Marcelo Elias/Gazeta do Povo
Analgésicos e anti-inflamatórios respondem por 40% dos casos de alergia a remédios. Problema atinge uma em dez pessoas
Publicado em 11/07/2011 | Rafaela BortoliCerca de 12% da população tem alergia a algum tipo de medicamento, de acordo com a Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia (Asbai). Os campeões são os analgésicos e anti-inflamatórios, que respondem por 40% dos casos. “Como são vendidos sem receita médica, as pessoas costumam ingerir esses remédios com frequência e, na maioria das vezes, sem acompanhamento profissional”, explica o médico alergista e diretor da Asbai, Luís Felipe Chiaverini.
Nos consultórios, os campeões em reclamações são o ácido acetilsalicílico, a dipirona e o diclofenaco. Segundo Chiaverini, isso não significa que esses medicamentos são mais tóxicos que os demais, mas que a alta ingestão potencializa os riscos de reações. “Eles estão no topo da lista por serem amplamente consumidos, o que, ao longo do tempo, sensibiliza o organismo até ele responder com um processo alérgico.”
URTICÁRIAS
90% das reações ocorrem na pele
Cerca de 90% das alergias aparecem na pele, principalmente em forma de urticárias, placas vermelhas que coçam distribuídas por vários locais do corpo ou concentradas em uma só região. “Também é comum a pessoa ter inchaço nas pálpebras, olhos, lábios, língua e garganta, o que pode causar dificuldades para respirar. Nos casos mais graves, há queda de pressão, desmaios e até choque anafilático”, afirma a alergologista Gisele Kuntze.
No caso de a pessoa ter estes sintomas, o primeiro passo é suspender a medicação e procurar um pronto-socorro imediatamente. “Só um médico é capaz de identificar a alergia e prescrever o melhor tratamento para contê-la. No mesmo dia, a pessoa deve ir ao alergologista e fazer os exames para ver o que motivou a reação”, orienta o alergista Luís Felipe Chiaverini.
Segundo os médicos, o hábito de ter sempre um anti-histamínico à mão ajuda a controlar as crises alérgicas, mas não é o ideal. “Como o medicamento demora meia hora para fazer efeito e cada pessoa precisa de uma dose específica, é perigoso contar somente com este recurso. Se desconfiar que está tendo uma reação alérgica, o melhor é não se medicar sozinho e procurar um hospital.” (RB)
Corantes e xaropes provocam reações
Não é só a substância ativa do medicamento que pode causar alergia. Aditivos usados para dar cor e sabor mais atrativo aos remédios também podem causar reações. Os mais comuns se relacionam ao corante amarelo, a tartrazina, e ao vermelho-carmim – os mais usados pela indústria farmacêutica. “Nos últimos anos, tem havido um esforço das empresas para retirar os corantes dos produtos, principalmente nos usados por crianças, mas é importante que o paciente leia a bula com atenção para verificar se o que está ingerindo tem ou não um componente deste tipo”, aconselha a médica alergologista Gisele Kuntze.
Entre os medicamentos, os principais focos de alergia a corantes são as suspensões (remédios líquidos, antibióticos, anti-inflamatórios e anti alérgicos) e produtos vendidos em drágeas (comprimidos revestidos). Como cada empresa pode usar os corantes que achar apropriados – ou nem usá-los –, a alergologista explica que são comuns casos de pessoas alérgicas ao remédio produzido por um laboratório e não ao feito por outro. “Com isso, percebemos que a pessoa tem alergia ao corante. Ela pode continuar tomando o remédio, mas sempre escolher a marca que não usa aquele tipo de aditivo.” (RB)
Os antibióticos (principalmente penicilina, amoxicilina e ampicilina) e os anti convulsionantes têm incidência menor de casos de alergia. E não são só os medicamentos de ingestão oral ou aplicação endovenosa que causam reações. Há pessoas sensíveis a colírios, pomadas, cremes e até vacinas.
Causas
Em geral, as alergias são causadas pelo princípio ativo dos medicamentos. Hoje, o diagnóstico é feito a partir do histórico do paciente, quando ele relata ao médico que substâncias ingeriu nas últimas semanas e se já havia manifestado sintomas alérgicos. Para alguns remédios é possível fazer testes para comprovar a reação do organismo. “Principalmente em casos envolvendo anti-inflamatórios e analgésicos, fazemos um teste de provocação: o paciente fica em observação e administramos pequenas quantidades para verificar se ele tem reações alérgicas”, diz Loraine Landgraf, especialista em alergia e imunologia do Hospital Vita Batel e diretora da Sociedade Brasileira de Alergia e Imunopatologia - Regional Paraná.
Mesmo o exame sendo simples, ele deve ser feito por um médico especializado e sempre em ambiente hospitalar, já que há pessoas com reação imediata e forte ao medicamento, podendo causar um choque anafilático.
O tempo para reação a um medicamento varia. Algumas pessoas alérgicas manifestam os sintomas poucos minutos após a ingestão. Para outras, são necessárias horas ou dias para que os primeiros sinais apareçam. E se engana quem acha que a alergia se manifesta imediatamente após o primeiro uso. “Pelo contrário, a maioria dos casos é de pessoas que tomaram o remédio pelo menos duas ou três vezes antes, sem ter reações, e há aquelas que ficam anos tomando o medicamento até que, um dia, passam a ter alergia a seus componentes”, explica Gisele Kuntze, médica alergologista do Instituto Paranaense de Otorrinolaringologia (IPO).
A explicação para isso é simples: para se defender, o organismo precisa ter contato com os agentes que causam as doenças (como vírus, bactérias e substâncias estranhas), para identificá-los e desenvolver o melhor mecanismo de reação. “Por algum motivo ainda não explicado, o organismo se sensibiliza e passa a identificar as substâncias do medicamento como ameaças e começa a atacá-las”, comenta Loraine.
Testes
Por enquanto, não há testes que identifiquem todas as substâncias ativas das quais alguém pode ser alérgico. “Por isso, o sistema é por tentativa e erro. A cada reação, o médico investiga seus motivos específicos”, diz Gisele. E não há padrão na ocorrência das alergias. “A pessoa pode ter reações a medicamentos de uma mesma família, como todos com penicilina, dipirona ou ácido acetilsalicílico, ou ter alergia a vários remédios de famílias diferentes.”
É o caso da funcionária pública Priscila Nakanishi, 27 anos. Há dez anos ela descobriu que era alérgica a diclofenaco. A partir daí, a lista de produtos contra-indicados não parou de crescer. “Hoje sei que tenho alergia a kiwi, molho funghi e alimentos que tenham corante amarelo ou vermelho. Entre os remédios, não posso tomar paracetamol, dipirona, ácido acetilsalicílico e todos os anti-inflamatórios”, enumera. Para evitar problemas, ela recorre a métodos alternativos, como homeopatia e até vacinas de imunoterapia. “Se tenho febre, uso uma compressa de água fria e espero passar.”
Fonte: Gazeta do Povo