a propaganda de bebida para jovens e crianças,como é nos países civilizados, vem uma anta magisterial e diz que “compromete a liberdade de expressão”
“Liberdade de expressão” de quem? De um faturador de câncer?
Fonte: Tribuna da Imprensa