Certificado Lei geral de proteção de dados

Certificado Lei geral de proteção de dados
Certificado Lei geral de proteção de dados

terça-feira, outubro 04, 2022

Bolsonaro: mais afetados por inflação serão foco no 2º turno




Presidente disse que priorizará na campanha a camada da população mais atingida por aumento de preços e pandemia e tentará convencê-la de que "mudança que alguns querem pode ser pior".

Por Bruno Lupion

O presidente Jair Bolsonaro afirmou neste domingo (02/10) que priorizará nas quatro semanas de campanha até o segundo turno o convencimento da camada da população que sentiu com mais força o impacto da inflação e da pandemia.

Em entrevista a jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse, sem mencionar o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que muitos votos em seu adversário teriam sido resultado da "condição do povo brasileiro que sentiu o aumento [do preço] dos produtos, em especial da cesta básica".

"Existe um sentimento que a vida dele não ficou igual do que estava antes da pandemia, e a tendência é buscar um responsável, e o responsável é o chefe do Executivo", afirmou. Lula terminou o primeiro turno com 48,4% dos votos válidos, 6,2 milhões a mais do que Bolsonaro, que teve 43,2%.

"Entendo que há uma vontade de mudar por parte da população, mas tem certas mudanças que podem vir para pior. A gente tentou durante a campanha mostrar esse outro lado, mas parece que não atingiu a camada mais importante da sociedade", disse.

Ele ressaltou que setembro será o terceiro mês seguido de deflação no Brasil e mencionou a queda dos preços dos combustíveis e da energia elétrica como possíveis temas a serem explorados na sua campanha.

Para Bolsonaro, o próximos dias serão uma oportunidade para "mostrar melhor para a população brasileira, em especial à classe mais afetada, que é consequência da política do 'fica em casa, a economia a gente vê depois', é consequência de uma guerra lá fora (...). E tenho certeza que vamos poder melhor mostrar para essa parcela da sociedade que a mudança que alguns querem pode ser pior".

Em seguida, ele mencionou a vitória de partidos de esquerda na Argentina, no Chile e na Colômbia como exemplos, na sua visão, negativos de mudanças. "Me preocupa o Brasil perder sua liberdade, caminhar com a esquerda nos caminhos da Venezuela, da Argentina, da Colômbia, do Chile e da Nicarágua", disse.

Críticas aos institutos de pesquisa

A diferença significativa entre a projeção dos institutos de pesquisa e o resultado das urnas foi mencionada por Bolsonaro, reforçando suas declarações durante a campanha com o objetivo de desacreditar as sondagens eleitorais.

As últimas pesquisas do Datafolha e do Ipec, divulgadas no sábado, apontavam 14 pontos percentuais de diferença entre Bolsonaro e Lula, enquanto que a apuração dos votos registrou diferença de cinco pontos percentuais.

"Vencemos a mentira no dia de hoje. Estava o Datafolha dando 51% a trinta e poucos. Vencemos a mentira", disse o presidente. "Se desmoralizou de vez os institutos de pesquisa."

À espera de "parecer" sobre urnas

Questionado se, diante do resultado deste domingo, ele confiava nas urnas eletrônicas – alvos constantes de ataques mentirosos pelo presidente nos últimos anos –, Bolsonaro disse que iria aguardar um parecer das Forças Armadas, que enviaram representantes para acompanhar a apuração no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Ele voltou a fazer alegações de que teria havido fraudes no pleito de 2018, nunca comprovadas, e disse que neste ano "algumas poucas reclamações [sobre as urnas] chegaram, não ao nível de 2018".

Bolsonaro também criticou a decisão do TSE que o impede de fazer suas lives no período eleitoral a partir do Palácio da Alvorada, dizendo tratar-se de uma "perseguição" contra si. "Eles tomaram partido político, eles têm candidato a presidente – ou pelo menos têm um que eles não querem de jeito nenhum lá, que sou eu."

Aliados eleitos

Bolsonaro disse que candidatos aliados que venceram as eleições neste domingo estarão livres para o auxiliar no segundo turno da campanha, como o governador reeleito do Rio, Claudio Castro (PL), e celebrou o resultado eleitoral do PL no Congresso, que elegeu 99 deputados federais – a maior bancada da nova legislatura da Câmara – além de 13 senadores – a melhor performance de um partido neste pleito para a Casa, que renova um terço de sua composição.

"Isso é bastante. Um partido que sai na frente para disputar cargos na Mesa [Diretora da Câmara]. (...) Crescemos bastante, são pessoas extremamente alinhadas comigo", disse.

Ele afirmou que essa bancada o ajudaria a aprovar reformas em um eventual segundo mandato, como a tributária. Questionado se tentaria, uma vez reeleito, ampliar o número de cadeiras no Supremo, para indicar a maioria dos ministros da Corte, o presidente não disse que sim nem que não, mas que avaliaria o tema se derrotasse Lula no segundo turno.

Deutsche Welle

Segundo turno entre Lula e Bolsonaro será uma disputa dramática




Por Luiz Carlos Azedo (foto)

O efeito do voto útil em Lula, que mirou principalmente o candidato do PDT, Ciro Gomes, havia se esgotado sem alcançar seu objetivo. As pesquisas não captaram a reação contrária

Estava escrito nas estrelas que a disputa entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) iria para o segundo turno; ontem mesmo, o petista ressaltou que nunca ganhou uma eleiçao no primeiro turno e que teria quer convencer a maioria dos eleitores de que será a melhor opção no segundo. Com 96,93% das urnas apuradas, Bolsonaro  recebeu 43,70% dos votos válidos, enquanto o Lula teve 47,85% dos sufrágios. Os candidatos Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) obtiveram, respectivamente, 4,22% e 3,06% dos votos válidos.

No sábado, as pesquisas do DataFolha e do Ipec já sinalizam nessa direção. O efeito da forte campanha a favor do voto útil em Lula, que mirou principalmente o candidato do PDT, Ciro Gomes, havia se esgotado sem que o objetivo almejado fosse assegurado. O que as pesquisas não captaram foi o efeito contrário, uma espécie de voto útil por gravidade, a favor de Jair Bolsonaro, até previsível. Era a famosa Terceira Lei de Newton, o princípio da ação e reação, segundo o qual para toda força de ação existe uma força de reação que possui o mesmo módulo e direção, porém em sentido contrário.

Esse princípio da mecânica serve para explicar o fenômeno político que ocorreu na reta final das eleição, com a mobilização de uma parcela silenciosa do eleitorado, motivada por forte sentimento antipetista, que acabou atingindo não somente os indecisos, mas também parcela dos eleitores que votariam na candidata do MDB, Simone Tebet.

A propósito, ao contrário do que aconteceu com Ciro, cuja liderança foi muitos esvaziada, inclusive no Ceará e no Nordeste, sua principal base eleitoral, Simone emerge da eleição como uma nova liderança nacional, que transborda o Mato Grosso Sul e o Centro-Oeste, ao obter o melhor desempenho eleitoral de seu partido nas eleições para a Presidência de sua história. Simone poderá ter um papel decisivo no resultado do segundo turno, ao se posicionar claramente sobre a disputa em curso, que será dramática. O resultado frustra a militância petista e deixa pilhada a base de Bolsonaro.

Correio Braziliense

O segundo turno é inimigo das platitudes




Em uma sociedade dividida em dois polos, como o Brasil de hoje, cresce o perigo de episódios violentos marcarem a reta final da campanha

Por Fernando Exman (foto)

Inimigo das platitudes, o segundo turno faz bem à democracia. Pelo menos em tese: é quando os candidatos são levados a debater com mais profundidade seus programas e a fazer acenos a segmentos menos radicais do eleitorado.

O segundo turno traz riscos consigo, é verdade. Numa sociedade dividida em dois polos, como o Brasil de hoje, com ele cresce o perigo de episódios violentos marcarem a reta final da campanha. Por isso, é preciso que o Judiciário mantenha-se firme e vigilante. Ladeado por outras instituições, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) demonstrou capacidade para reduzir a margem de atuação dos grupos mais violentos.

Ainda assim, há um aspecto positivo do ponto de vista do eleitor que deixou a sala de votação insatisfeito com a baixa qualidade do debate. Até agora, a campanha foi marcada por ataques mútuos e pouca discussão programática por parte do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Lula, por exemplo, deve explicar o que quer realmente dizer quando defende a revogação do teto de gastos e a revisão do atual regime fiscal brasileiro. Não basta anunciar que pretende “recolocar os pobres e os trabalhadores no Orçamento”, conforme fez no documento que protocolou no TSE, mas deveria detalhar como isso deve ser executado na prática. Também precisa ir além da promessa de construção de um novo arcabouço fiscal que “disponha de credibilidade, previsibilidade e sustentabilidade”, ainda que “possua flexibilidade e garanta a atuação anticíclica”.

Em relação à reforma tributária, o programa da chapa encabeçada pelo PT advoga que ela resulte num sistema solidário, justo e sustentável - “que simplifique tributos e em que os pobres paguem menos e os ricos paguem mais”, e com redução da tributação do consumo. É pouco.

De acordo com o programa de Lula, tarefa prioritária seria coordenar a política econômica para combater a inflação. Sua experiência pretérita à frente do Palácio do Planalto não lhe dá um cheque em branco neste e em outros assuntos. Também não está claro o que Lula e seus aliados pretendem fazer em relação à legislação trabalhista, o que preocupa empresários e investidores.

A situação também não é melhor quando se olha o programa de Bolsonaro. O documento protocolado na Justiça Eleitoral pelo candidato à reeleição promete que o presidente se concentrará, em caso de vitória no dia 30, em políticas de redução da taxa de informalidade. Até agora, porém, não conseguiu implementá-las para valer diante de resistências do Congresso.

Além disso, um dos compromissos prioritários de Bolsonaro e seus aliados é a manutenção do valor de R$ 600 para o Auxílio Brasil a partir de janeiro de 2023, algo que não está ainda no Orçamento do ano que vem e depende de mudanças na legislação.

Em outra frente, enquanto integrantes da própria equipe econômica ajudaram a flexibilizar o teto de gastos e criticam a estrutura que foi concebida para o instrumento em 2016, o programa de Bolsonaro promete continuar com os esforços de garantir a estabilidade econômica e a sustentabilidade da trajetória da dívida pública através da consolidação do ajuste fiscal no médio e longo prazos.

Pouco se avança também em relação à reforma tributária, até porque o Congresso tentou aprovar uma proposta nos últimos anos e ela não vingou em razão da resistência de segmentos do Executivo. Segundo o governo, tem-se como meta “simplificar a arrecadação, aumentar a progressividade e torná-lo concorrencialmente neutro”. Mais do mesmo.

Agora o eleitor pode exigir que o debate seja aprofundado, deixando-se de lado as platitudes que até agora prevaleceram no debate econômico. Caso contrário, corre-se o risco de ver os dois candidatos transformarem o segundo turno em uma nova arena para ataques mútuos. Neste caso, a campanha irá se limitar a um concurso de quem foi, é ou será mais corrupto.

Valor Econômico

Há chance concreta de Bolsonaro se reeleger




A possibilidade, tratada com desdém desde a desastrosa gestão na pandemia, tornou-se real

Por Thomas Traumann* (foto)

Os perto de 6 milhões de votos de vantagem do ex-presidente Lula sobre o presidente Jair Bolsonaro na votação deste domingo apontam para um segundo turno renhido. Nunca houve viradas nas seis disputas presidenciais que foram para o segundo turno, mas a distância menor que as projeções das empresas de pesquisa impede uma afirmação categórica.

Das 108 ocasiões desde 1998 em que as disputas para governador foram para tira-teimas, o candidato que chegou na frente foi o vencedor em 77. Das 31 viradas, 17 ocorreram quando os dois candidatos terminaram a menos de cinco pontos percentuais dos votos um do outro. Somente em cinco casos ocorreram viradas com uma diferença acima de dez pontos percentuais.

O timing é de Bolsonaro, que venceu em 13 estados, incluindo São Paulo, Rio de Janeiro e toda a região Sul e Centro-Oeste, contrariando não apenas as empresas de pesquisa, mas até seus próprios líderes no Congresso que quase o abandonaram no meio da disputa. A possibilidade de reeleição de Bolsonaro, tratada com desdém desde a desastrosa gestão na pandemia de Covid-19, tornou-se real.

Bolsonaro chegou aos 50 milhões de votos sem firmar um compromisso de campanha para além de um genérico “mais do mesmo” sobre o quem vem fazendo no governo. Considerado há meses um caso perdido pelos agentes econômicos, ele não recebeu nenhuma cobrança sobre seus planos, se é que eles existiam. Assim como em 2018, a campanha de Bolsonaro foi um misto de antipetismo e voluntarismo messiânico. Deu mais certo do que os próprios bolsonaristas esperavam.

Dada a polarização entre os dois lados, é natural esperar que as próximas semanas sejam tensas. Depois do debate na TV Globo na semana passada, é impossível imaginar que um encontro público entre Bolsonaro e Lula seja civilizado.

O segundo turno serve para impor realismo à campanha do PT. Estrategicamente, o campo lulista hesitou em apresentar detalhes de seu programa econômico, uma forma de ter espaço para futuras negociações. Para todas as perguntas delicadas, Lula tinha como resposta pronta a frase de que seus governos anteriores eram garantia suficiente sobre suas intenções.

Lula supôs que, ao trazer o ex-adversário Geraldo Alckmin como candidato a vice, daria um sinal suficiente para atrair o voto moderado, especialmente no Estado de São Paulo, onde o PT só venceu as eleições de 2002. Não foi o suficiente.

O PT também sofrerá com um Congresso eleito nitidamente bolsonarista, que trabalhará contra a eleição de Lula sem ter a pressão de buscar votos para si mesmo. Mesmo que vença em 30 de outubro, Lula terá uma Câmara dos Deputados muito menos ansiosa por negociar com ele do que quando foi eleito em 2002 e 2006.

A dinâmica do segundo turno, portanto, será de um Bolsonaro ainda mais agressivo e de um Lula pressionado a buscar votos no centro e na centro-direita para vencer. É um cenário com que o PT não trabalhava. Detalhes do programa econômico que o comando lulista imaginava poder adiar para novembro ou dezembro terão de ser debatidos e revelados em poucas semanas.

Não haverá lua de mel. Lula inicia a campanha do segundo turno sob a pressão de precisar ceder mais do que gostaria e antes do que imaginava.

*Thomas Traumann é jornalista e pesquisador da FGV/DAPP

O Globo

Domingo do espanto




Ciro e Tebet praticamente desapareceram da cena, abandonados por eleitores que, na última hora, sufragaram Bolsonaro

Por Demétrio Magnoli 

As urnas falaram, mas em língua incompreensível para a maioria dos analistas. As sondagens eleitorais dos institutos sérios indicavam a hipótese — na margem de erro — de triunfo de Lula no primeiro turno. No lugar disso, os eleitores produziram um segundo turno competitivo entre Lula e Bolsonaro. O que deu errado?

O mapa do voto traz a resposta fundamental. O presidente extremista saiu-se muito melhor do que indicavam as pesquisas no Sudeste e no Sul. Ao longo de diversas eleições, o PT produziu “ondas vermelhas” de última hora. Desta vez, foi o bolsonarismo que deflagrou o movimento inesperado, uma onda espraiada por todo o Centro-Sul em eleições para governadores e o Congresso.

Ao que parece, as filas diante das seções eleitorais não se deveram, apenas, ao procedimento de certificação digital. Nelas, havia eleitores que, em tese, não iriam votar. Mais: o feitiço do “voto útil” voltou-se contra o feiticeiro. Ciro Gomes e Simone Tebet praticamente desapareceram da cena, abandonados por eleitores que, na última hora, sufragaram Bolsonaro.

Qual foi a mágica?

Um mergulho no oceano de dados do Datafolha oferece uma explicação. A rejeição geral a Bolsonaro, pouco superior a 50%, é puxada para cima pelo eleitorado mais pobre, de renda inferior a dois salários mínimos (s/m). A rejeição geral a Lula, que gira ao redor de 40%, é puxada para baixo pelo mesmo estrato dos eleitores. Contudo, em todos os demais estratos, inclusive na classe média-baixa (2 a 5 s/m), a rejeição de Lula não só é superior à de Bolsonaro, como situa-se em torno do perigoso patamar de 50%. O Brasil não tão pobre saiu para votar — contra Lula.

Durante quatro anos, Bolsonaro concentrou sua artilharia contra o voto livre, secreto e limpo garantido pela democracia brasileira. Seus adversários entrincheiraram-se na defesa de nosso sistema eleitoral. Nessa longa jornada, repetiram sem cessar a primazia da vontade popular. Hoje, depois do espanto, não vale voltar atrás. É preciso respeitar o voto — todos os votos, inclusive aqueles destinados ao presidente antidemocrático.

Não adianta gritar “fascistas!”. A prática disseminada nas redes sociais tem o efeito contraproducente de fechar as portas ao diálogo e à persuasão. Respeitar significa entender as motivações de uma massa imensa de brasileiros que não se confundem com o núcleo minoritário de saudosistas da ditadura militar. O voto anti-Bolsonaro, como se sabe, decorre da memória dos quatro anos de seu desastroso governo. O voto anti-Lula, anti-PT, também deriva de uma memória, não apenas de camadas de preconceitos.

O PT nasceu em São Paulo e alcançou seus primeiros grandes triunfos no Centro-Sul. Ao longo de quase duas décadas, tornou-se o partido preferido por largas camadas das classes médias urbanas. O cristal só se partiu bem mais tarde, sob os governos de Lula, fragmentando-se inteiramente no inverno dilmista.

Hoje se sabe que Sergio Moro e seus procuradores-militantes converteram o sistema de Justiça em ferramenta de um projeto político. Mas a revelação não apaga o mensalão e o petrolão, cuja existência é inegável. A memória dos escândalos de corrupção entrelaça-se à da depressão provocada pelas políticas econômicas populistas inauguradas por Lula e radicalizadas pela sucessora. A rejeição tem raízes políticas, não é um fruto envenenado distribuído por atores demoníacos.

Lula sabe de tudo isso, ainda que seus fiéis não saibam. Sua tentativa de circundar o obstáculo foi montar a aliança com Geraldo Alckmin e chamar à formação de uma frente ampla democrática. A iniciativa, um gesto político genial, permaneceu incompleta. Faltou dar-lhe substância por meio de uma revisão crítica dos erros colossais do passado. O candidato até ensaiou fazê-lo na sua entrevista ao Jornal Nacional, mas logo recuou para sua redoma habitual. O Lula da frente ampla acabou muito parecido com o presidente triunfalista do passado.

Agora, resta menos de um mês. O tempo curto é suficiente para dizer que Lula 3 não será a reprodução de um filme antigo. Sem girar o timão, Lula corre o risco de sofrer a mais dura das derrotas. E de deixar o Brasil à mercê de um bárbaro.

O Globo

Eleições 2022: 'Economist' fala em 'vitória com gosto de derrota'; imprensa internacional repercute eleição




O New York Times abriu uma 'live' sobre a eleição brasileira

A eleição presidencial brasileira ocupou posições de destaque em portais da imprensa internacional — com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em geral, sendo apresentado como vitorioso, mas sem força suficiente para garantir uma vitória no primeiro turno sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL).

A seguir, confira como alguns dos principais veículos de imprensa do mundo noticiaram a eleição presidencial brasileira, cujo segundo turno será disputado em 30 de outubro.

'Vitória com gosto de derrota'

A revista britânica The Economist, que deu destaque em seu site para o resultado do primeiro turno da eleição presidencial brasileira, abre sua reportagem principal afirmando que para o ex-presidente Lula, foi uma "vitória com gosto de derrota".

O texto destaca que Bolsonaro se saiu melhor do que o esperado, e que o momentum agora está com ele, e não com Lula — lembrando que muitos aliados do presidente foram eleitos para o Congresso.

Diante deste cenário, a reportagem afirma que se Lula vencer, pode ter dificuldades para governar.

"Isso terá implicações a longo prazo. Mesmo que Bolsonaro perca a presidência, o bolsonarismo parece uma força que chegou no Brasil para ficar."

E diz ainda que o "segundo turno será um teste para as instituições brasileiras".

"Especialmente se Lula acabar vencendo por uma margem estreita, e Bolsonaro se recusar a aceitar o resultado."

'Grande golpe para brasileiros progressistas'

O jornal The Guardian, também do Reino Unido, destacou que Lula foi vitorioso no primeiro turno, mas com desempenho insuficiente. O título de uma das matérias principais do site, que transmitiu os resultados da eleição brasileira em tempo real, dizia: "Ex-presidente Lula ganha em votos, mas não com vitória definitiva".

"O resultado da eleição foi um grande golpe para os brasileiros progressistas que estavam torcendo por uma vitória enfática sobre Bolsonaro, um ex-capitão do Exército que atacou repetidamente as instituições democráticas do país e vandalizou a reputação internacional do Brasil", diz um trecho da reportagem.

Pesquisas julgaram mal força dos conservadores

O jornal americano The New York Times, que criou uma página de transmissão ao vivo de informações sobre a eleição brasileira em seu site no domingo, destacou na página principal que Bolsonaro e Lula vão para o segundo turno.

A reportagem do site do jornal começa afirmando que Bolsonaro teve um desempenho melhor do que o previsto por analistas e pesquisas de intenção de voto — que, nas últimas semanas, "sugeriram que ele poderia até perder no primeiro turno".

"Durante meses, pesquisadores e analistas disseram que o presidente Jair Bolsonaro estava fadado ao fracasso."

"Em vez disso, Bolsonaro estava comemorando. Embora seu adversário, Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente de esquerda, tenha terminado a noite na frente, Bolsonaro superou em muito as previsões e levou a disputa ao segundo turno", acrescenta o texto.

A reportagem cita ainda as eleições estaduais e legislativas, dizendo que "as pesquisas pareceram julgar mal a força dos candidatos conservadores em todo o país."

Ainda assim, o jornal afirma que, nas próximas quatro semanas, Bolsonaro terá que abrir vantagem sobre Lula, que saiu na frente no primeiro turno.

"O presidente de direita está tentando evitar se tornar o primeiro presidente no cargo a perder sua candidatura à reeleição desde o início da democracia moderna no Brasil em 1988."

A publicação destaca ainda que a eleição de 30 de outubro é considerada "a votação mais importante em décadas para o país" — "vista como um grande teste para uma das maiores democracias do mundo".

Para muitos brasileiros, o impensável aconteceu

O Washington Post também destacou no topo de sua página principal que o Brasil teria um segundo turno, afirmando que "o próximo turno colocará Bolsonaro, um incendiário contrário a regulações (pelo Estado) que é chamado de versão brasileira de Donald Trump, contra seu inimigo político, da Silva, líder do Partido dos Trabalhadores".

"A eleição chamou atenção global como o mais novo palco para a luta mundial entre a democracia e o autoritarismo", diz uma parte do texto.

O jornal também mencionou a disparidade entre as pequisas de intenção de voto, que "mostraram consistentemente que Bolsonaro perderia — e perderia feio", e o resultado nas urnas.

"Para muitos brasileiros, o impensável já aconteceu", afirma o texto.

E avalia que o Brasil entra agora em um período "potencialmente desestabilizador" até o segundo turno.

"O país mergulhará agora no que pode ser seu momento politicamente mais incerto desde que deixou o jugo da ditadura. O medo que muitas pessoas já sentiam ao entrar nesta eleição — medo da violência, medo do futuro do país — só aumentará nas próximas semanas."

Feridas continuam abertas

O jornal Público, de Portugal, destacou na manchete "Brasil vai ao 2º turno. Lula vence por 6 milhões de votos" — e trouxe ainda no topo do seu site várias matérias e artigos, além de um editorial com título "Brasil: as feridas continuam abertas".

O Diário de Notícias também publicou no site várias notícias sobre a eleição brasileira, incluindo a manchete "Lula e Bolsonaro vão ao segundo turno".

Já o francês Le Monde destacou o resultado no Brasil como manchete do site: "Eleição presidencial no Brasil: Lula à frente de Bolsonaro, com segundo turno a ocorrer em 30 de setembro".

O subtítulo acrescentava: "Com 48% dos votos, o representante do Partido dos Trabalhadores, antigo chefe de Estado de 2003 a 2010, tem quatro pontos e meio de vantagem em relação ao presidente de extrema direita".

'Resultado do primeiro turno no Brasil foi manchete no site do Le Monde'

Na América Latina

No México, maior país da América Latina depois do Brasil, um dos principais jornais do país, o El Universal, também colocou como manchete o resultado da eleição brasileira: "Lula e Bolsonaro definirão a presidência do Brasil em segundo turno".

O colombiano El Tiempo manchetou que "Lula da Silva e Jair Bolsonaro irão ao segundo turno".

Eleição surpreendente e apertada

'Jornais argentinos destacaram resultado da eleição brasileira como surpreendente'

Na Argentina, o jornal Clarín destacou na manchete o resultado da eleição brasileira como inesperado: "Eleição surpreendente e apertada: Lula ganhou mas irá a disputa com Bolsonaro". O jornal trouxe ainda no topo do site uma seção com informações em tempo real sobre a eleição brasileira.

Final com suspense

O La Nación também trouxe na manchete a surpresa do resultado:

"Final com suspense no Brasil. Lula ganhou, mas a surpresa foi Bolsonaro e haverá mais uma rodada de votação."

BBC Brasil

Campanha quer Bolsonaro mais combativo em segundo turno de guerra de rejeição




O comitê de campanha à reeleição de Jair Bolsonaro (PL) se prepara para um segundo turno que pode virar uma guerra de rejeições, na avaliação de aliados do presidente. A estratégia de propaganda eleitoral tende a recrudescer, se tornando "mais combativa", na palavra de um dos estrategistas de Bolsonaro. Do ponto de vista de alianças, estão na mira imediata governadores como Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, considerado um aliado-chave pelo Palácio do Planalto, e Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás.

Integrantes do governo e do comitê bolsonarista entendem que, para mudar o cenário de favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), será preciso ampliar o sentimento de antipetismo e apostar na desconstrução do adversário. Pesquisas de intenção de voto durante toda a campanha até agora mostraram que o antibolsonarismo prevaleceu. O resultado do primeiro turno foi de Lula com 48,4% dos votos, e Bolsonaro com 43,2%.

Na primeira entrevista após a votação, no Palácio da Alvorada, Bolsonaro indicou que irá rever a estratégia e promover ajustes. Em tom sereno, ele reconheceu o sentimento de desaprovação a seu governo e falhas no marketing. Já havia no seu comitê alas que pregavam a linhas distintas, uma mais propositiva e outra favorável ao enfrentamento maior com Lula. "Entendo que há uma vontade de mudar por parte da população, mas tem certas mudanças que podem vir para pior. A gente tentou mostrar durante a campanha esse outro lado, mas parece que não atingiu a camada mais importante da sociedade", disse o presidente. "Existe o sentimento por parte da população que sua vida não ficou igual ao que estava antes da pandemia, ficou um pouquinho pior e a tendência é buscar um responsável, que sempre é o chefe do Executivo."

O presidente, então, afirmou que vai mostrar "o que foi a pandemia" e seus efeitos sobre a economia. Ele repetiu argumentos já explorados como sua conhecida oposição às políticas de isolamento social, os efeitos da guerra na Ucrânia e o que chamou de "crise ideológica" - vitórias de candidatos de esquerda na Argentina, Chile, Colômbia e Venezuela. "Entendo que é por aí nosso trabalho por ocasião do segundo turno", disse Bolsonaro, que confirmou a intenção de comparecer mais a debates e sabatinas.

Um oficial-general da reserva com assento no governo lembra que a gestão do presidente tem dados positivos para mostrar, sobretudo indicadores econômicos mais recentes e redução de alguns crimes, "mas a chance de melhorar é fazer aumentar a rejeição do Lula". Para ele, a campanha tem sido feita com argumentos para "destruição do oponente" e não para a valorização do que cada um pode fazer.

Os integrantes da campanha, sobretudo ligados ao vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente que orientou a estratégia no debate da TV Globo e coordena as ações nas redes sociais, defendem a linha de ampliar a combatividade. A presença de Carlos e a postura de Bolsonaro no debate são vistas como indicativos de que a estratégia poderá ganhar força.

A propaganda do presidente já retomou o discurso "contra o sistema". Além das redes sociais, Lula já foi alvo de propagandas no rádio e na TV que o associavam a crimes comuns, como roubo e tráfico de drogas, além dos escândalos de corrupção como mensalão e petrolão.

Críticas contra institutos de pesquisa

O presidente e seus ministros voltaram suas baterias contra institutos de pesquisa. Querem usá-los como forma de animar seus seguidores, que chegaram à reta final com sinais de abatimento. Como os números de Bolsonaro ficaram acima dos registrados na véspera, em sua maioria, vão aproveitar a onda para ampliar a contestação de institutos de pesquisa.

Segundo o presidente, diante da divergência alguns institutos não deveriam voltar a fazer pesquisas. "Acho que se desmoralizou de vez os institutos de pesquisa. Não vão continuar a fazer pesquisa, não é possível", afirmou na porta do Palácio da Alvorada. Os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil) e Fabio Faria (Comunicações) cobraram explicações e defenderam investigação do que consideraram uma "vergonha" e um "escândalo".

Por outro lado, ministros como Paulo Guedes (Economia) e Marcelo Queiroga (Saúde) foram escalados para responder a temas sensíveis, como os cortes orçamentários para 2023 na Saúde, para manter os R$ 19,4 bilhões reservados ao orçamento secreto. Houve propagandas específicas com feitos do governo para atingir grupos como enfermeiros, agricultores, gamers, professores, mulheres, mães de crianças com doenças raras, estudantes do Fies e até idosos, com a prova de vida que dá acesso a benefícios do INSS, por meio do registro do voto. Boa parte dessas inserções nem sequer trazia a imagem de Bolsonaro.

Às vésperas do primeiro turno, o governo anunciou a nomeação de 560 policiais federais concursados, uma exceção justificada pelo Palácio do Planalto como forma de não comprometer o funcionamento do serviço público. Além disso, o governo pode explorar que vai incorporar ao Farmácia Popular, programa que vai perder 60% das verbas no ano que vem, como revelou o Estadão, cinco novos remédios para hipertensão e diabetes. É a primeira vez que novos medicamentos são incluídos desde 2011. O corte orçamentário, por sua vez, limita o acesso a 13 tipos de medicamentos.

Esse mesmo militar que participa do governo entende que Bolsonaro deveria ter modulado o discurso antes e que deu brechas para os adversários explorarem: "Se ele tivesse mudado meia dúzia de coisas no discurso ao longo do mandato levava no primeiro turno, com o pé nas costas. Ele foi o maior inimigo dele mesmo". Para ele, a campanha deve explorar que Lula seria um "cheque em branco", enquanto Bolsonaro não daria uma guinada diferente do que foi o atual mandato.

Os aliados do presidente tentam agora reagir ao que consideram uma onda de influenciadores contra Bolsonaro, como celebridades, parte da mídia, youtubers e artistas formadores de opinião. Diante de um sentimento de abatimento externado por apoiadores, Bolsonaro recorreu de última hora e conseguiu obter gravações de vídeo com apoio de cantores, principalmente os sertanejos, artistas e atletas, como jogadores de futebol da seleção brasileira, do atletismo e do automobilismo, além de personagens da direita internacional, como o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, o ex-premiê israelense Benjamin Netanyahu e o ex-presidente da Assembleia da Venezuela Juan Guaidó, considerado pelo governo como chefe do governo venezuelano.

Alianças e doadores

Em termos de recursos, a campanha aposta em um reforço de caixa por meio de doadores já aliados, principalmente com a base do agronegócio. Na avaliação de um ministro do Centrão, a passagem ao segundo turno é a senha para que as contribuições se destravem. Segundo esse titular do primeiro escalão do Planalto, com "Lula sempre na frente todo mundo fugiu".

Nesta segunda-feira, 3, o comitê do presidente deve se reunir em Brasília para traçar estratégias. Uma delas é a busca por partidos e candidatos eleitos ou que disputam o segundo turno nos Estados e que potencialmente se engajariam na campanha do presidente. Na reta final, familiares do presidente cobraram mais empenho de candidatos aliados, acusados de serem "alpinistas" e "caroneiros", que estariam omitindo o presidente da propaganda. Bolsonaro disse compreender o foco deles nas próprias disputas, mas agora vai atrás de manifestações explícitas.

Bolsonaro planeja se reunir com deputados e senadores eleitos em busca para reverter o quadro mais favorável a Lula. Ele disse que já recebeu um telefonema com promessa de esforços do governador reeleito no Rio, Cláudio Castro (PL).

Os governadores reeleitos Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, considerado um aliado pelo Palácio do Planalto, e Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, estão no topo da lista do comitê de Bolsonaro. No primeiro turno, ambos se afastaram do governo por causa da alta rejeição do presidente e fizeram campanha pela direita de forma independente. Bolsonaro lançou candidatos próprios contra eles, mas a estratégia não vingou.

Entre os dois, Zema já é dado como "apoio certo" por ministros palacianos. Bolsonaro disse já ter dialogado com um interlocutor do governador de Minas e que a conversa com ele está "bastante avançada". Há possibilidade de um encontro na terça-feira, em Belo Horizonte.

Minas é uma peça-chave para a decisão no segundo turno, por ter dado a vitória a Lula e ser o segundo maior colégio eleitoral do País. A ajuda de Zema poderia melhorar o desempenho de Bolsonaro, principalmente no interior, avaliam os estrategistas. Apesar de não ter dado garantias, Zema tem sido aliado do governo e admitiu conversar com Bolsonaro. Logo depois de reeleito, o governador disse que garante que não dará apoio ao PT: "Está fora de cogitação".

O comitê também comemorou os sinais de afinidade do Partido Novo, do candidato Luiz Felipe D’Ávila, que fez dobradinha com Bolsonaro no debate da Globo. Outra adesão oficial esperada é a do PTB, do candidato Padre Kelmon. O União Brasil, que planeja fusão com o Progressistas, também está na mira de Bolsonaro. O presidente se disse de portas abertas para conversar com outros presidenciáveis derrotados, mas não quis falar, por exemplo, do MDB. Simone Tebet, com 4,1% dos votos, deve declarar apoio a Lula.

"No segundo turno zera o jogo, temos chance de coligar com qualquer partido", diz o deputado Capitão Augusto (PL-SP), vice-presidente da legenda de Bolsonaro.

Estadão / Dinheiro Rural

Lula e Bolsonaro têm arsenal limitado para atrair votos no 2º turno




A batalha do segundo turno, que definirá o vencedor da guerra eleitoral de 2022, começou na noite do domingo (2), pouco depois de as urnas enviarem seus dados para Brasília.

Do ponto de vista de moral da tropa, Jair Bolsonaro (PL) saiu como grande vencedor do domingo, escamoteando de forma conveniente a seus aliados o fato de que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quase liquidou o jogo.

Politicamente, contudo, é inegável que a figura relaxada do presidente ao conceder uma entrevista noturna para comentar o resultado resumia o dia, em contraste à cansada figura do ex-presidente, claramente abatido pela vitória que lhe escapou das mãos.

Mas o caminho de Bolsonaro é mais duro do que o de Lula. Se o padrão de migração de votos de Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) seguir o que foi aferido antes do primeiro turno pelo Datafolha, o volume pró-Lula pode estar garantido. Apenas pode, como a arrancada final do presidente no domingo demonstra.

Se não chegou a ser um tsunami como em 2018, o avanço de seus aliados no Sudeste é motivo para celebração no bolsonarismo. O Rio reelegeu um soldado da causa, e Minas, um aliado algo distante, mas aliado. E São Paulo viu Tarcísio de Freitas (Republicanos) virar favorito na disputa contra Fernando Haddad (PT).

Os estrategistas do presidente agora olham para onde pescar os votos para tirar 6 milhões de eleitores que Lula teve à sua frente. O próprio Bolsonaro mostrou a tática dual na sua entrevista noturna, que teve direito a ironia e agressividade com a imprensa, como é usual.

O presidente começou a fala para o grupo que até aqui se mostrou inexpugnável a suas investidas: os mais pobres. De forma calma e pausada, ensaiou um mea culpa, dizendo entender que muitos que votaram nele em 2018 o abandonaram por causa das dificuldades econômicas do país.

Parecia um derrotado falando, até engatar o usual discurso de que foi pressionado por fatores externos, da pandemia da Covid-19 à Guerra da Ucrânia, e que as coisas estão melhorando. Mas o aceno a esse eleitor perdido foi notável, embora menos claro seja o que ele tem a oferecer.

Pois Bolsonaro abriu toda sua reserva de bondades nos últimos meses, de Auxílio Brasil turbinado a dinheiro na mão de grupos de pressão, como caminhoneiros. Não é aferível de forma precisa o quanto isso o empurrou no domingo, mas quando se vê os mapas de votação, fica claro que quem o levou a se aproximar de Lula foi um eleitorado de classe média urbano.

Aí entra a segunda parte da fala do presidente, na qual ele foi ele em estado puro, dizendo encarnar os valores familiares, a religiosidade, o conceito fluido de liberdade, o armamentismo, o combate à corrupção. E, claro, que Lula é o negativo de tudo isso. Com isso, ele busca manter no seu armário as camisas da seleção que foram às ruas na época do impeachment de Dilma Rousseff (PT).

Os petistas, por sua vez, precisam apelar a elas, dado que discurso para os mais pobres (metade do eleitora ganha até dois mínimos) já foi comprado. Aí a questão que fica é se a dica do discurso de Lula, em que fez defesa de ampla aliança e novas aberturas, vai colar.

É discutível. Quando colocou na sua vice Geraldo Alckmin, um tucano de quatro costados que se viu expulso do próprio partido, Lula deu uma real sinalização simbólica de que não pretendia transformar seu eventual governo numa vingança pelos seus 580 dias de cadeia.

A fotografia com oito ex-presidenciáveis às vésperas do primeiro turno foi no mesmo sentido. Por todas as declarações públicas e privadas, o mercado e o empresariado já precificaram Lula como um ator previsível e confiável, ainda que torçam nariz para o esquerdismo de seu entorno.

Esse povo não tem voto, mas influencia quem tem e decide o rumo de políticas públicas: o Congresso bastante conservador será um campo de batalha duro caso Lula vença o pleito. Assim, talvez o preço da fatura da aquiescência do pessoal do dinheiro suba, e o cheque em branco dado a Lula passe a exigir recibo, talvez com anúncios mais objetivos sobre a economia.

O antipetismo, pelo que se viu no domingo, segue tendo força em setores da classe média. Assim como Bolsonaro com os mais pobres, os instrumentos à disposição de Lula parecem limitados em termos de retórica, o que fará sua pescaria de votos para cristalizar a vantagem sobre Bolsonaro talvez se concentrar nos detalhes, nos 40% de eleitores de Tebet e Ciro que diziam apoiar o petista no segundo turno.

Presente para ambos os rivais é o fantasma de Erich Ludendorff. Há 104 anos o comandante alemão na Primeira Guerra Mundial viu a entrada dos EUA no conflito como determinante para uma virada pró-Aliados. Tendo acabado de derrotar a Rússia, ele juntou todas as forças que estavam na frente oriental e fez o maior ataque nas linhas ocidentais da guerra.

Avançou muito, só para ver suas forças exauridas, levando ao colapso da defesa alemã nos meses seguintes e à derrota em novembro de 1918. Neste momento, a metáfora militar pode se aplicar tanto a força mostrada por Bolsonaro no domingo quanto à quase vitória de Lula. Logo saberemos para quem ela valerá.

FolhaPress / Daynews

Em destaque

Bolsonaro cita recurso contra decisão de Moraes e diz que Michelle irá à posse de Trump

Foto: Reprodução/X/Arquivo O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a sua esposa, Michelle Bolsonaro 16 de janeiro de 2025 | 15:03 Bolsonaro ci...

Mais visitadas