quinta-feira, dezembro 06, 2007

O Senado, abraçado e entrelaçado com Renan

Por: Helio Fernandes

ATÉ QUE A MORTE (política) OS SEPARE
Lamentável a sessão que deveria ser de reafirmação do Senado, com a condenação de Renan, mas comprovou o apodrecimento da classe política. Os 81 que dizem orgulhosamente "sou senador da República", inicialmente cometem um equívoco e uma redundância, pois o único Senado que existe é o da República. No início, na Constituição de 1891, Rui Barbosa copiou a resistente Constituição americana e criou os "senadinhos".
Mas como estamos sempre inovando embora não renovando, esses "senadinhos" acabaram, não tem mais sentido o "orgulho vazio" de se intitular de "senador da República". Cheia de suplentes sem votos e até um segundo suplente sem voto, sem vontade, sem representatividade, o Senado lembra a frase eterna de Osvaldo Aranha: "Um deserto de homens e de idéias".
Além de tudo isso, anteontem faltou dignidade, credibilidade, vontade, seriedade, emoção e comoção. Quando Renan renunciou depois de se fartar de dizer "sou homem de luta e de resistência", estava identificada, PUBLICAMENTE, a barganha que já se sabia que TRAMAVAM nos bastidores.
Foi uma típica sessão velório. Deveria ter sido realizada no Cemitério do Caju, o único que tem crematório ao lado. Pois na verdade, no belo, amplo e vetusto, que palavra, prédio do Senado, Renan parecia o fantasma da ópera e ficará assim nos próximos 3 anos.
Toda a defesa (defesa?) de Renan se baseava no fato de que "pretendiam tirá-lo da vida pública até 2022". Todos os 81 senadores (os 29 contra, os 48 a favor, os 3 que se abstiveram) foram muito mais longe do que pretendia o apelo, choro, lamúria e lamento de Renan.
Em vez de cassá-lo e retirá-lo da vida pública até o ano de 2022 (data várias vezes citada por Renan, lembrada e relembrada por ele), construíram uma opção. Renan fica mais 3 anos nos escaninhos do Senado, como se fosse uma correspondência que ninguém quer receber. No dia 1º de janeiro de 2011, desaparece sem deixar vestígios, perdão, rastros.
Pois Renan não se elegerá para coisa alguma, a não ser que pretenda ser vereador por Murici, cidade da qual o filho é prefeito. Isso se ele continuar em outubro, se for reeeleito, se o povo de Alagoas abdicar do passado, do presente e do futuro.
Renan está convencido da absolvição. Isso pode ser avaliado em 3 fatos.
1 - Renunciou melancolicamente, desdizendo ou contradizendo tudo que se continha na frase que ele criou, recriou e difundiu: "Sou um homem de luta e não de renúncia".
2 - Era para renunciar depois da CPMF, estava tão apressado que renunciou antes.
3 - Nenhuma dúvida sobre os votos que teria, daí o discurso chato, monótono, cansativo, regimentalmente de 30 minutos, e que durou 64. (Uma hora e 4 minutos).
Ninguém prestou atenção. O orador falava sozinho ou então se dirigia a Tião Viana pedindo prorrogação. (Não da CPMF, e sim para ter mais tempo para se endireitar no caixão, que já desprendia cheiro característico).
Mais chato do que Renan só o relator. E a "ausência" dos 81 senadores presentes era a ratificação do "acordo" do qual todos participaram: com a ação ou a omissão. No discurso de Renan, nenhuma daquelas emocionantes colocações a que assistia no tribunal do júri, quando moço. Na fala da oposição, nem revolta, protesto, a disposição de se dirigir à comunidade.
Falam muito, hoje, em acabar com o Senado. Exagero, deve continuar, repetindo o que aconteceu com Rui Barbosa, o personagem mais importante em toda a história dessa casa.
PS - Em 1923 morria Rui, deixando vaga uma cadeira na Academia. Sugeriram deixar vaga para sempre a sua cadeira. Outros lembraram do baiano Laudelino Freire, que acabara de publicar um dicionário. Agripino Grieco, o mais famoso crítico da época, veio com a "conciliação": elegemos Laudelino e é o mesmo que deixar a cadeira vazia.
PS 2 - Podemos repetir o fato: deixamos o Senado aberto, será o mesmo que deixá-lo vazio. Como tem sido pelo menos nos últimos 250 dias.
Jefferson Peres
Seu relatório foi fraquíssimo. Parecia mais um advogado de defesa do que de acusação. Impressão: achava que não ganharia.
Depois do desembargador Alves de Brito, presidente da Nona Câmara e relator do processo em que Luiz Zveiter quer colocar Sergio Mazzillo como inventariante do ganhador da megasena de 54 milhões, ter se dado por IMPEDIDO, houve nova distribuição. O relator escolhido também se deu por IMPEDIDO. Alegaram MOTIVOS PESSOAIS. Mas já votaram duas vezes no mesmo processo. A verdade: intimidação total de Zveiter.
Ontem, o vice-presidente, Silvio Capanema, fez nova distribuição. Caiu com o desembargador Paulo Mauricio Pereira, ótimo. Mas o julgamento deve ficar para o ano que vem. Dia 20 começa o recesso, até lá ainda há muita tramitação. Zveiter-Mazzillo, trabalhando.
Pesquisa da Rádio Haroldo de Andrade, importante e que representa a realidade indestrutível: "Alguma pessoa da sua família já sofreu assalto?" S-I-M, 91%, N-Ã-O, 9%. Você reagiria se fosse assaltado? N-Ã-O, 100%.
Isso mostra o clima de insegurança geral e o fracasso da "política de segurança do governo Sérgio Cabral". E não há saída ou esperança.
Geraldo Mesquita, ontem, anunciou: "Voltarei contra a prorrogação da CPMF, acho um exagero". Como o voto será secreto, Tião vai puni-lo?
De todos os governadores, o mais tranqüilo em relação ao seu sucessor é Aécio Neves. Apoiará Fernando Pimentel, do PT-PT, favorito.
O que está em situação quase desesperadora, percebendo que terá que retroceder: José Serra. O favorito é Alckmin, do seu partido. Mas prefere Kassab, do antigo PFL, que não o assusta.
Tião Viana, que se reelegeu senador com o sacrifício do irmão (então governador, que ficou sem nada), ainda acredita que a luta dentro do PMDB venha em seu benefício. Quer ser efetivado.
Ontem, na reunião do PAC da Saúde, vários governadores. Sérgio Cabral não podia deixar de falar. Sibarita, troglodita, casuísta, carreirista, fez papelão ridículo. Disse que se a CPMF perder, "catástrofe". Como é que sabe?
O senador Renan Calheiros, como todo deputado ou senador, tem que pertencer a uma Comissão. Quem indica é o líder do partido, logicamente de acordo. Um ex-presidente do Senado receberá que missão ou comissão?
Ontem, dois senadores da oposição me diziam, pedindo sigilo (por que e para que), a surpresa com a renúncia de Renan: "Estava tudo combinado para a renúncia em fins de dezembro, depois da CPMF".
Terminaram: "Ninguém esperava essa renúncia, o próprio Renan continuava morando na Casa Oficial". Perguntei, isso influencia a votação da CPMF e aumenta a possibilidade de derrota do governo?
Resposta no mesmo tom de conspiração, olhando para todos os lados: "Você tem dito que o governo vai ganhar ou não haverá votação, é isso mesmo". Pelos meus cálculos, 49 votos o Planalto tem.
O aumento da participação da Petrobras no setor petroquímico merece aplausos. Há anos isso está para ser feito. A Petrobras tinha uma pequena participação na Petroquisa, pagava altos dividendos. Nota 10.
Cristina Lacerda fez uma boa foto de Moreira Franco com Carlos Alberto Direito. Faltou explicar: o agora ministro do Supremo deve tudo ao ex-governador. Desembargador, STJ, Supremo. Que amigo.
Desabafo de Lula no Planalto-Alvorada, pensava que ninguém estava ouvindo: "Não agüento mais esse ministro da Defesa, preferia que ele fosse de ataque". O jogo de palavras é bom, mas não melhora o ministro.
O presidente do PT-PT, Berzoini, está furioso e revoltado: acreditava que seria reeleito no primeiro turno, vai para o segundo, com risco de perder. Bota a culpa em José Dirceu. Tudo ele?
No mês de novembro, empresários (jogadores) estrangeiros ou empresas multinacionais compraram 47 bilhões de reais em ações, venderam 43 bilhões. Não pagam CPMF ou Imposto de Renda, ganham duas vezes.
Ontem, novamente por causa da Petrobras, a Bovespa funcionou em alta o tempo todo. Às 4, subia mais de 2%, em 64.850 pontos.
O dólar à mesma hora estava em 1,793, com queda de 0,75%. O BC retardou o anúncio sobre a taxa de juro, para sair na hora do Jornal Nacional. Meirelles quer "aumentar a blindagem".
Heloneida Studart e Vera Silvia Magalhães, quase no mesmo dia, na mesma semana, é uma vingança do tempo, uma violentação da realidade, duas mulheres extraordinárias. Viveram intensamente, não tanto quanto desejaram. Mas estiveram acima e além de qualquer outra, pioneiras.
Superaram as dificuldades da época e mais ainda: de um momento ditatorial, que conjugava como extrema-unção o verbo torturar. E torturavam mesmo. Física e psicologicamente, com o fervor da crueldade.
Como Heloneida viveu mais no Rio, fiquei muito mais amigo dela. Durante um tempo longo, escreveu nesta Tribuna. (O último artigo saiu semana passada). Quando não saía no dia seguinte ou no outro, telefonava perguntando. Sempre defendeu o interesse coletivo.
Vera Silvia marcou para sempre a foto daqueles 39 prisioneiros trocados pelo embaixador dos EUA. Foi a mulher mais torturada da nossa história. Mesmo homens, só Prestes e Apolonio de Carvalho sofreram tortura maior do que a dela, inimaginável.
A foto de Vera Silvia, sentada na cadeira, não podia andar por causa das torturas, é presença certa no imaginário dos lutadores.
XXX
Punir o Romario por causa de uma loção para o cabelo, absurdo. Suspendê-lo por 120 dias é o apogeu da contradição. Com quase 41 anos, ídolo em todos os clubes por onde passou (sem falar na seleção), Romario merecia que o processo fosse arquivado por impropriedade.
Como o Brasil é surrealista, contraditório e injusto, outro fato: Carlos Artur Nuzman, processando o jornalista Juca Kfouri. O juiz que recebeu o processo devia verificar os dois nomes, ver quem é o acusador e o acusado, e sentenciar: "Arquive-se imediatamente. Ou se transforme o acusador em acusado". Isso seria justiça verdadeira.
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Erro incrível do jornalão: Vera Silvia não foi torturada na Polícia do Exército. Presa e levada para o DOI-Codi, aí sim, torturadíssima. O único que esteve preso na Polícia do Exército (em 1963, antes da ditadura) e depois no DOI-Codi, estabeleço bem a diferença. A confusão de quem não viveu é que o DOI-Codi ocupou uma parte da PE, mas as duas, nenhuma ligação. Vera Silvia, barbarizada no DOI-Codi.
Fonte: Tribuna da Imprensa