A opinião pública, a isso estimulada pelos meios de comunicação, volta a indignar-se contra o Senado. Expostos os seus membros aos olhos de todos, hoje mais do que antes, pela transmissão - pela TV própria e ao vivo - das sessões parlamentares, os congressistas mostram suas debilidades. Aos poderosos não convém mostrar as emoções na face, nem a indecisão do olhar.
Goebbels, especialista no assunto, cobria, nos grandes eventos, a figura de Hitler com um manto de luz, mas o colocava ao centro de um palco bem distanciado das massas. Ele usava o rádio, com sua voz estridente, com que afiava a retórica perversa. Do rádio também se serviram, com vantagem, democratas autênticos, como Franklin Delano Roosevelt.
Uma das coisas que talvez tenham contribuído para o descrédito da atividade política é exatamente essa sobrexposição da imagem, promovida - diga-se de passagem - pela vaidade dos próprios parlamentares. A câmera vai ao olho do orador e a leva a milhões de outros olhos. Há nítida desvantagem daquele que se deixa ver e entrega as pupilas ao exame da multidão. Nesse episódio do processo de cassação do senador Renan Calheiros - sem que a coluna expresse juízos de valor - era possível perceber que havia um jogo de cena, que se cumpria algum acordo secreto entre seus pares, pelo qual se salvava o mandato do senador, em troca do simulacro de um julgamento.
Outra coisa que tem contribuído, e muito, para esse desencanto com o Parlamento é a renúncia do legislador à sua responsabilidade de pensar, de estudar os problemas do Estado, de lhes encontrar, conforme seu conhecimento e consciência, as soluções possíveis. No passado, até a República de 1946, os parlamentares não dispunham de tantos assessores pessoais, como ocorre hoje. Tinham direito a um secretário ou uma secretária, dispunham de serviço comum de datilografia, que cuidava dos manuscritos e decodificava as notas taquigráficas. Não ocupavam gabinetes no Parlamento e se valiam de salas alugadas nas redondezas do Palácio Tiradentes, antes da transferência para Brasília. Assim, dedicavam-se mais a suas obrigações. Hoje, são reféns da comodidade. Confiam muito de seu mandato aos assessores técnicos do Congresso e a assessores pessoais, que estudam a Constituição e as leis, consultam o regimento, redigem projetos e justificativas. Isso os torna vulneráveis a uma série de aborrecimentos. É comum que se vejam vítimas de equívocos e deslizes de seus auxiliares.
Sabendo dessa dependência, os lobistas quase sempre procuram certos e escolhidos assessores parlamentares, a fim de se informarem do caráter e do temperamento dos congressistas, e de lhes adiantar os pleitos, antes do contato direto com o alvo de seus interesses. Em quase todos os grandes casos de corrupção há também o envolvimento de alguns, felizmente poucos, servidores do Congresso.
As pessoas se cansam da ociosidade do Parlamento e da conduta antinacional da maioria de seus membros. Muitos até admitem - como mostram as pesquisas - soluções ditatoriais. Esquecem-se de que as ditaduras são muito mais corruptíveis e corruptoras do que os parlamentos.
A deterioração da credibilidade do Congresso tem um efeito positivo. Os cidadãos começam a organizar-se, trocando informações, formando grupos de estudos e de ação, à margem dos partidos tradicionais. Poderão influir nas eleições gerais de 2010, de forma a dar outra dimensão ética ao Congresso. No fundo, o problema é esse: ético.
Fonte: JB Online